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Michelle Fernandes, da Boutique de Krioula, fala sobre Whatsapp para negócios no Empreende aí Cast

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O programa de podcast da escola de negócios da periferia para a periferia, o Empreende aí Cast, convida a empreendedora Michelle Fernandes para bate-papo sobre a atuação de negócios periféricos no ambiente virtual e nas redes sociais, principalmente a partir do Whatsapp. Este bate-papo faz parte do quinto episódio da primeira temporada do podcast apresentado por Luís Coelho e Jennifer Rodrigues e está disponível no Spotify e no Youtube. 

Quando a gente fala de empreendedorismo, a gente não se sente representado. A gente olha uma capa de uma revista de empreendedorismo e é sempre um cara branco, que já tem grana pra poder empreender e se não der certo o negócio dele, ele começa outra coisa. Mas essa não é a nossa realidade, aqui na periferia a gente começa com pouca grana e dessa grana a gente multiplica para continuar vendendo

Michelle Fernandes

Moradora do Capão Redondo, Michelle percebeu que muitas pessoas se interessavam pelos turbantes e acessórios que ela utilizava em fotos nas redes sociais. Com um pequeno investimento inicial, ela encarou o desafio de empreender e passou a comercializar seus produtos pela internet e em shows de rap. Hoje, a Boutique de Krioula vende para todo o Brasil e também em outros cinco países. 

Dicas, ferramentas e inspiração 

Com o objetivo de auxiliar as empreendedoras das quebradas com histórias inspiradoras de mulheres que criaram o seu próprio negócio e também compartilhar dicas práticas para executarem em seus negócios, a Empreende Aí (Escola de Negócios da Periferia para Periferia) lança seu primeiro podcast nas plataformas do Spotify e do Youtube, o Empreende Aí Cast.

O podcast é um formato de conteúdo por áudio, que vem ganhando força nos últimos anos e se assemelha muito aos antigos programas de rádio. Esta primeira temporada conta com oito episódios, que serão lançados até fevereiro de 2021.

Criado por Luís Coelho e Jennifer Rodrigues, moradores da periferia do Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, a Empreende Aí é uma iniciativa que busca motivar pessoas das quebradas na criação de seus negócios e na sua capacitação profissional no mundo do empreendedorismo. Neste conteúdo em formato podcast, a ideia é inspirar quem já pensa em criar seu próprio negócio ou quem deseja aprender como melhorá-lo.

Com mais de cinco anos de atuação, o Empreende Aí já realizou diversos cursos e palestras nas periferias e conta com a parceria do Itaú Mulher Empreendedora e a International Finance Corporation (IFC), organismo do Grupo Banco Mundial, para a realização do Empreende Aí Cast.

Procurando presentes para o final do ano? Compre dos afro-vendedores

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Estamos há poucos dias para o fim do ano. Mesmo em plena pandemia, é possível sentir aquela correria frenética das pessoas em busca de presentes e roupas para as festividades.

Procurando presentes para o final do ano? Compre dos afro-vendedores

No texto Black Money publicado mês passado, falamos muito sobre a importância de formarmos uma rede de negócios, consumidores e serviços oferecidos por pessoas pretas. Eis nós aqui novamente não apenas para reforçar o que já foi dito, mas para vos apresentar alguns serviços e marcas de prestígio a serem consumidas sem peso na consciência.

Hoje temos aqui na zona sul de São Paulo, uma variedade de empreendedores pretos que produzem produtos de qualidade trazendo junto a representatividade preta e periférica que merecemos. As quebradas são polos de pessoas criativas e capacitadas e para se manterem, arriscam até o que não têm para abrir um investimento ou mais que isso, por acreditar em um sonho. É a partir daí que temos que chegar junto, do começo. Mesmo que você não possa ajudar financeiramente, uma divulgação feita nas redes sociais pode ajudar alguém que está iniciando. 

Falta visibilidade nas coisas que fazemos, desde as ações sociais aos pequenos produtos artesanais, por exemplo. A exploração da mão-de-obra escrava agravou a desvalorização dos trabalhos físicos e manuais, por isso há uma pretensão por parte de alguns de achar que por ser algo feito por pessoas pretas e periféricas tem que custar mais barato sem visar o talento e as dificuldades daquela pessoa. Sabendo disso, a mudança só depende de nós mesmos. Valorizar o produto e a pessoa é fundamental. 

Vamos então apresentar alguns negócios de diferentes segmentos localizados aqui na zona sul de São Paulo. 

Casa da Paula 

Para abrir o apetite, vamos falar dos Bolinhos Afro feitos pelas mãos da Ana Paula Evangelista, articuladora e cozinheira, ergueu o seu próprio negócio chamado Casa da Paula ao lado do shopping Campo Limpo. A Casa da Paula oferece também marmitas, feijoadas e quitutes deliciosos. É possível salivar só olhando as fotos.

WhatsApp: (11) 98983-9665

“Aonde você compra quando quer ser elegante?” 

Identidade Negra 

Outra ótima dica para presentear alguém, ou mesmo você, são os óculos, camisetas e as bolsas da marca Identidade Negra, fundada pelo empresário Wagner Cerqueira. Eu mesma comprei os óculos que usei no vídeo Black Is Back In Style e garanto que a qualidade e o atendimento é excelente.

WhatsApp: (11) 98531-1242

AfroPerifa 

E para os casais pretos que gostam de combinar nas roupas e acessórios, Afro Perifa – Design e Moda Afro Urbana da Periferia é a marca perfeita para vocês, lançada por jovens pretos que produzem acessórios, roupas infantis, moletons, meias chinelos, uma variedade de coisas. Têm uns vestidos lindos lançados agora no verão. Vale a pena conferir.

WhatsApp: (11) 95119-1854

Braids da Braba 

Eu me divulgo como dreadmaker, mas vira e mexe tem alguém me perguntando se sou trancista devido eu fazer para algumas amigas e amigos. Eu prefiro indicar os melhores profissionais que eu conheço, como a minha amiga e parceira Alessandra Santos, que manda muito bem em fazer qualquer tipo de trança. Ela trabalha em um dos melhores salões de beleza do Taboão chamado Rei das Tranças.

Braids da braba – WhatsApp: (11) 99162-1067

Rei_das_trancas_oficial – Tel: (11) 5844-3751

TrançAmor 

Agora vamos falar de um projeto social que realmente está fazendo a diferença na vida das pessoas – TrançAmor. Uma ação social idealizada pela trancista e ativista Evelyn Deyse. TrançAmor está desenvolvendo um papel muito importante, especialmente neste momento delicado de pandemia, com a distribuição de alimentação saudável às famílias periféricas e pessoas em situação de rua no Distrito do Jardim São Luiz. 

Os cardápios são descritos com o auxílio de uma nutricionista, o projeto tem como prioridade oferecer uma comida sem veneno, 100% orgânica. TrançAmor também oferece assistência psicológica e jurídica, cursos de formação, entre outros atendimentos, tudo de forma gratuita contando apenas com o apoio dos amigos, moradores e parceiros que investem e patrocinam essa caminhada. Fiquem atentos às campanhas de doação. O foco é intensificar as entregas de quentinhas orgânicas e de cestas de alimentos para que neste final de ano as crianças da comunidade tenham além dos brinquedos, frutas e legumes orgânicos e muito Amor. A galera se organizou para vender as marmitas orgânicas, então se você comprar, além de comer bem e sem agrotóxico, você estará contribuindo com essa iniciativa.

Receitas da Vó 

Para quem gosta de produtos naturais e medicinais, fica a dica Receitas da Vó tudo feito com cura pelas mãos e sabedoria de Romária Sampaio, atuante na região do Grajaú. Romária produz óleos, pomadas, géis, banhos de assento e sabonetes, com efeitos curativos, tudo feito com os princípios naturais de ervas, raizes, frutas, flores e plantas. Receitas da Vó também promove massagens e oficinas de auto cuidado e cultivo medicinal e tradições de uso popular.

Espero que vocês tenham gostado das sugestões aqui deixadas e que pratiquem de fato o Black Money. Se cuidem, cuidem dos seus próximos e fiquem em casa! Feliz Kwanzaa e Feliz Ano Novo!

Inteligência periférica: A lacuna entre os programas de apoio ao empreendedor e o profissional da quebrada

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Nas últimas cinco reportagens da série “Inteligência Periférica”, compartilhamos a história de cinco profissionais que mesmo com pouco ou nenhum auxílio do Estado, continuaram seus corres para gerar renda e seguiram construindo suas possibilidades. Na última reportagem de 2020 da série, contamos sobre como programas de apoio ao empreender são importantes, mas nem sempre atendem as reais demandas.

Muitos profissionais que moram nas periferias da cidade, encontram na abertura do CNPJ como Microempreendedor Individual, uma possibilidade para assegurar algumas condições básicas para o seu trabalho. Mas também tem aqueles profissionais que enxergam essa “formalização” um outro tipo de burocracia, e que em muitos casos não comporta a sua atuação.

Acessar fundos de apoio ao microempreendedor e conseguir suporte desses fundos não é uma realidade para muitos profissionais e trabalhadores informais. Muitos programas e políticas públicas não chegam até os profissionais das periferias que trabalham com uma diversidade gigantesca de atuação, e não encontram nesses programas medidas que de fato dialoguem com seu trabalho.

Entender a diversidade e as várias ramificações do trabalho autônomo e informal, e também o contexto que faz esses trabalhadores surgirem, é algo que ainda não está no radar de muitos investidores.

Segundo a Ade Sampa – Agência São Paulo de Desenvolvimento que atua junto a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de São Paulo, nos últimos anos foram desenvolvidas uma série de ações e políticas públicas que apoiam o empreendedor nos territórios periféricos da cidade, como o VAI TEC, programa de impulsionamento e aceleração de negócios de jovens das periferias.

“Outra política pública de apoio aos empreendedores de regiões mais vulneráveis é o Teia, coworkings públicos. A Prefeitura de São Paulo já conta com cinco unidades instaladas na cidade: Parelheiros, Santo Amaro, Cidade Tiradentes, Taipas e Centro. Os espaços de trabalho colaborativo oferecem mesas de trabalho, sala de reunião, acesso à internet, cursos e capacitações, eventos de networking e diversos outros serviços que o empreendedor teria que pagar para ter acesso em um coworking privado”, informa a Secretaria Desenvolvimento Econômico e Trabalho.

Ainda segundo a Secretaria, as iniciativas buscam auxiliar na formalização de empreendedores. “A Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho busca promover também a formalização dos empreendedores das periferias da cidade, para que assim eles possam não só ter seus direitos garantidos por lei, como serem reconhecidos pelo governo e pela economia paulistana. Os empreendedores têm sido uma das molas propulsoras da economia paulistana. Para continuar apoiando seus negócios, eles precisam se formalizar e comercializar os seus produtos legalmente”.

A Secretaria afirma que nas 24 unidades do Cate – Centro de Apoio ao Trabalho e Empreendedorismo, os empreendedores podem se formalizar como MEI – Microempreendedor Individual gratuitamente. A equipe da Ade Sampa atua nos postos de atendimento oferecendo orientações aos que desejam começar seu próprio negócio. “Neste momento de pandemia, o atendimento está sendo feito por telefone, whatsapp e e-mail. Pelos canais de atendimento os munícipes podem tirar dúvidas sobre como se formalizar, emissão de notas e documentos, além de acesso à linhas de crédito do governo estadual”, concluem.

Durante o período da pandemia, a Ade Sampa relata que firmaram uma parceria com o Banco do Povo, programa de microcrédito do Governo do Estado de São Paulo, para realizar o teleatendimento aos empreendedores na divulgação da nova linha de crédito de R$ 25 milhões para micro e pequenas empresas enfrentarem os efeitos econômicos da pandemia.

Também contaram que oferecem cursos e capacitações para o empreendedor entender a importância do seu empreendimento, alavancar o seu negócio, e se reinventar no período da pandemia. Durante a crise da covid-19 as palestras e atividades estão sendo ministradas de forma on-line semanalmente pelas redes sociais da AdeSampa.

“Já foram oferecidas atividades com diversos temas como economia criativa, gestão de negócios, maneiras de reinventar durante a crise econômica, vendas pela internet e muitos outros assuntos que podem auxiliar o empreendedor neste momento e durante a retomada econômica da cidade”.

Favela do Fim de Semana, Jardim São Luis – Zona Sul – SP/18 . Foto: DiCampana Foto Coletivo

Sobre os profissionais que atuam no segmento do artesanato, a Secretaria relata que apoia a geração de renda do setor. “A Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho apoia também a geração de renda dos artesãos e manualistas da capital por meio do Mãos e Mentes Paulistanas. O programa já conta com mais de 1.300 artesãos habilitados pela Prefeitura para participar de feiras, eventos e ações que são promovidas na cidade. No segundo semestre deste ano será contratada uma gerenciadora para desenvolver ações de capacitação, qualificação e um e-commerce para os participantes do programa”, finaliza.

Para o núcleo de trabalho do Centro de Estudos Periféricos, o governo vem abrindo mão do seu papel de mediador das relações trabalhistas, assim como de ser parte de um processo transformador que poderia criar uma outra economia, mais solidária, ao promover programas de compras públicas, organizando pequenos produtores, fortalecendo os processos de formação, promovendo crédito acessível e espaços de comercialização. 

Quando o poder público se ausenta e burocratiza sua relação com a sociedade, o resultado é que as pessoas passam a acreditar que a relação com o setor privado é mais real, mais próxima e concreta, o que reduz ainda mais a capacidade de organização e de reivindicação por parte da sociedade

Núcleo de trabalho do Centro de Estudos Periféricos formado pelos pesquisadores Cleberson da Silva, Nataly de Oliveira, Egeu Gomez e Matheus de Carlos.

O trabalho informal se tornou um caminho de possibilidade financeira para muitos moradores das periferias. Para além da escolha de começar nesse ramo, e da falta de postos de trabalho com carteira assinada, a discussão envolve muitas camadas, principalmente por estar ligada a condições históricas que afetam quem é das periferias: racismo, desigualdade social, econômica, e de gênero, negligência do poder público, e tantos outros que só quem está no dia a dia consegue entender na pele.

Enquanto isso é a periferia que continua criando suas próprias soluções, e seus próprios caminhos, como coloca o Dj Dagoma: “Baixar a cabeça nóis não pode, é aquele ditado, né!? Ou nóis encara a dificuldade, ou a dificuldade engole você”.

Através das cinco trajetórias que compartilhamos ao longo dessa série, conhecemos profissionais das periferias que continuaram suas lutas, se reinventaram e usaram de uma das habilidades que os moradores dos territórios periféricos possuem: a inteligência periférica.

Acesse e confira todos os conteúdos da série “Inteligência Periférica” de 2020:  

Confira a primeira reportagem da série Inteligência Periférica. 
Confira a segunda reportagem da série Inteligência Periférica.

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Inteligência periférica: juventude periférica segue se reinventando – Desenrola E Não Me Enrola

Você vai conhecer a trajetória do jovem Josiel, morador do distrito do Jardim Ângela, zona sul de São Paulo, que nos últimos nove meses precisou criar três formas diferentes de gerar renda.
Confira a terceira reportagem da série Inteligência Periférica. 

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Inteligência periférica: Durante a quarentena a rua continuou sendo um meio para gerar renda – Desenrola E Não Me Enrola

Vamos contar a história da Edilene Protásio, confeiteira e moradora da zona oeste de São Paulo, que assim como muitos moradores das periferias, não pôde parar de sair nas ruas para trabalhar.
Confira a quarta reportagem da série Inteligência Periférica. 

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Inteligência periférica: Como é ser mulher, mãe e empreendedora na quebrada sem o suporte do Estado? – Desenrola E Não Me Enrola

Conheça a história da artesã Thamyrys Tamer, que participava de muitos eventos com seu trabalho, mas com o início da quarentena precisou se readaptar e buscar novas formas de vender seus produtos.
Confira a quinta reportagem da série Inteligência Periférica.
 

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Inteligência periférica: “No começo da pandemia foi um choque, me senti desempregada” – Desenrola E Não Me Enrola

Na última história de 2020 da série, conversamos com a Valdirene Rodrigues, costureira e moradora da região leste de São Paulo, que durante a pandemia passou a produzir um dos itens essenciais para sair às ruas depois da chegada da covid-19, as máscaras de tecido.

Como nos lembra Emicida: “Tudo, tudo, tudo, tudo que nós tem é nós”

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Na esteira do lema Nós Por Nós, diversos coletivos, associações de bairros, ONG, Igrejas, comitês populares, movimentos periféricos, quase sempre sem apoio do poder público, constroem alternativas e formas de organização solidárias em suas comunidades.

Entrega de kits de higiene São Mateus, zona leste. Foto: Anderson Costa

Foi assim
No dia em que todas as pessoas do planeta inteiro
Resolveram que ninguém ia sair de casa
Como que se fosse combinado, em todo o planeta
Naquele dia ninguém saiu de casa
Ninguém

Raul Seixas

O ano 2020 vai ser lembrado como o ano em que a Terra parou. Da China, no final de 2019, um coronavírus se espalhou pelo mundo, provocando uma das maiores pandemias que já atingiu a população mundial. Infelizmente essa Pandemia está agravando desigualdades socioeconômicas, e mais uma vez as populações menos favorecidas são as que mais sofrem. De acordo com Mark Lowcock, da agência humanitária da ONU, “o quadro que vemos neste ano traz a perspectiva mais sombria e desoladora que já definimos até agora. Isso ocorre porque a pandemia gerou uma carnificina nos países mais frágeis e vulneráveis.”

Vivemos hoje um dos momentos mais incertos da história, o medo toma conta de nossas vidas. A maioria da população não sabe como agir, as políticas públicas de saúde e sanitárias não dão conta de amenizar as desigualdades, as ações econômicas são insuficientes e não chegam a toda população, sobretudo aos “brasileiros invisíveis”, milhões de desempregados, nomeado assim pelo ministro da economia Paulo Guedes.

Por outro lado, historicamente grupos desfavorecidos atuam cotidianamente em suas realidades com ações de solidariedade. Na esteira do lema Nós Por Nós, diversos coletivos, associações de bairros, ONG, Igrejas, comitês populares, movimentos periféricos, quase sempre sem apoio do poder público, constroem alternativas e formas de organização solidárias em suas comunidades. Desde o início da Pandemia, nas mais diferentes periferias do país, esses sujeitos sociais vêm mobilizando ações concretas em seus territórios para reduzir os impactos da Covid-19 que atingem de modo especial, as mulheres e a população negra, segundo dados do IBGE, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD COVID19.

No bonde da solidariedade a UNEAFRO-Brasil, organizou a Campanha Apoio Permanente para Famílias Negras e Periféricas – COVID19, que colaborou e está ajudando milhares de famílias com alimentos, produtos de limpeza e higiene, além de auxílio para educadores e desempregados. A UNEAFRO também criou o projeto Agentes Populares de Saúde, em parceria com diversos profissionais da saúde, para apoiar as comunidades assistidas pelo movimento

Nas maiores favelas de São Paulo, Heliópolis e Paraisópolis, a população também vem mobilizando seus territórios. A Unas (União de Núcleos, Associações dos Moradores de Heliópolis e Região) criou a Campanha Heliópolis no Combate ao Coronavírus, que já distribuiu mais de 40 mil cestas básicas, milhares de kits de higiene e limpeza, máscaras de proteção e botijões de gás, além da conscientização com carros de som e o convencimento boca a boca para reforçar as instruções que evitam o contágio pelo vírus causador da doença. Em Paraisópolis grupos de voluntários organizaram inúmeras ações de doações, mantém um hospital de campanha, com UTI móvel e logística dos profissionais da saúde, além da distribuição de alimentos, água, colchões, produtos de limpeza e higiene, são também distribuídas diariamente mais de mil refeições para os moradores mais pobres da favela.

Na zona sul de São Paulo, no distrito do Jardim Ângela, dentre inúmeros coletivos e movimentos, a Sociedade Santos Mártires, uma referência na Defesa da Vida, nessa Pandemia se tornou abrigo para milhares de famílias, distribuindo mais de 15 mil cestas básicas, milhares de kits de higiene, máscaras, álcool gel, sabonetes, além 4.500 vale compras no valor de 300 reais.

Essas ações das coletivos e movimentos periféricos devem ser vislumbradas como parte do que Milton Santos chamou de “período popular da história”, em que o incontestável, a naturalização das desigualdades passam a serem questionadas, onde a verticalidade e o autoritarismo das práticas hegemônicas, são substituídos pela solidariedade dos lugares, pela horizontalidade e afetos das relações cotidianas.

Como outrora disse Dom Hélder Câmara:

O  mundo não mudará pela ação isolada de líderes esclarecidos e sim pelo empenho comunitário de grupos de resistência e de profecia que se consagrem a transformar o mundo a partir de uma profunda convicção de fé no ser humano e na vida.

Dom Hélder Câmara – O Deserto é Fértil

Websérie “Salve Sobrevivente” mistura ficção e realidade durante a pandemia no Capão Redondo

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Pandemia, território e identidade são elementos presentes na série virtual criada por jovens do Capão Redondo durante este ano e todos os episódios já estão disponíveis para maratonar. 

Protagonizado por jovens do Capão Redondo, a websérie “Salve Sobrevivente” mostra a quebrada vivendo a pandemia de Covid-19. Combinando situações reais e outras fictícias, a produção conta com seis episódios e está disponível no Youtube. A direção é do ator Ícaro Rodrigues e o fotógrafo Fernando Solidade faz a direção de fotografia e edição.

Pensada inicialmente como um espetáculo de rua, a proposta se adaptou ao contexto de distanciamento social e se transformou em uma websérie, como explica Ícaro: “De alguma forma, a gente lida com a questão da pandemia porque foi o momento que essa obra foi criada. Não tinha como ignorar tudo que a gente viveu e ainda está vivendo”. 

“Para nós, o fim do mundo chega mais cedo”  

Música, poesia e futurismo se reúnem na produção que tenta abarcar a multiplicidade de linguagens do território do Capão Redondo. O processo de pesquisa da produção começou no início do ano e partiu da leitura do livro de Ailton Krenak “Ideias para adiar o fim do mundo”, lançado em 2019. Refletindo sobre as ideias e relações entre território e identidade propostas pelo autor indígena, a produção traz reflexões e relatos sobre o Capão Redondo a partir da visão dos jovens.

A gente percebeu que no decorrer do ano essa ideia de fim de mundo ficou cada vez mais latente. E a gente chegou na fábula que o fim do mundo tinha chegado e só sobrou o Capão Redondo. A gente pensou também que fosse um trabalho que transitasse entre a linguagem ficcional e a documental, trazendo o ponto de vista dos jovens e das jovens do Capão. […] O Krenak fala que o fim do mundo já chegou para os povos indígenas e os jovens fizeram essa relação com o povo periférico, porque de alguma forma, o nosso fim chega cedo também.

Ícaro Rodrigues

Todos os episódios já estão disponíveis e é possível acompanhá-los na sequência: 

Episódio 1 – O meu Capão é meu lugar de fala

Episódio 2 – Salve, Sobrevivente!

Episódio 3 – Constituição

Episódio 4 – Reizinho

Episódio 5 – Menina Água

Episódio 6 (final) – Reina sobre nós

Inteligência periférica: “No começo da pandemia foi um choque, me senti desempregada”

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Na última história de 2020 da série “Inteligência periférica”, conversamos com a Valdirene Rodrigues, costureira e moradora da região leste de São Paulo, que durante a pandemia passou a produzir um dos itens essenciais para sair às ruas depois da chegada da covid-19, as máscaras de tecido.

Nascida em Pilão Arcado, Bahia, e hoje moradora da zona leste de São Paulo, no distrito de Sapopemba, a costureira Valdirene Rodrigues, 47, transformou totalmente seu ateliê de costura Val Atelier, que tem pensado em uma costura que respeita às medidas do corpo, para um espaço de confecção, distribuição e comercialização de máscaras no território.

A costureira está na área informal há mais de dez anos, vivendo da costura que chega a ser quase um artesanato de tão manual. “É um trabalho literalmente manual, se torna até digamos um artesanato, porque eu faço a roupa desde a modelagem até a confecção, a entrega dela embalada e passadinha”.

Valdirene conta que a pandemia afetou sua forma de trabalhar e sua lucratividade. “No começo da pandemia foi um choque, eu me senti desempregada, porque eu não poderia levar mais as roupas até as pessoas e nem receber elas aqui em casa, então ficou difícil.”

Com a queda da sua lucratividade, a costureira teve de encontrar outras formas para continuar gerando renda e continuar com seu negócio. “Eu fiquei um tempo parada, até onde eu tive a ideia de fazer máscara, aí eu comecei com o material que eu tinha aqui em casa, fazendo para doar, eu fiz muita máscara para doar, aí depois a situação começou a ficar difícil eu comecei a vender, e optei isso por um financeiro, porque não tinha outra coisa para fazer, aí virou um financeiro, e eu tô fazendo até agora e continuo doando também”, conta a costureira.

A carga horária de trabalho também foi algo que mudou durante o período da pandemia para a profissional, mas o aumento da carga de trabalho não foi equivalente aos ganhos financeiros. “A lucratividade diminui muito, nunca vai chegar no nível que é vender uma roupa, diminuiu muito financeiramente. Tenho que trabalhar mais, porque é um produto de menor custo e você tem que dar conta de fazer aquele produto porque é aquilo que a população tá precisando no momento, a carga horária de trabalho aumentou bastante, mas financeiramente não”.

Valdirene questiona o auxílio do poder público e medidas de suporte que aparentemente não têm sido efetivas para os microempreendedores das periferias. 

Valdirene Rodrigues, costureira. Arte: Flávia Lopes

Para a costureira, a flexibilização da quarentena não trouxe grandes mudanças, mas relata que o preço dos tecidos aumentaram muito, então continua difícil, pois se aumentar o preço de suas máscaras e roupas, corre o risco de não vender.

“A flexibilização do comércio na verdade não teve muita alteração para mim, mas uma coisa que percebi é que as pessoas voltaram a encomendar roupa, seja porque voltaram a trabalhar ou a sair. Mas como costureira eu continuo pegando o serviço que aparece né, para mim continua não estando nada normal, no que se diz a um retorno financeiro”, afirma Valdirene.

O aumento da precarização durante a pandemia

Pesquisa Seade – Janeiro 2020 / Elaboração: Flávia Lopes – Info Território

Dentro de um cenário que já não se apresentava nada positivo, com a crise da covid-19, muitos moradores das periferias não tiveram a opção de ficar em casa com suas famílias. Para muitos, ficar em casa significaria não ter a certeza de que conseguiriam ter a refeição do dia seguinte garantida, sem contar que são esses trabalhadores que fazem a cidade girar.

“O fato de uma das primeiras mortes por covid-19 no Brasil ter sido de uma empregada doméstica foi triste e emblemático, evidenciando que, quando o trabalhador/a não tem seus direitos assegurados, o patrão coloca o mesmo em risco e nada acontece”, analisa o núcleo de Trabalho do Centro de Estudos Periféricos – CEP, que lembram também do importante significado por trás do primeiro caso diagnosticado no Brasil.

O grupo de estudo complementa: “o Estado brasileiro não garante o suporte material necessário para que os trabalhadores informais possam ficar em casa durante a pandemia. Isso implica que essas pessoas estão arriscando sua saúde e sua vida para garantir sua renda”.

Valdirene Rodrigues, 47, transformou totalmente seu ateliê de costura Val Atelier.

O desemprego, a informalidade, a falta de segurança física, emocional e financeira já existiam antes da pandemia para a população negra e periférica, e com o avanço da doença também houve o avanço da falta do Estado para essa população.

“A pandemia e o consequente isolamento social só aprofundaram as carências que já existiam. Mas agora muitos trabalhadores não possuem um guarda-chuva social que os proteja, aumentando o número de desempregados e se intensificando a economia dos bicos, principalmente nas periferias”, analisa o núcleo de pesquisa.

Os pesquisadores também apontam que os moradores dos territórios periféricos se movimentam para lidar com os impactos gerados pela pandemia, movimentações que já aconteciam de forma independente antes do contexto da covid no Brasil, sempre buscando cobrir lacunas deixadas pelo Estado.

“Também houve reações, algumas iniciativas, ainda que pontuais, tais como vaquinhas para financiar a compra de bicicleta para entregadores, ações voltadas a criar e ensinar a usar as redes sociais comercialmente, tal como montar uma loja, são exemplos de ações de colaboração que aconteceram nas periferias. Também ocorreram interações nas redes sociais com a finalidade de promover o comércio local. O Fórum Paulista de Economia Solidária construiu de forma colaborativa um market place que será lançado em breve para os empreendimentos de economia solidária”, conclui o núcleo.

 Leia também: 

“Não Podemos Esperar” é o título do mais novo conto de Israel Neto

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 Morador da Brasilândia, escritor, produtor cultural e educador, Israel Neto, escreve e lança conto afrofuturista em meio à pandemia. Seu intuito é disputar a imaginação e provocar leitores a sonharem com novos futuros.

Israel Neto, escritor e morador da Brasilândia. Foto: acervo Literatura Suburbana.

Israel Neto, 33, nasceu, cresceu e mora na Brasilândia, distrito da zona norte de São Paulo. Para a criação do hábito de leitura teve como maior incentivadora sua mãe. Ela o colocava para ler os rótulos dos alimentos e também deixava ele ler os livros do Arquivo-X que possuía, ela gostava muito de ficções, conta Israel, o que contribuiu para ele desenvolver sua imaginação. Outra força para a sua entrada no mundo fantástico foi a TV, “…pela enxurrada de programas japoneses que a gente tinha das 16h até às 19h e a partir disso eu comecei a escrever as minhas versões desses desenhos.” – lembra Israel. Para ele, neste princípio de desenvolvimento criativo existia muito prazer e disposição para criar suas próprias histórias.

Quando questionado se ele vê sua escrita como uma arma, discorda dizendo que é ferramenta, pois seria como “…um instrumento que a gente pode tocar para disputar o imaginário da nossa galera e dialogar sobre as nossas coisas, sendo uma ferramenta para discutir a nossa realidade e projetar o futuro, mas por outro lado, é também um alimento simples, é um arroz e feijão, porque ela mexe nas nossas emoções, na nossa felicidade, então hoje eu trabalho a minha escrita nestes dois segmentos. A arma acaba sendo algo com uma única finalidade, já a ferramenta, não. A ferramenta é um termo genérico que pode servir pra apertar, pra despertar, pra bater, pra atirar, pra ajustar, pra moldar. A arma só tem uma função”, conclui Israel.

A escrita de “Não Podemos Esperar”, conto publicado pela Editora Nua, levou apenas surpreendentes três dias, mas se engana quem pensar que o tempo de trabalho no processo criativo levou apenas esse tempo. Como Israel mesmo conta: “…a escrita deste livro começou com a pandemia, eu terminei um outro trampo que vai sair no ano que vem, e eu estava lendo muita coisa, dois livros do James Baldwin e assisti uns filmes que foram feitos a partir dos livros dele. Falei: caramba! Esse cara consegue trazer umas questões tão sensíveis nos livros dele com temas tão duros. E ele sempre falando na primeira pessoa, daí eu pensei: quero ver se eu consigo fazer esse negócio aí também. Me organizei pra escrever esse material num final de semana. Peguei sexta-feira, comprei um caderno e comecei a escrever e fiquei literalmente três dias internado, escrevendo, eu falei: tem que sair, tem que sair. E aí rolou, deu certo”, relata Israel.

Felipe Baldino, leitor.

Sua trajetória como escritor já vem há mais de uma década, quando essa bagagem começou a ser carregada e este conto, lançado agora, começou a existir, mesmo sem a intenção, em 2011, quando lançou o livro “Amor Banto Em Terras Brasileiras”, livro que levou dois anos para ficar pronto, a diferença, como Israel mesmo explica, é que “…o escritor é alguém que trabalha todo dia. Não existe pedreiro que num dia trabalha e no outro não, não existe arquiteto que num dia desenha e no outro não. E o escritor não pode ser também aquela pessoa que precisa receber uma entidade para poder escrever. Ela tem que praticar a escrita todo dia. E a escrita não é necessariamente escrever, é ler, estudar. Pesquisar para poder escrever. Em 2009 eu comecei a estudar para conseguir escrever o “Amor Banto Em Terras Brasileiras” e publicá-lo em 2011, só que esse material do ‘Não Podemos Esperar’ já é algo que ficou acumulado, vinha estudando e meio que já estava pronto e saiu de maneira mais espontânea”.

Nessa publicação mais recente a intenção de Israel é abrir caminhos para o sonhar com outro futuro, conforme ele relata, tendo a arte como essa ferramenta poderosa, como quando em “Star Trek” muitas tecnologias apresentadas ali naquela ficção não existiam, mas abriram a possibilidade de outras pessoas se desafiarem a tentar realizar o que a ficção apresentava. 

Por isso, Israel diz que está se “…desafiando todo dia pra poder deixar esses campos de interpretação abertos, porque quando uma poesia ou um conto é muito duro ele não dá possibilidade de você encontrar coisas no seu texto que você colocou lá mas colocou inconscientemente. Assim, o ‘Não Podemos Esperar’ é um grito ao pensar o agora, a se mobilizar. Não tem amanhã, é hoje. E ele dialoga também pelo sonho. E quem leu o livro sabe que a unidade africana precisou tomar medidas drásticas. Na história levou 50 anos para chegar nesse ponto. E, mesmo assim, a gente ainda vai ter que se arriscar para continuar desfrutando daquilo que a gente conquistou. Enquanto coletividade, me parece algo que pode estimular as pessoas a se perguntarem… será que a gente pode mesmo? Acho que sim, acho que é possível”, reflete Israel.

Guiniver Santos, escritora e uma das leitora do livro “Não Podemos Esperar” de Israel Neto.

Uma das leitoras do conto, Guiniver Santos, 41, que também é escritora, deu seu relato sobre a leitura: “Israel Neto faz com primazia um trançado entre raízes fartas de saberes ancestrais e o futuro que desejamos produzir. Neste livro me trouxe inquietações, pois fomos desconectados física e simbolicamente de nossos saberes e essa busca muitas vezes me pareceu ainda estar aqui no raso das minhas denúncias literárias. Israel me plantou um chip de afrofuturismo e me permitiu alcançar sonhos de um amanhã onde eu ainda exista para além de trajetórias catárticas de um futuro que tentaram adiar. Me lançou à Máquina do Tempo onde pretos e pretas avançam e não podemos esperar”

Um conto que sonha possibilidades futuras não deixa de ser uma história também disparadora de questões atuais. Em um trecho do conto, Mateus, um dos protagonistas, diz: “Estudamos o dobro, trabalhamos o dobro, pagamos o dobro, vivemos o mínimo e eles se livram de nós assim?” (p.39). 

Questionado sobre qual a discussão presente nessa fala, Israel diz que aqui a ideia é levantar a discussão sobre o lugar do corpo do homem negro na sociedade atual em que seu corpo é percebido como algo que pode ser violado a qualquer momento, em um enquadro, pela origem, pela cor da pele, sendo que isso está no corpo do homem negro. “O homem negro foi o cara que teve que sair pra trabalhar muito cedo, um cara que trabalhava no campo, que não tinha contato com os filhos, o cara que tem que trazer o sustento, literalmente com dificuldade de vivenciar o afeto.”

Afinal, o que é o afrofuturismo e porquê criar esse segmento literário? 

Israel explica que o afrofuturismo é algo que sempre esteve presente nas sociedades africanas e que para o tempo presente seria o “pensar o mundo a partir da visão preta, pan africanista, é um movimento que está na arte, está na moda, está na música, na literatura, no cinema, em todas as áreas, que é a projeção dos corpos negros no futuro, utilizando as tecnologias e todos os meios de produção a partir das nossas raízes, então é um movimento que projeta o futuro mas ao mesmo tempo vai inserindo as conquistas de nosso passado”. Para ele, o papel da ficção nesse universo é justamente projetar o futuro, “…se o que foi pensado vai acontecer ou não, a gente não tem obrigação com isso, mas se a gente não projetar elas, não propôr, ninguém vai fazer lá na frente”.

Israel Neto. Foto: acervo Literatura Suburbana.

Como exemplo desses movimentos afrofuturistas, Israel traz alguns exemplos. Na música ele cita George Clinton do Parliament-Funkadelic que no disco “Mothership Connection” (1975), apresenta uma nave que chega na Terra trazendo o funk. “Aqui no Brasil a gente tem um filme: Branco Sai Preto Fica, que é um filme feito na Ceilândia e que conta a história de um viajante no tempo, negro, que vem pegar provas para acusar o governo brasileiro de genocídio contra os negros e as populações periféricas”, conta Israel. 

Já na moda, Israel traz as influências do visual de Michael Jackson, Prince, as estéticas africanas, os povos de toda África. Para ele, é um movimento multicultural e político também, inclusive de resistência. Especificamente na literatura Israel fala que a influência afrofuturista, na opinião dele, vem para trazer “…um novo respirar para a literatura negra que nos últimos anos se tornou algo muito tangível enquanto protesto, exaltação das raízes africanas, mas talvez abriu mão de viajar para outros mundos, de filosofar sobre outros acontecimentos, de projetar outras terras, de criar fantasias, de trabalhar os seus medos de forma lírica, e o afrofuturismo vem trazer isso, inclusive para atingir um público que talvez não leia poesia, crônica, é um leitor que quer um universo mais dinâmico”.

A leitura de “Não Podemos Esperar”, certamente é uma abertura para diversas reflexões e questões. Fica o convite para perceber como Israel Neto projeta o futuro e disputa o imaginário e, quem sabe, participar da construção coletiva deste futuro.

Periferia, protagonismo nas eleições de SP

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Nessas aventuras e desafios que o dia a dia apresenta, vou contar minha travessia como cocanditada no pleito político para vereança de São Paulo com o Coletivo mais direito a cidade.

Vila Cais, zona sul de São Paulo. Foto: @menino_do_drone

Fui convidada a compor esse coletivo com mais cinco nomes importantes em movimentos sociais pela cidade, Gil Marçal, Beto Custodio, Evaniza Rodrigues, Iracema Araujo e Rayssa Cortez, além do nosso candidato de urna Nabil Bonduki, que tem uma trajetória política importante para cidade, além de ser um urbanista renomado, com vários títulos importantes publicados.

Quem me conhece sabe que nunca fui filiada a nenhum partido, que meu ativismo sempre se deu por outros caminhos conectados com o movimento social e cultural da periferia sul, mas o momento político pedia uma ação. Talvez eu acreditasse que o fato de não haver renovação de candidaturas políticas tenha me colocado nesse pleito, mas o provável é que já estamos tão acostumados a concorrer na vida através de editais sociais e culturais para desenvolver as ações que acreditamos, que esse parecia um desafio familiar demais para não ser aceito.

Não foi fácil aprender esse caminho, pois no macro as ações que desenvolvemos tem pouca visibilidade, muito menos as ações desenvolvidas por mulheres. Continuei sendo mãe trabalhadora nesse processo, isso torna tudo muito cansativo. O Covid-19 também era um risco eminente e dificultou muito o trabalho de encontro e construção nas bases da cidade.

Conheci os cocandidatos na formação do coletivo, alguns eu conhecia por nome pela importância da sua militância na cidade, alguns eu já conhecia como Gil Marçal, meu amigo da juventude, e Nabil Bonduki, pelos seus projetos de lei como o VAI e suas campanhas em outros pleitos. Houve um grande encontro entre pessoas que militam em diversas áreas, mas que tem um compromisso ético na construção de políticas públicas para população.

São muitas mãos que constroem uma candidatura, comunicação, mobilização, finanças, parceiros, doadores, voluntários, tudo muito familiar para quem trabalha na área social, seus alicerces são bases construídas ao mesmo tempo em que as pessoas vão se conhecendo e se apropriando da proposta.

A possibilidade de trabalhar coletivamente pela cidade parecia uma aposta muito coerente, principalmente depois de anos atuando em coletivos. Sabemos que as periferias mostraram que essa é uma forma forte e potente de trabalho e aqui na zona sul foi esse o fermento que fez a cultura periférica tomar o destaque nas grandes mídias de forma nacional e internacional movimentando hoje a economia criativa das quebradas. Hoje olhamos a debilidade que os governos deixaram os artistas durante esse período de pandemia, isto não combina com o alcance social e político dessa produção, mas isso já é assunto para um novo texto.

Com novas propostas, além das que eu participei, outros coletivos também concorreram e foram eleitos, os que carregam de forma restrita pautas das lutas sociais, das mulheres, LGBTQIA+, Antirracismo, entre diversas outras pautas importantes e fundamentais, em um momento de corte de direitos promovido pelo governo Bolsonaro e validado por São Paulo e seus empresários políticos que estão vendendo a cidade. Foi um pleito político curto, uma corrida com a ideia de deixar evidente a necessidade de transformar o panorama político para melhorar a vida da população.

Nossa campanha foi sincera, bonita e com projetos reais para luta na câmara dos vereadores, mas as grandes bandeiras, a urgência das lutas sociais conectadas a imagem de um candidato majoritário forte, não possibilitou nossa eleição. A eleição do Bruno Covas anuncia mais alguns anos da falta de diálogo público, da privatização da cidade, entre outros problemas. Perdemos o pleito, mas não fomos derrotados, até porque, as bandeiras foram eleitas por outras chapas coletivas importantes, como o Quilombo Periférico, um projeto político importante na luta antirracista e pela melhoria de vida da população periférica.

Foi uma grande experiência conhecer a cidade de forma ampla, os coletivos que estão na luta política no dia a dia da cidade, como se constrói um candidato, uma candidatura, o papel do partido, o impacto de sua visão na candidatura.

Hoje, a Martinha, minha vizinha, me disse uma coisa muito interessante, “São Paulo é aquele vizinho que vive numa situação ruim de moradia, mas que passa todos os dias lustrando o carro, porque não compreende a situação precária que ele e sua família vivem, o que importa são as aparências”.

Esse vizinho é São Paulo. Aparentemente cosmopolita, quando na verdade, o racismo e a xenofobia não combinam com a diversidade global. Moderno, que não respeita as escolhas de gênero e cultura da população. Trabalhador, que se rende a terceirização e sucateamento dos direitos trabalhistas. Cristão, que não tem resiliência pela pobreza, pelos sem teto, pelos moradores de rua, pelo genocídio do Estado e criminalização da pobreza. Essa caricatura grotesca paulistana tem sido mais respeitada em seu carro lustrado, do que aquele que luta, sem carro, pelo seu direito à moradia digna, pelos direitos trabalhistas e pela possibilidade de uma vida melhor para todos, todas e todes.

O pleito político de 2020 foi muito importante para a insurgência de novas formas de garantir o avanço político na luta por uma cidade melhor, por uma cidade para as mulheres, de uma metrópole antirracista, mas também ficou latente que temos muito o que lutar para conseguir vencer Bolsonaro e seus clones na eleição à presidência.

Pessoas acordadas para a urgência de uma renovação estrutural política, elegeram cidadãos periféricos de gênero e raça diversos, fincamos essas bandeiras na câmara dos vereadores, mesmo que ainda não conseguimos o cargo majoritário da cidade, conseguimos forças para construção dessa possibilidade. Fico feliz em ter, com o Coletivo Mais Direito à Cidade, feito muita gente sonhar, acreditar e ter esperança, mais de 16 mil sonhadores em tempos tão áridos e muitos outros milhões em nossa cidade com todas as candidaturas que acreditam no direito à cidade.

Empresária dos Racionais MC’s, Eliane Dias conta sobre desafios da crise no Empreende Aí Cast

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A empresária do mundo da música e empreendedora no setor de moda conta no quarto episódio do podcast sobre as adaptações dos negócios durante a pandemia, além de sua trajetória profissional à frente da Boogie Naipe e da Yebo  

Foto de Marcus Steinmeyer/UOL

 O Empreende aí Cast, o programa de podcast da escola de negócios da periferia para a periferia, convida Eliane Dias para um bate-papo sobre como adaptar seu negócio durante crises. A partir de suas vivências, Eliane conta um pouco sobre as estratégias adotadas neste período de pandemia e como tem sido o trabalho da Boogie Naipe, empresa de gestão de carreira de diversos artistas, como Racionais MC’s e Liniker, e a Yebo, marca de moda feminina criada pela empreendedora.

Além disso, neste bate-papo a convidada traz exemplos de métodos que utilizou e ainda utiliza para conquistar novas oportunidades. “Não sei se teve outra pessoa antes de mim a colocar um show de rap em uma casa A”, conta Eliane Dias sobre a produção dos shows dos Racionais MC’s em espaços elitizados como no Credicard Hall (atual Unimed Hall) e no Espaço das Américas. A partir desse exemplo, a convidada conta que é preciso estar em busca de inovação dentro do setor que se atua, algo muito importante para manter-se dentro da competitividade dos negócios. 

Compartilhando histórias de mulheres inspiradoras 

Com o objetivo de auxiliar as empreendedoras das quebradas com histórias inspiradoras de mulheres que criaram o seu próprio negócio e também compartilhar dicas práticas para executarem em seus negócios, a Empreende Aí (Escola de Negócios da Periferia para Periferia) lança seu primeiro podcast nas plataformas do Spotify e do Youtube, o Empreende Aí Cast. Confira:

Criado por Luís Coelho e Jennifer Rodrigues, moradores da periferia do Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, a Empreende Aí é uma iniciativa que busca motivar pessoas das quebradas na criação de seus negócios e na sua capacitação profissional no mundo do empreendedorismo. Neste conteúdo em formato podcast, a ideia é inspirar quem já pensa em criar seu próprio negócio ou quem deseja aprender como melhorá-lo. O podcast está disponível nas plataformas do Spotify e do Youtube.

Com mais de cinco anos de atuação, o Empreende Aí já realizou diversos cursos e palestras nas periferias e conta com a parceria do Itaú Mulher Empreendedora e a International Finance Corporation (IFC), organismo do Grupo Banco Mundial, para a realização do Empreende Aí Cast.

Inteligência periférica: Como é ser mulher, mãe e empreendedora na quebrada sem o suporte do Estado?

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Na quarta reportagem da série “Inteligência periférica”, contamos a história da artesã Thamyrys Tamer, que participava de muitos eventos com seu trabalho, mas com o início da quarentena precisou se readaptar e buscar novas formas de vender seus produtos.

Thamyrys Tamer Gonçalves, 30, usa uma das técnicas mais antigas que existem: o crochê, que é a sua fonte de renda. A empreendedora gere o Ateliê Herança de Vó, que confecciona peças de decoração usando fios de resíduo têxtil, produzindo desde cestos a almofadas, no Jardim Joana D’arc, Tremembé, na zona norte da cidade.

“Eu já trabalho na área informal praticamente há dez anos, e atualmente vivo apenas do meu negócio, eu sou parda e acredito que em relação a cor eu não sofra tanta negligência diretamente, eu acho que tem mais haver com meu gênero, as pessoas acham que não, mas a questão da mulher ser independente, mãe e solteira pesa muito no mercado”, compartilha a artesã.

A decisão de sair da carteira assinada para Thamyrys vem do fato de conseguir sobreviver e sair do ciclo de ser um robô de grandes empresários. “Eu comecei a trabalhar informal, como autônoma, porque eu me via muito como um robô em um período da minha vida. Quando eu encontrei um meio de ter uma renda extra informal, me fez sair um pouco dessa robotização, e conseguir sobreviver com um pouco de flexibilização.”

Para Tamer, o governo acaba fazendo com que as pessoas desistam de suas ideias e projetos devido às burocratizações que impõem para os profissionais se formalizarem no mercado. 

“Acho que para qualquer pessoa que está começando a empreender hoje e para quem está empreendendo a mais tempo, o que falta é encontrar um passo a passo, o governo enche de burocracia, não tem uma informação clara, é a aquela famosa expressão parece que eles dificultam justamente para fazer com que você pague o pato”

coloca a profissional.

A pandemia da covid-19 gerou uma queda de mais de 90% dos eventos que o ateliê participava. Antes se sustentava principalmente com a venda para os eventos, mas com a crise da covid-19 começou a focar suas vendas de forma totalmente online e pelas redes sociais.

“Com a pandemia, realmente foi um surto, porque quando o mercado de eventos ia começar a aquecer que seria em março, parecia um boliche, vários eventos um atrás do outro caindo, cancelando, sem previsão de retorno. A renda foi de 100% para 10%, não era mais nem pra dar certo, era pra sobreviver mesmo, aí a gente começou a buscar outros meios de ter um retorno financeiro estando dentro de casa”, relata a empreendedora.

A artesã enfatiza que o poder público não está ajudando em nada o comerciante neste momento, e sem isso a economia só tende a quebrar. “O governo deveria ajudar nesse momento, mas continua dificultando muito, acho que tem que partir deles essa informação clara, e auxiliar o empreendedor, fazer com que ele caminhe, desenvolva e cresça, porque é esse empreendedor que vai custear boa parte dos impostos, ajudar a população na economia, na saúde, na educação”.

Thamyrys Tamer, artesã. Arte: Flávia Lopes

A pandemia trouxe uma demanda de criar estratégias para alavancar as vendas no mundo online. A artesã conta que precisou ter mais foco nas vendas online, pensar com mais familiaridade em cadastrar produto, criar estratégia de venda e criar produtos novos: “As pessoas em casa começaram a reparar melhor que elas precisam de itens para decorar e organizar a casa, ter esse olhar mais crítico para o lar delas, e aí com isso gerou uma demanda maior de vendas”.

Para Thamyrys, muitas pessoas se agitaram com a reabertura e volta de algumas atividades, mas o olhar mais humano para o lar, enxergando a casa como seu templo, seu lugar de reconhecimento e de paz, continuou o mesmo.

“Com isso as minhas vendas continuaram no mesmo patamar, e ainda eu consegui ter alguns picos de venda, com as datas especiais como dia das crianças. A black friday, o natal, então eu já to vendendo coisas de natal desde de setembro, porque as pessoas já querem começar a decorar, a se sentir em um ambiente confortável, as minhas vendas aumentaram nesse período”

compartilha a artesã que acredita ter sido o ponto de partida do aumento de suas vendas as pessoas terem se familiarizado e enxergado benefícios na compra online, evitando ir até o estabelecimento.

Após alguns meses se readaptando ao novo cenário que a pandemia gerou, a artesã contratou três profissionais para auxiliar na produção e relata que hoje conseguiu mudar o olhar para o seu trabalho de apenas um serviço ou produto que estava fazendo para gerar renda, para pensar também no sentido de um negócio, e fazer crescer.

“Para empresa crescer como um todo, eu precisava começar a enxergar que eu precisava de uma produção maior para dar conta da demanda, e aí eu comecei agora uma formação com mulheres, que também são mães, que também não tem como sair porque dependem de ficar em casa”, conta Thamyrys.

Além de gerar renda para sua família, a artesã passou a ter uma equipe: “Que nem agora, eu tô com uma mulher que ela precisa cuidar da mãe que tem alzheimer, eu tenho uma outra mãe trabalhando comigo que tem três filhas pequenas, então eu comecei a pegar pessoas do mesmo tipo de realidade que eu, que precisava trabalhar, que era mãe solo, precisavam estar em casa, então comecei a buscar pessoas que tem esse tipo de anseio de precisar de uma renda, mas não ter como trabalhar fora, para me ajudar com a produção”, finaliza.

Na próxima reportagem, compartilhamos a última história da série “Inteligência periférica” de 2020. Você vai conhecer a Valdirene Rodrigues, costureira e moradora de Sapopemba na região leste de São Paulo, que durante a pandemia passou a produzir um dos itens essenciais para sair às ruas depois da chegada da covid-19, as máscaras de tecido.

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