Opinião

Realidade a céu aberto: um encontro entre a política e o cotidiano

Este texto não tem um final, ele é a retomada de um dos primeiros textos desta coluna, onde eu analisei de forma breve e superficial a figura de diferentes políticos como Jair Messias Bolsonaro e Milton Leite.

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O cotidiano é permeado por inúmeros conflitos. Este texto não tem um final, ele é a retomada de um dos primeiros textos desta coluna, onde eu analisei de forma breve e superficial a figura de diferentes políticos como Jair Messias Bolsonaro e Milton Leite. Na mesma época produzi uma série de texto onde trazia bordões para dialogar com a necropolítica presente em nossa sociedade. 

“Atrás de um ditador, existe um grande amor”: as emoções e seu uso na política: Realidade a céu aberto: um encontro entre a política e o cotidiano

Todos estes textos tinham algo em comum, eram uma análise pessoal com respingos de vivências minhas, porém, também norteados pelos conhecimentos que eu adquiri com o passar dos anos como estudante e pesquisadora. Por isso, o início desse texto é afirmando que cotidianamente enfrentamos conflitos, se não pessoais e direcionados a nós, ao menos assistimos eles acontecerem, incluindo os conflitos políticos.

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A realidade parece fugir ao nosso olhar, que apegado a ideia egóica que somente com “nosso poder” venceríamos, perdemos muito do cotidiano. Quando falamos de internet hoje, não se pode negar o poder de influência dela em nossas vidas, estou me comunicando com vocês por algum aparelho com acesso à internet, sem isso, este texto talvez jamais seria público.

Quando entendemos o nível a que a comunicação chegou, também se abrem outras questões: será que estamos nos conectando com quem queremos? Ou somente nos isolando numa bolha de afirmação? A realidade é insistente, ela não para, ela nunca parou.

Ao relembrarmos os dados das eleições de 2020, onde Guilherme Boulos e Bruno Covas foram para o 2º turno, Covas foi eleito pelo PSDB com 5.337.230 votos, 59.38% dos votos totais, contra 2.168.109 votos, 40.62% de Boulos, do PSOL. Quando prestamos atenção aos dados, tem algo muito importante: 2.769.179 pessoas escolheram se abster do voto, 30.81%. Nulos somaram 607.062 (9,76%) e brancos 273.216 (4,39%).

Assim, a última eleição para a prefeitura deveria ter uma disputa bem pontual, já que um número bem expressivo de pessoas escolheram não optar por nenhum dos candidatos na eleição anterior. Novamente retorno aos outros textos, as pessoas demonstravam decepção com a política. A eleição de 2020, também foi uma eleição extremamente atípica, com uma pandemia que matou milhões de pessoas ao redor do mundo acontecendo.

Seguindo este raciocínio, a eleição de 2024 reservava muitas lições, levando em consideração o poder que aplicativos como Tik Tok e Kwai tiveram durante a pandemia e o uso das mídias que já havia sendo necessário nos últimos anos, seria possível realizar uma eleição em 2024 sem belos closes? 

Para a surpresa de muitos, a resposta é não. Durante a disputa eleitoral, após somente um debate e algumas entrevistas, Pablo Marçal ganhou as mídias, candidato pelo PRTB, com falas extremas, irreverentes e exageradas conseguiu um crescimento expressivo. Uma tática muito utilizada por Bolsonaro, que em 2009, ganhou as telas da Rede TV com suas posturas polêmicas em Brasília.

Este texto foi escrito antes dos resultados da eleição, todavia decidi publicá-lo somente após a disputa, pois não queria lidar com conflitos, assumo que nos últimos anos venho observando a realidade, porém expondo menos as minhas observações já que enfrentei muitos embates antes e após a pandemia. Expor isso é ser honesta com todos os que me lêem e confiam na minha escrita.

A realidade aparece a céu aberto e não podemos desviar o olhar, para quem estamos falando?

“Uns desistem, outros ficam
Alguns desistem e ficam
Só espaço físico ocupam e indicam
A tragicomédia de quem não tem, da própria existência, as rédeas
Cérebros de férias
Vários vagabundos festejando o fim do mundo
Enquanto isso, o cidadão comum se sente ridículo
Não encontra paz no versículo
Batendo de porta em porta, debaixo do braço, um currículo
Família inteira num cubículo”

Black Alien / From Hell do Céu

Para quem não se recorda, PRTB é o partido fundado por Levy Fidelix, este mesmo que rendeu muitos memes em sua última participação nas eleições após a exposição de suas propostas. Um partido que recebia chacotas, considerado pequeno e com um certo acúmulo de eleições perdidas.

Este é o movimento real, não estou aqui falando do poder do Tik Tok, estou relembrando que a vida se movimenta, assim como a informação. É possível que quando este texto for ao ar, ele já não seja mais candidato devido às medidas judiciais, porém conseguiu o que queria, assim como o partido. 

ELE CONTINUOU SENDO CANDIDATO…

Contudo, em fevereiro de 2025, Marçal se tornou inelegível por oito anos, por abuso de poder político, poder econômico, uso indevido de meios de comunicação e captação ilícita de recursos. Uma vitória, mas posterior a todo o caminho que ele construiu para quem irá vir. 

Quero deixar claro que este não é um texto com uma crítica genérica, é um texto de reflexão. Quando falamos algo, falamos para alguém, então para quem? 

Essa não é somente uma questão de manipulação midiática, tem um movimento acontecendo, inclusive entre as redes que se formaram nestes anos e se mostram dispostas a trabalhar para combater esses discursos, saber responder é necessário. 

Destaco que morando na periferia e vendo o movimento acontecendo nos últimos anos, partidos como Republicanos e União Brasil têm ganhado força, algo que também aparece nas pesquisas recentes na corrida eleitoral pelo Brasil. 

Na última eleição, os candidatos a Prefeitura de SP foram: Altino Prazeres (PSTU), Bebeto Haddad (DC), Datena (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL), Pablo Marçal (PRTB), Marina Helena (Novo), Ricardo Nunes (MDB), Ricardo Senese (UP) e Tábata Amaral (PSB). De quem mais ouvimos falar? 

Arruaça não faz campanha, mas se movimenta. 

Quem não se lembra do Enéas, eleito deputado federal por São Paulo em 2002? Filiado ao PRONA (Partido de Reedificação da Ordem Nacional) que ao se fundir com o PL (Partido Liberal) se tornou PR (Partido da República), o mesmo que em 2022 se tornou PL (Partido Liberal), pelo qual Jair Messias Bolsonaro foi eleito. 

Será que Enéas não falou para ninguém? Nada é acaso, nós nos tornamos inocentes ao não entender que a realidade acontece. Nós escolhemos nos enganar, nos esconder em vitórias do passado.

Tratar como insano um homem que realizou um movimento minucioso se unindo a grandes figuras famosas no mundo fitness, por exemplo, é ingenuidade. Marçal é a construção da urgência, seu exagero encanta quem adotou o conceito “todos que já estiveram lá roubam”. 

Além disso, temos um movimento massivo e publicitário em cima do livro “Café com Deus Pai” e do marketing sobre uma vida cristã sem renúncias, apenas com o acréscimo do devocional e da divulgação do livro. Porém, Junior Rostirola, pastor e escritor do livro, é um apoiador assumido de Jair Messias Bolsonaro e os influenciadores que vem divulgando uma “conversão” ao cristianismo, em parte, não parecem abandonar nenhuma prática, como divulgar jogos de apostas, por exemplo. 

Todavia, a publicidade de um cristianismo estético está vendendo e essa venda também está parecendo ter um futuro político. 

No meu olhar, isso não é sobre igrejas evangélicas. A maior parte das igrejas nunca teria recursos para produzir um livro desse porte, vivem de assistencialismo e seus líderes possuem trabalhos fixos para se manterem na religião, não o oposto. Estamos aqui falando de um movimento publicitário, político e estrutural, é sobre lucros.

Vivemos em uma realidade onde as pessoas estão exaustas, essa é a verdade, a realidade não nos afaga em nenhum momento, discursos que generalizam a política ganham força. Este não é um texto com receita, é um texto sem finalização. Desejo que possamos refletir para encontrarmos novos caminhos, pois com certeza métodos antigos já não funcionam mais… e eles sabem! 

Abram seus olhos, não se ataquem, é urgente que possamos cuidar dos nossos, sem memes, sem piadas sobre “pobre de direita”, também não temos muito valor partidário para a esquerda sem poder, essa é a realidade, sejamos nós a sermos justos com os nossos! Sejamos nós a falarmos com as dores dos nossos, sejamos nós a olharmos incansavelmente para a profundidade do que estamos lidando cotidianamente, sejamos nós, antes que tudo nos escape. 

“Doa a quem doer, eu não acredito em você
Não acredito no sucesso, não acredito na TV
Não acredito no que me vem impresso
Acredito em ordem e progresso quando o povo tem acesso ao ingresso”

Black Alien / Umaextrapunkprumextrafunk
Este é um conteúdo opinativo. O Desenrola e Não Me Enrola não modifica os conteúdos de seus colaboradores colunistas.




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