Na segunda reportagem da série ‘Gestão da ausência’, o Desenrola mostra o impacto das ações de Assistência Social promovida a partir da perspectiva política da comunidade de samba Pagode Na Disciplina, localizada no Jardim Miriam, zona sul de São Paulo. Na zona oeste do município e em Osasco, vamos conhecer o trabalho das equipes de futebol de várzea Esporte Clube Ipanema e Complexo Vila Piauí, que já realizavam ações solidárias há muito tempo, mas devido à pandemia precisaram reinventar a sua forma de articulação com os moradores do território. Essas iniciativas estão transformando suas vivências comunitárias em inteligência e estratégia para reduzir o colapso social que já está afetando as periferias e favelas.
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Com mais de 140 mil habitantes, o Jardim Miriam é o bairro mais populoso do distrito de Cidade Ademar, região sul de São Paulo. Várias famílias que residem na região estão em alta situação de vulnerabilidade social, sem a garantia de acesso a recursos básicos para sobreviver. Consciente do seu papel comunitário e político, a comunidade de samba Pagode Na Disciplina está tentando minimizar a falta assistência social no território neste momento de pandemia.
Segundo Luana Vieira, integrante da comunidade de samba, a realização de ações solidárias tiveram início porque muitas famílias e moradores de rua estavam com dificuldades para se alimentar. “Muitos moradores de rua se localizam no bairro. O Bom Prato mais próximo daqui é na Vila Joaniza, que andando daria cerca de 40 minutos. Esses moradores não estão tendo condições de se alimentar, muitos dependem dos depósitos de reciclagem para venderem o que conseguem pegar na rua, os mesmos estão fechados”.
Além da distribuição de marmitas e cestas básicas que já ultrapassam as 250 unidades doadas, dado consolidado até o fechamento desta matéria, a comunidade de samba foi uma das poucas iniciativas que tiveram apoio do poder público no levantamento realizado pelo Desenrola. Érica Malunguinho, eleita a deputada estadual por São Paulo em 2018 se solidarizou com as ações da comunidade, que também é parceira da Uneafro Brasil, organização de direitos humanos que promove um debate nacional sobre injustiças raciais que afetam principalmente a população negra e periférica.
“A iniciativa começou por conta dos moradores de rua, mas tomou uma proporção maior, pois as famílias estão vindo retirar porque não tem alimento, não tem gás e estão sem se alimentarem”, explica Vieira.
Com a mesma proposta do Pagode da Disciplina, mas sem nenhum tipo de apoio de representantes do poder público, o projeto Favela Venceu que atua no Jardim Jacira, zona sul da cidade, na divisa com Itapecerica da Serra, tem realizado uma série de ações solidárias contando apenas com a parceria de comerciantes locais e moradores que não conseguem ver a quebrada ser impactada pela pandemia e não reagir.
A iniciativa já atendeu mais de 350 famílias e distribuiu quase 400 cestas básicas. Para Diego Souza, um dos integrantes do movimento comunitário Favela Venceu, a ideia era entregar 100 cestas, mas hoje não há mais um limite para atender a demanda de moradores. “Somos seres humanos e dói sentir fome. Não imagino passar fome, então se temos um pouco, temos que dividir. A meta era atender no máximo 100 famílias, mas hoje já não temos prazo para terminar”.
Zona Oeste: ações solidárias articuladas pelo futebol de várzea
Na favela do Jardim Ipanema, localizada no distrito do Jaraguá, zona oeste de São Paulo, o Esporte Clube Ipanema realiza anualmente uma feijoada comunitária para os moradores do território, como forma de criar um momento de lazer de maneira autônoma baseado nos valores culturais de quem mora na região há muitos anos.
Diante da pandemia, os integrantes da equipe que se responsabilizam pelas ações comunitárias do time varzeano mudaram totalmente o foco do seu trabalho. “Todo ano fazemos uma feijoada comunitária onde arrecadamos alimentos, mas esse ano não foi possível, por causa da pandemia. Aí resolvemos agir montando cestas para o povo. Não sabemos se iremos conseguir atender a todos, mas faremos esforço para atender o maior número possível”, diz Ademir Ferreira, articulador comunitário que integra a direção do Ipanema. Até o momento, a equipe já atendeu mais de 300 famílias, distribuindo cestas básicas e kits de higiene.
O distrito do Jaraguá faz divisa com o município de Osasco. Lá, Alex Stratorski, outro articulador comunitário que integra a diretoria do time Complexo Vila Piauí, está organizando o cadastro de famílias em situação de vulnerabilidade na favela da Brahma, ocupação de moradia no território que vem sofrendo inúmeras ações de reintegração de posse.
Embora esteja em fase inicial, a iniciativa já atendeu quase 40 famílias. Segundo Alex, a parceria com a Central Única das Favelas foi importante para dar início às ações. “Através da CUFA, começamos a repassar doações e distribuir na comunidade. Queremos atender 50% das pessoas que precisam”, afirma
Diferente dos coletivos culturais e organizações sociais que afirmaram não ter apoio de poder público, o levantamento identificou que os times de futebol da zona oeste têm parcerias com vereador locais, para apoiar a logística das doações.