Em 2024, a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil mostrou que mais da metade das pessoas no país não lê livros.
Esse é um problema com diversas origens: desde a falta de cultivo do hábito da leitura, preço dos livros, bibliotecas públicas raras e desatualizadas.
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O Itaim Paulista, por exemplo, onde moro, tem três bibliotecas públicas para 205 mil habitantes. Não trago nenhuma fórmula mágica; sinto decepcionar.
Pode realmente não ser nada fácil criar o hábito da leitura quando você tem que madrugar para trabalhar, estudar, cuidar de si e de outras pessoas, numa cidade que te consome um pedaço de vida todo dia em 3 ou 4 horas de transporte.
Podemos ainda colocar outro problema na mesa: o que as pessoas andam lendo?
Não vou comentar a lista de mais vendidos (você pode buscar online e tirar suas próprias conclusões), até porque comprar não é sinônimo de ler um livro.
Na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, que citei no início do texto, os livros que mais marcaram as pessoas não são exatamente os que estão na lista, nem aqueles que ensinam a enriquecer.
E aqui, um parêntese: sem julgamentos da minha parte sobre a literatura de autoajuda. Tudo merece ser lido com olhos críticos, inclusive o que proponho aqui.
De todo modo, como uma feliz adepta de clubes de leitura, queria abrir esta coluna para 2025 sugerindo seis livros ótimos escritos por mulheres.
Assim, se o transporte te der um pouco de espaço ou se você tiver 10 minutos de paz todo dia, talvez na cama, antes de dormir, tem leitura boa para te acompanhar. No seu tempo, sem pressão.
Comecemos com três autoras periféricas
Jô Freitas teve seu último livro, Goela Seca, indicado ao Prêmio Jabuti de 2024 — uma das mais importantes premiações literárias do Brasil. Goela Seca é um livro com 23 contos autobiográficos que, com muita delicadeza, poesia e um bocado de dureza também, contam histórias desde sua infância, na Bahia, até a vida adulta, em São Paulo. Além de escritora, Jô é poeta e faz parte do coletivo Sarau Pretas Peri.
A segunda é Lilia Guerra. Em seu último livro, Céu para os Bastardos, Sá Narinha, uma empregada doméstica que podia ser nossas mães, vai nos levando pelos becos e vielas de Fim-do-Mundo, encontrando suas mais diversas personagens.
É um livro delicioso, capaz de fazer com que você se reconheça em alguma personagem — ou, quem sabe, também tenha um cachorro chamado Bob.
Por fim, recomendo Notas sobre a fome, de Helena Silvestre, também indicado ao Jabuti, em 2020. Notas é um livro com diferentes estilos de texto, misturando autoficção, conto e ensaio.
Narrando suas andanças pela cidade, entre empregos precários, escola, movimentos sociais e fome, Helena vai tecendo sua história num fluxo de pensamento crítico e apaixonado.
Depois de dar passagem a algumas escritoras dos nossos territórios, e diante das muitas polêmicas em torno dos filmes indicados ao Oscar, me parece oportuno também indicar Reze pelas mulheres roubadas, da mexicana-estadunidense Jennifer Clement.
Neste livro, vamos ao interior do estado de Guerrero, no México — uma região dominada pelo tráfico — onde meninas precisam se esconder conforme vão crescendo, sob o risco de desaparecer.
Minha próxima sugestão tem a ver com um movimento recente na literatura que tem rediscutido as experiências da maternidade, cheias de contradições.
Nessa direção, A Cachorra, da colombiana Pilar Quintana, desconcerta, comove e angustia, mostrando a complexidade de sentimentos que esse tipo de amor pode fazer florescer. O livro, escrito enquanto a autora amamentava sua filha recém-nascida, retrata a relação de uma mulher com uma cachorrinha, adotada ao nascer.
O penúltimo desta lista é Ventre do Atlântico, da escritora senegalesa Fatou Diome. Aqui, acompanhamos a história pela relação entre a jovem Salie — em sua dura adaptação como imigrante na Europa — e seu irmão mais novo, Madické, no Senegal, que sonha em se tornar um astro do futebol.
Um livro que não idealiza a imigração, nem romantiza a terra natal. Mostra as dificuldades na busca por um sonho entre fronteiras e desigualdades.
Por fim, mas não menos importante: se não há livrarias, sebos ou bibliotecas perto de você, saiba que na internet é possível encontrar sites como a Estante Virtual, em que livrarias do país inteiro vendem livros novos ou usados online, por preços mais acessíveis.
Tenho evitado investir meu dinheiro na Amazon — maior vendedora de livros do país e talvez do mundo — porque sufoca pequenas (e nem tão pequenas) editoras e livrarias, vende livros abaixo do preço de custo, está sempre envolvida em violações de direitos trabalhistas e seu dono tem uma tendência política muito à direita.
Se você puder, sugiro que também estimule os pequenos negócios, compre livros usados (com atenção ao estado do livro, não vale comprar livros se desintegrando) e leia mulheres.
E se você tem outras dicas de onde comprar livros de pequenas livrarias — e, sobretudo, de como desviar das grandes corporações — vou adorar saber também.