Podcast vira estratégia digital para engajar mulheres nas periferias

Edição:
Ronaldo Matos

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Comunicadoras que atuam nos distritos de Parelheiros e Capão Redondo estão apostando no podcast como uma ferramenta que pode ser mais acessível e democrática para criar um diálogo mais próximo e afetivo com moradoras das quebradas de São Paulo. 

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 A Coletiva Subversiva é formada por jovens comunicadoras de Parelheiros, zona sul de São Paulo (Arquivo pessoal)

“Não queremos e não podemos falar pelo território, devemos falar com o território, falar com as mulheres que aqui estão”, afirma Beatriz Klein, 18, moradora nascida e criada em Parelheiros, distrito da zona sul de São Paulo. Ela é integrante da Coletiva Subversiva, um grupo de cinco mulheres comunicadoras da região que criaram o podcast ‘Balbúrdia Coletiva’, com o intuito de subverter o termo e informar principalmente as mulheres do bairro.

Maternidade da mulher negra, autocuidado da mulher periférica, educomunicação e educação sexual foram alguns dos temas que já foram abordados pelo podcast Balbúrdia. Segundo a produtora, os conteúdos servem como pontes entre mulheres, para que elas possam expressar suas subjetividades através da sua voz em um espaço digital. “As convidadas são mulheres que são referência para nós e que nos inspiram, mulheres periféricas que sempre somam com o território de forma positiva e transformadora”, afirma Beatriz.

O podcast é dividido em blocos. O que faz a transição de um bloco para o outro é uma música de autoria das próprias convidadas e de outros artistas do território. O bate papo que dá origem a entrevista é realizado através de uma reunião no Google Meet. “Conseguimos gravar esse bate papo, então a conversa fica mais orgânica e conseguimos interagir muito mais e respeitamos o isolamento”, conta Beatriz, ressaltando a importância de entender o podcast como um processo de diálogo coletivo.

As plataformas mais acessadas pelos podcast são Spotify, Other, Google Podcasts, Anchor e Overcast. A periodicidade dos episódios é quinzenal, porém a maior dificuldade encontrada pelo grupo para produzir não é a elaboração de conteúdo, mas sim a conexão de internet que muitas vezes costuma cair no momento das reuniões online que dão origem as entrevistas. “Na maioria das gravações caímos da reunião em muitos momentos, isso atrapalha porque perdemos a meada da conversa durante a gravação”, relata Beatriz.

Mesmo com as dificuldades para acessar uma internet de qualidade, a coletiva mantém o podcast na ativa, pois elas são inspiradas a todo o momento pela troca de saberes, por meio da comunicação. “Acreditamos na importância de trocar saberes e alimentar o nosso aquilombamento”, ressalta a produtora de conteúdo, afirmando a importância de destacar pessoas negras como referências nos conteúdos que elas produzem. “Buscamos em conjunto racializar nossas pautas e lembrar sempre que antes de qualquer característica ou situação social, o que chega primeiro é a cor da pele”.

Essa referência da coletiva de ‘aquilombamento’ na informação contribui para elas usarem recursos da escuta ativa na produção dos podcats. “Quilombos duraram e resistiram por décadas nesse país, eles se ensinavam e se escutavam, aprenderam a lutar, a plantar, sempre lembro que Tereza de Benguela criou um parlamento dentro do quilombo para que tomassem decisões justas e alinhadas”, finaliza Beatriz. 

 “Minha grande preocupação sempre foi levar informação de qualidade”

A jornalista Gisele Alexandre produz o podcast Manda Notícias em sua casa ( Alex Silva)

“Fiz um lista de distribuição no Whatsapp com 200 números de amigos, colegas e familiares. Essas pessoas me acionavam mais, e mandei o podcast pra eles”, descreve a jornalista Gisele Alexandre, apontando como foi o início dos trabalhos para distribuir o podcast Manda Notícias. A moradora do Parque Munhoz, localizado do distrito Capão Redondo, zona sul de São Paulo, criou um boletim informativo em áudio com as principais notícias sobre os acontecimentos da pandemia de coronavírus.

Tudo começou quando ela começou a se perguntar como iria como iria contribuir para levar informação para o seu bairro. Neste meio tempo, ela começou a receber mensagens no seu Whatsapp de pessoas que estavam com dúvidas sobre o novo coronavírus. “Ai eu pensei: via áudio parece que eu consigo esclarecer as dúvidas e passar isso pra mais gente, aí foi que surgiu a ideia de montar um podcast”, relembra Gisele.

Ela levou uma semana para elaborar a ideia do podcast, começando pelo aprendizado técnica de aprender a usar softwares para edição de áudios, e colocou no ar.

Os retornos de moradores sobre o conteúdo foram surgindo organicamente, e a partir desses feedbacks a jornalista foi entendendo novas possibilidades para ter um maior alcance de distribuição de conteúdo, construindo uma página de divulgação no Facebook e mensagens instantâneas no Whatsapp .

“Minha grande preocupação sempre foi levar informação de qualidade”, afirma Gisele, ao relembrar das suas maiores dificuldades para a produção do podcast na pandemia, que foi a falta de dados públicos para conseguir passar uma informação de qualidade para seus ouvintes.

Para lidar com essa falta de transparência do poder público, a jornalista adotou novas estratégias para captação de dados de forma orgânica e consistente. “Eu me inscrevi em todos os meios de informação oficial, o telegram do governo do estado, ficava no pé da prefeitura, com e-mails diretamente pra prefeitura né, pra secretaria de saúde e foi isso”, detalha.

Além do intuito de democratizar o acesso à informação, a jornalista ressalta a necessidade de potencializar e fazer com que vozes femininas ocupem o espaço na comunicação digital. “O machismo ele existe em todas as relações. E isso não é diferente na comunicação, pelo contrário”, afirma Gisele.

Ela considera que os melhores meios para se ter mais pluralidade de vozes se expressando na comunicação digital é a partir da autoafirmação das mulheres nesses lugares. “O que a gente consegue é entender um pouco mais esse nosso lugar, e se expressar a partir disso”.

Recentemente o episódio do podcast Manda Notícias que traz a pauta de violência contra mulher foi premiado como segundo melhor podcast pelo Instituto Jatobás, organização que vem investindo em projetos de combate às desigualdades sociais nas periferias de São Paulo.

Ela relata que após produzir 60 episódio durante cinco meses com conteúdos exibidos toda segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira, foi possível formar uma lista de transmissão com 500 pessoas. Após esses acúmulos, Gisele resolveu encerrar essa temporada para pensar em novas abordagens que tenha mais elementos para uma comunicação eficiente.

“Eu encerrei a primeira fase do Manda Notícias pra pensar em um manda notícias do futuro, é o que eu posso contribuir para essas relações que estabeleci é contribuir dentro do podcast”, finaliza.

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