“A casa é mais conhecida que eu”, conta Estevão Silva, criador do Castelinho em Paraisópolis

A partir de sua experiência como pedreiro e jardineiro, Estevão Silva transformou sua casa em uma obra de arte na zona sul de São Paulo.
Edição:
Evelyn Vilhena

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“Se você chegar lá na Giovanni [avenida em São Paulo], em qualquer lugar e perguntar ‘onde é a casa do Estevão’, pouca gente sabe. A casa é mais conhecida do que eu”, conta Estevão Silva da Conceição, 66, morador de Paraisópolis, bairro localizado na zona sul de São Paulo, que conquistou notoriedade ao transformar sua casa em uma obra de arte. 

O trabalho dedicado no desenvolvimento da casa está conectado a toda sua trajetória, que do cultivo de uma roseira criou o Castelinho, nome pelo qual a casa é conhecida na região. A casa tem aproximadamente 10 metros de altura, é dividida em três andares, e desde 1999 é aberta para visitas.

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Estevão nasceu na Bahia, em uma cidade do sertão, chamada Santo Estevão. “A minha infância lá era trabalho. Trabalhei até os 18 anos na roça, além de fazer a roça da gente eu trabalhava na roça dos outros”, relembra.

Estevão Silva mudou-se para São Paulo em busca de emprego e através de sua experiência como pedreiro e jardineiro, transformou sua casa em uma obra de arte. (Foto: Viviane Lima)

Em 1977, se mudou para São Paulo, com um amigo, à procura de emprego. “A maior parte [dos nordestinos] vêm neste destino de conseguir uma vida melhor e ter alguma coisa”, relata.

Ao chegar na capital paulista, o artista começou a trabalhar como servente de obra. “Nesse tempo, toda obra dava alojamento para a gente morar, tinha cantina”, conta sobre os primeiros anos em São Paulo e o período que morou em obras até 1985, quando se desligou da empresa. 

A região de Paraisópolis já era conhecida por Estevão, pois trabalhava perto do bairro e ia se divertir em um forró com os amigos na redondeza. “Foi um amigo meu que falou assim: ‘Estevão já que a gente saiu da firma vamos comprar um barraco lá em Paraisópolis’. Aí eu vim, comprei um barraquinho com o dinheiro que recebi da firma”, conta Estevão sobre sua chegada ao bairro.

“Eu cheguei em Paraisópolis em 1985 e tudo era casa de madeira, não tinha casa de bloco”

Estevão Silva

Na mesma época, Estevão passou a trabalhar com serviços gerais em um prédio, onde ficou por 24 anos. Entre as atividades que ele desempenhava estava a jardinagem, e foi do cultivo de uma roseira em seu terreno, que Estevão deu origem a conhecida “Casa de Pedra” em Paraisópolis, que atualmente é chamada de Castelinho pelos moradores.

Castelinho

Estevão deu início ao projeto arquitetônico assim que comprou sua casa no bairro. “Eu fiz toda essa instalação de ferro que era para a roseira se apoiar em cima”, menciona. A construção do Castelinho começou a ser feita na parte da frente do terreno, que de início também era a moradia da família. Atualmente a parte de trás do espaço abriga o salão de exposição. 

Com o tempo, o foco deixou de ser a criação da roseira e ele passou a fixar diversos objetos nas estruturas da casa, como porcelanas, telefones, xícaras, brinquedos e talheres. 

O artista diz que esse prato de porcelana azul foi o primeiro objeto a ser fixado na estrutura do Castelinho.
O artista diz que esse prato de porcelana azul foi o primeiro objeto a ser fixado na estrutura do Castelinho. (Foto: Viviane Lima)

“Comecei a fazer só para mim mesmo. Por isso que eu fiz baixinho, se eu fosse [pensar] assim: eu quero ser reconhecido como artista, eu tinha feito mais alto, para quando as pessoas altas chegarem não ter trabalho pra entrar”, comenta Estevão.

“Eu me sinto um cara lá em cima, [por] fazer uma obra que foi reconhecida [como semelhante] à obra do Gaudí”.

Estevão Silva
O local tem muitos detalhes, com os diferentes objetos que compõem a estrutura. (Foto: Viviane Lima)

Por volta dos anos 2000, Estevão começou a aparecer na mídia e a ser comparado com o arquiteto Antoni Gaudí. “Eu saí em vários jornais, revistas e tal. [Em] 2001, chegou a oportunidade que me levaram para Espanha. Ligaram para mim [falando] que iam fazer um documentário comigo, porque eu fiz um prédio parecido com o trabalho do Gaudí, sem [eu nem] conhecer”, conta sobre o fato da semelhança entre seu trabalho com o do arquiteto ter se desdobrado no documentário “Gaudí na Favela”.

Reflexos no cotidiano

Estevão conta que a maioria dos visitantes são turistas ou estudantes, e que os moradores do bairro não visitam muito o lugar. “Os daqui de perto viram [que] eu comecei a fazer desde o zero [e já] acostumaram. Bem pouca gente se interessa por conhecer”, diz. Ele comenta também que muitas pessoas passam em frente e não sabem que o Castelinho é um local aberto para visitas.

A entrada do Castelinho fica ao lado e dá acesso a uma das vielas de Paraisópolis. (Foto: Viviane Lima)

“Para mim foi uma [boa] divulgação, por ter tanto esforço de fazer esse trabalho para virar uma obra de arte e [conseguir] ser conhecido mundialmente”, compartilha sobre a repercussão que o Castelinho tomou fora do território.

Ele também menciona que teve oportunidade de estudar apenas até a 4ª série, e que mesmo sem ter concluído esse processo, entende como algo importante. “[Tem que] estudar, apesar que eu não estudei. Estudar e ter a influência de fazer alguma coisa na vida, né?”

Aposentado, Estevão aponta que o valor que recebe como artista não é o suficiente para manter a família financeiramente. “A gente tem uma casinha alugada e assim vai vivendo. Para viver da arte mesmo é muito pouco”, relata.

Estevão Silva trabalhando na finalização de uma obra, em frente ao Castelinho. (Foto: Viviane Lima)

Atualmente, Estevão mora em uma casa ao lado do Castelinho. “Eu gosto [de morar em Paraisópolis], se eu não gostasse não estaria aqui há 39 anos já”. Ele também conta que imagina a casa como um museu. “Isso aqui agora não pode desmanchar mais, os filhos têm que tomar conta, fica como casa museu.”

O espaço é administrado por Estevão e sua família. O filho mais velho, Enrique, cuida do agendamento das visitas e das redes sociais. Edilene, a matriarca do local, organiza e acompanha as visitas e entrevistas. Estevão constrói e faz a manutenção da estrutura.

Fora o valor da entrada para conhecer o local, que custa R$ 30 por pessoa, Estevão também produz quadros, violões ornamentados, esculturas e vasos que estão à venda por preços variados. 

O Castelinho se destaca entre as construções comuns do bairro Paraisópolis. (Foto Viviane Lima)

O Castelinho fica na Rua Herbert Spencer, n° 270, e pode ser visitado, das 10h às 17h, mediante agendamento no número (11) 98385-5771.

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