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Israel Neto: escritor fortalece a literatura antirracista nas periferias

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Escritor, educador, produtor musical e MC, são algumas das atuações de Israel Neto, que tem se dedicado a fortalecer e valorizar as produções afrofuturistas e contos antirracistas nas periferias.

Com uma trajetória dedicada ao fortalecimento e valorização do gênero literário afrofuturista e antirracistas nas periferias, Israel Neto, de 34 anos, é nascido e criado na região da Brasilândia, zona norte de São Paulo, e trabalha desde os 17 anos com a arte, atuando principalmente em discussões sobre educação, literatura e música

Tudo começou quando ele e mais alguns amigos se uniram para promover ações dentro das quebradas da zona norte. O escritor, que também é educador e MC, conta que ficou um tempo sem escrever, estudando sobre literatura fantástica, e o universo da cultura pop.

“Fui em todas as feiras que você imaginar, comecei a participar de clubes e constatei que só tinha branco nesse rolê, a galera era racista pra caramba e colocando os personagens negros de maneira esteriotipada”, compartila o escritor, que tem ligação com o mundo da literatura afrofuturista e ficcional também por influencia de sua mãe, que era leitora de ficção científica.

Após encontros e idealizações, junto com alguns amigos, iniciaram ciclos de bate-papos dentro das escolas, sendo que esse foi um dos primeiros caminhos que utilizaram para promover mudanças dentro do território onde moravam. Nesses bate-papos, incentivaram a ligação com a dança, canto, poesia e falavam sobre a cultura negra.

Esses ciclos iniciaram em 2007 e se estenderam durante um ano, tendo como incentivo a Lei nº10.639, que estabelece as bases da educação no Brasil, incluindo na grade curricular oficial da rede de ensino a temática obrigatória de “História e Cultura Afro-Brasileira”.

Incentivo a produção afrofuturista e antirracista nas escolas

Em 2009, Israel começou o curso chamado “Escola da África”, que acontecia dentro de uma das escolas em que passou durante esse tempo. O curso foi mantido por 4 anos, uma vez na semana, onde preparavam oficinas, passeios e traziam convidados para falar da cultura negra com os alunos.

“A gente preparava para eles cada semana uma oficina, sobre a cultura negra, cultura africana, trazia convidados, fazia passeios, então foi um momento muito gostoso”, relembrou o escritor sobre as atividades que realizou dentro das escolas.

E foi a partir dessas ações que o educador começou a realizar um desejo antigo de escrever usando esses ciclos de conversa, como base para criar uma história que ele pudesse usar para trabalhar com as crianças e adolescentes, público que sempre tinha ali por perto. 

“Então eu começo a escrever o romance Amor Banto em Terras Brasileiras, é um livro que foi publicado em 2011, teve a 2ª edição publicada agora em 2018 e em 2020 ganhou uma versão em francês que está rodando lá na França”

contou Israel.

Livros publicados do escritor Israel Neto – Foto: Arquivo pessoal

Assim que termina o curso “Escola da África”, Israel e amigos montam um novo projeto chamado “Coleção Literária Besouro”, em 2012, que está em atividade até hoje. O projeto consiste em publicações de livros infantis e infanto-juvenis, ainda no intuito de fomentar e aproximar as temáticas da história e cultura Afro-Brasileira no ambiente educacional, junto às crianças, adolescentes e educadores.

A partir da influência e das vivências que construiu utilizando a literatura, a história e cultura afro-brasileira, Israel e seus companheiros fundaram a Editora Kitembo, com o objetivo de quebrar alguns estereótipos do mercado editorial, disputando comercialmente com livros já lançados e de outros gêneros.

“Sempre fomos amantes da cultura pop, da cultura geek. Só depois de adultos conseguimos acessar esses produtos culturais, a nível mesmo de comprar uma HQ, ir no cinema, enfim”, conta o escritor, que tem na Kitembo um espaço de estímulo para novos escritores e jovens que têm interesse em falar e escrever sobre ficção científica, fantasia, horror.

Desde 2018 até agora, o catálogo da Editora Kitembo conta com a presença de 11 obras em seu catálogo, e com a assinatura de autores, ilustradores, com uma diversidade de gênero, porém todos eles negros. Jovens, adultos e alguns até residentes de outros estados para além de São Paulo, como o Ceará, Paraíba, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

“A nossa pergunta provacativa era sempre essa: me fala três escritoras ou escritores negros, brasileiros, que escrevem horror, romanscitas, ficcção científica”, citou o escritor sobre a importância do trabalho da Editora. 

Israel em uma roda de leitura com jovens – Foto Arquivo pessoal

As contribuições, estudos e aprendizados ligados ao ensino da história e cultura afro-brasileira, também refletiram em outras produções do escritor. Em 2021, Israel lançou o livro Ancestral, obra afrofuturista que navega pelas culturas do centro, sul e noroeste africano. A obra está concorrendo como melhor literatura geek, no prêmio Clube de Ouro de 2022.

“Todos os livros falam de identidade, de valorização, de potencial da cultura negra, da beleza, só que a gente fala através da fantasia, da ficção, da literatura fantástica”, finalizou Israel, que ao longo de sua carreira tem buscado incentivar jovens leitores a conhecer autores negros, periféricos, fomentando o busca pela identidade, criatividade, resgate da autoestima.


Varre Vila transforma hábitos de coleta de lixo na zona leste de São Paulo

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Em parceria com moradores e poder público, projeto realiza ações de educação ambiental para melhorar os processos de limpeza e conservação dos espaços comuns das periferias de São Paulo. 

Quadra do bairro Santa Inês, zona leste, depois da revitalização do Varre Vila. Foto: Redes Sociais

Durante o ano de 2020, auge da pandemia de covid-19, a Prefeitura de São Paulo registrou aumento de 17,4% na coleta seletiva de resíduos domiciliares. Neste contexto, o trabalho de iniciativas como o Varre Vila, teve grande impacto, pois o projeto criado em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, transforma moradores em agentes comunitários que zelam pela limpeza das ruas, praças e vielas do território.

Mesmo durante o período de isolamento social, os trabalhos não pararam para o Varre Vila, iniciativa que existe há 10 anos e tem como ponto de partida realizar este tipo de trabalho de mobilização de moradores no bairro Santa Inês, que faz parte do distrito de Ermelino Matarazzo.

“Antes eu descartava o lixo juntando tudo, não tinha essa noção de como impacta o meio ambiente”

Jenilda Maria de Jesus, 50, é professora e mora no bairro Santa Inês, no distrito de Ermelino Matarazzo. 

Espaço comum de lazer e convívio dos moradores do Jardim Santa Inês passou pelo processo de revitalização promovido pela Varre Vila. (Arquivo pessoal)

Para a professora e moradora do bairro Santa Inês, Jenilda Maria de Jesus, 50, a relação dos moradores com o lixo impactou não só a limpeza do bairro, mas também a auto estima.

“O Varre, além de proporcionar a limpeza da rua, ele também proporciona a limpeza pessoal. Através do trabalho com lixo e com as pessoas, o projeto já começa com diferencial que é o envolvimento com as pessoas como um todo”, afirma a moradora.

Uma das principais mudanças de comportamento notadas pela professora é o aumento de atenção em relação ao descarte e separação do lixo domiciliar. “Antes eu descartava o lixo juntando tudo, não tinha essa noção de como impacta o meio ambiente e aqui a gente não tinha hora para colocar lixo”, relata a professora.

“A gente entra no território desacreditado e vamos fazer um resgate da confiança entre prefeitura, empresa e morador”

Ionilton Gomes de Aragão, 53, é morador do bairro União de Vila Nova e criador do Varre Vila.

Rotatória onde o lixo é acumulado para remoção. Foto: Ionilton Aragão

O idealizador do projeto, Ionilton Gomes de Aragão, 53, um baiano nascido na Chapada Diamantina, e morador do bairro União de Vila Nova, zona leste, afirma que a ideia é promover a mudança de comportamento e melhoramento dos espaços em comum entre os moradores da região em que o projeto atua.

“A gente entra no território desacreditado e vamos fazer um resgate da confiança entre prefeitura, empresa e morador. Nesses lugares em que a confiança está comprometida, principalmente na periferia, a gente vai tentar conversar com as lideranças e lá dizem que não tem jeito, limpa hoje, amanhã já tá tudo sujo de novo”, comenta menta Aragão.

Para o criador do projeto, o Varre Vila é pautado na mudança de comportamento através de conversas e ensinamentos, ministrados por ele e uma equipe do projeto, nos próprios bairros em implementação, batendo de porta em porta e os convidando para entender a proposta de descarte dos lixos orgânicos, sólidos, recicláveis e entulhos.

O idealizador do projeto explica que utiliza os princípios de Paulo Freire e uma das metodologias aplicadas no projeto é como a do metrô, onde os que estão pichados, são recolhidos para a limpeza antes de voltar a circular, ou seja, o autor nunca mais o vê. Segundo ele, com os moradores funciona da mesma maneira em relação ao lixo. Quando um morador vê o descarte incorreto, ele mesmo tira o quanto antes.

“Tudo isso tem a ver com a disciplina. E aí o morador pensa ‘sempre joguei o lixo aqui’ mas eu faço uma abordagem de que eu estou compartilhando a responsabilidade com eles, eu não tô trazendo uma ordem de que tem que trazer o lixo naquele horário, pronto acabou”, explica.

Os moradores dos bairros onde o Varre Vila atua, passaram por um processo de reeducação, onde aprendem a lidar com o lixo reciclável, com os orgânicos e através da composteira transformar em adubo, e também o entulho.

“Hoje é notável, se você chegar aqui no bairro você não vai ver lixo nas calçadas de forma aleatória e até a maneira de descartá-lo é diferente”, enfatiza a professora, ressaltando a transformação que o projeto gerou de forma coletiva no bairro. 

Túnel revitalizado no bairro União de Vila Nova pelo Varre Vila. Foto: Thomaz Martins

Articulação comunitária 

Durante as reuniões que acontecem nas próprias ruas, os moradores recebem orientações de descartes, combinam os melhores dias e horários para o recolhimento de seus lixos e recebem 20 unidades de sacolas plásticas de 50 litros para a partir daquele momento fazer o descarte correto.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, cerca de mais de 50% dos resíduos sólidos são gerados por atividades humanas de construções. Por conta disso, o Varre Vila também propõe a mudança de hábitos dos construtores da quebrada, os pedreiros e ajudantes que recebem orientações mais específicas e diretas sobre os resíduos pós obras. É uma parceria à parte, já que são eles quem dão fim aos entulhos.

“A geração de entulho passa pelo pedreiro, se nós tivermos o pedreiro conosco ele não vai deixar ninguém levar esse entulho para qualquer lugar, ele vai ensacar bonitinho e levar para o ecoponto ou vai contratar uma caçamba”, explica Aragão.

O Varre Vila disponibiliza uma caçamba de lixo na última sexta e sábado do mês, onde recolhe aproximadamente 30 toneladas de entulho. Nos primeiros quatro anos deste serviço, o projeto disponibilizou um calendário anual com imã de geladeira para os moradores, depois desse período virou hábito e não precisavam mais dele.

Segundo a prefeitura da cidade de São Paulo, existem cerca de 10 mil funcionários responsáveis pela limpeza urbana, que atendem aproximadamente 7.800 quilômetros de vias. São coletadas, em média, 270 toneladas de resíduos domésticos por mês.

Ainda assim, iniciativas como o Varre Vila, acabam se tornando uma ação fundamental para promover o serviço onde o serviço público não chega até a população com a possibilidade de oferecer uma educação ambiental.

Grupo de teatro discute infância e funk em espaços culturais periféricos na zona sul de SP

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 O grupo de teatro Rosas Periférica usa funk para retratar o cotidiano das crianças nas periferias.

Embalado pelo ritmo do funk, o espetáculo retrata o universo das crianças, seus sonhos e desejos. (Foto: Andressa Santos)

Nesta quarta-feira (18), o grupo Rosas Periférica dá sequência a uma série de apresentações gratuitas do espetáculo Ladeira das Crianças – TeatroFunk em espaços culturais independentes localizados no Jardim São Luís, Campo Limpo e Capão Redondo, zona sul de São Paulo.

Após realizar uma série de apresentações na zona leste de São Paulo, o espetáculo chega a ONG Interferência, localizada no Capão Redondo, com apresentações às 11h e 14h. Dando continuidade na circulação pela região, no dia 28, o grupo se apresenta às 11h no Espaço Cultural CITA, no Campo Limpo, e no mesmo dia estará presente às 13h na Quadra da Comunidade Monte Azul.

No domingo (29), o Rosas Periféricas encerra a sua temporada de apresentações presenciais nas periferias da zona sul de São Paulo com uma intervenção às 11h na Casa 27 e às 15h realiza a última encenação na Biblioteca Comunitária Luiza Erundina, localizada no Jardim Ibirapuera.

Cena do espetáculo Ladeira das Crianças – TeatroFunk. (Foto: Andressa Santos)

Inspirados pelos livros ‘O Pote Mágico’ e ‘Amanhecer Esmeralda’ do escritor Ferréz, o grupo de teatro Rosas Periféricas criou o espetáculo Ladeira das Crianças – TeatroFunk, para retratar o universo das crianças periféricas, seus desejos e sonhos embalados pelo ritmo do funk.

No espetáculo tem vários personagens marcantes da infância nas periferias: tem criança que sonha em ser DJ, menino curioso para saber o que há dentro do pote e menina de cabelo de nuvem e garota que vive no mundo da lua.

A peça, dirigida pelo coletivo, estreou em 2019, quando o grupo completou 10 anos. Investigando o próprio território, os integrantes perceberam a importância das crianças para formação de um público periférico e, junto com elas, da valorização da linguagem do funk na região.

Confira a programação:

18/ de maio (quarta-feira)

11h e 14h – ONG Interferência

Rua José de Brito, 91 – Jardim Lilah. SP/SP.

25 de maio (quarta-feira)

15h – Exibição online nas páginas

Facebook e Youtube do Grupo Rosas Periféricas

27 de maio (sexta-feira)

15h – Exibição online nas páginas

Facebook e Youtube do Grupo Rosas Periféricas

28 de maio (sábado)

10h – Espaço Cultural – CITA

Rua Aroldo de Azevedo, 20 – Jardim Bom Refúgio. Campo Limpo. SP/SP.

13h Quadra da Comunidade Monte Azul

Rua Vitalina Grasmann, 290 – Jardim Monte Azul. SP/SP.

29 de maio (domingo)

11h – Casa 27

Rua Pedro Starbulov, 152 – Grajaú. SP/SP.

15h Biblioteca Comunitária Luiza Erundina

Rua Acédio José Fontanete, 86 – Viela Química, Jardim Ibirapuera. SP/SP.

Coletiva Jovem: periferia e alternativas para trabalho e renda

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Os jovens estão sim capacitados, querem sim trabalhar e sabem sim se organizar.

Jovens na oficina de escrita do edital VAI realizada no Bloco do Beco, na zona sul de SP, em abril de 2022.

Ao andar nas ruas podemos observar o aumento de trabalhadores “informais”, muitos jovens com mochilas nas costas trabalhando em meio a chuva e muitos motoristas de aplicativo utilizando “táticas” para ampliar seu ganho mensal, a realidade do trabalho está em mudança, não só no Brasil como no mundo, a ideia de que a burocracia e o envolvimento do Estado no campo do trabalho são um problema estão mais ferrenhas e os brasileiros vem sofrendo um desmonte do que conhecemos um dia como “realidade do trabalhador”.

Buscando ressignificar suas histórias, dar um novo rumo a sua vida ou até mesmo deixar de passar por situações violentas, trabalhadores das periferias acabam construindo seus negócios individuais ou aderindo ao movimento dos coletivos que geram trabalho (neste caso em especial existe uma grande presença de jovens e do meio cultural).

Pensando nisso e em outras questões, a pesquisa financiada pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e em parceria com Ação Educativa, São Mateus em Movimento e Bloco do Beco, a Coletiva Jovem se define enquanto pesquisa-ação e vem ao longo de mais de 2 anos pesquisando dentro da periferia e mais recentemente sendo implementada.

O boletim explicativo com dados detalhados que está disponível no site da Coletiva, ainda explicita que existem 3 principais segmentos nesses coletivos e empreendimentos: cultura, moda e educação. Menos da metade se consideram formalizados, 82% precisam acumular mais de um trabalho para conseguir manter sua renda mensal e 62,5% têm como “sede” a casa de algum dos integrantes.

Como desvantagem principal os coletivos apontam a insegurança com a renda mensal, já os empreendimentos apontam não terem direitos associados ao trabalho.

Jovens na oficina de escrita do edital VAI realizada no espaço São Mateus em Movimento, na zona leste de SP, em abril de 2022.

 Mas o que tudo isso explica sobre histórias e identidades? 

Bem, nos primeiros dados que apresentei aqui já pode-se ver questões como a construção em conjunto, o lugar do jovem nessa história e no mercado de trabalho (parte desses jovens construíram seus próprios negócios a partir de situações difíceis ou com o impulso e planejamento de conseguir empregar seus amigos e explorar algum conhecimento que possuíam, por vezes conhecimentos com fundo afetivo que tem ligação com aprendizado familiar e coletivo).

Isso nos leva a refletir não somente sobre como esses jovens estão sim querendo trabalhar e possuem sim conhecimento para o mercado, bem como precisam de oportunidades para viverem seus sonhos e políticas públicas podem transformar essas realidades complexas e exaustivas de acumulação de trabalho, ausência de direitos, entre outros.

Jovens na oficina sobre alternativas de trabalho realizada no Bloco do Beco, na zona sul de SP, em maio de 2022.

Observar alternativas que buscam fortalecer trabalho e renda na periferia é analisar a contramão as políticas de um Estado que nos largou, a Coletiva Jovem traz não só os dados como uma possibilidade de mudança, mas a participação ativa de jovens em rede como uma possibilidade de transformar a narrativa, os jovens estão sim capacitados, querem sim trabalhar e sabem sim se organizar.

Acreditamos ser possível construir políticas públicas com a participação jovem e que visem garantir direitos básicos, bem como no “nóis por nóis”, e as redes que se formaram na periferia ao longo dos anos como forma de resistência. Eu acredito na Zona Sul e Zona Show como polo cultural, resistente e de luta.

Nós podemos, juntos, podemos e eles sabem disso, por isso nos falaram que é difícil convivermos, mas nós provamos todos os dias que isso é mentira. 

E aí, que tipo de trampo você sonha que nossos jovens acessem? 

Tô no ponto, hora da facul

“Santo Amaro”, “Campo Limpo”, ” Ângela”

Cadê o Capão? Chegou!

Subo e acompanho a cena

Passa o Hospital, passa o terminal

Passo perto da Santos Mártires

Essa muda a quebrada sem igual

Tô de boa, passo em frente à 1daSul

Lembro do Ferréz, Racionais, TSG

Eu tô diante da História, tru

Saulo VilaNova

“Somos matáveis”: abolicionismo penal revela presença da escravidão dentro do sistema prisional brasileiro

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Entrevista realizada pelo Desenrola com Fábio Pereira Campos, abolicionista e integrante do movimento social Amparar, mostra como o tratamento desumano dado aos escravos durante mais de 300 anos no Brasil continua mais vivo do que nunca, só que agora, acontece também dentro dos presídios brasileiros.

Fábio Pereira Campos, 44 anos, abolicionista e integrante da Associação Amparar. Foto: Arquivo Pessoal.

Como o Abolicionismo Penal poderia transformar a vida da população negra brasileira, moradora das periferias e favelas que passa pelo processo de encarceramento? Essa é a pergunta que norteia a entrevista especial realizada com Fábio Pereira, 44, estudante de Serviço Social na Universidade Federal de São Paulo, que apresenta uma série de argumentos sólidos que questionam se o dia 13 de maio é de fato uma data para celebrar a Abolição da Escravatura no Brasil.

“A gente tem dificuldade de elaborar história e memória. Enquanto a gente não conseguir fazer isso de uma forma mais sistematizada, a história vai ser sempre contada pelo outro (pessoas brancas). E pelo outro ficou tudo legalzinho, a princesa assinou a Lei Áurea, e ficou tudo certo”, ironiza o estudante de serviço social.

Desde 2015, Pereira atua como militante no movimento social Amparar, atendendo pessoas e famílias afetadas pelas marcas do sistema prisional brasileiro, em busca de garantir acesso à informação e a direitos fundamentais, que possam reduzir o sofrimento destes sujeitos, que em sua maioria são negros e moradores das periferias e favelas.

“As famílias que estão sofrendo processos de vulnerabilidade social”

Na Amparar, Fábio Pereira realiza atendimento de famílias afetadas pelas desigualdades sociais causadas pelo sistema prisional brasileiro.

Fábio participou de um intercâmbio em fevereiro de 2022, onde conheceu organizações de lutas antiprisionais na Argentina. Foto: Arquivo Pessoal.

 Além deste trabalho, ele utiliza a sua vivência dentro da universidade para desenvolver uma pesquisa sobre o Abolicionismo Penal, que de acordo com suas descobertas, se trata da continuidade da escravidão, através de uma série de fatos que mostram claramente que o tratamento dado aos escravos durante mais de 300 anos no Brasil continua mais vivo do que nunca, só que agora, acontece dentro dos presídios brasileiros.

Esse estudo tem o objetivo de entender como os assistentes sociais atuam para ajudar as famílias de pessoas presas, e quais são os retornos que esses profissionais recebem diante de todo esse trabalho.

“As famílias que estão sofrendo processos de vulnerabilidade social, tem todo um processo do aumento da pobreza, porque elas têm que dar conta de suas casas, e tem que dar conta para manter uma pessoa que está presa”, argumenta.

Segundo o estudo de Pereira, a sociedade enxerga o Abolicionismo Penal de forma limitada, e que é preciso desmistificar o que as pessoas entendem, pois essa não é uma ação com finalidade de acabar com as cadeias ou colocar todo mundo na rua.

“A ideia do abolicionismo penal é abolir a pena , e dessa forma a prisão perderia a sua suposta função social, que é maquiar o controle e as torturas de determinados corpos racializados através de uma falsa ideia de justiça”, , explica Pereira.

Outro propósito do Abolicionismo Penal é  garantir que essas pessoas encarceradas e suas famílias sejam acolhidas e auxiliadas diante de suas realidades, sem precisarem passar pela malha do judiciário. “É preciso pensar políticas públicas que alcancem uma dimensão que não determine outro processo de isolar aquelas pessoas e acharem que os problemas estão sendo resolvidos a partir do isolamento, sendo que essa pessoa tem que sair em um determinado momento e ela precisa de alguma forma ser restabelecida na sua cidadania”, explica Pereira.

Sobreviventes: marcas da escravidão 

Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública e do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional, publicados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 66,3% da população carcerária no Brasil se autodeclara preta ou parda. Ou seja, dos 759 mil presos, 397 mil são afro-brasileiros e 195 mil são brancos.

“Você vai ficar 3 anos e 5 meses sendo torturado, de vez em quando vai chegar uma comida estragada e tudo bem, você vai tomar banho frio, e tudo bem se você tiver tuberculose e qualquer coisa”

Fábio Pereira é estudante de Serviço Social e pesquisador do Abolicionismo Penal.

Presença da Associação Amparar na Marcha da Maconha em 2019. Foto: Arquivo Pessoal.

Para Pereira, entre as marcas ainda presentes da escravidão nos dias de hoje diante da periferia, está o tratamento diferente para pessoas negras e brancas dentro das penitenciárias, o descaso com os encarcerados, a falta de políticas públicas para as famílias, e as condições dos serviços de saúde, alimentação e moradia dentro dos presídios.

“Ele [o juiz] não fala pra você: olha você vai ser preso, vai ficar 3 anos e 5 meses sendo torturado, de vez em quando vai chegar uma comida estragada e tudo bem, você vai tomar banho frio, e tudo bem se você tiver tuberculose e qualquer coisa, porque você vai ter que aguentar isso, porque você cometeu um crime”, argumenta Pereira.

No seu ponto de vista abolicionista, as cadeias foram construídas já pensando nos povos mais vulneráveis, e mesmo tendo pessoas brancas nesse espaço, esse local de cadeia, de aprisionamento, foi e sempre será mantido para pessoas pretas, isso simboliza um marco da escravidão e que afeta até hoje a realidade dos povos das periferias.

“As pessoas estão morrendo de fome na cadeia, tem alguma coisa muito errada com a nossa humanidade. Só que é a mesma humanidade que construiu esse processo escravista, porque as pessoas que frequentam ou são levadas para dentro do sistema prisional, elas têm as mesmas características dos nossos ancestrais”, afirma.

“Essas pessoas não são egressas, são sobreviventes do sistema prisional”

Desde 2015, Fábio Pereira trabalha na Amparar, organização social que promove ações para garantir os direitos sociais de pessoas encarceradas e suas famílias.

Fábio Pereira, abolicionista, estudante de Serviço Social e criado na favela do Jabaquara, Americanópolis. Foto: Arquivo Pessoal. 

De acordo com o Anuário de Segurança Pública de 2021, 250 presos morreram no sistema prisional do Estado de São Paulo em 2020. O Rio de Janeiro ficou em segundo lugar, com 154 óbitos. O suicídio está entre as principais causas das mortes de presos, segundo o estudo.

Pereira considera que as pessoas que conseguem sair do sistema prisional no Brasil não são egressas, como aponta a Lei de Execução Penal (LEP), mas sim, sobreviventes. Esses sobreviventes são vistos como mercadorias, e sempre colocadas de escanteio, principalmente quando seus perfis se tratam de pessoas pretas, periféricas, a falta de auxílio dentro das cadeias para esses que são tratados como minoria, é presente e visível.

“A pessoa não é confundida, ela é identificada”

Fábio Pereira atua como assistente social, dialogando diretamente com pessoas que sobreviveram ao sistema prisional brasileiro.

“Uma pessoa presa, o Estado vive dizendo que ela custa de 3 a 4 mil, e a gente sabe que essa não é a grana pra manutenção da vida dessas pessoas. Esses lugares de confinamento, esses calabouços que se institui as prisões no Brasil, e no mundo”, diz.

Na Bahia, onde 81,1% da população se autodeclara preta ou parda, o estado diz que gasta 3.273 reais por cada preso dentro do sistema prisional. Em Tocantins, esse valor aumenta ainda mais. O estado gasta por mês 4.200 reais por preso. Em São Paulo, o governo gasta 1.373 reais com cada preso, um valor que reforça a tese de Pereira, de ser um valor insuficiente para manter uma pessoa vivendo com dignidade dentro do sistema prisional. 

O formato de encarceramento no país 

Mas para além desta realidade, está o fato de que a construção de um sujeito criminoso ainda precisa ser debatido, pois foi estruturada no pensamento de que “bandido bom é bandido morto”, e é a partir deste pensamento que o sistema penal do país começa a colocar em prática seus formatos de encarceramento.

“A pessoa não é confundida, ela é identificada, ela tem uma identidade racializada enquanto sujeito criminoso, porque ela tá dentro desse bojo da construção desse sujeito”, enfatiza o abolicionista.

O estudante e pesquisador entende o sistema penal como um espaço de castigo, no qual as pessoas são tratadas como material descartável, e que ninguém faz nada para mudar, por isso, ele ressalta a importância de lutar e pontuar o que realmente acontece dentro desses locais, e que isso já não é mais um sistema, isso é um crime.

“A gente precisa reivindicar esse lugar, a gente precisa apontar o que as prisões têm feito no mundo também é um crime de lesa-humanidade, e ninguém se importa. Porque são pessoas que são descartáveis”, afirma o abolicionista.

O estudante de serviço social também diz que o tratamento praticado diante de pessoas em estado de encarceramento é sempre baseado em sua etnia, do solo de onde veio, e que isso sempre aconteceu, pois, segundo ele, a ideia era que pessoas negras fossem totalmente arrancadas da sociedade, reforçando também o fato de que os povos pretos são sobreviventes no país.

“Cadeia não reabilita ninguém, é simplesmente um lugar de castigo, de vingança social, são as pessoas que sobreviveram ao processo de embranquecimento no Brasil que vão passar por esses lugares. Porque a ideia é que não existisse mais negros em 2022”, finaliza.

Artistas e coletivos de reggae, moda e funk ocupam as Fábricas de Cultura em maio

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As unidades da Brasilândia, Diadema, Jardim São Luís e Capão Redondo contam com programação gratuita e variada ao longo do mês de maio.  

Dub Lova Experimental Sounds

 Neste sábado (14) de maio, a unidade da Fábricas de Cultura do Jardim São Luís, localizada na zona sul de São Paulo, vai celebrar o Dia Nacional do Reggae (11 de maio) com o Festival Reggae: a Vida com Amor, que começa às 15h, é reunirá artistas como a cantora e compositora Marietta, a operadora de som Selectah Tuti, e o coletivo Dub Lova Sound System System, que trata um repertório musical que inclui instrumentais clássicos da música jamaicana e suas vertentes. Entre um show e outro, a DJ Jazz irá discotecar ao longo do evento.

Além da programação musical, a unidade do Jardim São Luís terá espaço para o teatro. No dia 18 de maio, às 10h, a Cia Arte Raiz apresenta a peça O Homem que Queria Enganar a Morte. Com tradução simultânea em Libras, a peça traz a história de um homem que, para salvar o filho, pede à morte que o leve no lugar do menino. A morte aceita e diz que daqui sete anos vem buscá-lo. Quando chega o dia, ele decide armar um plano para enganá-la.

Outra programação aberta ao público é a Instalação Trono Cadeira Realeza Periférica, intervenção artística que acontece na Fábricas de Cultura de Diadema até 31 de maio. Criada por jERONa RuyCe, artista plástico e arte educador, a obra propõe a reflexão sobre as questões territoriais, e lugares que são destinados para a existência da população preta e periférica que anseia ser Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas do seu existir.

No dia 19 de maio será a vez do cinema ocupar a unidade Diadema, que exibe às 19h o web documentário “Somos Plurais, Vidas Trans Importam!”, que conta com relatos de experiências de vida e luta das pessoas trans em seu cotidiano, seguido de falas contra o combate a homofobia e finalizado com uma apresentação cultural. A atividade faz homenagem ao Dia Internacional contra a Homofobia (17/5).

Já no dia 20, às 19h30, ocorre a Batalha das Minas, evento que ocupa a unidade Brasilândia, na zona norte de São Paulo, com o intuito de enfatizar o empoderamento feminino e valorizar cada vez mais a participação das mulheres no universo das batalhas.

A programação do mês será finalizada com duas atividades ligadas ao funk na Fábrica de Cultura Capão Redondo. No dia 24 de maio, às 15h, a unidade realizará um bate-papo com a pesquisadora e funkeira Renata Prado e a estilista e fotógrafa Fernanda Souza sobre “A Moda da Ostentação: A economia criativa do funk e seu impacto no universo fashionista”.

E no dia 26, às 14h30, acontece o workshop “Academia do Funk: da teoria à prática”, também com Renata Prado. A funkeira trará uma vivência corporal para ensinar técnicas de rebolar, além de trazer conhecimento histórico e corporal sobre a dança do funk como prática artística a partir da corporeidade periférica.

Para entrada nos prédios das Fábricas de Cultura é obrigatório a apresentação do comprovante de vacinação contra covid-19, com duas doses ou dose única e as unidades do programa recomendam o uso da máscara de proteção nos ambientes internos. A programação completa pode ser acessada no site das Fábricas de Cultura.

Serviço 

Fábrica de Cultura Jardim São Luís

FESTIVAL REGGAE, A VIDA COM AMOR

Com: Dub Lova, Dj Jazz, Marietta & Selectah Tuti

14/5 – Sábado – 15h

Atividade Livre – Lotação: 40

Local: Rua Antônio Ramos Rosa, 651 – Parque Santo Antônio – São Paulo/SP

O HOMEM QUE QUERIA ENGANAR A MORTE

Com: Cia Arte Raíz | Coordenação: Equipe de Biblioteca

Atividade com tradução simultânea em Libras

18/5 – Quarta-feira – 10h

Atividade Livre – Lotação: 15

Local: Rua Antônio Ramos Rosa, 651 – Parque Santo Antônio – São Paulo/SP

Fábrica de Cultura Diadema

INSTALAÇÃO: TRONO CADEIRA REALEZA PERIFÉRICA EM DIADEMA

Artista: jERONa RuyCe

De 3 a 31 de maio

Visitação: de segundas a sexta das 9h às 21h, e aos sábados 9h às 17h.

Atividade Livre – Lotação: 40

Local: Rua Vereador Gustavo Sonnewend Netto, 135 – Centro – Diadema/SP

WEB DOCUMENTÁRIO: SOMOS PLURAIS, VIDAS TRANS IMPORTAM!

19/5 – Quinta-feira – 19h

Atividade Livre – Lotação: 40

Local: Rua Vereador Gustavo Sonnewend Netto, 135 – Centro – Diadema/SP

Fábrica de Cultura Brasilândia

BATALHA DAS MINAS

20/5 – Sexta-feira – 19h30

Atividade Livre – Lotação: 40

Local: Av. General Penha Brasil, 2508 – Vila Nova Cachoeirinha – São Paulo/SP

Fábrica de Cultura Capão Redondo

A MODA DA OSTENTAÇÃO: A ECONOMIA CRIATIVA DO FUNK E SEU IMPACTO NO UNIVERSO FASHIONISTA

24/5 – Terça-feira – 15h

Classificação Indicativa: maiores de 14 anos – Lotação: 40

Local: Rua Bacia de São Francisco, s/n – Conjunto Habitacional Jardim São Bento – São Paulo/SP

ACADEMIA DO FUNK: DA TEORIA À PRÁTICA COM RENATA PRADO

26/5 – Quinta-feira – 14h30

Atividade Livre – Lotação: 40

Local: Rua Bacia de São Francisco, s/n – Conjunto Habitacional Jardim São Bento – São Paulo/SP

Mulheres transformam as periferias em centro de moto clubes femininos

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Iniciativa está criando uma rede de apoio para mulheres que trabalham, locomovem e se divertem em duas rodas na região metropolitana de São Paulo.

Encontro de moto clubes femininos em Guarulhos reúne mulheres de todos os cantos do estado. Foto: Wagner Germano

Com camisetas estilizadas e capacetes personalizados, um grupo de cerca de 100 mulheres pilotam motos e chamam a atenção nas ruas da cidade de Guarulhos, na Grande São Paulo. Fazendo barulho com escapamentos e um coral de buzinas, elas distribuem sorrisos e acenos por onde passam.

Juntas elas integram cinco moto clubes femininos paulistas: Equipe Iluminadas do Asfalto, Apaixonadas por Duas Rodas, Comboio das Gatas, Rainhas do Toque e Equipe Motogirls 013, que, durante uma motociata realizada no domingo (13), desfilaram pelos bairros de Pimentas, Cumbica, Nova Cumbica, Parque Jurema e Centenário, com uma organização de segurança reforçada para evitar acidentes.

O perfil das participantes é diverso: mães, estudantes, trabalhadoras, entre 18 e 45 anos, e que moram em diferentes cantos da área metropolitana do estado, principalmente nas periferias. O evento foi mais um dos encontros promovidos por elas para se conhecerem, organizarem ações sociais e trocar experiências sobre como tem sido transitar nas cidades sob duas rodas.

Segundo o Detran de São Paulo, houve um crescimento de 8% no número de mulheres habilitadas para condução de motocicletas entre 2019 e 2021. O número saltou de 2,2 milhões para quase 2,5 milhões e, com isso, elas passaram a representar 25% do número total de motociclistas no estado.

Há 14 anos pilotando, Jéssica Pereira Lima, 29, criadora da Equipe Iluminadas do Asfalto, e responsável por organizar o encontro deste domingo em celebração ao Dia da Mulher, diz que ainda se espanta com a quantidade de mulheres que ocupam as ruas e avenidas com suas motos.

“Quando comecei a andar eu trabalhava com entregas, e na época nem tinham esses aplicativos, e o GPS quase ninguém usava. Dá até saudade disso. E hoje em dia, olho grupo e são muitas meninas pilotando. Comparando com antigamente não dá nem para acreditar”

Jéssica Pereira Lima, 29, criadora da Equipe Iluminadas do Asfalto

Membros do Iluminadas do Asfalto e Apaixonadas por Duas Rodas que fizeram o encontro acontecer: Foto Patricia Santos.

Pandemia em duas rodas 

Na análise do Detran-SP, o aumento de mulheres habilitadas para motocicletas foi provocado pela pandemia, uma vez que muitas mulheres estavam fora do mercado de trabalho e passaram a atuar em aplicativos de delivery para gerar renda.

A agente comunitária de saúde Talita Lessa, 32, moradora do Jardim Dionísio, zona sul de São Paulo, é uma dessas mulheres. Ela trabalha em um equipamento público de saúde durante o dia e, à noite, utiliza sua moto para fazer entregas. A jornada de trabalho também continua nos finais de semana, quando ela ministra aulas para mulheres habilitadas, tanto de moto quanto de carro.

Para Talita, pilotar é uma espécie de terapia. “Às vezes a gente só precisa pilotar para relaxar. Às vezes acontece uma coisa difícil no trabalho, alguém me maltratou naquele dia, então tudo que a gente quer é espairecer, tomar aquele ventinho no rosto, sentindo a sensação gostosa de liberdade. É uma terapia para gente.”

Talita Lessa, administradora do Comboio das Gatas e encontrou seu lugar ao lado de mulheres que pilotam. Foto: Patricia Santos.

Ela é uma das organizadoras do Comboio das Gatas, grupo que reúne cerca de 190 mulheres e tem sede no Jardim Ângela, zona sul da capital. Ele foi criado no ano passado em meio à pandemia da covid-19 e realiza encontros periódicos que são marcados e organizados por meio de um grupo no Whatsapp, além de interações no perfil da iniciativa no Instagram.

Foi nesse grupo que me encontrei. Aqui encontrei amizades verdadeiras, são pessoas que, se precisar, estarão lá para ajudar, ouvir ou só espairecer, tirar um lazer

Talita Lessa, 32, agente comunitária de saúde

Enfrentando o mecânico 

O uso intensivo da moto durante o trabalho de entregas com os aplicativos de delivery fez com que Talita demandasse mais de serviços de mecânica. Como nem sempre é possível pagar pelos consertos ou achar um mecânico ou mecânica confiável, ela passou a buscar soluções de maneira autônoma para os problemas que apareciam repentinamente na Ventania, nome com o qual batizou sua moto.

“Quando precisa, a gente se ajuda, colocando um fio no lugar, trocando o óleo, ajeitando uma mangueira, a corrente que se solta e, até mesmo, trocando um retrovisor quebrado”, conta.

Encontro de mulheres que pilotam reúne cerca de 100 motoqueiras em Guarulhos

O conserto alternativo tem dado tão certo que ela já auxiliou amigas que passaram pelos mesmos problemas. Quando a solução caseira não é o suficiente, Talita sempre tem em mãos o contato de mecânicos que ela considera que têm um atendimento diferenciado para as mulheres.

“Em termos de oficina, tem muitas pessoas que querem cobrar por um serviço que não é justo, querem cobrar mais pelo fato de nós sermos mulheres e não entender muito. Então, toda vez que a gente vai no Jander ele sempre explica: essa peça aqui faz isso, essa faz aquilo, e se eu fizer esse tipo de concerto pode ser que leve um tempo para danificar de novo, ou se a gente trocar uma peça por uma nova, mesmo que seja paralela, vai dar bom’. O ponto é que o Jander não enxerga a gente como sexo frágil”, argumenta.

O mecânico ao qual Talita se refere é Jander Sousa, 29, morador do Jardim Lídia, que tem uma oficina no Jardim Mazza, nas proximidades da Estrada do M´Boi Mirim, na região sul da capital. Segundo ele, cerca de 20% de sua clientela é formada por mulheres, muitas delas, integrantes do Comboio das Gatas. “É inusitado ver mulheres pilotando”, afirma. “Muda bastante a forma de explicar qual é a peça danificada e o que aquela peça vai fazer na moto dela”, diz.

O número de mulheres habilitadas cresceu 8% em dois anos. Foto: Patricia Santos.

“Tem muitas pessoas que tratam as mulheres de uma maneira que não é legal. Só porque elas estão andando de moto acham que elas estão tomando o lugar de certos homens. Tem muitos mecânicos que são assim”

Jander Sousa, 29, mecânico.

Trabalho, afeto e segurança  

Tayná Venturino, 24, moradora do Morro do Índio, bairro da zona sul de São Paulo, foi uma das criadoras do Comboio das Gatas. A motivação, explica ela, se deu porque não queria mais se sentir sozinha. Retornando de um longo período morando no interior do estado, ela queria conhecer mais pessoas que também eram apaixonadas por motos, assim como ela.

Com um grupo de Whatsapp e mensagens no Instagram disparadas para pessoas que ela identificou que eram motociclistas, o Comboio das Gatas foi criado. “No mesmo dia que eu criei o grupo deu a maior repercussão. Nunca imaginei que seria assim”, relembra.

Um dos propósitos da iniciativa é ser uma rede de apoio para suas integrantes, seja pessoal ou profissional. Talita relembra de quando uma das colegas do motoclube teve a casa alagada durante as fortes chuvas em São Paulo na primeira semana de março. Imediatamente ela e outras integrantes iniciaram uma mobilização e arrecadaram doações em dinheiro.

Foram recolhidos R$ 350, com os quais a colega de motoclube comprou alimentos básicos e complementou o pagamento do aluguel da casa onde ela mora atualmente. “Isso foi para dar força a ela e para ela entender que não tá sozinha. E sempre foi assim… quando alguém do grupo precisou de apoio, ela também já ajudou”, conta Talita.

Mulheres vieram do litoral de São Paulo para acompanhar o encontro de moto clubes femininos. Foto: Patricia Santos.

Após um ano de criação do motoclube Comboio das Gatas, Talita afirma que experiências como essa de apoio mútuo às mulheres do grupo transformaram positivamente o estado da sua saúde mental.

“Depois do Comboio das Gatas eu até parei de tomar remédios para depressão. Foi uma fase muito difícil. Chegou uma época em que eu só queria chegar em casa e me isolar literalmente, eu não queria fazer mais nada e foi muito ruim. Ninguém merece viver assim, todo mundo tem que saber o seu lugar e eu encontrei o meu aqui”, comemora. 

Na luta

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Entrar em diversas comunidades de São Paulo para acompanhar e fotografar os times me faz enxergar mais além, daí o nome “Além do jogo”. Não é só apenas uma partida de futebol em um lazer do fim de semana, muita coisa envolve a quebrada no decorrer disso tudo.

Nunca fui de escrever muito, mas dessa vez aceitei rsrs, como um novo desafio pra mim, e cá estou. Ao longo disso esperem por textos bem diversos, onde inclui muito futebol, quebrada e a galera que mora nela, onde faz muita coisa acontecer.

O futebol varzeano me propôs um olhar clínico não só para o futebol em si. Entrar em diversas comunidades de São Paulo para acompanhar e fotografar os times me faz enxergar mais além, daí o nome “Além do jogo”, não é só apenas uma partida de futebol em um lazer do fim de semana, muita coisa envolve a quebrada no decorrer disso tudo.

Muitas pessoas tiram hoje seu sustento do futebol varzeano, o que para muitos pode ser uma informação nova nesse exato momento. Já pensou quando você está na sua quebrada assistindo um jogo no campinho, o quanto de pessoas estão à sua volta trabalhando? Por mais que ali seja um lazer, para muitos também é um dia de trabalho.

Sim, trabalho!

Gosto muito de observar tudo isso quando estou em campo. Sabe aquele senhor ou senhora que está ali pegando e juntando as latinhas que a galera bebeu e colocando em suas humildes sacolinhas? é para completar a sua renda. Ou às vezes, e até pasmem, ou não, porque no país que vivemos já sabemos o que o nosso povo passa, é a única fonte de renda daquela pessoa.

A tia que faz seus gelinhos caseiros e sai na beirada de campo para vendê-los, o bar que fica próximo ao campo que lucra três vezes mais quando se tem partida no campo com o alto movimento de pessoas.

Campo do Maria Eugênia, localizado em Mutinga, Pirituba, SP. Foto: Juh na Várzea

Mas na quebrada o jogo está ficando cada vez moderno, tem fotógrafos, repórteres e todos eles estão ali, pois estão trabalhando e revendendo por isso. Tem também as empresas de artigos esportivos que vendem para cada time da quebrada e é de onde lucram.

E aí, você já percebeu o quanto a quebrada faz gerar renda?

Cada pessoa ali buscando seu sustento, sacrificando seu descanso, sacrificando seus sábados e domingos de lazer com suas famílias para (por ironia do destino) trazer o melhor para a sua família.

Me diz aí, agora quando tu for assistir um jogo na quebrada sua visão vai ser outra né não? Ou quem sabe lendo aqui você se identificou, porque seu pai, sua vó, tia, tio está na luta vendendo na beirada de campo.

Tu vai começar a reparar nessas pessoas que eu te falei nesse texto, pode ser em qualquer comunidade, a história se repete. Nosso povo sofrido atrás do mínimo enquanto a elite só arranca cada vez mais de nós.

Seguimos na luta. O povo da quebrada tem muito a ensinar. Viva ao povo da periferia!!

Caminhos e encruzas

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Um texto introdutório do caderno Conexões Territoriais, publicação gratuita sobre direito à cidade e mobilidade nos bairros de Guaianases, Itaim Paulista e Ermelino Matarazzo, na Zona Leste de São Paulo.

Foto: Yuri Vasquez

O texto que segue é a introdução da publicação Conexões Territoriais publicada no final de 2021 e na qual fiz incidência local e articulação em parceria com a Ciclocidade – Associação dos ciclistas Urbanos de São Paulo e a Fundação Rosa Luxemburgo.

Querendo acessar o material completo basta acessar o link aqui. 

• Quais as potências da minha quebrada?

• Há incentivos pra mobilidade ativa entre as periferias das cidades?

• Porque o asfalto e as calçadas da minha quebrada são diferentes das de outros bairros?

• Quem tem direito pleno a transitar no espaço público?

O ano é 2021. Estas perguntas e várias outras perpassam nossas mentes, nossos corpos, nossas corpas, ao longo dos nossos caminhos.

Há tempos. Há tempos nós, moradores e moradoras de subúrbios, quebradas, periferias, temos tido pouca atenção de governantes e pouca ou quase nenhuma abertura para influenciar no “lado A” do que as cidades apresentam como “nossa história”, nossa relevância na memória das cidades, nossa contribuição material e imaterial sobre o que é público, sobre o que é de “todos” e sobre o que sonhamos ser de todes por lei, por direito.

Pessoas de periferia, comprovadamente, são o grupo que tem menos direito à cidade, pois estas regiões, ao longo de décadas, tiveram acesso restrito a todos os serviços públicos, tem menos infraestrutura no geral, saneamento básico desigual (às vezes inexistente) e são as pessoas que mais pagam pelo transporte público das cidades, que é caro e que tem acessos e confortos “diferenciados”, dependendo de onde você acessa (ou “compra”) este serviço (pra alguns: este produto).

Foto: Yuri Vasquez

Somos nós, pessoas de periferia, que trabalhamos mais horas por dia, e também somos nós que viajamos mais horas pela cidade a trabalho, sendo exploradas por umas poucas famílias endinheiradas. Também somos nós, pessoas de periferia, as maiores pagadoras de impostos e as pessoas mais afetadas por pandemias mundiais.

Em suma, o “Brasil” foi e ainda é fábula para a maioria das pessoas destes territórios, maioria que segue vendo seus direitos negados e que muitas vezes acabam sendo as últimas a saber que o seu futuro foi decidido a portas fechadas por “nobres senhores”.

Por isso, fazemos e fortalecemos nossos corres das e nas quebradas. Por isso, trocamos essas ideias. Merecemos mais.

Oprê! Eu que aqui te escrevo sou uma pessoa preta e de periferia. Sou filho de Roberta, de Minas Gerais, e de Aloisio, da Bahia. Eu nasci no Bexiga e estou na metade da minha vida. Moro na terra dus Guaianás, Guaianases, Zona Leste da periferia de Éssepê. Eu tenho testemunhado, muitas vezes com medo e sempre com indignação, como nos últimos anos há uma tendência perversa de tirar o povo pobre de periferia das instâncias de participação das cidades.

Pra piorar, aqui na cidade de São Paulo, não se considera a participação de conselhos e a criação de Planos Municipais gerados através de participação popular que ocorriam, ainda que timidamente, aqui na cidade de São Paulo.

A dobradinha Dória-Covas tem no currículo o histórico de ter acabado com a Secretaria de Mulheres e a Secretaria da Igualdade Racial no Município. E segue, coerente com sua história, numa toada de exclusão e silenciamento, tendendo à participação de fachada, “gourmet”, ou seja, a participação na qual só participa (ou disputa “mercado”) a classe média não-negra, lobistas e empresas de “compadres e comadres” que em sua maioria já tem informações privilegiadas sobre a administração pública.

E tem mais, e mais grave: durante a pandemia da covid-19, que matou muito em Essepê, em 2020 e 2021, a prefeitura quer porque quer fazer a revisão do Plano Diretor, sem garantir à população pobre e de periferia o acesso para influenciar.

E no Brasil, como estamos?  

A participação popular em Conselhos de Direitos ou em Conselhos de Políticas Públicas tem fundamento na Constituição de 1988 que instituiu, ou ao menos tentou instituir, a cidadania e a participação como elementos-chave para a democracia “brasileira”, havendo menção a isso em vários artigos dela.

A prática geral dos governantes, em sua maioria, é a de se colocar como a primeira e a última palavra no que diz respeito à formulação e acompanhamento de políticas públicas que afetam a todes. 

O resultado é: periferias, negres, povos originários, povo de axé, mulheres, LGBTQIA+, idosos, gordes e PCDs ficam de fora da maioria das formulações de políticas públicas.  

Apesar disso, de tantas mancadas históricas feitas com a gente, as periferias seguem criando linguagens e tecnologias culturais e pensando e repensando sua atuação política. Vêm mandando a real há décadas em fóruns, coletivos, associações e outros diversos espaços, até mesmo nos partidos políticos, com as tensões inerentes a isso.

As periferias vêm sempre se organizando para pautar o que querem e o que não querem nas quebradas. Acho bem importante, inclusive, a possibilidade de transitar com as ideias de uma quebrada pra outra, coisa que é prática de mili anos nas quebradas.

Essa cartilha que você está lendo tem denúncias, propostas e formulações que partem de várias manas e manos que, como dizemos, “não estão de chapéu atolado”. 

Foto: Yuri Vasquez

A Ciclocidade trouxe aqui na minha região uma provocação bacana sobre mobilidade ativa, infraestrutura e um diálogo super potente sobre participação no Plano Diretor Estratégico da Cidade de São Paulo.

Não o plano apresentado pela prefeitura de Bruno Covas (hoje de Ricardo Nunes), um plano “vilanesco” que quer o povo de fora, mas um outro, um plano em gestação e formulação nas ruas há anos, nas ocupações culturais, nos ilês, nas igrejas, nas associações de comunidades, nas vielas, bares e saraus das perifas da cidade de São Paulo. Um plano que parte da roda, da troca, da escuta.

Há tempos as quebradas sabem a necessidade de se ouvir, promover escambos de saberes sobre questões que nos atravessam diariamente como moradores de periferia. Talvez somente dessa forma poderemos ter um plano utópico e ainda sim possível, no qual nos sintamos parte integrante, como promotores de políticas públicas, não só como destinatáries da metade do que temos direito.

Ao longo de dois Cafés Encontros e um ciclo de formações, proseamos sobre mobilidade dos bairros de Ermelino Matarazzo, Guaianases e Itaim Paulista. Pude ouvir e perceber o quanto as quebradas têm questões urgentes pro transporte, pro meio ambiente, pra convivência. Estamos em busca de um bem viver nos bairros.

➜ Por que as ciclovias não chegam ao meu bairro? Por que os espaços ociosos não são revitalizados, ocupados, vocacionados? Por que o asfalto que chega no fundão das perifas não é o mesmo que o dos bairros ricos e o centro da cidade?

➜ Por que o investimento em infra-estrutura de ruas, praças e espaços públicos é diferente se comparado a outros lugares mais centrais ou “nobres”? Por que não tem incentivo pra circularmos e socializarmos entre as quebradas? 

Por que a polícia nos agride quando estamos nas ruas dos nossos próprios bairros? Por que toda condução leva para o centro?

Ouvir e ler vários relatos nossos, participar dessas conversas me fez enxergar mais pessoas que são diariamente desviadas das suas potencialidades territoriais por culpa do Estado e do “Deus Mercado”, que mimados que são teimam em não ouvir os seus vizinhos.

O que a gente vê por aí é que nossas cidades não são cidades “mal planejadas”, mas são sim cidades planejadas para “outros” que não nós. Privilégio cega e ensurdece. 

Temos vários desafios. Podemos saber disso tudo e deixar de nos inquietar, nos mover, falar pra amigues e familiares? Que potências nossos caminhos e tantas das nossas encruzilhadas tem pra moldar novos caminhos e quereres mais paritários, justos, coletivos?

Os textos, dados e ideias que você verá e lerá por aqui têm muito a ver com as inquietações e lutas históricas das quebradas, que seguem sangrando, lutando e pautando pelos tão óbvios e tão negligenciados direitos sociais.

Espero que você curta ler o conteúdo da Conexões Territoriais, porque ela foi escrita a partir de uma escuta ativa da nossa oralidade plural de periferia.

De certo, não achamos todas as respostas e você pode até se sentir à vontade pra formular novas perguntas. Isso mesmo! Nossa encruza e nossa gira é coletiva.

Bora junto?! Saravá as mudanças!

Querendo acessar o material completo do Caderno Conexões Territoriais basta acessar o link aqui 

Agradeço se comentar o que achou desse texto. Brigado!

Estilista de Itaquera cria coleção de roupas e fortalece autoestima de mulheres das periferias

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 Nascida em um núcleo familiar que tem em sua essência a ligação com a arte da costura, Bárbara Luiza criou sua própria marca com peças sob medida e pensadas para mulheres das periferias.

Ensaio da coleção Cool For The Summer, feito com mulheres das periferias e na antiga casa da avó de Barbara, que é uma de suas inspirações.

A ligação com a costura para Bárbara Luiza, de 21 anos, moradora da quebrada Vila Carmosina, Itaquera, Zona Leste de São Paulo, se originou muito antes dela nascer, pois sua avó sempre foi referência no assunto no lugar onde mora, e isso foi passando de geração em geração.

Após terminar o ensino médio, as dúvidas de qual área seguir começaram para Barbara, tanto que ela chegou a pensar em fazer psicologia ou relações públicas, mas mesmo assim as incertezas continuavam. Até que uma amiga a sugeriu cursar moda.

“Eu nunca tinha parado para pensar, mas sempre foi algo que eu gostava muito de acompanhar, ver roupa das pessoas, desenhar bastante look, eu fazia muito isso quando era mais nova. Só que nunca vi como algo que eu pudesse levar pra frente”, explicou ela.

Babi, apelido como Bárbara é conhecida, começou então a fazer faculdade de moda, mas na metade do curso veio a pandemia, e as coisas se tornaram um pouco mais difíceis para ela.

A princípio, a ideia da marca era só um trabalho da faculdade, isso ainda no início do ano de 2020, mas no decorrer do semestre, as complicações aumentaram, porque ela considerava quase impossível estudar no formato online, sendo que a moda precisava de contato, então Bárbara decidiu trancar o curso.

“Nesse tempo que eu fiquei parada, foi aí que a BZA de fato surgiu. Eu inquieta decidi me jogar de cara nesse mundo de empreender e tudo mais”

pontuou a costureira.

Assim, em 2020, a partir de um trabalho mediado na faculdade, começou a ser projetada a marca de roupa, onde o nome tinha três letras, formando a sigla “BZA”, que abrevia o nome completo da modelista, Bárbara Luiza. 

Bárbara Luiza, 21 anos, moradora da quebrada Vila Carmosina, Itaquera, Zona Leste de São Paulo. Inicio a BZA Company em 2020.

 A BZA Company, como conta Bárbara, tem a intenção de fazer com que as meninas e mulheres da quebrada se sintam bem, se sintam representadas e confortáveis com seu estilo de roupa.

Mesmo chateada por ter trancado o curso de moda, ela continuou se especializando através de cursos livres na área que ela gostaria de seguir, entendendo os tecidos, focando na modelagem e todos os vieses da costura.

“Eu tinha medo de que se eu ficasse parada talvez eu pudesse perder o gosto, então eu continuei tentando e me joguei”, exclamou.

Como era tudo novo e ela precisava de experiência e saber se aquilo iria de fato dar certo, começou a confeccionar ecobags, e foi aí que as pessoas passaram a se interessar, a encomendar e sua produção, que desde então não parou mais. 

Produção sob medida

 Hoje a BZA possui um site oficial de vendas da marca, mas o maior alcance é pelo Instagram, por isso Babi investe muito no conteúdo da rede social, considerando que a grande maioria de suas vendas são feitas por lá.

“Tem o site tudo mais, mas meu público maior é no Instagram, é por lá que eu mais vendo e tenho o maior alcance”, explicou Babi, que ainda não possui uma equipe e cuida sozinha da produção e venda das peças, contando com ajuda do pai em algumas demandas da marca.

A BZA Company possui o alcance de quase 3 mil pessoas no Instagram, e conta com a parceria das influencers de quebrada: MC Luanna e Lua Lopes. 

A produção das peças são realizadas na casa da modelista.

Para Bárbara, a BZA tem originalidade em todos os aspectos, é um trabalho orgânico e voltado diretamente para as mulheres de quebrada, no intuito de resgatar a autoestima de cada uma e vestir uma marca que possa representar sua personalidade de forma totalmente exclusiva.

“Para meninas de quebrada, se sentirem gostosas e também se sentirem bem com seus corpos”, afirma, reforçando o resgate da autoestima de meninas e mulheres de quebrada, ressaltando que apesar do processo ser difícil, existem potências que acreditam nelas.

Cada peça é feita sob medida, sendo que, após realizar a encomenda, Bárbara inicia o processo para tirar as medidas das clientes e produzir cada peça, desde bodys, vestidos e biquínis. 

Aprendizados e construção em família

Bárbara é natural de São Paulo, e sua família paterna, mais especificamente as mulheres, sempre tiveram o contato vivo com a costura e com a moda, mas ela nunca levou em consideração que pudesse de fato seguir esse caminho, pois sentia que esse mundo era distante demais para ela.

“Começou até antes de eu nascer, a família do meu pai sempre mexeu com essa parte de costura, minha avó, minha tia avó, todas as mulheres da família sempre foram referência nessa parte de costura”, pontuou a modelista.

Ela conta que seu pai, juntamente com sua avó e seu avô, vieram de Araripina, município do estado de Pernambuco, nos anos 70, quando ele tinha apenas 6 anos, para tentar construir uma vida e estabilidade financeira em São Paulo.

De início, sua avó trabalhava para algumas confecções ajustando partes específicas de uma roupa e ganhava uma porcentagem baixa por esse serviço. 

“Ela não chegava a costurar uma peça inteira igual eu, ela trabalhava para algumas outras confecções, tipo, fechava uma parte específica da roupa, sabe? Uma alcinha, uma bainha, essas coisas assim. Ela e minha tia avó são referências até hoje”

compartilha Bárbara.

A costureira ainda pontuou o fato de que seu pai sempre foi um grande investidor de seu trabalho, mesmo com o esforço dela, quem sempre apoiou e não deixou ela desistir foi o pai, contribuindo com tecidos para novas coleções, roupas de provas e tudo o que fosse necessário para que a BZA pudesse progredir.

Um marco importante para Bárbara, foi no final do ano de 2021, no dia 1º de dezembro, quando lançou sua coleção Cool For The Summer, onde trouxe a essência do verão com suas peças praianas, com mulheres modelos de corpos totalmente periféricos. Mas para ela, o mais importante foi o ensaio fotográfico dessa coleção, que foi feito na casa antiga de sua avó, que é uma de suas inspirações na família.

“Uma das coisas mais importantes pra mim foi que o ensaio foi na casa que ela morava [avó]. A casa que ela estava ali fechando as costuras nem imaginando que um dia poderia chegar algo assim, foi muito importante pra mim”, disse Babi.

Para o futuro, Barbara acredita que seu trabalho, juntamente com suas parcerias, podem chegar a outras quebradas e mulheres periféricas, dando continuidade ao resgate da autoestima e confiança para cada uma delas.

“Algo que eu levo comigo e com a BZA pra tudo, em Itaquera e todas as quebradas, é dar voz e preferência para as meninas periféricas, que estão no mesmo corre que eu e que estão na luta”, concluiu.