A noite de 06 de fevereiro de 2025 ainda não acabou para os moradores das ruas Rafael Portante e Vitoriano de Oliveira, às margens do Córrego do Engenho, entre o Jardim Rosana e o Jardim Mitsutani, na zona sul de São Paulo.
O rompimento de uma manilha (tubulação) da SABESP na Rua Rafael Portante foi uma das causas da enchente que destruiu lares de moradores dessa via na primeira semana de fevereiro. A força das águas inundou, inclusive, algumas residências na rua paralela (a de trás): Rua Guerra dos Mascates.
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Outro fator também determinante para alagar a Rua Vitoriano de Oliveira, do outro lado do Córrego do Engenho, foi a execução de obras da Prefeitura de São Paulo (PMSP).
Segundo a Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras foram realizadas melhorias na rede de drenagem do Córrego do Engenho – 216 metros, em suas margens estão as ruas Praias de Costa Verde e Rua José de Maistre.
Embora tenha garantido um direito fundamental à parte da população local, a intervenção do poder público (entregue em maio de 2023), visou, de modo especial, à Av. Alto de Pirajussara, importante via de interligação entre bairros da região (inclusive com dois municípios vizinhos, Taboão da Serra e Embu das Artes), que alagava, “atrapalhando o trânsito”.
Em outras palavras, a prioridade era o trânsito, não as pessoas. “Tempo é dinheiro”, dizem, não é?
Ser humano, por sua vez, só é número e voto em época de eleição.
Por isso, as vidas dos que moram nas ruas afetadas estacionaram, ou pior, “desceram ladeira abaixo” (como se diz popularmente).
O montante de R$ 8,4 milhões investidos – segundo o site oficial da prefeitura de São Paulo – não apenas deixou de contemplar todos os moradores das ruas em que houve obras, prejudicou também aqueles que habitam as ruas Vitoriano de Oliveira e Rafael Portante.
A prioridade era o trânsito, não as pessoas.
Em contraste com o trecho canalizado, a prefeitura deixa considerável extensão do Córrego do Engenho, no trecho margeado pelas ruas Praias de Costa Verde e Rua José de Maistre, bem afastada aos olhos de quem transita pela Av. Alto de Pirajussara – sem nenhum tipo de intervenção.
Para além da solidariedade
Mais uma vez quem está resolvendo a questão é a população local. De um lado estão os que não residem nos pontos atingidos pelas águas poluídas do Engenho, auxiliando em campanhas; do outro, os que foram afetados, lutando por seus direitos.
Enquanto a sociedade civil entregava marmitas na noite de domingo (09/02) – “Graças a Deus! Não havia como cozinhar, né?”, agradeceu uma moradora –, prosseguia o mutirão para ajudar na limpeza de casas, auxiliar vizinhos, bem como fazer articulação para cobrar os responsáveis.
O restabelecimento de água, na Rua Vitoriano de Oliveira, por exemplo, só ocorreu uma semana depois do transbordamento do córrego em razão da pressão popular junto à Subprefeitura de Campo Limpo e à SABESP.
Apesar do engajamento dos moradores afetados pelas cheias, contudo, a prefeitura se limitou a fornecer apenas mil reais (em parcela única), por meio do Cartão Emergencial. “Essa quantia uma vez vai resolver o quê?’, questiona uma das moradoras.
A Defesa Civil, apesar dos protestos populares, vistoriou as residências apenas pelo lado de fora. “Quer dizer, nem se deram o trabalho de ver as condições da casa”, denuncia outra moradora. “Como posso saber se está segura?”
A manilha que se rompeu, debaixo de uma casa da Rua Rafael Portante, virou jogo de empurra-empurra entre PMSP e SABESP: ambos se eximem da responsabilidade. A família dessa residência, por exemplo, não poderá retornar ao seu lar enquanto as providências necessárias não forem tomadas.
A atuação do poder público tem de ser urgente: tanto SABESP quanto PMSP precisam cuidar dos munícipes afetados.
Neste primeiro momento, a SABESP tem de realizar os reparos na tubulação e promover os reparos necessários nas residências afetadas; também, ressarcir as perdas materiais: TV, geladeira, fogão, cama, dentre outros.
Em caráter de urgência, a prefeitura deve limpar o córrego. Mas apenas como paliativo. Apenas para evitar enchentes enquanto não concluir – o essencial – a canalização do Córrego do Engenho, em toda a sua extensão (por que não terminou, Ricardo Nunes?)
Disparar alertas de chuvas – para encerrar – é uma estratégia interessantíssima! Sobretudo, para a publicidade da gestão Nunes, como um governo que atua nesse segmento. Sua eficácia, porém, “vai até a página dois” em alguns casos, como este do Jardim Rosana (ou do Pantanal, na zona leste da cidade).
Acionar o modo trabalho para promover a prevenção de enchentes não rende curtidas, nem tampouco likes, tanto quanto a lacração dos “alertas” na mídia.
Arregaçar as mangas para garantir o mínimo de dignidade aos moradores do Jd. Rosana: é para isso que Ricardo Nunes, também, foi reeleito!
Em tempo: Tarcísio de Freitas, governador do estado de São Paulo, precisa participar desse processo, garantindo que a SABESP cumpra seu papel. Só quem não pode perder mais (até porque não tem o que perder) são as pessoas prejudicadas pela omissão pública.
Fábio Roberto Ferreira Barreto é professor da rede pública de ensino e mestre em literatura pela USP.