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“Sempre vou ser um Pankararu”, afirma Wesley dos anjos sobre identidade indígena

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Segundo o Censo do IBGE de 2022, cerca de 63% de pessoas indígenas vivem em áreas urbanas no Brasil, e parte dessa população está nas periferias. Como é o caso do Wesley dos Anjos, 32, indígena do povo Pankararu e morador do bairro Cohab Adventista, localizado no distrito do Capão Redondo, na zona sul de São Paulo. “Tanto na favela quanto na aldeia lutar é uma necessidade presente, no sentido de resistência”, diz Wesley, que prefere ser chamado de Wes.

Wes é assistente social, ativista indígena e pesquisador. Ele faz parte da primeira geração da família que nasceu fora da aldeia Pankararu, mas sempre esteve conectado com a sua cultura e identidade através da mãe, Maria das Dores. 

“Minha mãe é uma mulher indígena do povo Pankararu e saiu do nosso território com 15 anos de idade fugindo [da] seca de 1970, [que] foi um período de estiagem no nordeste que deixou o ambiente sem comida e água, e aí boa parte dos nordestinos migraram para São Paulo, mas pouco se fala da migração dos povos indígenas”, diz o pesquisador. 

“Eu sempre me senti em luta social, por ser favelado, do Capão, por ser filho de um homem preto, por ser indígena, por ser gay. A semelhança que [tem] em tudo isso é precisar lutar para existir”.

Wes Pankararu, assistente social, ativista indígena e pesquisador.

Entre os contrastes de viver na aldeia e na periferia, Wes afirma que a diferença está nas formas de lutar. Segundo ele, na aldeia, não se expor e optar por observar, por vezes é um modo de se proteger. “Já na favela eu aprendi a revidar, a ser mais visível”, coloca.

O Brasil tem 1,69 milhão de indígenas, conforme mostra o Censo do IBGE de 2022. Desse total, aproximadamente 622 mil (36,73%) vivem em Terras Indígenas e 1,1 milhão (63,27%) fora delas. O estado de São Paulo concentra 55.295 (3,27%) pessoas que se autodeclaram indígenas, sendo que dessas, cerca de 51 mil indígenas (92,44%) vivem em contexto urbano, e 4 mil (7,56%) moram em terras oficialmente reconhecidas como indígenas.

A origem da etnia Pankararu é de Pernambuco, região nordeste do Brasil. O território desse povo é atravessado por três municípios: Tacaratu, Jatobá e Petrolândia. “A minha aldeia Brejo dos Padres está mais no município de Tacaratu”, compartilha Wes.  

O pesquisador coloca que no Capão Redondo vivem 60 Pankararus, parte deles são da mesma família do ativista e todos são parentes. “A gente se considera parente independente da relação de sangue. Se você é do mesmo povo que eu, você é meu parente”, aponta Wes, que comenta sobre a existência de outros núcleos de indígenas Pankararus em São Paulo. 

A Associação SOS Comunidade Indígena Pankararu fica no bairro Real Parque, distrito do Morumbi, zona sul de São Paulo, e segundo o ativista, ela representa os Pankararus em contexto urbano e desenvolve ações em diversas áreas, como saúde, assistência social, cultura e educação. 

Wes conta que, geralmente, quando algum Pankararu migra para a cidade procura estar próximo a um núcleo de parentes indígenas. “Porque ali ele sabe que vai ter força para enfrentar esse cotidiano que muitas vezes engole a gente. Juntos lembramos com mais constância de onde a gente vem, e quem a gente é”, pontua.

Aldeias e periferias

De 2007 a 2011, Wes viveu na aldeia Pankararu, em Pernambuco, e voltou para São Paulo em 2012 para estudar. Ele conta que mudar para a aldeia em plena adolescência foi um tanto conflituoso. “Hoje eu acho que [essa] foi a melhor coisa que ela [Maria das Dores] poderia ter feito por mim, além de fortalecer a minha identidade. [Viver na aldeia] me fez desenvolver outro olhar sobre quem sou e sobre quem a gente é enquanto povo, inclusive para lembrar que em qualquer lugar do mundo eu sempre vou ser um Pankararu”, afirma. 

O pesquisador conta que não invalida a estratégia de não se colocar como indígena, e que atualmente ele não gerencia mais a própria identidade, e sim os conflitos que isso pode gerar.

“A minha mãe já foi chamada na escola para a professora falar que a gente estava fumando maconha, porque a gente ia com cheiro de ervas. A gente ia com cheiro de ervas, porque a gente estava tomando banhos que espiritualmente para a gente faz sentido”, exemplifica Wes sobre situações que já vivenciou morando em contexto urbano.

“Quando as pessoas falam sobre quem é indígena no Brasil vem uma imagem já desenhada e eu [não faço parte desse imáginário], não só por ter o pai negro, mas também pelo meu povo não ser enquadrado dentro dessas características estereotipadas. Quando eu falava que era indígena ou quando a gente fala que é indígena, as pessoas automaticamente desvalidam e nos violentam”

Wes Pankararu, assistente social, ativista indígena e pesquisador.

O pesquisador compartilha que sua formação acadêmica se deu através do programa de inclusão de pessoas indígenas da universidade, chamado Pindorama, da PUC São Paulo. Ele aponta a educação como o caminho para combater os preconceitos e a invisibilidade das diversidades étnicas e também com indígenas que vivem fora das aldeias.

“Deve ser ensinado para as crianças, desde a educação infantil, para que elas saiam desse senso comum de que ‘índio’ é um ser mitológico, que não existe ou só existe nos livros, no folclore. A gente está na favela, na cidade, nas aldeias, nas florestas, [estamos] onde a gente quiser, porque o Brasil todo é território indígena”, ressalta Wes Pankararu, que aponta não existir o cumprimento da lei federal 11.645 de 2008, sobre a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo oficial da rede de ensino, e que por isso, quem acaba tendo a iniciativa de fazer essas articulações são os próprios indígenas.

O olhar da quebrada

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Dia 19 de agosto se comemora o Dia Mundial da Fotografia. Já parou para pensar como é importante ter esses registros em nossa história e memórias?

Hoje, com alguns acessos que temos, conseguimos registrar nossa quebrada de uma forma na qual poderemos, em um futuro não tão longe, mostrar para nossas próximas gerações a expressão de nossos sentimentos através da fotografia.

Na quebrada existem muitos talentos e sonhos. A conquista de uma câmera é algo gigantesco, uma verdadeira luta e resistência. Cada foto é uma maneira de mostrar  a quebrada pelo nosso olhar, um olhar que revela a beleza, a luta e a força do nosso povo.

É no sorriso da criançada, na correria do dia a dia, nos grafites que colorem os muros, nos jogos de futebol que encontramos inspiração.

Cada clique é um manifesto, cada retrato é uma declaração de que nossa cultura e nossa história merecem ser vistas e respeitadas.

A fotografia na quebrada é feita de momentos reais, de gente que transforma a dificuldade em arte e expressa nas imagens a alma da comunidade.

Este é um conteúdo opinativo. O Desenrola e Não Me Enrola não modifica os conteúdos de seus colaboradores colunistas.

Comerciante une admiração ao futebol à venda de espetinhos na Copa Terra Nossa em Osasco

Nascido em Cajazeiras, na Paraíba, Carlos Antônio da Silva, se mudou para São Paulo em 1960, ainda criança. Após morar em Pirituba, e se mudar para o bairro Jardim Bonança, em Osasco, região metropolitana de São Paulo, foi no bairro Terra Nossa, no mesmo município, que ele encontrou a oportunidade de continuar seu trabalho como vendedor de espetinhos, mas agora unindo seu apreço pelo futebol à sua renda extra.

Aposentado e recuperando-se de um AVCI (Acidente Vascular Cerebral Isquêmico), Carlos mora próximo do seu filho Leandro, e segue ativo na comunidade. Através do apoio de Flávio, conhecido como “Pinguim”, dono do bar em frente ao campo de futebol que acontece a Copa Terra Nossa, o vendedor encontrou ali um novo espaço para trabalhar.

Carlos Antônio complementa sua renda a partir da venda de espetinhos na beira de campo em Osasco. Foto: Yasmin Turini

Como é sua rotina atualmente?

Eu sou aposentado, então eu fico em casa fazendo os afazeres de casa, vou fazer uma compra, vou atrás das necessidades diárias, arrumo minha casa, visito a minha nora, visito o meu filho que mora aqui perto. Eu tenho que vir aqui no domingo, então na sexta-feira, eu já vou buscar a carne, já corto, tempero e no sábado eu espeto. Tem 150 espetinhos e no domingo eu venho para assar acompanhando o futebol. 

Como o senhor começou a vender os espetinhos aqui nessa região?

O espetinho eu vendo desde 2005, numa outra localidade onde eu morava, no Jardim Bonança. Aí eu tive um AVCI no ano passado, e esse ano eu mudei para perto do meu filho. Por coincidência tem essa quadra aqui e com esse campeonato. A gente uniu o útil ao agradável e eu vim fazer os espetinhos, que modéstia à parte, é muito saboroso. Aí eu estou iniciando. Inclusive, hoje é o meu segundo domingo.

Como foi a recepção da comunidade local quando o senhor começou a trabalhar aqui?

O Pinguim é o dono do estabelecimento aqui, do bar, ele que me cedeu o espaço aqui tranquilo. A gente já se conhece há mais de quatro [ou] cinco anos. Então eu não sou novato para o pessoal daqui. Eu já sou amigo do Pinguim há muito tempo, agora para vender churrasquinho, para trabalhar em si, é o meu segundo domingo, mas a recepção foi muito maravilhosa, me acolheram muito bem, não tenho do que reclamar, é só agradecer. 

A venda dos espetinhos traz alguma mudança no seu bem-estar?

Olha, é um trabalho como outro qualquer, só que com um pequeno diferencial, aqui você lida com o povo, você lida com o ser humano, então você faz muitas amizades e não tem como não fazer, né!?

Qual é a melhor parte de ter começado a vender aqui? 

Veja bem, trabalhar por conta é isso. Você faz o seu horário. E por coincidência eu vim morar próximo ao meu filho. Aí é essa união de morar perto do meu filho e ter esse evento aqui para poder fazer esse churrasquinho. No outro local, eu vendia 50 espetinhos por dia, trabalhava três dias da semana, aqui eu trabalho aos domingos e vendo 150 espetinhos. Como eu sou aposentado por idade, recebo um salário mínimo, então o que eu pego aqui ajuda muito na renda. Aqui o pessoal me chama de Carlinhos, mas futuramente serei conhecido como Carlinhos do Espetinho.

Esse conteúdo foi produzido por jovens em processo de formação da 8° edição do Você Repórter da Periferia (VCRP), programa em educação midiática antirracista realizado desde 2013, pelo portal de notícias Desenrola e Não Me Enrola.

Moradora de Osasco conta sobre relação entre coletividade e esporte na região

Vitória de Cássia, 23, dona de casa, moradora de Osasco, região metropolitana de São Paulo, tem como atividade de lazer aos domingos, acompanhar os jogos da Copa Terra Nossa, competição de futebol de várzea que acontece no território, cujo objetivo é integrar a comunidade através do esporte. 

A importância da modalidade na vida de Vitória vai além dos momentos de lazer. Segundo ela, patrocinadores e a comunidade ajudam nos custos de casa com itens como cesta básica e fralda para seus filhos. Vitória conta que essa movimentação também vai além dos patrocínios, pois os jogadores e a comunidade sempre se ajudam. Ela também ressalta que entre as mulheres que frequentam o local esse senso de comunidade cresce de forma natural.

Vitória de Cássia, 23, dona de casa, moradora de Osasco, região metropolitana de São Paulo, tem como atividade de lazer aos domingos, acompanhar os jogos da Copa Terra Nossa. Foto: Yasmin Turini

O que te traz até o campeonato Terra Nossa? Como é ver esse evento de pertinho? 

Comecei a acompanhar os jogos há 3 anos por causa do Jonathan, meu esposo, que joga no time Lobos. Ver os jogos é incrível. A emoção é algo que te envolve, e quando você percebe já está participando. Os jogos são muito emocionantes, especialmente quando você vê a disputa acirrada entre os dois times. Tanto no início, quanto no final, quando você vê os finalistas jogando, é pura emoção. Além disso, [tem] a emoção do público que se junta com a torcida e tudo mais.

Como você vê a importância do campeonato para os jogadores e a comunidade?

Mesmo com as adversidades no campo, os jogadores estão sempre unidos, apoiando uns aos outros. Além disso, o campeonato fortalece a comunidade, proporcionando um tempo de lazer, onde as pessoas se reúnem para assistir aos jogos. É uma disputa saudável, um ambiente natural […]. A Copa Terra é algo relativamente recente, mas desde que começou, muitas pessoas no bairro têm se reunido para fazer esse trabalho incrível que ajuda muito as famílias. Os patrocinadores contribuem com fraldas e outros itens essenciais que as pessoas pedem, o que é muito importante. 

Como é a relação desses patrocínios na sua vivência? 

Os patrocínios ajudam com fraldas e outros itens, e eu vejo isso como algo muito positivo. Minha filha mais velha, de quatro anos, sempre me acompanhou nos jogos do Jonathan. Inclusive, quando eu estava grávida da Maria Luiza, de nove meses, eu ia assistir aos jogos barriguda e os meninos do time sempre me ajudavam. Eles fizeram um chá de bebê para mim e me deram muitas fraldas e outros itens para o bebê. Hoje eles continuam ajudando financeiramente sempre que precisamos, seja para comprar leite ou qualquer outra coisa.

E sobre as suas filhas, você vê a possibilidade delas seguirem o caminho do futebol que ainda é visto como um ambiente majoritariamente masculino?

Se a Maria Luiza decidir seguir o caminho do pai eu com certeza vou apoiar, porque não vejo mal algum no futebol. Eu já ouvi muitas vezes o meu marido falar que quando ele joga futebol ele se desestressa dos problemas do dia a dia. Então eu super apoio. Minha filha mais velha, de quatro anos, já me acompanha nos jogos, e embora ainda não tenha se enturmado com as crianças que jogam, eu estou sempre apoiando.

Como é para você trazer as crianças para cá, especialmente as mais novas?

No começo era bem difícil, mas agora eu me dedico a estar aqui com as meninas para vê-las crescer assistindo o pai jogar futebol. Muitas vezes, o futebol foi o nosso ganha-pão. Por isso, eu tenho o maior prazer de trazer as crianças, mesmo com a dificuldade de ter um bebê de quatro meses. Venho sempre preparada, com leite, roupa de frio, carrinho e cobertor, para passar o dia apoiando o Jonathan. Além disso, as meninas de outros times sempre me ajudam, seja segurando o bebê ou ajudando com outras coisas. Dentro do campo, a rivalidade existe, mas fora dele, somos todas unidas.

Esse conteúdo foi produzido por jovens em processo de formação da 8° edição do Você Repórter da Periferia (VCRP), programa em educação midiática antirracista realizado desde 2013, pelo portal de notícias Desenrola e Não Me Enrola.


Desenrola e Não Me Enrola entrevista candidaturas periféricas a vereança da cidade de São Paulo

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Assista a sabatina completa.

Nesta terça-feira (03), a jornalista Thais Siqueira, co-fundadora do Desenrola E Não Me Enrola, apresentou a primeira sabatina do Desenrola Aí nas Eleições, programa de entrevistas dedicado a entrevistar candidaturas negras e periféricas que visam ocupar o cargo de vereador na Câmara Municipal de São Paulo, um espaço de construção de leis e políticas públicas fundamental para a defesa da democracia e da pluralidade de vozes na política institucional.

A primeira entrevista com candidaturas periféricas contou com a presença dos candidatos Advogado Ewerton (PODEMOS) e Neon Cunha (PSOL).

A iniciativa faz parte da proposta do Desenrola e Não Me Enrola de realizar uma cobertura especial das eleições na cidade de São Paulo, a partir da sua  linha editorial, baseada em temáticas como raça, gênero, população LGBTQIAPN+, mulheres e povos indígenas.

No município de São Paulo, foram registradas 927 candidaturas ao cargo de vereador, conforme dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por meio do portal Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais. Devido ao número elevado de candidaturas registradas, não é possível entrevistar todas. Portanto, o Desenrola selecionou oito candidaturas que dialogam com temas conectados à sua linha editorial.  

Ao todo, serão realizadas quatro transmissões ao vivo no canal de YouTube do portal de notícias, todas as terça-feiras, nos dias 03, 10, 17 e 24 de setembro, sempre às 12h, com duração de uma hora. 

Cada entrevista contará com a presença de duas candidaturas, e terá perguntas elaboradas a partir das pautas emergentes dos territórios periféricos, além de perguntas criadas pelo público que estarão acompanhando o programa. 

As próximas entrevistas do Desenrola Aí nas Eleições conta com a presença da candidata a reeleição, Elaine Mineiro (PSOL), que representa a mandata coletiva Quilombo Periférico, Ingrid Soares (Rede), Keit Lima (PSOL), Professora Flavia (PSTU), Chirley Pankará (PSOL)Erick Ovelha (PSOL)

Confira as próximas datas com entrevista simultânea as candidaturas periféricas a vereança da cidade de São Paulo

📅 [10 de setembro, às 12h] Elaine Mineiro (PSOL) e Ingrid Soares (Rede).

📅 [17 de setembro, às 12h] Keit Lima (PSOL) e Professora Flavia (PSTU)

📅 [24 de setembro, às 12h] Chirley Pankará (PSOL) e  Erick Ovelha (PSOL)

Sobre o Desenrola Aí nas Eleições

O Desenrola Aí nas Eleições é um programa de entrevistas dedicado a sabatinar candidaturas negras e periféricas que disputam cargos públicos nas eleições municipais e estaduais. O programa foca em candidaturas que visam ocupar posições como vereança, deputado (a/e) estadual e federal, espaços essenciais para a construção de leis e políticas públicas que defendam a democracia e promovam a diversidade de vozes na política institucional.

Desde sua primeira edição em 2022, o Desenrola Aí nas Eleições tem sido um importante espaço de diálogo, entrevistando candidaturas periféricas para cargos de deputado estadual e federal, ampliando o debate sobre representatividade e inclusão no cenário político.


Tarifa zero no transporte público: é possível?

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O cientista social e pesquisador do Centro de Estudos Periféricos, Sandro Oliveira, responde à pergunta feita nas redes sociais do Desenrola.

Adotar a tarifa zero está entre as soluções mais importantes e imprescindíveis para garantir o direito à cidade para todas, todos e todes cidadãos. Essa é uma política pública adotada em alguns municípios brasileiros, como em Maricá, no estado do Rio de Janeiro e, recentemente, em São Caetano do Sul, na Região Metropolitana de São Paulo. Ela implica num potencial de circulação em que, paulatinamente, tende a melhorar as condições do trânsito, ao reduzir os congestionamentos, além de promover um bem-estar comum no quesito da qualidade de vida para o conjunto da população das cidades em que são aplicadas e esperamos que isso ocorra em breve em São Paulo.

Histórico

Cabe destacar que a tarifa zero, que atualmente ocorre aos domingos em São Paulo pela atual gestão municipal, foi uma política criada e adotada originalmente na gestão da prefeita Luiza Erundina (1988-1992), na época do Partido dos Trabalhadores. Essa política foi criada pelo então Secretário de Transportes da Erundina, o engenheiro Lúcio Gregori, que implantou parcialmente a tarifa zero em finais de semana e em alguns bairros como em Cidade Tiradentes, no extremo leste de São Paulo (com os ônibus circulares). Ele pretendia ampliar para toda a cidade, mas foi boicotado pelos empresários de ônibus das empresas privadas, que não permitiram e até sabotaram essa proposta.

Gregori desde então vem fazendo a defesa de que em vez de a cobrança do “custo do transporte” ser por catraca, que pudesse haver uma mudança para a cobrança por quilômetro rodado, que poderia estimular inclusive as empresas privadas em investirem em mais ônibus para a circulação, já que quanto mais circulação, mais ganham, A catraca é o inverso: poucos ônibus, ônibus lotados e muitas vezes em situação precária. Por isso, a tarifa zero apenas aos domingos tende a não ser funcional plenamente para os/as trabalhadores/as que vivem e habitam as periferias da cidade, porque o intervalo dos ônibus tornam-se mais demorado e há uma quantidade menor de ônibus circulando.

Mas a tarifa zero aos domingos é uma medida importante para viabilizar a circulação de pessoas que sequer saem do bairro em que moram por não dispor de recursos para o transporte, ao permitir o lazer, a circulação e a apropriação para outras partes da cidade por esses/as trabalhadores/as. Todavia, esse experimento aparece como um piloto para verificar as possibilidades de implementação da tarifa zero na cidade, algo que seria fundamental, já que o transporte não deve ser tratado apenas como serviço, mas como um direito social, tal como a educação, a saúde (SUS), etc.

A importância das empresas públicas e o combate a privatização

Outra questão para a implementação da tarifa zero é a retomada das empresas públicas de transportes. Em São Paulo existia a CMTC – Companhia Municipal de Transportes Coletivos, fundada em 1949 e privatizada na gestão de Paulo Maluf em 1993. É fundamental haver empresas estatais de transporte que, inclusive, há uma urgência em colocar a questão da importante pauta de reestatização do sistema de transporte, a exemplo do SUS que é uma política pública de Estado, para garantir o transporte como direito social e viabilizar a tarifa zero, já que empresas estatais não visam lucro. Em muitos países como Alemanha, por exemplo, há um processo de reestatização de empresas que foram privatizadas nas últimas décadas. Não podemos cair no mito ideológico do “mercado virtuoso versus estado ineficiente”. 

Por isso, o Estado precisa assumir o seu papel de regulador da sociedade, dos espaços sociais e da circulação, independentemente de seus governos, ao também operar o transporte como fez em outras épocas aqui em São Paulo, seja pela CMTC ou mesmo pela EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos), e como faz ainda pelo Metrô (Companhia do Metropolitano) e CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), empresas estatais fundamentais para o transporte de massa ameaçadas de privatização pela atual gestão do governo do Estado de São Paulo, na contramão da tendência mundial de reestatização e melhoria dos serviços públicos de transportes. A grande questão é que a gestão de uma cidade, Estado e país passa pela ação de governos e, muitos destes, não atende os interesses do conjunto da população, apenas os interesses de grupos econômicos e políticos vinculados ao seu programa de governo. 

Iniciativa ocupa espaço público na Brasilândia através do samba

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Todo primeiro domingo do mês, moradores e público em geral, são convidados a participarem de uma roda de samba, na qual podem inclusive tocar algum instrumento e ser o cantor da vez. Essa é uma das propostas do Samba do Bowl, criado em 2013, e que realiza diversas atividades na Praça Sete Jovens, localizada no bairro Elisa Maria, no distrito da Brasilândia, zona norte de São Paulo. 

Morador dos arredores onde acontece o samba, Fábio Alves, conhecido como Lol, arte-educador e um dos fundadores da iniciativa, conta que além de fomentar o lazer e entretenimento, o evento promove diversas formações, principalmente para os jovens. “A ideia do samba em si era a gente criar um espaço de apresentação ao ar livre para os artistas do território”, conta. 

Fábio Lol cofundador do Samba do Bowl e arte-educador. (foto: arquivo pessoal)

“Hoje em dia a gente tem um embasamento que é formar as pessoas dentro do conteúdo artístico. Elas aprendem a tocar no samba, a cantar, a organizar o evento, aprendem produção, pré-produção e pós-produção cultural”, diz o arte-educador.

Golfe, slackline, desfile de moda, feira empreendedora, oficina de pipa, de trança, turbante, oficina de boneca abayomi, teatro e grafite são algumas das atividades que já foram realizadas na praça a partir do samba. “A cada mês a gente traz também uma pessoa [ou grupo] que queira participar”, compartilha Fábio.

A prática de golfe acontece com frequência na praça junto com o samba. (foto: arquivo pessoal)

O arte-educador acredita que a partir do contato das crianças e dos jovens com a cultura, a arte e o movimento popular, que também são fomentados por outros coletivos da Brasilândia, eles têm construído imaginários e perspectivas de vida mais prósperas. “Daqui pode sair o [próximo] Tiger Woods, do golf”, diz.

“São várias atividades que vão trabalhando também a autonomia das pessoas que participam diretamente ou indiretamente. Quando a gente fez o desfile de moda da periferia, [convidamos] 10 marcas locais, costureiras [e] modelos do território. Então, você vê as pessoas se apropriando, se tornando protagonistas do rolê.”

Fábio Lol, arte-educador e cofundador do Samba do Bowl.

Apesar de não ser o foco, ações sociais voltadas para a saúde também já foram realizadas pelo movimento. “A gente já fez atendimento psicológico, já transformou escola em hospital odontológico, foram mais de 500 famílias atendidas. Na pandemia, atendemos 10.000 famílias com cesta básica”, relembra Fábio. 

Cestas básicas foram entregues durante a pandemia de Covid 19. (foto: arquivo pessoal)

A iniciativa acontece de forma independente, um dos motivos da única atividade fixa ser o samba na praça. Em 2018 e 2019, o grupo teve acesso ao edital público VAI (Programa de Valorização de Iniciativas Culturais), mas atualmente não possui nenhum tipo de fomento para manter as atividades. O que ocorre são parcerias pontuais com espaços públicos e institucionais da região que atuam com cultura. 

O arte-educador conta que a articulação no território acontece a partir do saber de cada morador. “‘Ah, mas eu não sou artista’, tudo bem. Sabe fazer bolo? Faz um bolo, traz aí e vamos começar a vender. Você costura? Vem costurar, fazer um bordado, vem ensinar a gente. Teve uma vez que um jardineiro veio e deu oficina de jardinagem. Então a gente vai despertando coisas que já existem dentro do território”, pontua. 

Praça Sete Jovens

Ocupar a praça por meio da cultura e do movimento popular é uma estratégia do coletivo para tentar se distanciar do contexto de violência que é reincidente no território. “Eu vejo [isso] como uma ferramenta de redução de danos”, diz Fábio.

“A Praça Sete Jovens é uma denúncia”, afirma ao contar sobre o histórico do local que envolve a chacina que resultou na morte de seis, dos sete jovens que foram baleados enquanto conversavam na escadaria da Rua Olga Benário, próxima à praça, que na época ainda não existia. 

Cartaz feito com  as crianças em uma oficina de grafite. (foto: arquivo pessoal)

A chacina ocorreu em 2007, e investigações realizadas pelo DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) provaram que foi realizada pela Polícia Militar. No mesmo ano, moradores reivindicaram e conquistaram a construção de um espaço de lazer no terreno, que era conhecido como Pastão. No entanto, Fábio explica que essa luta pela praça existe desde os anos 80, puxada pelo movimento popular dos moradores.

Em assembleia, foi decidido que a praça passaria a se chamar Sete Jovens em homenagem às vítimas. “[A princípio] a prefeitura não aceitou, a gente levou quase seis anos para oficializar o nome e até hoje eles não mandaram a placa”, relata Fábio.

O samba é realizado dentro de uma piscina de skate, por isso leva o nome de Bowl. Local em que, em 2014, ocorreu outra chacina que matou mais três jovens. “A gente não morrer aqui ainda é uma luta”, menciona Fábio.

“Só construir a praça não garantia que a gente ia estar vivo, foi aí que a gente se ligou que não adianta só ter a praça, tem que ocupar com as famílias, crianças, [assim] os polícia não vai chegar dando tiro na gente”

Fábio Lol, arte-educador e cofundador do Samba do Bowl.

Com o passar do tempo a praça se tornou um polo cultural. Segundo Fábio, “um espaço democrático de encontro”. As crianças utilizam o local para brincar, sendo esse um dos poucos acessos que elas têm na região para correr ao ar livre e ter contato com a natureza. 

Iniciativa ocupa espaço público na Brasilândia através do samba
As crianças estão sempre presentes nos eventos que realizados pelo coletivo Sete Jovens. (foto: arquivo pessoal)

Fábio ressalta que um dos principais desafios para manter as atividades é conseguir fazer as pessoas participarem ativamente, e reforça que tudo é construído em coletivo. 

“É difícil fazer com que as pessoas se apropriem, porque a gente está tão envolvido no cenário do capitalismo, da escassez, que é até compreensível que elas não se [disponibilizem]”, pontua Fábio, que também pontua sobre a importância das novas gerações darem continuidade ao que vem sendo construído no território.

Uma vítima imperfeita

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Nas últimas semanas, li nos jornais sobre uma jovem estudante de 21 anos e sua via crucis para acessar o aborto legal em São Paulo. Por conta de violência doméstica e abuso sexual do então namorado, Maria engravidou (vou manter o nome fictício usado pela imprensa). Descobriu a gravidez já com mais de 13 semanas, mas só se deu conta de que tinha direito ao aborto legal depois de 24 semanas.

Consegui seu contato e marcamos de nos conhecer. Na estação de trem, encontrei uma mocinha miúda, de cabelos cacheados, bem agasalhada e com uma mochila enorme nas costas. Se ela dissesse que tinha 15 anos, eu teria acreditado. “Tá de mudança?”, brinquei. Ela respondeu com um sorriso, dizendo que não tem tido forças para ir para faculdade, mas que tem tentado manter as leituras em dia na biblioteca perto de casa. 

Maria é uma jovem negra periférica, que está no segundo ano de graduação em uma universidade pública. Super articulada, dona de olhos curiosos, ela é extraordinária. E é justamente por ser extraordinária que sua vida está de cabeça para baixo. 

Durante todo o último mês, se tornam comuns comentários do tipo: nossa, uma estudante desta universidade não tinha acesso à informação? Por que não separou dele antes? Não procurou ajuda antes? 

Além de uma enorme ignorância sobre a dinâmica da violência, inclusive nos serviços de acolhimento, essas perguntas ignoram também que toda e qualquer mulher pode ser vítima de violência doméstica. Outra Maria, a da Penha, é um exemplo.

É mais provável o senso comum criar empatia com uma história terrível, de uma menina afroindígena de 10 anos, do interior de algum estado fora do sudeste, abusada por um familiar. Já que ela não tem nenhuma agência sobre sua própria desgraça, não pode ser também responsabilizada. Elas existem, são um retrato cruel da imensa tragédia em que estamos submersas. 

Talvez por isso dê mais trabalho argumentar contra uma vítima perfeita. 

Só que o problema de Maria é justamente ser uma vítima imperfeita. Mais de um ano de relacionamento abusivo havia passado quando ela parou de duvidar de si mesma: “eu só tomei consciência de verdade depois que eu fui no Hospital do Campo Limpo. Quando eu contei a minha história lá, a assistente social e a psicóloga me acolheram, me ajudaram a identificar as muitas camadas do que eu estava vivendo. Conforme elas iam me explicando, parecia um bingo e eu tinha marcado quase todos os pontos”.

A via crucis começou porque Maria deu o azar da médica estar de férias e precisou ser transferida para o Hospital Mário Degni, no Rio Pequeno. Lá, teve que recomeçar do zero e perdeu um mês, em seis idas e vindas ao hospital, chegando a 29 semanas. Para cada vitória que teve na vida, foi se tornando mais imperfeita e a equipe se sentiu excessivamente à vontade para minimizar sua história. 

Uma equipe de profissionais de saúde tirou o jaleco do cuidado, vestiu toga de juiz e criou barreiras no acesso a um direito.

Nas seis visitas ao hospital Mario Degni, Maria não recebeu nenhuma orientação sobre serviços para mulheres vítimas de violência, nem tampouco informações sobre medida protetiva ou fez qualquer exame médico. 

Não houve cuidado para ela, a paciente. Ao contrário, foi colocada em risco psíquico pela demora na autorização do aborto e pelos comentários incabíveis (“já escolheu o nome?”, “você tem uma história de vida bonita, vai ser uma mãe guerreira”), prova da falta de preparo da equipe técnica. Foi submetida a um risco físico, por não ser incluída em nenhuma rede de suporte que a ajudasse a sair da situação de violência doméstica, que poderia escalar a qualquer momento; e a um risco obstétrico, por condições comuns a gravidez, como diabetes gestacional e pré-eclampsia, que aumentam a medida que a idade gestacional avança, sem o devido cuidado em saúde. 

A equipe nunca entregou uma negativa ao aborto, mas estimulou que ela não voltasse ao hospital, que procurasse a adoção e pediu que viesse com seus pais, criando um terror psicológico. “Quando eu comecei a chorar, elas me trataram um pouco melhor”. 

O que Maria viveu é tortura.

Fiquei dias olhando para a página em branco depois de encontrar com Maria. Me faltavam palavras. Uma jovem mulher preta e periférica, consegue entrar em uma das universidades mais importantes do país, mas ninguém consegue olhar pra ela e dizer: você tem o direito de escolher sobre a sua vida. 

A gente tinha conversado por telefone antes de se encontrar, e eu levei um livro de presente, o Gravidez Indesejada, um importante estudo sobre os impactos de ter o acesso ao aborto negado. Tinha lido ali uma história muito parecida com a dela, e com um final positivo, achei que Maria poderia se animar um pouco.

“Amei, obrigada! É bom sentir que não sou a única, não estou sozinha. Tô passando com uma psicóloga do Projeto Vivas, e conversamos sobre o quanto ser uma mulher que defende seus direitos e que busca ser feliz e livre (liberdade de ir e vir, de estudar, de trabalhar, de se colocar, de fazer planos) incomoda, e incomoda bastante. Ela disse que também viu a matéria e que me considerava uma guerreira sim, mas não por ter passado por tudo isso, mas sim por não ter me resignado, pois eu poderia ter desistido e ter aceitado a minha “sina”. Ela completou dizendo que eu posso ser guerreira para muitas outras coisas, como nos estudos, para um trabalho legal, para uma vida legal. Que a guerra de ser mãe, não é obrigação, ou melhor, não deveria ser.”

Não mesmo.

Com o apoio do Projeto Vivas, Maria foi acolhida com muito mais profissionalismo e empatia em outro hospital. Conseguiu fazer o aborto e já tomou sua vida de volta.

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De diarista a confeiteira: a conquista do primeiro ponto comercial na periferia

Desde 2002, o Bloco do Beco reúne moradores do Jardim Ibirapuera, Zona Sul de São Paulo, em prol do incentivo da produção cultural do território. Em frente ao local, de terça a sábado, o carrinho de doces de Solange Ferreira, 46, moradora do Jardim Mazza, reforça a importância da gastronomia local ao agradar o paladar dos frequentadores, entre uma atividade cultural e outra do espaço cultural comunitário.

Até o momento da pandemia, Solange era diarista – atividade afetada pelo lockdown, como tantas outras. Considerando os índices do IBGE, nos primeiros 5 meses de restrição de aglomerações, a taxa de desemprego aumentou em 33,1%. Dado que pode ser explicado por um contexto de mudanças estruturais baseadas na insegurança econômica de modo geral. 

Solange Ferreira, 46, confeiteira e moradora do Jardim Mazza, zona sul de São Paulo. Foto: Sthefani de Jesus.

A diminuição expressiva da demanda de serviços também impactou diretamente no fechamento de empresas e gerou demissões em massa. Escancarando assim um panorama de desigualdades que passa a popularizar a informalidade como uma alternativa viável de geração de trabalho e renda, principalmente nas regiões periféricas do país.

Enquanto pessoas de média e alta classe podiam trabalhar de maneira remota, diaristas, assim como Solange e outros prestadores de serviços essenciais, não tinham condições ou alternativas de trabalho seguro com critérios rigorosos de proteção contra o vírus. 

A história de Solange nos abre horizontes para debater a importância da auto realização empreendedora, a partir de conquistas como o primeiro estabelecimento comercial. Proporcionando acesso a benefícios legais, além de melhora na logística, na segurança e muitos outros aspectos que influenciam na estabilidade e no crescimento de sua empresa a longo prazo. Em entrevista ao Você Repórter da Periferia, ela conta como o negócio está movimentando a economia local e contribuindo com a geração de empregos. 

VCRP: Como era ser diarista? Você gostava do ofício?

Não gostava muito. Era o que eu tinha para fazer. Fui empregada doméstica por 10 anos e diarista por mais 5. É um serviço que a gente trabalha muito e é pouco valorizado.

VCRP: O que te fez parar com o ofício de diarista para começar a empreender?

Eu sempre tive o sonho de montar meu próprio negócio e vi na minha sobrinha Karen, que também é confeiteira, a visão da gente poder crescer trabalhando juntas. Começamos em 2021, já num momento de flexibilização da quarentena. Ainda diante dos desafios que a pandemia trouxe para todos os ramos, mas principalmente para o serviço doméstico. Acho que o dom com a confeitaria vem de família, meus irmãos também trabalham com isso nas cidades em que moram.

VCRP: Você sente falta da sua função anterior ou prefere trabalhar com confeitaria?

Eu amo o que eu faço agora. Trabalho muito, né? Porque ser empreendedora não é fácil, tem que se esforçar bastante, mas eu gosto muito.

VCRP: E o que que te motiva a continuar empreendendo?

Eu sempre gostei de trabalhar com empreendedorismo. A minha mãe também trabalha com isso, vende artigos de cama, mesa e banho. É mais uma coisa que vem de família e eu sempre a incentivei.

VCRP: Como é trabalhar no seu território?

Faz muita diferença. Como diarista, eu sempre trabalhava longe. Na Vila Leopoldina, na Berrini, na Vila Mariana. Estar por perto agora é gratificante em todos os sentidos. Quando chego para trabalhar, já tem gente esperando para comprar o doce da tia. Eu abri uma loja há duas semanas, num ponto um pouco longe daqui e “tá” todo mundo reclamando disso. Por conta da afinidade, o pessoal acaba me dando dicas para novos produtos e feedbacks dos doces que eu já vendo. Tenho clientes bem importantes na Rua Estados Unidos e na Brigadeiro Faria Lima, que encomendam meus bolos sempre que podem. Na Zona Leste também sou conhecida e forneço sobremesas para alguns restaurantes no Itaim Bibi. 

VCRP: E quais os planos para o futuro?

Me vejo abrindo uma loja lá no Piraporinha, no Jardim Mazza. E quero abrir uma filial aqui no Jardim Ibirapuera, onde estão meus clientes mais antigos. Mas a longo prazo, meu planejamento é que minha filha aprenda tudo que eu sei, “pra” ela poder continuar com as lojas que eu quero futuramente abrir. Tenho uma filha só e é isso que eu falo para ela: “Um dia eu vou ficar velha, então você tem que aprender um pouco de tudo, para lá na frente fazer o que a sua mãe fazia e continuar o legado dela.”

Esse conteúdo foi produzido por jovens em processo de formação da 8° edição do Você Repórter da Periferia (VCRP), programa em educação midiática antirracista realizado desde 2013, pelo portal de notícias Desenrola e Não Me Enrola.

“Não tenho que pegar trânsito”: fotógrafa celebra o fato de ir andando ao trabalho

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Na contramão da rotina diária da maioria dos paulistanos que gastam em média 2h30 no trânsito para ir e voltar do trabalho, a fotógrafa Letícia Pires, 47 anos, moradora do Jardim Ibirapuera, zona sul de São Paulo, tem o privilégio de trabalhar perto de casa, fato que permite ter uma rotina com mais tempo para o lazer e qualidade de vida. Ela trabalha no Bloco do Beco, um bloco de carnaval que promove a difusão da cultura periférica, por meio da música, dança, literatura e alimentação saudável. 

Enquanto moradores e visitantes do Bloco do Beco saboreiam uma feijoada ao som da batucada de um grupo de sambistas  que fazem parte da construção da organização cultural e do bloco de carnaval, Letícia corre de um lado para o outro apoiando na produção de imagens do evento e também na organização logística do espaço que recebe mais de 100 pessoas aos finais de semana, quando ocorre o tradicional samba da velha guarda.

Letícia Pires atua há dois anos auxiliando na organização dos eventos e atividades culturais do Bloco do Beco. Em entrevista ao Você Repórter da Periferia, ela relata sobre a melhor qualidade de vida e conforto de trabalhar no seu território.

Jovens do Você Repórter da Periferia em entrevista com Letícia Pires, moradora do Jardim Ibirapuera, zona sul de São Paulo. Foto: Vinicius Ramos.

VCRP: Como é o trabalho ideal para você?

Olha eu gosto muito de estar com pessoas, eu acho que todo trabalho é trabalho, eu entrei aqui no bloco para ajudar com o público. Para dar informação sobre os cursos, para falar sobre os eventos. Eu não tenho muita rotina. Então para mim é maravilhoso atuar ajudando onde precisa.

VCRP: Seu último emprego era longe de casa?

Não. Eu sempre trabalhei aqui na quebrada e o último trabalho que eu tive foi na Fábrica de Cultura do Jardim São Luís, que já é aqui ao lado. Não tem essa questão de pegar trânsito e nem de falta ônibus, mesmo quando eu estava por conta própria, o local era perto também, porque eu fazia unhas, ajudava e pintava a parede de casas, então pegava vários bicos perto de casa.

VCRP: Qual é o impacto na sua rotina ao trabalhar perto de casa?

A primeira questão é que tenho pais, minha mãe já tem uma idade, então se eu precisar ir almoçar em casa para ver eles eu consigo. Então isso facilita a rotina e eu não perco tempo, né? Porque a qualquer minuto eu tô dentro de casa, um fator importante com relação a minha mãe que tem idade e precisa da gente lá.

VCRP: Em relação a segurança, você se sente segura trabalhando no território?

Eu moro aqui desde quando eu nasci. Eu tenho 47 anos. Então a gente já conhece a maioria das pessoas. Agora eu tô trabalhando aqui no Bloco do Beco e tudo que eu faço é muito comunitário. É lógico que como todo lugar que você vai passar, você vai ter que ter cuidado e responsabilidade com as pessoas, não tem essa né? Mas mesmo assim, eu não me sinto desconfortável.