Desde 2019, após a morte de 272 pessoas devido ao rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, Minas Gerais, o debate sobre essas construções se intensificou. Conversamos com a bióloga e doutoranda em geociências Maíra Silva, e com a Joyce Silva, militante do Movimento Atingidos por Barragens, sobre o histórico de barragens construídas ao longo dos anos, o que representam para o meio ambiente e para as populações desses territórios.
As especialistas abordam o aspecto racial e social que envolve a autorização dessas construções, que são estruturas criadas para conter ou reservar substâncias, sejam líquidas ou sólidas, e podem ser destinadas para abastecimento de água, mineração, hidrelétrica e outros.
Uma agulha encosta no vinil e faz brotar memória, afeto e resistência. Desde 2019, a música tem sido a junção de diferentes pessoas que se reúnem todo último domingo do mês, no espaço Canto de Cultura Negra, localizado no bairro Guilhermina Esperança, na zona leste de São Paulo. Criado pelo Tiganá Macedo, o projeto Dialogando ao Som do Vinil apresenta a música como ferramenta de transformação, através da audição de discos de samba produzidos por artistas negros.
O projeto nasce da vivência de Tiganá, que cresceu em uma casa onde a música sempre teve um papel sagrado. As rodas nos quintais, os almoços de domingo, as conversas atravessadas por canções, tudo isso moldou seu olhar sobre o mundo.
“Lá em casa era muita música”, lembra Tiganá. “As casas se abriam, os vizinhos juntavam as famílias, preparavam o almoço e passavam o dia inteiro em resenha. Eu brincava com galho, fazia carrinho, mas tava sempre ouvindo tudo.”
Inspirado pelos pais, especialmente por sua mãe, Tiganá transformou essas lembranças em potência coletiva. Com o projeto, por meio do vinil, ele resgata histórias e promove encontros onde política, cultura, arte e ancestralidade caminham juntas.
Antes de qualquer samba, veio o exemplo. Os pais de Tiganá seguem afinando o tom da vida, firmeza, afeto e presença. Fotos João Santos
“Dialogando ao Som do Vinil é um evento feito por pessoas negras e para pessoas negras, e tem como proposta usar a música como um canal para refletir sobre identidade, negritude e pertencimento”, diz Tiganá.
A cada edição, um artista é escolhido para ser celebrado. No encontro do mês de junho, a homenageada foi Alcione.
Durante a audição, Tiganá propõe uma escuta atenta e crítica. O artista costura as músicas com histórias, vivências pessoais e reflexões sobre o papel social da arte. Para ele, canções como “Pedrinha da Cor” ou “A Loba” carregam mais do que melodia: são manifestações da força ancestral das mulheres negras que nos precederam.
“A música sempre esteve presente na minha construção como homem negro. Não só como entretenimento, mas como ferramenta política, social e espiritual. Alcione é uma dessas artistas que representam tudo isso”, afirma Tiganá.
De acordo com Tiganá, as escolhas dos artistas acontecem por meio de trocas: “eu procuro dialogar com pessoas que já fazem parte da caminhada de anos e que tem visões políticas progressivas e diáspora. E com pessoas mais novas para que eu dialogue com os tempos de hoje para não perder o fundamento e manter a chama acesa do agora”, diz o educador.
Música, memória e política
Com uma curadoria delicada, ele debate política e ancestralidade, como quando se fala sobre conscientização racial, na música Pedrinha da Cor do álbum da Cor do Brasil em que Alcione fala sobre momentos de racismo em sofreu, mas também abre ali o diálogo e exalta a beleza negra e a diversidade da cultura afro brasileira.
É nesse momento que Tiganá mostra a música pra quem tá nas audições e convida todo mundo a contar como ela bate, onde pega, o que mexe por dentro.
Entre as memórias que atravessam sua relação com a música, ele relembra com carinho o primeiro grupo que marcou sua trajetória: o Fundo de Quintal. “Foi ali que tudo começou. Eu pegava o balde e tentava imitar o repique de mão, meu irmão pegava a frigideira como se fosse pandeiro. A gente ficava horas trancado no quarto, tocando, ouvindo rádio.”
A Transcontinental FM era uma referência. “Tinha um horário só de samba. A gente apertava o play no rack e ficava ouvindo em silêncio, tentando decifrar quem era o grupo, o nome da música, os detalhes. Foi ali, com uns 12 anos, que muita coisa se formou em mim.”
Mas as referências não estavam apenas no rádio. Elas vinham do quintal da avó, onde todo domingo era dia de encontro, afeto e tambor. “Minha avó sentava no quintal cercada de planta, meu tio Vadu pegava o balde e começava a tocar samba. Aí vinha minha mãe, meu tio Nezinho e virava festa. Era emoção, alegria, mas também tinha dor ali. E era essa mistura que ensinava”, relembra.
O Dialogando ao Som do Vinil é mais do que uma roda de conversa com música: é um espaço de reconexão com as raízes, de valorização da cultura negra e de reafirmação da identidade. Em um país que ainda apaga memórias e vozes negras, iniciativas como essa são respiros de resistência e cuidado.
A presença de Greta Thunberg garantiu mais cobertura midiática à interceptação do barco com comida para Gaza, em águas internacionais, do que as fotos de crianças chorando de fome.
Eu tinha planejado outro tema neste mês, mas a vida se impõe, e decidi falar sobre Gaza. Não vou fazer aqui um histórico da ocupação da Palestina, você me desculpe, mas sugiro esta série de cinco vídeos da Sabrina Fernandes, que explica esse processo muito melhor do que eu conseguiria.
Imagino que você também esteja vivendo um bombardeio de informações sobre isso. Se não estiver, talvez precise ajustar seu algoritmo.
Vamos ao resumo: Um barco, com um grupo de doze ativistas de diversos países, entre eles, um brasileiro, tentou chegar à Palestina por via marítima, levando uma quantidade simbólica de alimentos, incluindo leite em pó e fórmula para bebês.
Mas foi interceptado, em águas internacionais, pelo exército israelense antes de chegar a Gaza. O grupo queria mostrar, ao vivo, que Israel está usando a fome e a sede como armas de guerra, ao impedir qualquer ajuda humanitária de chegar ao povo palestino.
Diante da magnitude do que acontece na Palestina desde a ocupação, há mais de 70 anos, e que se agravou desde 2023, a gente poderia achar que o “Iate de Selfies”, como o nomeou o governo de Israel, não era uma ação de muito impacto, mas foi.
Só o fato de o governo de um país em guerra se dar ao trabalho de inventar um apelido para ridicularizar a ação nas redes sociais, quando teria sido relativamente simples afundar o barco ou fazer desaparecer as pessoas, já diz bastante coisa.
Mas por que essa ação chama mais atenção do que os números ou as imagens de crianças sofrendo?
Ou do que as manifestações que juntam milhares de pessoas em todo o mundo?
Manifestações ocorrem, inclusive dentro de Israel, com israelenses pedindo cessar-fogo. Por que um barco com apenas doze pessoas chama mais atenção do que a Marcha Global para Gaza, com mais de quatro mil pessoas tentando chegar por terra à fronteira de Gaza com o Egito?
Bom, Greta Thunberg, famosa ativista ambiental sueca de 23 anos, uma das tripulantes do barco, ao ser perguntada por que o mundo fecha os olhos para o genocídio em Gaza, respondeu: por causa do racismo.
Por conta da presença de Greta, e de todo o privilégio branco que seu corpo carrega, a viagem teve que ser noticiada em jornais do mundo todo.
A interceptação do barco em águas internacionais e a deportação da tripulação tiveram que ser manchetes. Houve coletiva de imprensa no aeroporto.
Não era possível deixar “em branco” qualquer coisa que acontecesse com o barco em que Greta Thunberg estava. Isso impediu, inclusive, que ele fosse bombardeado.
Não é exagero. Escolas e hospitais em Gaza foram, sim, bombardeados. Militantes contra o genocídio na Palestina estão presos dentro e fora de Israel. Greta sabe disso.
Um governo violento, tão desesperado para se manter no poder quanto o de Benjamin Netanyahu, não teria pensado trinta segundos em simplesmente explodir esse barco no meio do mar — se isso não fosse causar uma dor de cabeça maior do que “apenas” prender e, em seguida, deportar a tripulação.
Greta não precisa do meu aplauso para continuar sendo a europeia-branca-ativista-estrela-heroicizada que ela é desde os 16 anos.
Seu nome é, e vai continuar sendo, usado como foi: para garantir que o mundo olhasse para uma quase minúscula demonstração do que está acontecendo em Gaza.
Cerca de duas mil pessoas israelenses estão entre mortas ou reféns desde o ataque do Hamas a Israel, em 2023.
Depois disso, e supostamente por conta disso, mais de 60 mil palestinos foram mortos, entre os quais 14 mil crianças.
Cerca de 1,9 milhão de pessoas foram deslocadas, o que corresponde a quase 80% da população de Gaza. O massacre de Israel sobre o povo palestino é genocídio, é limpeza étnica.
Não há como minimizar isso, em nome de uma suposta ponderação antiestrelismo, ou, muito menos, sob qualquer argumento que defenda “olhar os dois lados”.
No fim,Greta tem razão. A resposta “simples” é racismo. E ela não faz mais do que sua obrigação ao usar a visibilidade que tem para chamar atenção para isso.
Pra terminar: dentro do tema principal desta coluna, Justiça Reprodutiva — como foi pensada pelas mulheres negras, também se defende o direito de criar suas crianças sem medo da violência. É um movimento antigenocida.
Entre as diversas vertentes da esquerda judaica, existe um movimento que reconhece a ocupação israelense em território palestino como neocolonialismo, e defende o êxodo total — o que é um tema delicado e doloroso para o povo judeu, historicamente perseguido e forçado a migrar.
Hoje, o governo israelense é acusado, inclusive por parte de sua própria população, de ter deixado de procurar pessoas sequestradas pelo Hamas, porque, ao serem encontradas, deixariam de ser justificativa para a guerra.
“Eu preciso vir aqui implorar para vocês trazerem de volta a minha filha, que o Estado de Israel abandonou? Se eu pudesse escolher, não viveria neste país. Aconselharia minha filha a pegar tudo o que ela ama e deixar este país. Este é meu conselho para as novas gerações.”
Que conselhos as mães palestinas gostariam de dar às suas novas gerações?
O Mẹ́rìndílógún ou Jogo de 16 Búzios, é um oráculo milenar de tradição Yorùbá, no qual sacerdotes e sacerdotisas do culto afrobrasileiro são os intérpretes das 16 caídas e cada uma delas tem uma interpretação, seja ela positiva ou negativa.
Normalmente recorremos a ele para termos orientações quando os caminhos estão fechados. Com perdas de toda ordem, através delas podemos tomar boas decisões para abrir os caminhos e nos recuperar dessas perdas.
Hoje quero citar o 6 º Odu, conhecido como Obará, que cultuamos no mês de junho, no dia 06/06.
Em um dos mitos sobre Obará, que interpreto como um ensinamento sobre generosidade, humildade e até mesmo acolher aqueles que nos desprezam, pois, no final, as riquezas deste caminho serão certeiras e lhe darão o sucesso no momento certo.
Na filosofia tradicional, a ética é como um código para interpretação e podemos internalizar conceitos sobre boa conduta e bom caráter para que o destino nos devolva bons frutos à nossa colheita. Se apresenta como um aprendizado para a evolução moral e espiritual.
Quando vivenciamos perdas e entendemos que são barreiras, desafios, má sorte, inveja, etc, normalmente pensamos ser algo negativo, o que nos leva, muitas vezes, a desistir de lutar ou de seguir em frente. Às vezes as perdas nos paralisam.
Porém, precisamos esperar o tempo passar, sentir a dor e nos ouvir. Entender quais são as situações que nos afetam nas perdas, se é o apego, o ego, fantasias de que tudo é estável, que estamos no controle e nada vai mudar.
No jogo de búzios, o oráculo é um grande conselheiro e nos ajuda a entender que as perdas ou erros podem ser ganhos ou acertos. Que o tempo é um mestre sábio, que o silêncio é um excelente conselheiro.
Entendo que a vida nos ensina que a dor é o maior professor, porque nos mostra possíveis formas de mudanças. Mostra quem torce por você, lhe estende a mão e também quem não nos quer bem, pois é nas dificuldades que conhecemos as pessoas.
Temos que, diante do caos, organizar e recalcular a rota. Desistir não é uma possibilidade, temos que seguir e continuar, mas espere o tempo, o mestre que nos ensina a descansar, acalmar a mente e o coração para se ouvir.
A perda nos deixa solitários no processo da vida, mas isso não quer dizer que estamos realmente só. Muitas vezes é sobre aprender a ter fé e confiar em si mesmo, seguir sua vida guiado pela sua intuição.
Temos deuses a nos governar e essas deidades, como nos mitos, são protetores. Podemos soltar o controle, o medo e confiar, pois teremos como Xangô e Oyá, deuses da justiça para nos fortalecer e lutar para que tenhamos vitórias sobre as perdas injustas.
Desde que iniciei o caminho da tradição e da vida devotada aos ancestrais, tenho observado que há uma grande filosofia que está por trás de cada conto e mito que se revela a partir dos movimentos do jogo.
São ensinamentos e orientações diante de perdas ou quedas, nos sentimos derrotados, desesperançados, não há caminho e nem vitórias diante da realidade que temos, mas na verdade, me parece uma reeducação. Tiram tudo do lugar, pois estávamos acomodados.
Pois crescemos somente no desconforto que nos faz ter movimentos e desenvolvemos novas estratégias para sobreviver ao caos e vamos colocando a casa interior e exterior em ordem.
Mudamos internamente para vivermos de outra maneira e conduzir a vida ou os relacionamentos de outra perspectiva.
Não estamos sós. Esta é a grande verdade. Nunca estaremos e seremos sempre testados a nos desafiar e crescer pelo nosso bem viver.
Seguir confiando que algo melhor está por vir. Isto não é o fim da linha, mas o fim de um ciclo que irá dar espaço para o início de um novo, com a experiência das quais sem estes desafios não teríamos aprendido grandes lições para avançarmos e crescermos.
Esta é uma filosofia num conceito afrocentrado e não eurocêntrico. É um caminho de grandes aprendizados nesta jornada, pois perceber outro contexto que nos impulsiona a seguir e não desistir, nos abre uma nova visão diante dos caminhos que precisamos trilhar.
Este é um conteúdo opinativo. O Desenrola e Não Me Enrola não modifica os conteúdos de seus colaboradores colunistas.
O papo desse episódio são os bailes funk, movimento cultural e símbolo de lazer entre muitos jovens nas periferias, que há tempos são alvos de abordagem policial e perseguição.
Instalada em maio deste ano, na Câmara Municipal de São Paulo, a CPI dos Pancadões, é um dos exemplos dos mecanismos de criminalização do movimento. Presidida pelo vereador Rubinho Nunes (União), a comissão pretende investigar possíveis omissões dos órgãos públicos na fiscalização das festas realizadas no município e a perturbação de sossego.
Filipe Barbosa, diretor do filme Fluxo, e Renata Prado, pesquisadora e especialista da cultura funk no Brasil, integrante Frente Nacional das Mulheres do Funk, chegam nessa conversa e abordam como o movimento também representa o direito à cultura e ao lazer nos territórios.
Desde 2023, a quadra da rua das Seringueiras, no bairro do Jardim Sapopema, divisa com o bairro Eldorado, em Diadema, se tornou o tablado de diversos moradores do entorno que treinam junto com o Caique Alves, 23, morador do bairro Jardim Sapopema, em Diadema, São Paulo. Lutador, professor de boxe e idealizador do Projeto Família Street Boxe, o jovem conduz aulas da modalidade no local como forma de fomentar o esporte na região.
O que começou como uma brincadeira motivada por alguns amigos, se tornou um propósito de vida. Caique já tinha oito anos de experiência no boxe quando começou com os encontros na quadra. “É interessante ter boxe aqui, geralmente quando tem algum esporte é só [voltado] ao trabalho do futebol. Então, [trazer o boxe para cá foi uma novidade] para a criançada e até mesmo para os pais que começaram a se interessar e vir praticar”, conta.
O treino na quadra é sempre coletivo, mas é feito uma análise de perfil para entender as necessidades individuais de cada participante, que se encontram sempre às terças e quintas, das 20h às 23h.
A trajetória do professor começou em um projeto social. Na época, jovem curioso, ao lado de amigos que cultiva até hoje, deu os primeiros passos na modalidade. Com o tempo, a prática foi ganhando mais espaço em sua vida até o momento que ingressou nas competições federadas. Além de continuar treinando, Caique compartilha suas vivências através da iniciativa. “O que a gente aprende, não é para guardar. É para passar pra frente”, afirma.
“Hoje fico pensando o que seria de mim se não tivesse conhecido o boxe ou o mundo da arte marcial. Talvez seria um jovem deprimido. Meu pai foi morto [perto de casa], vim de um lar que, em qualquer oportunidade, ele agredia a minha mãe, cresci vendo isso e tinha tudo para ‘dar errado’, mas escolhi fazer diferente. O boxe mudou a minha vida. Me salvou, me deu resiliência, força, personalidade” – Caique Alves, professor de boxe e idealizador do Projeto Família Street Boxe.
Caique destaca que todas as pessoas podem participar dos treinos, mas diz que o esporte exige disciplina, comprometimento, esforço e sobretudo, respeito consigo e com o outro.“No final dos treinos, a gente se reúne e sempre troco um papo com meus alunos que tudo o que a gente aprende aqui no boxe, fica aqui [em relação à troca física]. Não podemos aprender a lutar para sair daqui e querer brigar ou até mesmo arrumar desavenças”, conta.
Trocas e aprendizados
Inicialmente, o projeto teve a formação de várias mulheres e meninas da região, mas muitas delas não seguiram nas atividades. “Havia uma turma só de mulheres, [mas com o trabalho e rotina] o grupo acabou se desfazendo. Então, foquei no treino coletivo, com todos juntos e o espaço continua totalmente aberto e acolhedor para todo mundo. E quem [tem filhos] também pode trazer a criança para participar”, diz.
“Quando um adolescente está se conhecendo, se desenvolvendo, o esporte se torna muito importante neste processo de autoconhecimento. Ajuda muito para que venha crescer e [se desenvolver] integralmente como pessoa, não só como atleta.” – Caique Alves, professor de boxe e idealizador do Projeto Família Street Boxe.
Gregory Martins, 19, motoboy, lutador e aluno do Projeto social Família Street Boxe,conta: “Treino há quase um ano, conheci através de um primo e vim fazer parte do projeto. Sempre gostei de boxe, desde criança, ‘brigava’ com meu irmão dentro de casa (risos), só que depois [mais velho], não encontrava [um local] para conseguir treinar de forma gratuita, até que conheci a Família Street Boxe.”
“Aqui é disciplina, somos uma família, treinamos sério [sempre com o foco] de levar nosso nome lá para fora”, destaca o aluno, morador do bairro de Eldorado.
João Gabriel, de 8 anos, é irmão de Gregory e fala com empolgação sobre as atividades. “A aula dele é muito boa, me ajuda, o que eu mais gosto é sparring (simulação de combate entre duas pessoas para aperfeiçoar técnicas e estratégias). Foi o meu irmão, o Gregory, que me trouxe para conhecer e estou achando muito bom fazer os exercícios, porque eles ajudam no meu reflexo, aumentam a minha força”. O projeto também se tornou um espaço de convivência para ele. “Eu acho que a gente fica mais próximo e vira mais amigo das outras crianças”, compartilha.
“Eu faço boxe para passar tempo, mas penso também em ser lutador [profissional] quando crescer. Lutar para valer.” – João Gabriel, 8, aluno do Projeto Família Street Boxing, no Jardim Sapopema, em Diadema, São Paulo.
Rafael Monteiro, trancista, pai do João Gabriel e do Gregory, conheceu o projeto levando seus filhos e acabou se tornando aluno também. “A gente sempre tenta colocar atividade física [na rotina] e acho que isso ajuda para que as crianças não fiquem só no celular ou só na rua. O projeto [é sensacional], mas precisa chamar mais gente para participar. As aulas são totalmente gratuitas. O treino é pesado para os adultos, mas também tem cuidado com as crianças, principalmente na parte física”, conta Rafael.
Mudanças na coordenação e na agilidade são alguns dos reflexos que o Lucas Dias, de 13 anos, conta ter percebido a partir do boxe. “A falta de reconhecimento é bem difícil. Às vezes você fala que faz um esporte e todo mundo acha que você faz futebol, basquete. Aí quando você fala boxe, [as pessoas estranham]”, diz o jovem que é aluno do projeto desde abril.
Lucas mora com a família no bairro do Jardim Sapopema e fala sobre conciliar os estudos e a prática da modalidade. “É importante ler, escrever e entender um pouco sobre o mundo, né? O mundo gosta de passar para trás quem não tem [estudo], as pessoas olham pra um preto e pobre na rua e já acham que ele é burro, sem nome, sem futuro, marginal…”.
“Com a luta eu quero um dia colocar meu cinturão e conseguir dar um futuro melhor pra todo mundo da minha família.” – Lucas Dias, 13, morador da comunidade do Jardim Sapopema, em Diadema, e aluno do Projeto social Família Street Boxe.
Articular um trabalho como esse, segundo Caique, tem muitos desafios. “O que a gente mais precisa é de um teto, porque quando chove, por exemplo, a nossa quadra alaga e ficamos impossibilitados de fazer os treinos. Além disso, tenho cinco sacos de areia parados sem uso, pois a gente não tem como fixá-los na quadra por falta de estrutura.”
Os interessados em participar dos treinos podem entrar em contato, através das redes sociais do projeto.
Você provavelmente já ouviu falar sobre arcabouço fiscal na TV. Apesar do nome complicado, o tema afeta diretamente a vida de quem depende dos serviços públicos, como saúde, educação, assistência social e programas sociais como o Bolsa Família, o Abono Salarial e o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Confira o resultado dessa conversa no sexto episódio da quarta temporada do Desenrola Aí
Para entender esse assunto, o último entrevistado da 4a temporada do Desenrola Aí é Júlio César Djeli, economista e pesquisador vinculado ao Núcleo de Estudos da Violência da USP, que explicou o impacto da medida fiscal na vida da população periférica.
O arcabouço fiscal é um conjunto de regras que define quanto o governo pode gastar e como ele deve controlar as suas despesas. “É um tipo de guia que organiza as entradas (impostos, taxas e arrecadações) e as saídas (gastos públicos) do orçamento federal”, explica.
Para organizar as contas públicas, o governo pode escolher reduzir os investimentos em Seguridade Social que tem como base a saúde, à previdência e assistência social ou passar essa conta para o setor privado.
Quando o governo decide cortar gastos de benefícios como Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e o BPC, por exemplo, quem mais sofre é quem depende desses serviços. “Se corta na saúde, na educação e na assistência social, quem sente é a periferia. Porque no Morumbi tem hospital particular, escola particular. Mas e a gente, que depende do SUS e da escola pública?”, questiona o economista.
Foto: João Vitor Santos
Se o governo restringe os gastos reduzir também o número de pessoas que têm direito aos benefícios ou aos valores pagos por eles. Mesmo que o arcabouço não comprometa o valor dos alimentos no mercado, ele compromete o quanto de dinheiro se tem no bolso para fazer as compras.
Para Djele, essa lógica amplia a desigualdade e expõe como os governos estabelecem suas prioridades.
É possível governar sem arcabouço?
Segundo o economista, sim. “Antes do governo Temer, não existia teto de gastos nem arcabouço fiscal, e o Brasil funcionava. O que existe é um modelo de país: você pode escolher um modelo que prioriza o social ou um modelo que prioriza o privado”, afirma.
Tudo depende da escolha política: gastar mais com saúde, educação, assistência social e gerar bem-estar para a população, ou gastar menos e beneficiar quem já é rico.
A orientação é que ao ouvir sobre arcabouço fiscal na TV, a atenção deve ser focada não só no tamanho dos cortes de dinheiro, mas onde estes cortes estão sendo feitos. “Falam em cortar milhões da saúde, mas o que exatamente está sendo cortado? É um programa? É uma assistência? Isso vai te afetar? Ficar atento a esses detalhes faz toda a diferença, principalmente para quem depende dos serviços públicos no dia a dia”, alertou.
Desenrola Aí
O programa Desenrola Aí é uma iniciativa quinzenal que promove diálogos com especialistas da quebrada, abordando temas relevantes que impactam o cotidiano da população negra e periférica, além dos direitos humanos, que são fundamentais para a convivência em sociedade. O programa é uma realização do Desenrola e Não Me Enrola, Fluxo Imagens e Portal Kintê Notícias, com apoio da Lei de Fomento à Cultura da Periferia, da cidade de São Paulo.
“No meio do caos, o afeto tem sido o meu acalento”, é assim que Thays Gonçalves Menezes, 26, tem percebido o lugar do afeto na sua vida. Moradora de Guaianases, município de São Paulo, para ela, o amor está no cuidado cotidiano, nos vínculos com amigos, família e caminha junto com a liberdade.
“Afeto é uma delícia e eu adoro ser afetado por ele. Mas afeto e amor precisam de liberdade. Se vira prisão, deixa de ser afeto, de ser amor. Acho que carinho, amor e cuidado precisam andar junto com liberdade. A liberdade de ser quem eu quiser. E quem quiser estar comigo e me dar carinho, esteja ao meu lado. Quem não quiser, pode ir”, compartilha.
Thays relaciona esse entendimento de como vivencia o amor à sua infância e as dinâmicas sociais em que cresceu. “Meus pais não me colocaram em caixinhas. Mas dentro do nosso contexto social, eu vivia numa prisão. Quando saí de casa, aos 18 anos, comecei a explorar a jovem mulher que há em mim.”
“Mesmo crescendo num ambiente de extrema violência e desigualdade, pois viemos de comunidades muito pobres, entendi que a violência pessoal era reflexo de uma violência social. Às vezes me pergunto como consegui ter tanto amor para dar, mesmo tendo crescido nesse cenário. Acho que isso veio da minha mãe: esse olhar mais amoroso para a vida”. Thays Gonçalves, 26, moradora de Guaianases.
A moradora da Zona Leste relaciona o afeto também na perspectiva do senso de comunidade. “Na região onde eu morava, eu criava projetos artísticos com apenas 13 anos. Queria fazer algum trabalho social. Já questionava, por exemplo, por que não havia uma quadra para a molecada jogar.”
Viajar, ler, ouvir música, ficar em silêncio sem fazer nada, são algumas formas que Thays encontra de cultivar o autoamor. “Escrevo para compreender minhas emoções, o que vivo, o que quero para o futuro. Quando estou com quem amo, gosto de um café da tarde. Essa é a forma de afeto mais gostosa. Comer um bolinho, tomar um café e conversar. Adoro fazer isso com minha mãe, dona Ivone”, conta.
Thays Gonçalves Menezes, 26, encontra nas viagens uma forma também de viver sua liberdade. Foto: Arquivo pessoal.
Ao mencionar sobre a construção do sentimento com outras pessoas, ela conta que já se casou duas vezes e que ao longo de suas relações passou a se questionar sobre os padrões afetivos impostos às mulheres, especialmente nas periferias.
“Quando estamos bem com a gente, temos autoestima e energia para retribuir o afeto e o amor de forma mais natural. Não com uma busca desesperada por receber de volta” – Thays Gonçalves, 26, moradora de Guaianases.
“Mesmo sendo muito gostoso dar e receber afeto em várias relações, eu diria: se ame mais e seja mais afetuosa com você. Porque, quando a gente se encontra e se cuida de verdade, não sai buscando migalhas para suprir o que falta. Fiz isso por muito tempo. Ainda estou nessa caminhada, tentando focar mais em mim, tenho muito que aprender, mas diria isso [de] ser afetuosa com você mesma. Cuide de você, da sua mente, estude, cuide do corpo, de tudo”, compartilha.
Amor enquanto ação
“Me lembro, na infância, que eu amava quando minhas irmãs deitavam no meu colo [para] ficar horas mexendo nos cabelos grandes e crespo delas. Isso é uma referência que eu sempre tenho de afeto”, relembra Onika Soares, 35, ao contar que cresceu em uma família que demonstrava amor através de ações, o que influenciou na sua forma de expressar o sentimento.
Moradora do bairro República, Onika cresceu junto de cinco irmãos e conta como percebia essa construção no seu cotidiano. “Lá em casa a minha mãe nunca foi muito afetiva, de fazer carinho, de falar muitas coisas. Mas ela sempre foi muito afetiva em ações. Então, fazia uma comida que a gente gostava. Sempre fazia alguma coisa pra agradar a gente, no sentido de ato de serviço mesmo”, compartilha.
Onika relaciona essa demonstração, a partir do seu contexto familiar, ao território e as dificuldades de famílias periféricas em manter uma presença emocional diante de inúmeras demandas cotidianas e exigências do trabalho, por exemplo, que muitas vezes impossibilita a presença física.
“Eu acredito que afeto pode ser uma palavra, pode ser uma ação, pode ser a forma como alguém te trata. Acho que existem várias coisas que podem representar o afeto, porém que vão em direção a você se sentir querido e valorizado. Além disso, admiração. [Pois] faz com que uma pessoa queira fazer coisas que façam você se sentir bem”, diz.
A dançarina destaca que foi a sua transição de gênero, iniciada aos 25 anos, um dos seus maiores atos de amor próprio. “Eu acho que, como qualquer pessoa negra ou criança negra que vivenciou o Brasil de antes, eu tinha minhas questões com o cabelo, houve momentos onde eu questionei o amor, minha estética… desde a adolescência, ali pelos 16 anos, eu já pensava em transicionar, só que sempre deixei isso em segundo plano, por conta da minha família. Minha família é extremamente conservadora. Fui deixando a minha vontade de lado durante quase 10 anos, até finalmente, começar a minha transição.”
“E quando eu comecei, vi que tudo estava fazendo sentido mesmo, sabe? Que, realmente, era aquilo que eu precisava colocar no mundo… Acho que esse foi o maior ato de amor que eu tive por mim. […] pessoas trans, geralmente, não vão ser desejadas, família nenhuma pensa que quer ter um filho ou filha trans. Então, no fim das contas, a nossa família não colocou a gente no mundo, né? Ela colocou outra pessoa, e esperam uma outra coisa. É uma expectativa. Uma idealização”, continua.
Assim como Thays, para Onika, amor e posse são coisas que não podem andar juntas. “Acho que o afeto, ele pode ser uma coisa profunda, mas pode ser também uma coisa mais superficial. Porque às vezes a gente tem afeto pelos nossos colegas de trabalho, por uma pessoa que não é tão próxima. No geral, ele vai nessa direção de fazer, de ser alguma ação que demonstre um apreço, um carinho, um cuidado.”
“A não-monogamia me ensinou muito sobre afeto e liberdade. Me mostrou que amar mais de uma pessoa não diminui o amor por ninguém. Que estar com alguém por escolha e não por obrigação ou exclusividade é muito mais potente. Mesmo sentindo ciúmes às vezes, e mesmo que a não-monogamia não tenha me [isentado] de algumas questões, ainda acho que ela me contempla.” Onika Soares, 35, poledancer, professora de dança e articuladora no Coletivo Travas da Sul.
Sobre os amores que a sustenta, menciona a arte como uma de suas bases. “Como artista e pessoa curiosa, estou sempre buscando conhecimento e me politizando. Esse olhar investigativo se estende para o campo afetivo também, fazendo a gente questionar o que sente e se reconstruir. Acredito que a arte ajuda a desconstruir o romantismo tóxico e a idealização nas relações, porque ela está sempre questionando normas e padrões, e isso leva a gente a se repensar internamente também”, afirma.
Amor como partilha
“Nós nos conhecemos olhando um para o outro, dando um sorriso, dizendo que a coisa estava bem boa e que podia ficar bem melhor. Eu morava em Exu, no Pernambuco, e ele também, mas Francisco veio do Ceará”, conta Expedita Maria de Morais, 89, enquanto ajeita Francisco Germano de Morais, 85, no sofá da sala. Moradores do Jd Arco-Íris, município de Diadema, São Paulo, o casal divide a vida há quase sete décadas.
Ela conta que três dias após se conhecerem, começaram a namorar. “Foi rápido, mas esse nosso amor vem de longe. Bem longe”, compartilha Expedita, que gosta de conversar, diferente de Francisco que é mais calado e inquieto, por conta do avanço do Alzheimer.
Com a trilha sonora de Luiz Gonzaga, artista que embalou a juventude do casal, tocando baixinho na rádio em Pernambuco, Dona Expedita compartilha que tudo começou com um sonho quase inexplicável. “Antes da gente se ver pela primeira vez, eu já tinha visto ele num sonho meu. Cheguei a ver ele todinho. No sonho vi que estava sentado, depois escrevendo e o resto já não me lembro mais”, relembra.
A aposentada conta que durante esse sonho, Francisco lhe entregou um bilhete e depois desapareceu. “Eu cheguei a sonhar ainda mais três vezes. Depois dessa terceira vez eu encontrei com ele e lembrei: é o rapaz do sonho. Dali pensei na gente ficar junto a vida inteira. Eu conheci a família dele no mesmo dia”. Pouco mais de um ano depois, o casal se casou, ainda em Pernambuco.
“Quando se ama assim, de verdade, o amor não termina, ele é o mesmo, mas a gente tem que ter paciência” – Dona Expedita Maria de Morais, 89, dona de casa, aposentada e moradora do Jd Arco-Íris, município de Diadema, São Paulo.
Respeito, admiração, presença, dedicação, cuidado e paciência são algumas características que Expedita cita na construção do amor quando pensado na perspectiva da relação com o outro. “Agora ele está nesse estado, doente, mas eu gosto dele, eu ainda o amo. Eu e ele vamos continuar até o fim da vida. Não sei quem vai primeiro, se é eu ou se é ele, mas enquanto eu não partir, enquanto Deus não me levar, nós estamos juntos”, conta.
Dona Expedita, assim como muitas mulheres que são a base do seu núcleo familiar, se preocupa com as dificuldades de todos ao seu redor e entende que existem diferentes formas, ritmos e configurações de afetos. Ela ressalta que toda ternura aparente de um casamento, por si só, não isenta das dores reais que existem. Isso inclui lidar com a rotina, com o envelhecer e as mudanças que o tempo provoca.
“Amo Francisco, mas [confesso] que quando ele começou [a piorar do Alzheimer], eu senti medo sim. Até hoje sinto. Ainda hoje sinto que é pesado pra gente estar aqui vivendo essa vida assim [com ele dependendo de mim e de outras pessoas]. A gente ainda está junto, mas não podemos estar só nós dois juntos como era no tempo que começamos [a nossa história]”, reflete Expedita sobre a influência do tempo e do Alzheimer nas construções de afeto enquanto casal.
Com 65 anos de relação, ela compartilha sobre as mudanças ao longo dos anos. “Aquele tempo da gente novo, nem se compara como é agora com a idade que temos, mas ainda assim a gente tem aquele prazer de estar os dois velhinhos juntos. De todo jeito, eu queria que ele pudesse andar, ficar bem para os dois juntinhos andar, dar um beijos, sair pra passear, nem que fosse aqui pela rua mesmo, só nós dois, porque era tão bom”, conta com tom de saudade.
Foi a partir de uma amizade em comum que se deu o encontro entre Gisele Vicente, 30, e Andressa Andrade, 30. Moradoras do Jardim Santo Antônio, no Capão Redondo, zona sul de São Paulo, que entendem o amor como uma escolha diária, mesmo diante dos desafios.
Entre um dia e outro, é no cuidado e no esforço de manter o vínculo que se reencontram. “Eu tenho feito esse trabalho de me auto analisar para não deixar o estresse cotidiano afetar a pessoa que eu estou. Porque, no fundo, ela não tem culpa. Ela é o meu lar. É a pessoa que eu tenho que trazer o afeto, ou buscar conforto. E não descarregar o estresse”, conta Andressa.
“A vida é de altos e baixos. Todo dia temos o hábito de falar como cada uma está se sentindo, dividir. Sou aquela pessoa mais de acolher, escuto, às vezes a gente só abre um vinho. Dessa forma, não deixamos com que o que pesa na relação faça a gente desistir. A rotina é puxada, [mas pra ela ser boa], ela precisa ser suave”, diz Gisele Vicente, 30, gerente operacional, moradora do Jd Santo Antônio, Capão Redondo, zona sul de São Paulo.
Juntas há um ano, a rotina e demandas do dia são questões que atravessam a construção desse laço, diz Andressa.“Duas horas e meia num transporte público lotado, as pessoas já estão tendo seu dia exaustivo e todo mundo vira meio egoísta nesse transporte. Você já chega em casa cansado, mal-humorado. Mas tenho feito um esforço de me observar mais, para não deixar o estresse do dia a dia afetar quem eu sou. Porque, no fim das contas, a pessoa que está comigo não tem culpa disso.”
Apesar das dificuldades, Andressa reforça que seguem escolhendo estar juntas e que para ela, o amor não é tudo. “Tem gente que se ama e não consegue ficar junto. Mesmo assim, o amor é um ponto de partida. Às vezes, duas pessoas estão juntas mesmo que tudo ao redor diga que não vai dar certo. Mas se ainda existe amor, existe uma chance”, reflete.
“Com certeza eu acho que falar [sobre afeto nas periferias] é revolucionário. Pensando como a Gisele de 15 anos, eu queria ter visto mais casais aqui [na periferia], queria ter partilhado essa vivência com pessoas próximas da nossa região, para as ter também como inspiração, referência”, coloca Gisele, que ressalta sobre a importância de falar sobre afeto na perspectiva de pessoas LGBTQIAPN+.
“No geral, quando existiam duas mulheres demonstrando afeto nas ruas, era um grande problema. É disso que estou falando, quando digo que não via [outras pessoas LGBT+]. Hoje a gente poder estar aqui e falar sobre isso é muito bom”, destaca.
Chegaram as festas juninas e julinas! É tempo de muita comida típica, brincadeiras e celebração. Em muitas escolas infantis, a programação inclui apresentações com as crianças caracterizadas de “caipirinhas” para a tradicional dança. Meninas com penteados de trancinhas e vestidos coloridos, meninos de calça, camisa e chapéu estilo cowboy.
Do jeitinho que a tradição pede: trancinhas no cabelo, chapeú e pintinha. Fotos – Juh na Várzea
Na quebrada, muitas ruas já começam a ganhar as famosas bandeirinhas penduradas como decoração. A galera sempre aposta naquela camisa xadrez, faz as famosas sardinhas no rosto… A Festa Junina é linda, cheia de tradição. Vem lá do interior, das comunidades rurais, da fé popular e da alegria da colheita.
Especialmente no Nordeste, ela se tornou uma celebração ligada à colheita do milho e à resistência da cultura popular. A figura do “caipira” representa o homem do interior, e por isso os trajes típicos fazem referência direta à zona rural.
Clima de festa na quebrada! Bandeirinhas no alto, cheiro de milho no ar e aquele som de forró misturado com funk. Fotos – Juh na Várzea
Então, vale a reflexão: quando a gente se veste de “caipira”, estamos celebrando uma cultura ou zombando dela?
A resposta pode estar na intenção, mas também no cuidado. É importante entender de onde vem essa tradição, valorizar quem vive essa realidade o ano inteiro, e não só no mês de junho, e, acima de tudo, respeitar.
Lembrando também o quanto essas festas movimentam empregos e geram renda para empreendedores autônomos. Na quebrada, sempre rolam as barraquinhas de venda, as danças e, claro, a fogueira. A galera vai no estilo: mistura xadrez com Nike, quadrilha com passinho… Muita tradição com identidade!
O que não falta é alegria e diversão, aquecendo os corações no frio de junho, com muito som, risada e aquele cheirinho bom de milho assado no ar.
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A partir da atuação da Biblioteca Becei e do Quilombo Seu Gustavo, o episódio aborda como a música, o teatro, a dança, a literatura e outras linguagens artísticas colaboram nos processos de aprendizagem e podem ser utilizados como prática pedagógica.