Socióloga aponta que não ter nenhuma candidata para os cargos em destaque no pleito é um diagnóstico das relações de gênero presente na política e na sociedade.
A partir de análises nos planos de governo dos três principais candidatos ao Governo do Estado de São Paulo, Fernando Haddad (PT), Rodrigo Garcia (PSDB) e Tarcísio Freitas (Republicanos), a socióloga Anabela Gonçalves traz um panorama sobre as propostas dos candidatos com foco nas mulheres.
A socióloga Anabela Gonçalves aponta que muitas vezes um plano de governo não consegue dar conta de todas as necessidades de um público, mas constatou que em nenhum dos planos tem uma proposta chamada “demandas das mulheres”, o que considera um destaque importante.
“Ainda com alguns avanços, não se vê presente a população carcerária feminina nessas propostas, ou um diálogo direto com a pobreza menstrual, tema que esse ano foi tão abordado”, aponta.
Anabela afirma que os planos de governo dão destaque para a economia, parceria público-privada, como o de Rodrigo Garcia (PSDB), que eleva a participação do setor privado em decisões públicas, “prometendo criar canais de participação para esse setor, quando não aponta medidas de participação do povo”, afirma.
“Tanto no que se refere ao plano do candidato Rodrigo Garcia e de Tarcísio Freitas, as mulheres aparecem de forma genérica, mesmo reconhecendo suas necessidades quando diz respeito à segurança pública no combate à violência contra a mulher ou quando salienta a ampliação dos serviços de saúde”
avalia a socióloga.
Segundo ela, apesar de apontarem a necessidade de atenção às mulheres nas políticas públicas, não apontam como vão realizar e como darão conta de políticas que não levam em consideração raça e classe. “Já vimos isso nos planos da presidência e eles se repetem no Estado de São Paulo quase como um alinhamento político”, constata a socióloga.
“O candidato Fernando Haddad apresenta em seu plano políticas que levam em consideração mulheres negras, a população LGBTQIA+, quilombolas, pessoas com deficiência, migrantes e refugiados”, afirma.
Anabela reforça que nas propostas do candidato Fernando Haddad se destaca a necessidade de olhar para população de mulheres negras de São Paulo, “lembrando que toda precarização, seja na moradia, empregabilidade, cultura ou saneamento básico, a população pobre é mais afetada e em destaque as mulheres negras, trabalhando com a interseccionalidade em relação aos fatores de desenvolvimento”.
Em seu plano de governo, o candidato Tarcísio Freitas fala sobre a ampliação da educação integral em parceria com o Programa Forças no Esporte (PROFESP) e com as Forças Armadas para atividades de ensino em tempo integral em escolas municipais e estaduais.
A intelectual avalia como grave a proposta, principalmente quando o candidato cita educação cívica: “Sem dúvida coloca nós mulheres periféricas que enfrentam o genocídio do Estado em alerta”.
“O mesmo candidato [Tarcísio Freitas] apresenta a proposta de transformar o estado em um polo de referência na utilização de saúde digital e telemedicina, levando o sistema a um novo patamar de gestão, sustentabilidade e satisfação do usuário, mas não achei nada sobre wi-fi gratuito ou a democratização da internet para população de baixa renda, muito menos para as mulheres que na maioria das vezes gerenciam a saúde de suas famílias”
aponta a socióloga Anabela.
Falta de representatividade que reflete nas propostas
A especialista analisa que não adianta propor mais frentes de trabalho para as mulheres sem apoio à educação das trabalhadoras, sem ampliação da licença maternidade e sua remuneração, sem bolsa para mãe estudante e sem construção de creches nas universidades públicas.
“Todo mundo entendeu que é importante falar da participação, do combate à violência, mas ainda existem poucas propostas de apoio à produção intelectual, cotas em cargos públicos de alto escalão, regulamentação em comissões, editais entre outras políticas que garantam a equidade de gênero e inclusão das mulheres trans nessas propostas”
analisa.
A socióloga aponta que chama sua atenção o candidato Fernando Haddad referenciar o combate à criminalidade em sua proposta 67, sobre segurança pública, mas o combate ao genocídio da população preta não está de forma objetiva nessa proposta.
“O genocídio é um assunto das mulheres periféricas, que estão cansadas de verem seus filhos assassinados”, pontua Anabela, fazendo referência a proposta do candidato.
“Não encontrei nada de novo sobre políticas para as mulheres, o que temos de mais positivo é o aperfeiçoamento e continuidade de políticas públicas com atenção às mulheres negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+ e suas interseccionalidades propostas pelo candidato Fernando Haddad”
afirma a socióloga.
Anabela Gonçalves lembra que, de acordo com os dados da Fundação Seade, a faixa etária da maioria da população feminina entre os anos 2040 e 2050 será de mulheres entre 45 e 74 anos, o que reflete as mudanças na diminuição de nascimentos e aumento da expectativa de vida da população em geral.
Para ela, esses dados devem pautar políticas de saúde, emprego e previdência para as mulheres e nenhum plano apresentado reflete diretamente essas questões.
“Isso porque não estamos falando sobre as meninas e as idosas diretamente, as políticas para as mulheres devem envolver idade, gênero, fecundidade, maternidade, emprego, previdência e educação, para além de violência”, afirma.
A socióloga destaca também a necessidade de planos políticos que de fato falem das cidadãs: “se estamos querendo fazer uma política includente, no mínimo seu plano de governo deve falar de todes“, afirma.
“Não ter nenhuma candidata para os altos cargos em destaque no pleito, para mim é um diagnóstico das relações de gênero presentes na política. Quando se fala em governo de São Paulo esse dado se torna agravante pela não existência de mulheres há anos nesse pleito”, conclui a especialista.