Pedro (nome fictício) tem 16 anos de idade e nunca foi à uma consulta com urologista. Na verdade, Pedro sequer sabia de que se tratava essa especialidade antes de nossa conversa.
O menino conta que a última vez que foi à Unidade Básica de Saúde foi na infância, numa consulta pediátrica e quem o levou foi a mãe, depois disso nunca mais “precisou ir”, pois não adoeceu.
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Embora a Organização Mundial de Saúde (OMS) tenha definido a mais de 70 anos que saúde está relacionada ao bem-estar físico, mental e social, ampliando o conceito para além da ausência de doenças, muito se acredita ainda que só devemos procurar um atendimento em saúde para tratar enfermidades.
A adolescência é um período da vida em que acontecem muitas mudanças emocionais, sociais e físicas e é importante que adolescentes possam acessar equipamentos de saúde para cuidar de si e aprender sobre as alterações que tem acontecido em seus corpos.
Tenho trabalhado a mais de 14 anos com adolescentes e pessoas adultas, falando sobre a importância do cuidado à vida durante o período da puberdade, e o que observo é sempre um número alto de meninas interessadas em debater sobre autocuidado e as mudanças em seus corpos.
O número de meninos ainda é muito baixo nos espaços de diálogo e reflexão sobre saúde, e por que isso acontece?
Eu quero arriscar uma hipótese e quero pensar junto contigo sobre isso: Acredito que os meninos têm pouca (ou nenhuma) referência masculina que aborde temas em saúde com foco nas masculinidades.
Temos bastante iniciativas de mulheres de quebrada que dialogam com adolescentes, mas muitos meninos não se sentem a vontade de falar conosco sobre suas mudanças, ou porque acreditam que não vamos entender (já que não passamos por isso), ou porque sentem vergonha de falar com mulheres sobre desejo, sexualidade e medos.
Os meninos precisam dos homens, sobretudo os meninos de quebrada, eles precisam que homens periféricos se organizem para falar de saúde do menino e não só ser referência na música, cultura ou esportes.
Os homens precisam aprender e desenvolver estratégias de diálogo com os meninos sobre saúde, sexualidade, corpo e adolescência.
Fiz uma pesquisa no Portal de Transparência da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais e só este ano, são cerca de 5.537 crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento.
Então soma aí a ausência paterna e a ausência de referências positivas em cuidados à saúde do homem. O resultado é uma população de meninos que vão aprender sobre sexualidade, corpo e puberdade com os recursos que estão facilitados para eles: a pornografia.
São poucos os meninos que sabem o que é urologista, mas muitos sabem o que é tadalafila. Poucos meninos sabem como usar corretamente um preservativo, mas muitos sabem como acessar conteúdo erótico adulto.
Nós, mulheres de quebrada, temos nossas limitações no cuidado à adolescentes e homens periféricos precisam se colocar como responsáveis também pela promoção de saúde com os meninos.
A ausência para os meninos de quebrada não é só paterna, ela é uma ausência de referências masculinas em saúde também.