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Eleições: Jovem mobiliza mais de 90 pessoas para votar no primeiro turno nas periferias de SP

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A educadora Martha Gaudêncio montou um posto de atendimento em uma igreja e circulou por cursinhos populares das periferias, promovendo diálogos sobre a importância do voto e incentivando jovens e adultos a emitir e regularizar o título de eleitor.

A educadora ajudou jovens e adultos a emitir, regularizar ou tranferir o título de eleitor para uma zona eleitoral mais próxima de suas casas. (Foto: Arquivo Pessoal)

Enquanto artistas e influenciadores digitais ocupavam as redes sociais para engajar jovens a tirar o título de eleitor, a educadora popular Martha Gaudêncio, 23, estava circulando as periferias dos municípios de Itapecerica da Serra e da zona sul de São Paulo, para promover espaços de diálogos sobre a importância do voto, participação social e a construção de políticas públicas fundamentais para as periferias.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, em 2018, quase 30 milhões de brasileiros deixaram de comparecer às urnas , com isso, a última eleição presidencial alcançou a marca de maior número de eleitores que deixaram de votar desde 1998.

Enraizada nos movimentos de educação popular das periferias, Gaudêncio é moradora do Jardim Santa Júlia, bairro de Itapecerica da Serra, região metropolitana de São Paulo. Ela é formada em Ciências e Humanidades pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e atualmente está cursando a graduação de políticas públicas na mesma instituição.

“Por muitos anos no Brasil, mulheres, analfabetos e negros não podiam votar. Esse processo é muito importante para a gente conseguir reconhecer os nossos direitos e mais que isso, reconhecer como as políticas públicas afetam o nosso dia a dia”

Martha Gaudêncio é educadora popular.

Martha Gaudêncio criou um posto de atendimento em um igreja de Itapecirica da Serra para atender os moradores interessados em votar nas eleições de 2022. (Foto: Arquivo Pessoal)

A educadora enfatiza que durante os diálogos com os jovens e adultos, ela fez questão de relembrar o fato histórico de que o voto no Brasil foi um direito conquistado, informação que muitas vezes não está disponível com fácil acesso para os moradores das periferias.

Foi na Rede Ubuntu de Educação Popular que Gaudêncio começou sua trajetória como educadora popular. A iniciativa que busca inserir estudantes de escolas públicas no ensino superior foi o principal parceiro da educadora para impactar os jovens moradores das periferias.

Cerca de 150 jovens da Rede Ubuntu de Cursinhos Populares foram impactados pela proposta de educação cívica de Gaudêncio, que realizou rodas de conversa sobre a história do voto, a importância da participação social e a construção de políticas públicas para a garantia de direitos.

Além disso, ela atendeu 97 jovens e adultos que moravam nos bairros onde ela realizava as palestras e atendimentos na igreja. O público ia até ela, pois estavam com dúvidas para emitir o primeiro título, regularizar o documento ou transferir o local de votação para outra zona eleitoral.

“Tem inevitavelmente um pouco de formação cidadã, né”

Martha Gaudêncio atua como educadora popular na Rede Ubuntu de Educação Popular.

Ao lembrar que é uma das primeiras pessoas da família a acessar a universidade, a educadora reflete e reconhece que sua mãe, pai e avós não tiveram a mesma oportunidade ou política pública para usufruir deste direito fundamental que é o acesso à educação superior.

Esse interesse em fomentar espaços de diálogo sobre direitos sociais e participação política com jovens das periferias levou Martha a se tornar coordenadora da Pastoral Fé e Cidadania da Paróquia Jesus de Nazaré e Secretaria de Juventudes do Partido dos Trabalhadores (PT) em Itapecerica da Serra.

Uma das estratégias utilizadas pela educadora para chamar a atenção dos jovens durante os diálogos é discutir a presença ou ausência de políticas públicas no bairro onde eles vivem.

“Essas conversas sempre partem de uma perspectiva territorial. Então é chegar e falar: ó, a gente que mora aqui no fundão se o metrô saísse do Capão Redondo e viesse até o Jardim Ângela ia melhorar a nossa vida, não ia? Aí todos eles reconhecem que sim. Aí eu falo que o fato de ter ou não uma estação de metrô no Jardim Ângela é uma decisão política”, detalha Gaudêncio sobre uma de suas estratégias de educação e engajamento cívico com os jovens.

O próximo passo, segundo a educadora, é debater como a ausência dessas políticas públicas afetam o cotidiano dos jovens e de seus familiares, como forma de ampliar a percepção deles para essas questões fundamentais que muitas vezes não são discutidas dentro do ambiente familiar ou no seu convívio social.

“Eu acho muito legal, porque isso faz com que os jovens vão criando uma consciência sobre o quão importante é você entender de fato o que tá acontecendo, quem são os nossos representantes e tudo mais”, diz.

Cerca de 150 jovens da Rede Ubuntu de Cursinhos Populares foram impactados pela proposta de educação cívica da educadora popular. (Foto: Arquivo Pessoal)

Voto jovem e participação política 

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Brasil ganhou 2.042.817 novos eleitores com idade entre 16 e 18 anos, um aumento de 47% em relação ao número de jovens que tiraram título de eleitor nas eleições presidenciais de 2018.

Esse também foi um dos principais motivos que incentivaram Martha a organizar um plantão de atendimento em uma igreja católica na periferia de Itapecerica da Serra.

“Falei com o padre da Paróquia Jesus de Nazaré e ele me deu abertura para realizar a campanha. Peguei uma mesa, uma cadeira, um computador e comecei a divulgar nas redes sociais que a gente já tá lá tirando e regularizando título de eleitor de pessoas aqui na periferia de São Paulo”, relembra ela.

Como resultado deste processo, a educadora relata que impactou 97 pessoas atendidas no posto da paróquia. Além disso, chegaram 19 contatos de pessoas via WhatsApp, pois não conseguiram ir até igreja. Segundo ela, os moradores mandaram mensagem com as informações para realizar o atendimento online.

“Tem pessoas que vieram do nordeste para cá, que vieram da Bahia e Pernambuco e nunca tinham transferido o título para Itapecerica”, relata.

A conclusão do processo ocorreu nos polos do cursinho da Rede Ubuntu de Educação Popular, onde 37 jovens tiraram o primeiro título de eleitor. “Foi muito legal perceber que as pessoas realmente estavam interessadas em tirar o título. Atendi jovens com 17 anos que irão votar por livre e espontânea vontade”, finaliza.

“Vote mulher”: Escadão no Capão Redondo ganha grafite que incentiva voto feminino

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A ação realizada por artistas visuais faz parte da campanha Elas que Decidem, que visa incentivar mulheres a votar nas eleições deste domingo.

A iniciativa faz parte da campanha de incentivo ao voto feminino Elas que Decidem. Foto: Tamara dos Santos

Um grupo de mulheres artistas visuais transformaram a paisagem de um escadão localizado na Rua Abigail Maia, no Capão Redondo, zona sul de São Paulo. A passagem de ligação com outras ruas do território amanheceu colorida nesta segunda-feira (26), com mensagens de incentivo ao voto feminino.

Munidas de escadas, latas de tinta e de spray durante o último domingo (25), as artistas Suzana Maria, Vanessa de Souza e Stephany Alves – criaram intervenções visuais no escadão para deixar um recado pra mulherada que transita no território: a importância de votarem nas eleições do próximo domingo, dia 02/10.

A iniciativa faz parte da campanha de incentivo ao voto feminino Elas que Decidem, que realizou um levantamento de dados que apontam um cenário alarmante: 33 milhões de brasileiras não compareceram às urnas, ou votaram branco e nulo nas eleições presidenciais de 2018. Os números tem como fonte um cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) juntamente com informações do Datafolha.

“Fiz uma jovem preta, indígena, de quebrada, pra retratar a importância da presença dela na política”

Stephany Alves é artista visual.

Foto: Tamara dos Santos

Nas texturas e letras da frase “Vote, mulher!”, Stephany conta que tentou trazer a contribuição artística que retrata as ancestralidades da mulher negra e indígena. “Elas lutaram para termos representatividade na política, e o futurismo; que é o que fazemos hoje para as mulheres que virão”, conta a jovem artistas de 23 anos, que atua como arte-educadora e grafiteira desde os 15 anos, quando começou a ensinar a arte nos muros para jovens e crianças periféricas.

Já Vanessa, com o projeto de arte Muito Amor, se expressou através da frase: “Um Futuro Juntas” em letras grandes e coloridas. Cria de Carapicuíba, na grande SP, é estudante de comunicação na USP e desde 2016 estuda lettering, pintura e desenho. “Sou apaixonada por arte urbana, considero o grafitti uma forma de contar histórias da cultura periférica e fiquei muito feliz quando surgiu esse muro, pois ele une a oportunidade de mostrar minha arte e meu posicionamento político junto de duas artistas e mulheres incríveis. Como mulher negra e periférica, sei da importância do voto como motor de mudança na vida das mulheres”, arremata.

Apesar de serem fundamentais para a decisão dos governantes do País, (em 2022 as mulheres serão 53% do eleitorado), a população feminina se abstém mais na hora de indicar suas preferências nas urnas.

Foto: Tamara dos Santos

A ilustradora e diretora de arte brasiliense Suzana Maria já havia criado a ilustração em que uma garota segura um cartaz escrito “Vote” para a campanha Elas que Decidem. O desenho agora foi ampliado na parede e eternizado no Capão.

“Essa pintura exalta a força da mulher, representada pela figura hiperbólica e ilustração, fazendo um convite para que a sociedade eleja cada vez mais lideranças femininas e incentive a organização de mulheres no espaço político”, explica.

A ação da campanha também celebra os 90 anos do sufrágio feminino no Brasil, movimento que em 1932 permitiu que todas as mulheres brasileiras, maiores de 21 anos, alfabetizadas e assalariadas, tivessem direito ao voto.

Escritor indígena analisa propostas de Lula e Bolsonaro para os povos originários

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A análise aponta que Bolsonaro busca ampliar a mineração e Lula quer reforçar a proteção de terras dos povos originários com mais participação social na FUNAI.

Durante os primeiros três anos (2019 – 2022) do governo de Jair Bolsonaro (PL), as atividades de grilagem de terras, desmatamento de florestas, mineração e garimpo ilegal aumentaram e se tornaram ameaças diretas à vida da população indígena que vive na Amazônia Legal, território reconhecido por lei e composto pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e Maranhão.

Além de possuir a maior biodiversidade de floresta tropical e a maior bacia hidrográfica do mundo, que distribui água para diversos estados do país, a Amazônia Legal concentra 98% das terras indígenas e abriga 56% da população indígena do Brasil, segundo dados do IBGE. Esses fatores demográficos e climáticos tornam as eleições presidenciais de 2022 o principal debate de interesses políticos e econômicos do planeta.

Atento a importância de colocar a população indígena no centro do debate político, o Desenrola entrevista o escritor e ativista Olívio Jekupé, importante liderança indígena guarani no Brasil, autor de 24 livros, que levou para centros acadêmicos o pensamento e o conhecimento dos povos originários. Ele irá analisar as propostas dos presidenciáveis Jair Bolsonaro (PL) e Lula (PT).

Logo no início da entrevista, o escritor indígena relembra a fala de Jair Bolsonaro em fevereiro de 2018, momento de pré-campanha eleitoral à presidência da república, na qual o atual presidente comentou em uma entrevista: “Nem um centímetro a mais para terras indígenas”.

Para Olívio, liderança indígena Guarani que já presenciou uma série de ataques do governo Bolsonaro aos direitos dos povos indígenas, as propostas do candidato não apresentam um interesse genuíno em promover o direito à vida e à terra.

“Não dá para acreditar nas propostas de Bolsonaro. É um governo complicado na questão indígena. Ele cumpriu o que ele falou na outra proposta dele – não dar nenhum centímetro de terra – mas a terra não é dele, a terra é nossa, dos nossos parentes. Com isso, as demarcações das terras indígenas no Brasil estão todas paradas”

Olívio Jekupé é escritor e liderança indígena. 

Plano de governo 

Intitulado ‘Caminho da Prosperidade – Construindo uma Grande Nação’, o plano de governo de Jair Bolsonaro (PL) cita pela primeira vez a palavra indígena na proposta focada em promover “Liberdade para o Uso Responsável dos Recursos Naturais”. Ao todo são 12 citações ao termo ‘indígenas’ no documento.

De forma resumida, o item apresenta o seguinte objetivo: “o governo deve propiciar a todos, incluindo indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outros, a LIBERDADE de uso responsável dos recursos naturais que cada indivíduo ou coletividade dispõe legalmente.”

Na contramão do que propõe Bolsonaro, o plano de governo do candidato Lula (PT) cita a palavra indígena apenas três vezes, mas faz menção direta à proteção dos povos originários. “Estamos comprometidos com a proteção dos direitos e dos territórios dos povos indígenas”, diz o item 40 da proposta, que propõe criar mecanismos de proteção das terras indígenas para impedir atividades predatórias que colocam em risco a vida dos povos tradicionais.

“Com a proposta do Lula, a gente acredita que as questões indígenas podem melhorar. Inclusive com a criação de um ministério ocupado por povos indígenas do Brasil que são capacitados e inteligentes, para trabalhar melhor as nossas demandas”, coloca o escritor guarani. 

Combate à pobreza 

Olívio faz uma distinção entre as propostas de Bolsonaro e Lula, no que se refere à construção de proteção às populações mais pobres e melhorias de condições de vida. “Bolsonaro é da elite, principalmente na questão dos fazendeiros. Como ele prometeu não demarcar terra indígenas, isso incentivou ainda mais os fazendeiros, então a gente corre um grande perigo”, aponta o escritor, que enfatiza uma preocupação coletiva com o trabalho e a renda dos povos indígenas.

De acordo com o plano de governo, Bolsonaro visa combater a desigualdade socioeconômica incentivando e fomentando o empreendedorismo para os cidadãos brasileiros. Segundo Olívio, essa visão de política econômica impacta diretamente a cultura dos povos tradicionais, na sua forma de viver em harmonia e preservar os recursos naturais dos territórios onde vivem, como a terra e a água.

Outra medida proposta pelo plano de governo do atual presidente é promover e estimular a realização de atividades de turismo em territórios indígenas, para promover a economia local.

Já o presidenciável Lula aposta em medidas como fortalecimento das ofertas de trabalho com carteira assinada, a partir de uma renovação de leis trabalhistas para contemplar as novas formas de geração de renda da população brasileira, englobando novas categorias de trabalhadores que precisam de proteção social para não serem continuamente afetados pela informalidade e perda de direitos presente na atual legislação de apoio ao empreendedor e relação com aplicativos.

“O Lula sempre teve uma preocupação com a sociedade brasileira e especialmente os mais pobres”, diz Olívio, mencionando a importância de construir mecanismos de proteção social dos trabalhadores, para combater a extrema pobreza que vem afetando não só as populações de áreas urbanas, mas também a população indígena.

FUNAI 

No plano de governo do candidato Bolsonaro, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) aparece citada de forma tímida sem uma proposta concreta para reformular, organizar ou ampliar as competências do órgão público que tem por objetivo garantir a proteção dos direitos dos povos indígenas brasileiros.

Diante dos ataques de violência contra a vida dos povos indígenas promovidos por garimpeiros, mineradores, grileiros e fazendeiros, a FUNAI representa uma das principais instâncias do poder público para promover um debate em torno destas circunstâncias, apontando os problemas e soluções em defesa dos povos indígenas.

“A FUNAI precisa de mais poder para trabalhar com força as questões indígenas com respeito e honestidade, porque o atual presidente da FUNAI é ‘bolsonarista’, então a questão indígena ficou pior”, afirma Olívio, e ressalta ainda que essa é uma questão urgente que precisa ser alvo de mudança do próximo presidente eleito.

Para o escritor guarani, enquanto Lula fala em impedir atividades predatórias em territórios indígenas, o plano de governo de Bolsonaro propõe a legalização de atividades de mineração em terras dos povos tradicionais com apoio e fiscalização de órgãos do governo. Desta forma, ele avalia que o candidato Lula propõe uma série de ações para fortalecer a FUNAI e sua atuação no combate aos ataques contra a vida dos povos indígenas e o meio ambiente.

“Vamos combater o uso predatório dos recursos naturais e estimular as atividades econômicas com menor impacto ecológico. Para isso, será necessário recuperar as capacidades estatais, o planejamento e a participação social fortalecendo o Sistema Nacional de Meio Ambiente e a Funai”, descreve o item 49 do plano de governo do presidenciável do PT.

Um dos trechos que mais chama a atenção do escritor indígena é o fato de Lula propor a participação social nesse importante órgão do governo. Segundo ele, isso é um caminho para ouvir e acolher lideranças indígenas no comando da entidade. “Uma coisa importante é a presidência da FUNAI. Os próprios indígenas devem eleger quem vai governar a FUNAI”, finaliza.

Periferia em Movimento lança livro sobre experiências em educação midiática no Grajaú

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“Repórter da Quebrada: Experimentações marginais nas práticas jornalísticas” traz percepções sobre processos jornalísticos em periferias de São Paulo

(Foto: Comunicação Periferia Em Movimento)

 Nesta terça-feira (27), a partir das 18h, a produtora independente de jornalismo de quebrada Periferia em Movimento lança seu primeiro livro no Espaço Cultural Cazuá, localizado no Grajaú (Extremo Sul de São Paulo).

Produzido com apoio do Programa de Fomento à Cultura da Periferia de São Paulo, o livro tem distribuição gratuita, porém com prioridade para quem atua na educação formal ou não formal. Em breve, a obra estará disponível em versão on-line. Para ter acesso, é necessário preencher este formulário de interesse (clique aqui).

O evento vai contar com exibição de conteúdos produzidos a partir dessa metodologia, com um coquetel de recepção e venda de bebidas – a verba arrecadada será revertida para a própria Periferia em Movimento, que recentemente teve parte dos equipamentos de trabalho furtados.

O livro 

O projeto Repórter da Quebrada reúne uma série de processos pedagógicos para formar repórter atentos a garantia de direitos sociais nas periferias. (Foto Divulgação)

 Em “Repórter da Quebrada: Experimentações marginais das práticas jornalísticas”, a produtora independente de jornalismo de quebrada apresenta como a metodologia de educação midiática desenvolvida ao longo dos últimos 13 anos se materializa nos territórios periféricos e favelados e na sociedade como um todo por meio dos conteúdos jornalísticos produzidos e na ação de fontes consultadas, de pessoas e de iniciativas parceiras.

Voltado a educadoras, educadores e educadorus formais e não formais e que podem multiplicar essas práticas, nos três primeiros capítulos o livro traz depoimentos de 17 pessoas sobre observação apreciativa dos territórios, articulação para representatividade real nas narrativas e a incidência no campo da comunicação. E no quarto e último capítulo, há um guia prático de oficina para experimentar a metodologia.

“Nosso desejo é que o livro seja uma ferramenta de fomento ao direito à informação e direito à comunicação a partir das quebradas”

Aline Rodrigues é co-fundadora da Periferia em Movimento.

A jornalista e educadora Aline Rodrigues é a organizadora da publicação. 

Desde sua fundação, a Periferia em Movimento promoveu mais de 2,5 mil horas de encontros de aprendizagem (entre cursos, oficinas e palestras) sobre mídia, direitos humanos e periferias com mais de 5 mil participantes, especialmente adolescentes estudantes de escolas públicas.

“Queremos garantir que chegue principalmente para quem topa somar em seus fazeres esses saberes periférico-ancestrais que acessamos e amadurecemos ao longo de mais de uma década, com a contribuição de muita gente que vive e atua nos territórios periféricos”, diz Aline Rodrigues, organizadora do livro, co-fundadora e gestora de redes e parceria da iniciativa.

Thiago Borges no centro da imagem é editor de conteúdo e co-fundador da Periferia Em Movimento. Além de editar o livro, ele é um dos autores da publicação. (Foto: Comunicação Periferia Em Movimento)

Esses encontros apresentam conceitos e práticas do campo do jornalismo e como isso vai ao encontro da realidade nas periferias, em um processo contínuo de experimentação do fazer jornalístico da Periferia em Movimento que serve como base e ao mesmo tempo é aperfeiçoado nas vivências realizadas com participantes. Por isso, é válido dizer que a metodologia de educação midiática da produtora não se restringe ao período do encontro de aprendizagem, como se estende para a própria forma de trabalho do grupo.

Anotaí!

Lançamento do livro “Repórter da Quebrada”

Quando? Terça-feira, 27 de setembro, das 18h às 21h30

Onde? No Espaço Cultural Cazuá – Rua Affonso Paullilo, 193 – Jardim Eliana – Grajaú – Extremo Sul de São Paulo

Entrada e distribuição gratuitas

Juventude trans e periférica busca representação no Congresso Nacional

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Recorde de candidaturas trans nas eleições de 2022, reacende a esperança da comunidade após quatro anos marcados por retrocessos e violências.

Grupo protesta por direitos da população trans. Imagem: AFP

Segundo um levantamento feito pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), as candidaturas trans e travestis bateram recorde nestas eleições, com um aumento de 47% em relação a 2018. Ao todo, foram registradas pelo menos 78 candidaturas trans pelo Brasil, das quais 69 são de mulheres trans e travestis – em 2018 foram 52; homens trans representam 5 candidaturas – em 2018 foi 1 candidatura; e 4  são de pessoas não-binárias. 

Embora os números sejam pequenos, sobretudo quando comparado às mais de 28 mil candidaturas registradas na disputa eleitoral deste ano, eles correspondem a uma grande expectativa: fazer com que o Congresso Nacional – mais especificamente a Câmara dos Deputados – seja ocupado por pessoas trans e travestis.

Para a juventude trans e periférica da capital paulista, superar essa ausência de representatividade significa a possibilidade de construir instituições políticas que dialoguem com todas as camadas da sociedade e que realmente reflitam a pluralidade observada nas ruas e avenidas do país. 

“Eu quero ver na política pessoas iguais a mim, pessoas que a gente pode encontrar na rua de casa ou no mercadinho da esquina, sabe? Porque só quem conhece as nossas necessidades vai ser capaz de mudar um pouco as coisas”

compartilha Vênuz Capel, 23, ao mencionar que está priorizando candidaturas de pessoas trans, negras e de quebrada nas eleições deste ano.

Venuz morava em Santos, no maior aglomerado de palafitas da América Latina, e mudou-se recentemente para São Paulo. Imagem: Leasi Gomes

Vênuz é social media, mora em Ermelino Matarazzo, zona leste da capital paulista, se identifica como uma pessoa não-binária e explica que ver uma mulher trans ou travesti eleita é uma oportunidade de mudar a visão da sociedade e ressignificar os estigmas que atravessam a população trans e contribuem para que 90% tenha a prostituição como única fonte de renda e de subsistência.

“Seria muito importante implementar uma educação sobre diversidade nas escolas e nos serviços de saúde, porque, muitas vezes, a pessoa não é nem transfóbica, mas não tem acesso à informação, né?”, explica Vênuz ao falar sobre quais deveriam ser as prioridades do legislativo durante os próximos anos.

Em Itapevi, município da região metropolitana de São Paulo, o estudante de Gestão e Produção Cultural, Acân Odara, 21, diz que depois de dois anos caóticos de pandemia, ele finalmente está se sentindo otimista.

“A gente não tem o mínimo, mas se a gente tivesse, já mudaria muita coisa. Então é preciso ter esperança, porque se não a gente acaba vivendo num limbo, né?”

comenta Acân.

Nascido e crescido em Itaquera, zona leste de SP, atualmente Acân mora no município de Itapevi. Imagem: Acervo Pessoal

Essa é a primeira eleição da qual Acân participa, ele explica que ainda está indeciso sobre em quem votar, mas espera que as pessoas eleitas tenham sensibilidade para enfrentar as injustiças sociais que atravessam a população negra, trans e periférica.

“Porque a gente que movimenta esse sistema, mas viver no capitalismo é não ser valorizados da forma que deveríamos, né?”, reflete o estudante de Produção Cultural.

Do outro lado da cidade, há quase 60 quilômetros de Itapevi, Sanara Santos, jornalista, moradora do distrito de São Lucas, zona leste de São Paulo, diz que também está se sentindo confiante.

“Eu acredito que a gente tem a oportunidade de voltar a debater política de forma democrática, sabe? A gente passou os últimos quatro anos somente gritando: parem de nos matar”

comenta a jornalista.

Nascida e criada na Favela da Ilha, atualmente Sanara mora no distrito de São Lucas. Imagem: Reprodução Énois Conteúdo

Neste ano, os votos de Sanara já estão decididos. Ela explica que, desde as últimas eleições, tem priorizado candidaturas de mulheres negras e trans.

“Elas não pensam exclusivamente nelas e isso é algo que a gente não enxerga em nenhum candidato homem e branco. São lutas que fazem muito mais sentido no debate político do que as de um playboy que só entrou na política porque está preocupado com o comunismo”, pontua a comunicadora.

Com a possibilidade da eleição de uma mulher trans ou travesti para a Câmara dos Deputados, cresce também a expectativa de leis voltadas à comunidade, principalmente porque, até hoje, nenhum projeto de lei em benefício da comunidade LGBTQIA+ foi aprovado pelo Congresso Nacional – todos os direitos até então conquistados vieram por meio de decisões do judiciário.

“Tem muitos acessos que são negados para a gente por causa de onde a gente mora. Então acho que uma pessoa trans que venha de quebrada, entende isso, sabe? Nestas eleições, as minhas prioridades estão relacionadas à saúde trans, porque ultimamente é uma das coisas que mais me atravessam e que eu vejo pessoas passando também”, finaliza Vênuz. 

Este conteúdo foi produzido no âmbito do projeto Planeta Território, uma iniciativa da Território da Notícia com apoio do Instituto Clima e Sociedade para fomentar e distribuir informação de qualidade sobre a emergência climática, o contexto eleitoral e o impacto na população periférica por meio de totens digitais em estabelecimentos comerciais das periferias de São Paulo

Propostas de candidatos ao governo de SP associam combate à violência às mulheres

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Socióloga aponta que não ter nenhuma candidata para os cargos em destaque no pleito é um diagnóstico das relações de gênero presente na política e na sociedade.

A partir de análises nos planos de governo dos três principais candidatos ao Governo do Estado de São Paulo, Fernando Haddad (PT), Rodrigo Garcia (PSDB) e Tarcísio Freitas (Republicanos), a socióloga Anabela Gonçalves traz um panorama sobre as propostas dos candidatos com foco nas mulheres.

A socióloga Anabela Gonçalves aponta que muitas vezes um plano de governo não consegue dar conta de todas as necessidades de um público, mas constatou que em nenhum dos planos tem uma proposta chamada “demandas das mulheres”, o que considera um destaque importante.

“Ainda com alguns avanços, não se vê presente a população carcerária feminina nessas propostas, ou um diálogo direto com a pobreza menstrual, tema que esse ano foi tão abordado”, aponta.

Anabela afirma que os planos de governo dão destaque para a economia, parceria público-privada, como o de Rodrigo Garcia (PSDB), que eleva a participação do setor privado em decisões públicas, “prometendo criar canais de participação para esse setor, quando não aponta medidas de participação do povo”, afirma.

“Tanto no que se refere ao plano do candidato Rodrigo Garcia e de Tarcísio Freitas, as mulheres aparecem de forma genérica, mesmo reconhecendo suas necessidades quando diz respeito à segurança pública no combate à violência contra a mulher ou quando salienta a ampliação dos serviços de saúde”

avalia a socióloga.

Segundo ela, apesar de apontarem a necessidade de atenção às mulheres nas políticas públicas, não apontam como vão realizar e como darão conta de políticas que não levam em consideração raça e classe. “Já vimos isso nos planos da presidência e eles se repetem no Estado de São Paulo quase como um alinhamento político”, constata a socióloga. 



“O candidato Fernando Haddad apresenta em seu plano políticas que levam em consideração mulheres negras, a população LGBTQIA+, quilombolas, pessoas com deficiência, migrantes e refugiados”, afirma.

Anabela reforça que nas propostas do candidato Fernando Haddad se destaca a necessidade de olhar para população de mulheres negras de São Paulo, “lembrando que toda precarização, seja na moradia, empregabilidade, cultura ou saneamento básico, a população pobre é mais afetada e em destaque as mulheres negras, trabalhando com a interseccionalidade em relação aos fatores de desenvolvimento”.

Em seu plano de governo, o candidato Tarcísio Freitas fala sobre a ampliação da educação integral em parceria com o Programa Forças no Esporte (PROFESP) e com as Forças Armadas para atividades de ensino em tempo integral em escolas municipais e estaduais.

A intelectual avalia como grave a proposta, principalmente quando o candidato cita educação cívica: “Sem dúvida coloca nós mulheres periféricas que enfrentam o genocídio do Estado em alerta”.

“O mesmo candidato [Tarcísio Freitas] apresenta a proposta de transformar o estado em um polo de referência na utilização de saúde digital e telemedicina, levando o sistema a um novo patamar de gestão, sustentabilidade e satisfação do usuário, mas não achei nada sobre wi-fi gratuito ou a democratização da internet para população de baixa renda, muito menos para as mulheres que na maioria das vezes gerenciam a saúde de suas famílias”

aponta a socióloga Anabela.

Falta de representatividade que reflete nas propostas

A especialista analisa que não adianta propor mais frentes de trabalho para as mulheres sem apoio à educação das trabalhadoras, sem ampliação da licença maternidade e sua remuneração, sem bolsa para mãe estudante e sem construção de creches nas universidades públicas.

“Todo mundo entendeu que é importante falar da participação, do combate à violência, mas ainda existem poucas propostas de apoio à produção intelectual, cotas em cargos públicos de alto escalão, regulamentação em comissões, editais entre outras políticas que garantam a equidade de gênero e inclusão das mulheres trans nessas propostas”

analisa.

A socióloga aponta que chama sua atenção o candidato Fernando Haddad referenciar o combate à criminalidade em sua proposta 67, sobre segurança pública, mas o combate ao genocídio da população preta não está de forma objetiva nessa proposta.

“O genocídio é um assunto das mulheres periféricas, que estão cansadas de verem seus filhos assassinados”, pontua Anabela, fazendo referência a proposta do candidato. 

“Não encontrei nada de novo sobre políticas para as mulheres, o que temos de mais positivo é o aperfeiçoamento e continuidade de políticas públicas com atenção às mulheres negras, indígenas, quilombolas e LGBTQIA+ e suas interseccionalidades propostas pelo candidato Fernando Haddad”

afirma a socióloga.

Anabela Gonçalves lembra que, de acordo com os dados da Fundação Seade, a faixa etária da maioria da população feminina entre os anos 2040 e 2050 será de mulheres entre 45 e 74 anos, o que reflete as mudanças na diminuição de nascimentos e aumento da expectativa de vida da população em geral.

Para ela, esses dados devem pautar políticas de saúde, emprego e previdência para as mulheres e nenhum plano apresentado reflete diretamente essas questões.

“Isso porque não estamos falando sobre as meninas e as idosas diretamente, as políticas para as mulheres devem envolver idade, gênero, fecundidade, maternidade, emprego, previdência e educação, para além de violência”, afirma.

A socióloga destaca também a necessidade de planos políticos que de fato falem das cidadãs: “se estamos querendo fazer uma política includente, no mínimo seu plano de governo deve falar de todes“, afirma.

“Não ter nenhuma candidata para os altos cargos em destaque no pleito, para mim é um diagnóstico das relações de gênero presentes na política. Quando se fala em governo de São Paulo esse dado se torna agravante pela não existência de mulheres há anos nesse pleito”, conclui a especialista. 

Cientista social analisa propostas de Lula e Bolsonaro sobre questões raciais

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O cientista social Wellington Lopes do Instituto de Referência Negra Peregum analisa como os presidenciáveis Bolsonaro e Lula abordam o racismo estrutural em seus planos de governo.  

Em entrevista para o Desenrola e Não Me Enrola, o cientista social Wellington Lopes, pesquisador e articulador político no Instituto de Referência Negra Peregum, analisa as propostas dos planos de governo dos presidenciáveis Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL), focando especificamente nas demandas da população negra, que representa 56% da população brasileira, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).  

 

Planos de governo sem dados racializados

O cientista social chama atenção para a necessidade de compreensão sobre a população negra e suas questões, que são fundamentais para superar os próprios desafios de desenvolvimento econômico, social e político que o Brasil enfrenta.  

“Nas duas propostas dos programas dos candidatos à presidência, questões como geração de emprego e renda e trabalho informal, por exemplo, aparecem sem dados racializados”,  argumenta o cientista social.

“Se de um lado o programa petista tenta compor um aspecto de diversidade e composição democrática através da participação dos povos no poder, no programa de Bolsonaro é marcante o ponto de vista de unidade sem diversidade, em nenhum momento de seu plano as palavras raça, negro, negra, negros, negras são citadas”. 

Aponta Wellington Lopes, pesquisador e articulador político no Instituto de Referência Negra Peregum. 

Segundo  o especialista, na política raça é inserido como um debate ‘identitário’, mesmo que ela apareça como uma discussão essencial na formação da economia política dos estados modernos, ela continua sendo tratada de forma setorizada.

Também  cita que a pauta mais relevante para o movimento negro há décadas é a mudança da política sobre guerra as drogas. Em 2020, o 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, apontou que de 657,8 mil presos, 438,7 mil (66,7%) eram negros. O estudo revela como houve um crescimento de prisões de pessoas negras e que o perfil da maioria dos presos é também o mesmo da maioria das vítimas por homicídio, jovens negros e homens.

“Quando falamos em revisão da política de guerra às drogas é preciso discutir formas de combater milícias, desmilitarizar as polícias (desmilitarizar a polícia não significa extingui-la) e cercear sua participação na política, regulamentação e descriminalização de drogas e ampliação das políticas de atendimentos assistenciais e políticas de tratamento de saúde para dependentes químicos. As possibilidades são imensas de poder produzir no Brasil uma mudança de valores humanos e civilizatórios”, ressalta. 

 Guerra às drogas

Além do forte índice do aumento do encarceramento no Brasil, também é importante destacar os dados em relação às vítimas fatais em decorrência de intervenções policiais no país. Segundo o 5º Anuário de Segurança Pública divulgado em 2022, 99,2% das vítimas fatais, são homens pretos, desse percentual, 74%  jovens pretos de até 29 anos. Com isso, é possível observar o racismo estrutural e genocídio da população preta, por meio de dados que a cada ano aumentam. Para o especialista, existe uma discrepância entre os dois planos de governo dos candidatos, Lula (PT) e Bolsonaro (PL).

O programa do candidato Lula (PT) ressalta a revisão da política de guerra às drogas como abertura para reflexão e decisão junto à sociedade, focada na redução de riscos, na prevenção, tratamento e assistência ao usuário de entorpecentes. Essa intencionalidade não aparece na proposta de Bolsonaro (PL), que sequer cita a questão racial como um campo do plano de governo.

“Existe uma aposta no aumento da brutalidade para reduzir a violência. Na proposta, dados do aumento de operações policiais e apreensão de drogas são apontados como responsáveis pela redução da violência e como incentivo à política de combate ao crime organizado e ao tráfico, que desconsideram as milhares de vítimas jovens e negras”.

Analisa o cientista social, criticando o plano de governo de Bolsonaro.

Ele chama a atenção para um fato importante que é o avanço da cultura do comércio de armas com apoio do governo Bolsonaro, em caso de uma possível reeleição. “Em seu programa, a ideia de busca por expansão da ‘liberdade’ ao indivíduo na sociedade civil e a redução da presença do estado como “árbitro” dos conflitos, serve como justificativa para dizer que o acesso ao porte de armas civil fortalecem medidas de segurança pública”, avalia.

Tais medidas podem ampliar os indicadores de letalidade que mostram como a população negra tem sido alvo de armas de fogo. “Abre prerrogativa para permitir a livre associação de grupos da sociedade civil armados sem controle e regulamentação, o que pode acarretar no aumento da violência contra negros, grupos racializados e mulheres. Sobretudo, Bolsonaro visa ampliar a capacidade do uso da violência como instrumento político de popularidade e figura de ‘pureza moral’ ao combater ‘o mal’, dando continuidade à atual política de drogas e de segurança pública”, contextualiza o sociólogo.

De outro lado, no plano petista, a proposta busca assumir um compromisso de revisão da atual política de guerras às drogas, para construir uma visão ampla de como ela instrumentaliza o racismo estrutural.  Os itens 31 e 34 do plano de governo de Lula indicam primeiro que deverá ser criado um sistema integrado de gestão entre as esferas federativas e os setores da segurança pública, somando esforços para valorização da vida e diminuição de crimes contra juventude negra, mulheres e LGBTQIA+. O segundo trecho do plano, ressalta a construção de uma nova política de drogas e propõe que ela seja desenvolvida entre os setores, focada no tratamento e assistência ao usuário, substituindo o modelo de guerra.

Para Wellington os movimentos devem estar atentos desde agora para  que participem dessa mudança no provável novo governo. 

“Cabe aqui aos movimentos negros, sociais, institutos de monitoramento da violência, de assistências sociais e de saúde questionar e participar de quais serão às condições de mudança da política.”

Ressalta Wellington sobre a necessidade da participação política,  referente a revisão da  política de guerras às drogas no Brasil. 

Direitos sociais

O plano de governo do atual presidente busca uma mediação da promessa de ampliação de programas sociais, mas não apresenta detalhes sobre como irá fazer tais mudanças. A proposta também sugere a realização de privatização de empresas públicas ou estatais. No âmbito do trabalho e renda, Bolsonaro sugere diminuir o desemprego promovendo contratos específicos por categorias e enfraquecendo sindicatos.

“Das propostas de maior expressividade no campo social, Bolsonaro sinaliza a continuidade do ‘Auxílio Brasil’. Mas não se fala em pessoas negras, se fala em liberdade para prosperidade individual em empreender para reduzir a desigualdade. Não se fala em fome, mas se fala em reduzir o tamanho da intervenção do Estado no consumo e que ‘o cidadão pleno não deve ser dependente do Estado’. Apesar de assumir compromissos com a constituição e a defesa dos direitos humanos, o plano demonstra contradições entre a realidade do país e do próprio governo. Sobretudo, seu plano de governo ignora a existência de negros no Brasil e aposta em privatizações, individualizando a pobreza e às desigualdades”, diz o cientista social.

Na avaliação do sociólogo, o candidato Lula apresenta medidas concretas e direcionadas a promover políticas públicas que ajudem a reduzir as desigualdades sociais que afetam a população negra e periférica.

“De modo objetivo, num possível governo Lula, suas proposições de fortalecimento da CLT; às medidas de ações afirmativas na educação, eleições e funcionalismo público; a ampliação de políticas de transferência de renda e taxação de grandes fortunas; regulamentação de políticas de reforma agrária e titulação de terras para quilombos; por último, a revisão da política de segurança pública e de guerra às drogas para a redução da violência se destaca, dentre outros compromissos, como fonte de redução de desigualdades racial”, finaliza.

Clube de leitura apoia jovens do Campo Limpo com bolsa e acesso à internet

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A iniciativa é da Biblioteca Comunitária Djeanne Firmino. Uma das participantes é a jovem Micaele Cauane que já leu 15 livros em uma ano, três vezes mais que a média nacional. 

A biblioteca Djeanne Firmino, localizada no jardim Olinda, zona sul, conta com cerca de 4 mil livros em seu acervo. Foto: arquivo pessoal.

A estudante Micaele Cauane Carvalho dos Santos, 16, moradora do Jardim Umarizal, zona sul de São Paulo, leu 15 livros num período de um ano, uma quantidade três maior que a média nacional de leitura de livros do brasileiro, que é 4,96 livros por ano, segundo a pesquisa feita pelo Instituto Pró-Livro em 2021.

O incentivo para Micaele estreitar o contato com o livro e a leitura é promovido pela Biblioteca Comunitária Djeanne Firmino, que realiza projetos como o Clube de Leitura e o Ligue e Leia. Essas iniciativas foram criadas por mulheres arte-educadoras e pedagogas que fazem parte da Coletiva Achadouras de Histórias, que atua no Jardim Olinda, zona sul de São Paulo.

Com a intenção de democratizar o acesso aos livros e a leitura, além de se tornar um lugar de acolhida e convivência comunitária para jovens e adultos nos arredores, a biblioteca comunitária conta com cerca de 4 mil livros para empréstimos.

Além disso, a iniciativa de incentivo à leitura nas periferias fornece uma bolsa de R$ 150, além de R$ 25 para custear o auxílio internet para 15 alunos de escolas públicas que fazem parte dos encontros mensais para debater o conteúdo dos livros. O projeto ainda garante que os participantes recebam em casa os livros que serão lidos no mês. 

Os encontros do clube de leitura acontecem mensamente de maneira remota, onde os alunos contam suas experiências a partir da leitura dos livros. Foto: divulgação.

“O clube de leitura acontece uma vez por mês, onde a gente distribui livros para esses jovens e depois que eles fazem essa leitura, a gente faz uma troca das experiências, de como foi ler esse livro, pensando na perspectiva de cada um dos jovens.”

Alessandra Leite Nunes, coordenadora do clube de leitura da Biblioteca Comunitária Djeane Firmino.

Por ter sido o primeiro ano de atividades do clube de leitura, estava previsto um ciclo de leitura de três livros, mas foi preciso dobrar esse período, pois durante os encontros com os jovens, as mediadoras de leitura perceberam que eles já tinham o hábito de ler, e que poderiam ler ainda mais se o contato aos livros fosse facilitado.

“Os encontros com os alunos da Escola Estadual Professor Flávio José Osório Negrini vão até novembro de 2022. Foram 28 inscrições, mas só poderíamos ter 15. Com isso a gente percebeu que os jovens leem sim, mas os livros são caros, muitas vezes falta recurso como o celular para ler online, e até a internet para esse acesso”, avalia Michele Andrade, mediadora do clube de leitura.

Micaele teve sua vida transformada através da leitura desde que aprendeu a ler e hoje deixa troca a tela do celular pelas páginas dos livros. Foto: arquivo pessoal.

Transformação da juventude 

Para Micaele, aluna do primeiro ano do ensino médio, a leitura passou a ser um hábito ainda criança, quando ela tinha um constante contato com gibis por meio da biblioteca comunitária. Nessa época, o espaço comunitário de incentivo ao contato com o livro e a leitura precisou mudar, com isso, a estudante relata que acabou perdendo a rotina de ler, por não ter uma referência de um lugar onde poderia pegar livros emprestado.

“Quando eu aprendi a ler, eu ia todos os dias pegar livros e gibis na biblioteca e lá elas me ensinaram a ler melhor, interpretar texto e fiquei triste quando elas mudaram, perdi toda a ‘vibe’ de ler e não queria mais, mas na escola a gente se reencontrou”

Micaele Cauane Carvalho , estudante e moradora do Jardim Umarizal, zona sul de São Paulo. 

Sem nunca ter pisado em uma biblioteca pública e sem acesso aos livros da escola onde estuda, Micaele sabe da importância da leitura na sua vida e futura carreira como advogada, por isso ela leu cerca 15 livros em um ano, superando a média de leitura dos brasileiros que é de 4,96 ao ano.

“Os livros trazem uma realidade que eu posso viver, entrar na vida do personagem do livro. Cada livro e história tem um significado e você pode viver isso sem nem sair de casa, sem viajar, sem se mover e me comovem de uma forma diferente a cada vez que eu leio”, conta a estudante.

Segundo dados do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), entre 2015 e 2020, cerca de 800 bibliotecas foram fechadas no Brasil, sendo que 91% das unidades que encerraram as atividades, ou seja, 764 estavam localizadas nos estados de São Paulo e Minas Gerais.

Cristiane Lima, membro da Coletiva, entrega os livros escolhidos pela leitura Emmely Barbosa. Foto: Edvânia Rodrigues.

Ligue e Leia 

O projeto Ligue e Leia da Biblioteca Djeanne Firmino existe desde julho de 2021, e já emprestou 344 livros para 44 moradores dos bairros próximos ao Jardim Olinda. Cada morador tem direito a um mês de empréstimo para cada livro e as entregas são feitas pelas próprias mediadoras de leitura do projeto.

“O Ligue e Leia é um projeto que veio com a pandemia para que os livros pudessem continuar circulando, por isso as entregas à domicílio são totalmente gratuitas.”, explica Edvania Duarte Rodrigues, mediadora de leitura da biblioteca.

Ainda segundo Alessandra, a intenção do delivery de livros é atingir todos os públicos, principalmente aqueles que não têm tempo de acessar os espaços públicos de leitura nos horários de funcionamento, além de atender as necessidades de acessibilidade de possíveis leitores, sem precisarem sair de casa.

“Foi o jeito que encontramos também de atingir aquele aluno trabalhador, ou que é adolescente e não tem permissão de sair, ou que até são mais caseiros. A nossa missão é trabalhar pela democracia do acesso e dos bens culturais”, finaliza Alessandra Leite.

Ancestralidade: as águas que limparam o sangue também regaram a terra

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 Do costume de cantar e comer ao modo de lavar as roupas. A ancestralidade mora no dia a dia, naquilo que nos toca porque é real.

Praça do Campo Limpo, zona sul, SP/2017 – Foto: DiCampana Foto Coletivo

Muito se fala em como a ancestralidade seria importante, mas as narrativas nos fazem pensar que a mesma mora distante do nosso olhar, quando na realidade nossa ancestralidade se faz presente no dia a dia e nos hábitos que nem sabemos de quem herdamos, mas estão vigentes.

Esta ancestralidade que faz parte de nós pode sim ser redescoberta, ser estudada e por vezes ser reconhecida nas falas de outras pessoas, mas mora em nós. Do lavar as mãos ao hábito do uso de ervas na comida. Do costume de cantar e comer ao modo de lavar as roupas. Da estética vinda do samba de roda ao rock. A ancestralidade mora no dia a dia, naquilo que nos toca porque é real.

A ancestralidade não foi encontrada em livro, nem em blog, a ancestralidade não foi embora de nós, ela foi saqueada sem permissão, foi apagada para que nossos ancestrais perdessem as forças pois tirar o dia a dia, a família e a língua de alguém é a maior violência que se pode aplicar, não à toa Portugal foi bem sucedido em seu colonialismo mesmo sendo um país falido.

Todavia, mesmo com essa trajetória as construções ocorreram e as trocas de afeto foram se constituindo, o Brasil tem mais de África do que de Estados Unidos e não precisa ser um grande estudioso para saber disso, as águas que limparam o sangue também regaram a terra, os morros que foram isolamento também constituíram novas formas de se relacionar.

Não existe romance nessa história, isso é nítido, mas existe vida, pulsante, existe afeto, existem saberes que foram passados durante séculos em comunidade, existem saberes que nunca nos disseram o que são, mas temos. Afetos que sabemos trocar e que sabemos construir.

A periferia vive e bebe o tempo inteiro dessa história, nossas vivências são parte disso, não aprendemos somente olhando para fora, também nos reconhecemos olhando para nós, para nosso redor, compreendendo nossas próprias formas de viver, de se comunicar e de sobreviver.

Foto: Pedro Oliveira

Esse texto é uma forma de me comunicar com uma parte de mim que ainda conflita muito em falar sobre o que me cerca intimamente, talvez começar a me reconciliar com aquilo que sempre senti, talvez abrir alas para contar o que sei de África até agora, que é pouco, mas que já transformou muito do meu dia a dia. O texto mais breve de todos os que já escrevi nesta coluna e talvez o mais introspectivo.

Mas sobretudo, feito com o foco em destacar que é preciso valorizar nossos saberes, nossos modos de viver, é necessário entender a ancestralidade como parte de nós, não como um organismo distante.

“Nludi nzo ka u natanga muntu mosi ko”

O teto da casa nunca é levantado por uma pessoa só

“Que mulheres são essas?”: socióloga analisa propostas de Lula e Bolsonaro para questões de gênero

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A socióloga Anabela Gonçalves traz um panorama sobre as propostas dos candidatos à presidência com relação às demandas sociais das mulheres negras, indígenas e quilombolas.

Durante o mês de setembro, o Desenrola irá realizar entrevistas com especialistas que irão analisar os planos de governo de candidatos à Presidência e ao Governo do estado de São Paulo. O ponto de partida para produção das análises são os marcadores sociais que atravessam a vida das mulheres, povos indígenas, população negra, periférica e LGBTQIA.

Na primeira entrevista para analisar o plano de governo dos dois principais candidatos à presidência, Lula (PT) e Bolsonaro (PL), a socióloga Anabela Gonçalves traz um panorama sobre as propostas destinadas às mulheres. Para ela, em geral, os planos de governo apresentam um aspecto genérico e são norteadores das visões ideológicas de cada candidato.

“Temos dois candidatos que apresentam planos de governo distintos. Bolsonaro apresenta um plano liberal de políticas focadas no crescimento econômico. O outro candidato, Lula, apresenta propostas mais humanitárias levando em consideração os diversos grupos sociais que compõem nossa nação”

aponta Anabela Gonçalves, que também atua nas áreas de gênero, políticas públicas e cultura nas periferias.

A socióloga aponta que sente falta de coerência do atual presidente, pois em suas propostas cita o direito à liberdade religiosa “quando ele mesmo não criou nenhuma medida para proteção das religiões de matrizes africanas, que foram muito atacadas durante seu governo”, aponta.

Outro ponto observado pela especialista, é que no plano de governo do candidato Lula, ela nota coerência, mas não identifica como tudo que o candidato propõem será garantido: “para mim parece uma incógnita”, avalia.

“Mulheres aparecem de forma mais ampla nos planos de trabalho, relacionadas ao empreendedorismo, participação no parlamento, inclusão produtiva e combate às violências, mas a pergunta é: que mulheres são essas?”

questiona Anabela sobre marcadores sociais ao pensar nas demandas das mulheres.

Segundo a socióloga, no plano do candidato à reeleição, Jair Bolsonaro, não é possível visualizar em poucas linhas quais mulheres estão sendo tratadas. “Não são identificadas se fala de mulheres pobres, desfavorecidas ou mães, se são negras, indígenas, quilombolas, ribeirinhas ou camponesas. Não aparecem de fato nomeadas e suas necessidades específicas”, afirma.

Em sua análise, a socióloga aponta que o candidato à reeleição, Bolsonaro, não muda sua atuação política que atrela mulheres à família e à maternidade.

Ela observa que o candidato à eleição Lula, apresenta quem são as mulheres e a necessidade de políticas públicas para essa população atrelada a gênero, raça e classe. “Tanto no que diz respeito a políticas que foram interrompidas no atual mandato, como a intensificação de lutas históricas”, coloca Anabela.

“Na proposta de Bolsonaro, mulheres são um termo genérico e muitas vezes o documento fala sobre os cidadãos e esquece das cidadãs, que nunca se apresenta envolto de conceitos importantes como raça, gênero e classe”, pontua a socióloga.

Anabela acrescenta que oque o candidato a reeleição Bolsonaro, chama de valores e princípios centrais do seu plano de governo está atrelado a ser contrário ao aborto, apresentando o termo nascituro na mesma linha que aborda o direito à propriedade. “Para mim não dá para um candidato escrever em suas propostas ‘liberdade é tão importante quanto a própria vida’ e ignorar o direto ao aborto”, argumenta. 

“Especificar políticas e seus participantes é mais que necessário e combate um plano genérico de trabalho, como se a desigualdade pudesse ser combatida de forma igual”

afirma Anabela sobre a necessidade de se considerar raça, gênero e classe nas tomadas de decisões e criações de políticas públicas para a população.

A intelectual aponta que nas propostas do candidato Lula, se considera o genocídio como algo existente. “Dar rosto às mulheres, principalmente negras, em um plano de governo, é mais que necessário nos tempos atuais”.

Anabela reforça que é preocupante a relação genérica ao se tratar das mulheres, que ignora o racismo e as violências que alguns grupos sofrem.

“Para mim aí está o grande perigo, todos falam de trabalho e renda, educação, infraestrutura, mas só em um plano se percebe esses projetos envolto das relações de desigualdade e que leva em consideração a diversidade social”, finaliza.

Machismo e política nas redes sociais

Analisamos 40 publicações com o maior número de engajamento e compartilhamentos no twitter nesse período envolvendo menções às palavras “mulheres, família e Bolsonaro”, uma referência direta ao plano de governo do candidato à reeleição.

Em 27 publicações, que renderam mais de 6 mil compartilhamentos no twitter, Bolsonaro conta com uma base de aliados que transformam o debate sobre machismo e misoginia, em uma tentativa de mostrar um presidente preocupado em convocar as mulheres para pensar estratégias de fortalecimento dos laços da família, criando assim uma semelhança com a análise da socióloga sobre o plano de governo de Bolsonaro.

Do outro lado, figuras públicas e políticos opositores da esquerda protagonizam 13 publicações com mais de 35 mil compartilhamentos no twitter, onde reforçam mensagens de apoio às mulheres que atuam como jornalistas, artistas e apresentadoras de programas, que foram alvo de discursos de ódio do Bolsonaro.