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Autores contam como é viver da arte na quebrada durante o Congresso de Escritores da Periferia

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Entre diversos problemas de acesso a direitos sociais básicos que os moradores da periferia enfrentam, podemos apontar a dificuldade de se viver de arte, seja com a escrita, a pintura ou qualquer outra forma dela. Esse debate ganhou força durante a segunda meda de discussões sobre novos autores, realizada no Congresso de Escritores da Periferia.

Autores discutem a produção literária independente das periferias (Foto: Ricardo Trindade)

A segunda roda de conversa do 4° Congresso de Escritores da Periferia abordou o tema “Contribuição dos saraus para o surgimento de novos autores”, mostrando como é a realidade e a forma de vida de quem produz arte na periferia. O debate contou com a participação de Marcio Ricardo, autor independente do Grajaú, do escritor e artista plástico Casulo e da poeta Carol Peixoto, integrante do coletivo Poetas Ambulantes.

Durante o debate, o poeta Marcio Ricardo resgatou a dificuldade de produzir as suas primeiras poesias ainda na infância, apontando a falta de confiança transmitida por familiares e pessoas próximas. “Quando criança, um colega foi mostrar uma poesia minha para uma professora e ela disse que eu não tinha capacidade de fazer aquilo, que tinha copiado, eu tinha nove anos”, relembra.

Ele conta que a primeira pessoa que ele sentiu confiança para mostrar as suas poesias foi à professora e escritora Maria Vilani, que dava aula para ele em um escola do Grajaú. “A primeira vez que eu fui mostrar minha poesia para alguém, foi com 18 anos, para a Vilani, de tanto que isso me travou”, afirma, citando que esse momento vivido na infância provocou alguns anseios e desconfortos em relação ao seu potencial para a escrita.
Já a poeta Carol, abordou os trajetos e tomadas de decisão que ela tomou para tentar vender sua produção. “Todo domingo eu ia para a Paulista, saía de casa às 8 horas, ficava até as 17 horas. Se tinha Bienal, eu ia e assim seguia, se tem FlLIP, faço divida e vou”, comenta a artista.

Os participantes contaram que a ajuda de outras inspirações foram fundamentais para seu início nesse ramo. Carol e Casulo citaram a Cooperifa como um estimulante artístico.

“Eu tinha muita poesia escrita antes de 2004, 2005, quando comecei a frequentar a Cooperifa, mas é aquela coisa né, eu gostava de falar para os amigos, vizinhos e parentes. Quando eu cheguei na Cooperifa, eu percebi que tinha um monte de gente que queria ouvir aquilo. Aí eu comecei a tirar as poesias manuscritas e ler lá, tremendo no microfone e as pessoas até gostavam. Mesmo assim, demorou 6 anos para eu publicar meu primeiro livro”, descreve Casulo.

Durante mais de uma hora e meia de roda de conversa, os autores concluíram que viver de arte tem seus desafios, mas é uma atividade importante para inspirar crianças, adultos e jovens com suas ações vivências.

“Há cinco anos atrás, um menino chegou até mim pedindo para que eu o adicionasse no Facebook e eu adicionei. Passou 20 minutos, eu fui para casa e lá estava ele me chamando. Na conversa, ele contou que só tinha um real e estava gravando o tempo de cinco em cinco minutos para poder falar comigo. Ele pediu para que eu lesse um versinho dele, eu li, e depois de elogiar, o menino prometeu que largaria a cocaína para fazer poesia igual a mim. Hoje, o mesmo menino trabalha na biblioteca com o irmão dele. É isso que a literatura faz nas quebradas”, conclui Marcio Ricardo.

Coletivos LGBTs usam arte para pautar direito à vida nas periferias

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O simples ato de circular pelas ruas, andando a pé, utilizando um aplicativo de mobilidade ou transporte público apresenta uma série de situações de conflito que envolve a população LGBT. Em paralelo, o surgimento de espaços culturais que promovem encontros afetivos e de entretenimento tem mostrado caminhos alternativos para resistir ao avanço da intolerância do preconceito de gênero e orientação sexual.

Perfomance no palco principal da boate Chimmus LBGT, no Capão Redondo. (Foto: Thais Siqueira )

Quem passa pela altura do número 5.170 da estrada de Itapecerica nas terças-feiras à noite, por volta das 23h30, não imagina que a Choperia Fortaleza, muito conhecida na região se transforma em uma balada LBGT neste dia da semana. A Chimmus Baile LGBT recebe em média 500 pessoas a cada edição.

Ela está dentro de um circuito cultural formado por mais quatro baladas voltadas para a comunidade LBGT nos territórios do Jardim Ângela, Jardim São Luis, Capão Redondo e Campo Limpo. Frequentado por pessoas de 16 a 35 anos, além de ser um ponto de encontro e diversão, o espaço está se consolidando como um lugar de afeto e formação política orgânica para o seu público.

“Para poder estar com os amigos, para escutar uma música, para poder beijar na boca e estar com os nosso parceiros, nós não precisamos atravessar a ponte para desenvolver alguma coisa. Aqui na nossa comunidade também é muito potente”, conta o bailarino e educador Thiago Silva, de 27 anos, morador do Jardim Ângela.

Assista a reportagem completa.

Ele criou em 2017 o projeto Quebrada Maquiada, iniciativa que trouxe para espaços públicos do território da M´Boi Mirim e do Capão Redondo intervenções artísticas protagonizadas por personagens da cultura drag queen.

“A arte Drag só é visível dentro de uma boate. É tudo muito marginalizado”, enfatiza Silva. Ele afirma que as pessoas ainda julgam de maneira muito preconceituosa o estilo de vida de uma drag. “Se você encontrar uma transformista drag andando na comunidade ou no centro, ela é sempre vista como prostituta. Más ela simplesmente está indo fazer a sua arte e o seu trabalho dentro de uma boate, que querendo ou não, na zona sul é potente.”

A experiência com o projeto foi tão positiva que ao final ele continuou fomentando essas atividades, por meio de apresentações de performances dentro das baladas, conectando diretamente o publico desses espaços com outras vertentes da arte LGBT.

A menos de dois quilômetros de distância da Chimmus Baile LGBT acontece o projeto Basquete & Autonomia, iniciativa articulada por um coletivo formado por jovens que são moradores do Capão Redondo, também na zona sul da cidade.

O projeto promove uma série de atividades que pautam a autoafirmação da pluralidade de gênero e orientação sexual, a partir do contato com o basquete, praticado de maneira emancipatória e libertária. “A gente tende a achar que somos muito sozinhos e quando você vê outros coletivos produzindo e fazendo coisas, o território também evolui e isso é muito importante”, aponta Fran Bandeiras, uma das criadoras do coletivo.

A jovem de 21 de anos argumenta que o projeto encontrou no basquete uma maneira de fazer essa discussão sobre quebras de estereótipos. “As nossas atividades tem esse trabalho de aproximar as pessoas para entender o que a gente é, porque essas discussões abrem mais o horizonte das pessoas que são preconceituosas.”

Do Capão a Pirituba: uma dimensão territorial da luta por direitos

Para quem pretende atravessar a cidade e sair do distritos do Capão Redondo, em direção ao distrito de Pirituba, localizado na zona noroeste de São Paulo, para conhecer outros movimentos de luta da comunidade LGBT das periferias vai percorrer uma média de 50 quilômetros utilizando transporte público ou carro particular.

E essa viagem vale muito a pena para conhecer a trajetória da rapper e produtora musical Luana Hansen, moradora de Pirituba. Envolvida no movimento hip hop há cerca de 20 anos, ela acumula uma série de vivências e histórias de luta que ilustram bem a vida de uma mulher negra, lésbica e periférica, que decidiu lutar pelo direito ao trabalho e renda em meio ao cenário machista do rap nacional.

“Eu só existo dentro do movimento hip hop porque eu criei o meu próprio estúdio. Eu tive que aprender a produzir, ser Dj, Mc e produtora musical, para eu ter a liberdade de gravar e falar o que eu quisesse e ter o direito de um dia existir”, desabafa a rapper.

Ela acredita que a sua postura foi determinante para quebrar o estigma machista dentro do movimento hip hop, que a impedia de ter ascensão em sua carreira. “Tudo o que eu fiz, a minha orientação sexual sempre esteve em destaque. Teve emprego que eu consegui através da minha orientação sexual e teve muitos outros que eu perdi através da minha orientação sexual. É muito bizarro isso.”

Dados desumanos sobre o direito de ir e vir na cidade

Enquanto pesquisas apontam que o Brasil é um dos países onde mais morre pessoas por questões de agressão motivadas pela sua orientação sexual e identidade de gênero, existem poucos dados que buscam mostrar as motivações culturais, sociais e políticas, que contribuem para que esse cenário continue a crescer.

A pesquisa “Viver em São Paulo: Diversidade” publicada em maio de 2018 pela Rede Nossa São Paulo, em parceria com o SESC e o Ibope traz um dado alarmante, no qual, 51% das pessoas entrevistadas disserem já ter presenciado situações de preconceito contra pessoas LGBTs.

Na mesma pesquisa, um dado chama ainda mais atenção para o alto nível de preconceito presente nas respostas dos entrevistados, pois 43% afirmaram ser contra pessoas do mesmo sexo demonstrar afeto, com beijos e abraços em locais públicos. Essa estatística reforça o constante aumento de agressões em locais públicos.

Para o articulador cultural Thiago Silva, nos últimos anos últimos anos houve uma espécie de transformação de comportamento das pessoas. Segundo ele, elas continuam preconceituosas, más passaram a aceitar a presença de gays, lésbicas e trans em determinados lugares.

Já a produtora musical, Luana Hansen, classifica essas pessoas como cidadãos que fazem o papel do politicamente correto. “As pessoas não chamavam mais ninguém de negro, de gordo, de veado, pois ficavam com medo de expor. Passado esse período do politicamente correto, a gente voltou a intolerância. Na verdade, a gente sempre foi tolerado. A gente nunca foi respeitado”, avalia.

O pesquisador Anderson Maciel, que também atua como educador e possui um trabalho de base importante com ações cultural desenvolvidas pelo Coletivo Cultural Sankofa, da zona leste de São Paulo, acredita que a arte tem um papel fundamental nas periferias para criar espaço de afeto e resistência política. “O trabalho nas bordas é importante. De norte a sul e de leste a oeste tem bastante grupos que já conseguem fortalecer essa questão de nos sentirmos acolhidos, bem recebidos, fortalecidos e representados culturalmente.”

De olho no atual momento político, o pesquisador destaca que haverá ainda mais luta. “Por mais que esse seja um governo bem difícil, a luta e a resistência vai ser ainda maior. Se construiu muito conhecimento, articulação e empoderamento com a população LBGT. Agora as pessoas vão colocar a mão na massa de verdade, mais do que já estavam fazendo antes.”

Esta reportagem faz parte do projeto #NoCentroDaPauta, uma realização dos coletivos Alma Preta, Casa no Meio do Mundo, Desenrola e Não me Enrola, Imargem, Historiorama, Periferia em Movimento e TV Grajaú, com patrocínio da Fundação Tide Setubal.

Cerca de 30 reportagens serão publicadas até o final de outubro com assuntos de interesses da população das periferias de São Paulo em ano eleitoral. Acompanhe os sites e as redes sociais dos coletivos e não perca nada!

Jovens da periferia querem plano de governo participativo

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Na zona sul de São Paulo, jovens interessados em um plano de governo participativo que os inclua nas tomadas de decisão sobre políticas públicas, já movimentam ações transformadoras em seus territórios.

Jardim Vera Cruz, zona sul de São Paulo (Foto: Flavinha Lopes)

Para jovens moradores dos distritos de Parelheiros, Campo Limpo, Capão Redondo e Jardim Ângela, regiões da cidade de São Paulo com alto índice de vulnerabilidade social, a transformação dos territórios periféricos depende da conquista de espaço para participação ativa da juventude nos ambientes de poder de esfera pública municipal, estadual e federal.

Um dos fenômenos sociais que possibilitam a construção deste cenário está na inserção desses jovens em projetos, coletivos e movimentos que abrem espaço de fala e participação, uma ferramenta política que vem envolvendo esses atores em debates sobre o “país e a cidade que queremos”, a partir da sua atuação nos territórios periféricos.

Assista a reportagem completa.

Governo participativo 

No Jardim Vera Cruz, território pertencente ao distrito do Jardim Ângela, o jovem Isaac Souza de 24 anos, um dos criadores do Núcleo de Jovens Políticos, aponta uma característica fundamental para os futuros governantes do país. “Qualquer candidato que queira se eleger e que tenha a pretensão de ser presidente precisa dialogar com a juventude. Por que o jovem não é o futuro. O jovem é o agora.”

A moradora do distrito do Campo Limpo Franciele Meireles, 25 anos, compartilha da mesma visão política do jovem Isaac. “O que a gente quer é um presidente que entenda que a participação dos jovens no plano de governo é importante”, enaltece ela, questionando o formato de fazer política pública no país. “Não tem como planejar alguma coisa pro jovem sem saber o que ele quer.”

Meireles convive em meio ao trabalho de coletivos culturais e agentes sociais que visam um diálogo com o poder púbico para melhorias no território. “Eu participo de algumas assembléias aqui no Campo Limpo, onde tem vários coletivos e representantes da prefeitura de São Paulo. É assim que eu participo, falando o que realmente necessito e o que eu acho que eles deveriam levar em consideração”, afirma.

Entre as diversas ações que mudaram pra melhor a vida de muitos moradores do bairro, Isaac relatou que a sua vocação para a participação política nasceu dentro do ambiente escolar, vindo a ganhar força no ensino médio para discutir as questões do bairro onde mora até hoje. Nesta mesma linha de valorização da educação, a jovem Gisele Matos, 25 anos, moradora do Capão Redondo, que atua como educadora numa organização social, reconhece que a participação política entrou na sua vida a partir do contato com a universidade.

“O ambiente universitário fez muita diferença na minha vida no sentido de me permitir a acompanhar as discussões que estavam sendo colocadas ali dentro da universidade e dentro do próprio movimento estudantil. Isso fez com que eu desenvolvesse um olhar diferente em relação ao lugar onde eu moro e convivo.”

O Capão Redondo está localizado entre os distrito do Jardim Ângela e Campo Limpo. O território possui mais de 260 mil habitantes, ambiente no qual Gisele consegue intervir encurtando a distância entre a educação popular e a juventude local.

 Info Território

Intrigado em investigar o cenário da participação política e a sua relação com a juventude periférica, a equipe de Jornalismo e Pesquisa do Desenrola E Não Me Enrola saiu às ruas de Parelheiros, Jardim Ângela, Capão Redondo e Campo Limpo, para entrevistar jovens com idade entre 16 e 25 anos. Essa iniciativa faz parte do programa de pesquisa Info Território, que atua na produção de dados sobre opinião pública, focando em revelar a identidade cultural dos moradores das periferias de São Paulo.

Mais de 80 jovens foram entrevistados. Um dos indicadores apontados pela pesquisa revelou que 71,3% deles têm interesse em participar das tomadas decisão sobre melhorias nos serviços sociais do seu bairro e cidade.

Para confrontar essa tendência de participação política, a pesquisa também abordou o formato de governo entendido por essa faixa etária como o mais ideal para o país. A resposta obtida mostra que 43,6% dos jovens querem um governo presidencial participativo. Já 31,9% preferem um presidente com boas propostas. Em meio a esses indicadores, um dado chama atenção para a descrença deles, pois 18,1% não acreditam nos políticos brasileiros. Apenas 6,4% dos entrevistados não souberam opinar.

Envolvida com diversas iniciativas que oferecem formação cultural e política à juventude periférica, a socióloga especializada em poder político, Anabela Gonçalves faz uma cronologia sobre a evolução do jovem na participação social. “Nos anos 90, a gente nunca poderia imaginar que jovens poderiam escrever sozinhos propostas políticas e desenvolver elas do começo ao fim, como a gente vê hoje, tanto no movimento cultural e em parte no movimento social”, relembra.

O projeto articulado pelo jovem Isaac, chamado Núcleo de Jovens Políticos é um exemplo claro dessas iniciativas citadas pela socióloga. “Nós não tínhamos nenhum equipamento de cultura, esporte e lazer. Ai nós pensamos numa pista de Skate e fizemos uma manifestação até a subprefeitura de M´Boi Mirim e aí nós conseguimos essa pista de Skate no Vera Cruz e outra pista no Vila Calu”, argumenta ele, enfatizando que essa conquista foi fruto da reivindicação da juventude do território, que pode ser ampliada para dois bairros.

Do outro lado da zona sul, mais precisamente no bairro do Colônia, no distrito de Parelheiros, o fazer político da juventude está presente dentro da biblioteca comunitária Caminhos da Leitura, lugar no qual, o jovem Bruninho Souza, 23 anos, atua como mediador de leitura, apresentando o mundo da literatura para os moradores do bairro.

Com um trabalho dedicado a trabalhar com grupos de leitura formado por moradores da região, Bruno reflete sobre a potência do jovem para a criação de soluções para os problemas do território. “Precisamos pensar em mecanismos de participação para que os jovens possam colocar a sua voz nesses espaços de decisão política. Esses espaços têm que acontecer dentro do território. A gente está se mobilizando aqui e falando destas questões, mas eles também têm que se mover, para sair do centro e vir para a quebrada.”

Esta reportagem faz parte do projeto #NoCentroDaPauta, uma realização dos coletivos Alma Preta, Casa no Meio do Mundo, Desenrola e Não me Enrola, Imargem, Historiorama, Periferia em Movimento e TV Grajaú, com patrocínio da Fundação Tide Setubal.

Cerca de 30 reportagens serão publicadas até o final de outubro com assuntos de interesses da população das periferias de São Paulo em ano eleitoral. Acompanhe os sites e as redes sociais dos coletivos e não perca nada!

Festival Percurso transforma praça do Campo Limpo em território de tradições africanas

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A partir do tema #omaiorterreirodomundo, Festival Percurso – De Jardim a Jardim propõe troca de saberes entre a ancestralidade e a nova geração de visionários das periferias de São Paulo. O evento ocupa a Praça do Campo Limpo com mais de 40 atividades gratuitas.

Apresentação do Maracatu Ouro do Congo (Foto: Léu Brito)

Entre os dias 8 e 9 de dezembro, a quinta edição do Festival Percurso, um dos maiores festivais de economia solidária das periferias de São Paulo chega a mais uma edição com a parceria firmada entre a associação C de Cultura e a Agência Popular Solano Trindade, que apoia o desenvolvimento da arte e negócios da periferia na Zona Sul da cidade.

Diante da sua atuação mais central, a C de Cultura, acredita que a parceria é um convite a um importante deslocamento, não apenas físico, mas também cultural, dos moradores dos centros urbanos da capital para as áreas periféricas da cidade.

Com mais de 40 atividades gratuitas na Praça do Campo Limpo, palco histórico de saraus, eventos literários e de artistas como Racionais MCs, Criolo, entre tantos outros, o festival propõe troca de saberes entre a ancestralidade e a nova geração de visionários que atuam em meios as adversidades dos territórios periféricos.

Todo esse intercâmbio estará concretizado em mais de 10 shows, entre eles os de Rincon Sapiência, Bia Ferreira, Tião Carvalho, Mãe Beth de Oxum, Curumin, De Jardim a Jardim e Xaxado Novo. Além dos shows, o festival contempla intervenções de dança e teatro,capoeira, afoxé, roda de samba, exposições de fotos e, principalmente, em encontros de gerações, origens e culturas diferentes.

Haverá desde a troca de experiências entre chefs de cozinha do centro, como Bel Coelho do Clandestino, e da periferia, como Tia Nice da Cozinha Criativa da Agência Solano à comitiva de povos de terreiro, indígenas e lideranças periféricas que estará reunida em rituais de fortalecimento, cura e troca de saberes.

Além disso, trajetórias inspiradoras de vida em relatos sobre negócios, propósitos, saúde mental ou juventude periférica, estarão na tenda do PERIFA Talks, a versão TED Talks com o tempero local que abre o pré-festival no sábado, a partir das 10 da manhã.

No domingo, a praça estará dividida em 9 grandes tendas ou atividades temáticas. O Percurso terá programação infantil completa com brincadeiras populares e antigas, além de roda de diálogos sobre a maternagem na Tenda dos Êres, por exemplo.

Já na Tenda das Yabás, dedicada às mulheres, haveráapresentação do Slam das Minas SP e, entre outras, atividades da União Popular de Mulheres, que já na década de 60, criou uma “tecnologia do encontro” capaz de implementar políticas públicas de incentivo ao empreendedorismo no bairro.

Tudo isso, ainda, fomentando a economia da região do Campo Limpo, Capão Redondo e arredores, com três feiras de empreendedores locais: uma de gastronomia, outra de agricultura familiar e a terceira de arte e artesanato.

Confira a programação completa no site www.festivalpercurso.com.br.

Agenda

Festival Percurso – De Jardim a Jardim

Local: CITA – Cantinho Integração de Todas as Artes

Data: 8 de dezembro

Horário: 12h às 22h

Local: Praça do Campo Limpo

Data: 9 de dezembro

Horário: 16h às 22h

Classificação: Livre

UniGraja celebra potencialidades do Grajaú com feira de produtores locais

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Depois de mais de 400 horas de vivências em seis asas curriculares alicerçadas em saberes locais, educadores e jovens participantes da Universidade Livre Grajaú promovem evento de encerramento no dia 09 de dezembro 

Com a proposta de apontar possibilidades de atuar como agentes de transformação social em um território onde vivem mais de 500 mil pessoas à margem da represa Billings, a UniGraja – Universidade Livre Grajaú encerra seu primeiro ciclo de formação com a Feira UniGraja.

O evento acontece no próximo domingo (09 de dezembro), no Parque Linear Cantinho do Céu, localizado às margens da represa Billings. Entre as 10h e as 19h, acontecem diversas atividades, como capoeira, oficina e passeio de bike, vivência náutica, rodas de conversa e uma feira com empreendedores locais. Para finalizar, artistas da região se apresentam em um sarau temático.

“Antes da UniGraja, eu não imaginava o tanto de conhecimento que o lugar em que vivo poderia me fornecer”, conta Gustavo Gonçalves, de 17 anos, que participou de vivências de graffiti, desenho, fotografia, vídeo, design e redação jornalística. “Com as vivências, captei muita coisa, me enchi de conhecimento e agora eu olho e cuido bem mais do lugar em que eu moro”.

Território de conhecimento

A Feira UniGraja marca o encerramento do primeiro ciclo de formação da UniGraja. Idealizada por coletivos e organizações socioculturais locais que fazem da quebrada uma sala de aula, entre agosto e novembro aconteceram mais de 400 horas de vivências em seis asas curriculares: Reconhecimento de Território, Hip Hop, Permacultura, Produção Cultural, Comunicação e Empreendedorismo.

Com cerca de meio milhão de habitantes, o Grajaú é o distrito mais populoso da cidade de São Paulo. Mais da metade da população é negra, tem até 29 anos e encontra-se em situação de vulnerabilidade social. Por outro lado, a região tem forte histórico de lutas populares e uma efervescência cultural movida por pelo menos 160 agentes culturais identificados.

As vivências da UniGraja mesclaram reflexão, ação e avaliação, e foram baseadas na experiência dos coletivos envolvidos e indicam algumas possibilidades que a rua oferece. A proposta é aproveitar os saberes e práticas acumulados por esses coletivos ao longo de anos e iniciar um processo de sistematização e construção de uma metodologia própria, horizontal, que aposta nas inteligências múltiplas de educadores e educandos.

A UniGraja é uma iniciativa da Associação Esporte Clube Vila Real (AECVR), Agência Cresce, Cooperpac, Ecoativa, Graja na Cena, Imargem, Meninos da Billings, Periferia em Movimento e Salve Selva. As atividades começam com apoio da Fundação Via Varejo por meio do programa Casas Bahia na Comunidade.

“Oprograma Casas Bahia na Comunidade é uma iniciativa da Fundação Via Varejo que tem o objetivo de fortalecer e articular atores socioambientais por meio de um trabalho rede, visando potencializar o impacto social positivo em suas comunidades”, explica Lilian Sturm, coordenadora de Investimento da Fundação Via Varejo. Iniciado em 2014, o programa está presente em sete localidades entre São Paulo e Rio de Janeiro. “O projeto UniGraja, da rede do Parque Cocaia no Grajaú, é uma proposta inovadora. A Fundação Via Varejo só tem a agradecer e parabenizar a todos os coletivos da rede por todo o empenho, sucesso e alcance do projeto”, completa.

Confira a programação completa.

Programação

10h – Vivência em Yoga / Campeonato de futebol

10h40 – Vivências náuticas com o coletivo Navegando nas Artes; Roda de conversa sobre sustentabilidade com a Cooperpac

11h40 – Oficina de turbante com Pam

12h40 – Discotecagem com os DJs Wedson e Phil

13h40 – Oficina de dancehall com Felipe Berní

14h40 – Vivências náuticas com Meninos da Billings

15h40 – Apresentação musical – Laís

16h40 – Apresentação musical – Mmoneis

17h40 – Entrega de certificados – UniGraja

18h30 – Discotecagem UniGraja

Ao longo do evento: exposição com barracas de empreendedores.

Representatividade do slam e das batalhas de rima inspira autoafirmação da juventude periférica

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Mediado pelo escritor Emerson Alcalde, o debate “Slam e Batalhas de Rima – Narrativas da juventude periférica”, com participação da slammer Kimani e o rapper Luis França, trouxe importantes discussões para a quarta edição do Congresso Escritores da Periferia, abordando a literatura como instrumento de autoafirmação e identidade dos jovens. 

Mesa formada por artistas do movimento do movimento do slam e de batalhas de rima. (Foto: Daniel Brasil)

A ocupação de espaços públicos com manifestações culturais articuladas por jovens dentro de seus territórios vem trazendo um legado de autoafirmação e entendimento da sua identidade, ao colocar em pauta discussões como gênero e racismo. 

Questões como essa apareceram no segundo debate do Congresso de Escritores da Periferia, realizado neste sábado (24/11/2018), no Centro de Mídia M´Boi Mirim, localizado no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo.

As vivências da slammer Kimani, do rapper Luiz França e do escritor Emerson Alcalde, marcaram a terceira e última mesa do 4°Congresso de escritores da periferia, organizado pelo coletivo Desenrola e Não me Enrola no Centro de Mídia M’Boi Mirim, trouxe como tema “Slam e Batalhas de Rima – Narrativas da juventude periférica”.

Com o amplo processo de apagamento histórico, silenciamento e invisibilidade cultural, pela qual a juventude periférica passa cotidianamente, se torna cada vez mais comum a perda de suas identidades, o que tem como consequência a busca por padrões de beleza e de vida normativos, impostos pela sociedade do consumo.

Como forma de transgressão social, esses jovens criam dentro de si uma grande necessidade de serem ouvidos e vistos e nesse sentido, os saraus, slams e as batalhas de rima se tornam espaços de visibilidade, encontro e transformação social.

Tais espaços acabam por promover o acolhimento destes jovens que, distribuídos em roda, dividem suas realidades e angústias de forma coletiva, entrando em contato com suas próprias identidades e ganhando visibilidade.

“Na cena do slam eu consegui me descobrir, me entender como mulher negra, e não mais moreninha, entrei em contato comigo mesma, agora consigo transformar minhas dores em poesia”

conta a poeta Kimani.

Os slams começam em Chicago nos anos 80 como uma brincadeira de dar notas às poesias e logo se expandiram pelo mundo, chegando ao Brasil em 2008 com o Zap Slam. “Tanto as batalhas quanto o slam ou sarau estão dentro do hip hop, são falas políticas e sociais, de quem vive a quebrada”, argumenta a poeta Kimani.

Esses espaços são marcados pelo embate político e, por serem organizados em territórios que têm uma grande ausência de políticas públicas, os moradores articulam sua própria cultura e meios de discutir política: “o slam da Guilhermina é na rua, em si é um evento político, nós desde a fundação temos a nossa bandeira vermelha. Deixamos claro um posicionamento político do lado da esquerda e de enfrentamento ao fascismo”, argumenta Emerson Alcalde, poeta e organizador do Slam da Guilhermina, na Zona Leste da cidade de São Paulo.

A marcante presença de adolescentes e moradores nesses espaços de fala e visibilidade demonstra o impacto e a transformação social causada pela articulação dos jovens nos territórios. Com poucos espaços de cultura e lazer nos bairros periféricos, se torna ainda mais legítima a ocupação de ruas e praças transformando a quebrada, como conta Luiz França, organizador da Batalha do Bambuzal.

“A melhor coisa é ver todo mundo reunido na praça, meus amigos, minha família, as tia que vende doce na quebrada, todo mundo aparece, e organizamos as batalhas para todos terem voz, e conseguir passar sua mensagem.”

aponta Luiz França.

Com a forte demanda de construção ou criação de espaços de cultura nas periferias, se torna essencial na vida dos jovens a existência de saraus, slams e batalhas de rima, pois assim se constituem como espaços de visibilidade, representatividade e reconhecimento de suas identidades, acarretando também uma descentralização da produção cultural e surgimento de artistas de várias linguagens dentro das periferias.

Política e Religião: jovens da periferia questionam a representatividade da bancada religiosa

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Com o crescimento das bancadas políticas que impactam em vários setores da sociedade, o debate sobre os valores e morais propagados pelas frentes parlamentares se faz necessário para entender quem de fato eles representam.

Historicamente, política e religião são âmbitos que formataram grande parte da sociedade atual. Durante muitos séculos a igreja e a monarquia formavam uma só estrutura. Ainda hoje, mesmo após a separação Igreja-Estado, é possível identificar claramente a interferência desses dois temas em pautas importantes como gênero, raça e classe.

Mesmo ainda sendo um país com 64% da população católica – a maior nação católica do mundo, o Censo Demográfico de 2010, mostra o crescimento da diversidade dos grupos religiosos no Brasil ao longo dos anos, principalmente o crescimento da população evangélica que passou de 15,4% em 2000 para 22,2% em 2010, sendo que a cidade de São Paulo concentra o maior número de evangélicos que qualquer outra cidade do Brasil, com 2,3 milhões. Os seguidores da umbanda e do candomblé permaneceram em 0,3% em 2010.

A partir deste cenário, jovens das periferias de São Paulo, entendendo a importância da construção de um parlamento que de fato trabalhe e desenvolva ações que dialoguem com as reais necessidades e demandas da população, principalmente nas periferias, contam como enxergam o cenário político no qual tem sido pautado por políticos diretamente ligados a correntes religiosas.

Assista a primera parte da reportagem especial do Desenrola E Não Me Enrola. 

Representatividade para quem? 

Para o jovem estudante Alessandro Akim, 17, candomblecista e morador do Jardim Jacira, região sul de São Paulo, a sua religião é fundamental na construção de sua identidade como jovem, negro e morador da periferia. “Estar no candomblé, cultuar a religião que meus ancestrais cultuavam na África, poder resgatar aquilo que foi roubado, para mim isso representa muito.”

A hierarquização e a presença massiva especialmente do catolicismo nas estruturas do país, trouxe diversas consequências, principalmente para as religiões de matrizes africanas que hoje buscam espaço em um ambiente político marcado pelo conservadorismo.

Rayane Braga, 18, moradora do Jardim Ângela, é católica e acredita que mesmo sendo cristã é preciso manter um pensamento inovador dentro de sua doutrina como jovem e periférica. “Mesmo a igreja católica tendo um pensamento um pouco mais antigo e ideológico, trago sempre um pensamento de inovação, feminismo e emponderamento dentro da religião. ”

Indo além dos aspectos intangíveis das religiões, os jovens notam que ela também esta diretamente ligada com o fazer político, e que essa associação pode ser extremamente favorável para os interesses pessoais dos parlamentares.

A musicoterapeuta e estudante de pedagogia, Estela Cândido, 25, que é evangélica protestante e residente do bairro Vila Natal, pertencente ao distrito do Grajaú, a igreja é um ambiente de grande desafio, mas ao mesmo tempo um espaço onde pode promover ações nas quais acredita, inclusive política. “Eu acredito nos processos formativos de conscientização. Gostaria de citar, por exemplo, o Fast Food da Política. Lá eu percebi como eu, sendo uma civil, posso influenciar na política, e quando eu percebo algumas influências religiosas tentando ditar o voto dos fiéis, acho isso frustrante.”

Assim como Akim que relata não se sentir retratado pela bancada religiosa presente hoje no contexto político, Estela acredita que as bancadas não representam a maioria: “O preconceito religioso está sim inserido na bancada evangélica, uma bancada que não representa a maioria, porque existe uma dificuldade em coexistir na diferença”, conta a jovem.

Segundo o Cientista da Religião, Felipe dos Anjos, quando representações de doutrinas religiosas como Silas Malafaia, Marco Feliciano e Eduardo Cunha, vêm a público dizendo que refletem a igreja, é apenas mais uma tentativa de capitalizar representação: “Esses sujeitos religiosos ocupam o centro do poder, e nesse centro eles tem dinheiro, mídia e visibilidade. Dali eles inventam e discursam o que eles querem, fazendo parecer que são representativos. Quando a gente foca nesse centro do poder, a gente não perceber que nas periferias, não existe essa representatividade.”.

A partir do posicionamento político dos jovens e da opinião de um especialista cientista em religião e política, para além dos discursos que não estão alinhados com as demandas reais da população, a ligação entre esses dois campos coloca em jogo o andamento de pautas fundamentais que interferem diretamente a vida de milhões de pessoas nas periferias, territórios vulneráveis que demandam urgentemente por políticas públicas eficazes e plurais.

*Esta reportagem faz parte do projeto #NoCentroDaPauta, uma realização dos coletivos Alma Preta, Casa no Meio do Mundo, Desenrola e Não me Enrola, Imargem, Historiorama, Periferia em Movimento e TV Grajaú, com patrocínio da Fundação Tide Setubal.

Cerca de 30 reportagens serão publicadas até o final de outubro com assuntos de interesses da população das periferias de São Paulo em ano eleitoral. Acompanhe os sites e as redes sociais dos coletivos e não perca nada!

Os caminhos de jovens das periferias até a universidade

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Se preparar para o vestibular é apenas um dos passos que o jovem dá em busca de uma vaga no ensino superior. No meio desse trajeto, ele ainda precisa lidar com a escassez de políticas públicas de educação, além de problemas que impactam a sua saúde mental e física.

Feira das Profissões do Cursinho Popular Carolina de Jesus (Foto: Thais Siqueira)

A educação pública está entre as áreas que mais vem sofrendo com a falta de investimentos públicos. Em 2018, por exemplo, o orçamento para novos investimentos no Ministério da Educação, teve uma redução de 32% em relação a 2017. O valor destinado para investimento em 2017 foi de R$ 6,6 bilhões, enquanto no ano de 2018 foi de apenas R$ 4,52 bilhões.

Esse cenário de sucateamento atinge um público especifico: jovens, negros e principalmente a população de baixa renda, que na pratica, é quem mais utiliza e precisa acessar serviços públicos educacionais de qualidade.

No entanto, quando abordamos sobre o ingresso da juventude periférica nas universidades, precisamos refletir sobre o processo que esse jovem passa durante o período de formação escolar, tendo em vista alguns fatores que influenciam diretamente no desenvolvimento desses indivíduos, como o desgaste psicológico, emocional e físico.

Para entender a fundo como esse contexto social está em curso nas periferias, conhecemos a história de três jovens que percorreram diferentes caminhos em busca do acesso à universidade. Os estudantes Pedro Fernandes, Larissa Rodrigues e Ana Carolina, contam como se dá esse processo desde o desgaste psicológico, até a busca e uso de métodos alternativos à educação pública.

Assista a reportagem completa do projeto #NoCentrodaPauta 

O sucateamento do ensino médio 

Antes mesmo de pensar no ensino superior, a educação pública básica já não oferece recursos suficientes para o desenvolvimento completo desses estudantes. Segundo os dados apresentados recentemente pelo Ministério da Educação nenhum estado brasileiro atingiu a meta do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2017 no ensino médio.

Nas escolas publicadas estaduais de São Paulo, a meta de desenvolvimento do ensino médio não é alcançada desde 2013, conforme revela a pesquisa anual realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Para o coordenador pedagógico, Rafael Cícero, o estado precisa fazer o contrário do que tem feito hoje: “ao invés de sucatear, deveriam aumentar significativamente os investimentos, de modo a ter uma educação básica de maior qualidade, que consiga ser universalista.”

Ele chama atenção para o perfil do público prejudicado pela decadência causado pelo governo no ensino público. “Quem estuda na escola pública na sua maioria são jovens periféricos. Não avançar nesse cenário, impacta diretamente a vida dessa população.”

A estudante Ana Carolina, 19, moradora do Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo, conta que não houve base suficiente em seu ensino fundamental e médio que a preparasse para o ensino superior. “No fundo eu acho que a escola ela não te prepara para o vestibular, ela te desprepara, te desmotiva. O desgaste psíquico de passar pelo processo da escola pública é muito desgastante.”

Para além do contexto da educação básica, quando entramos na conjuntura do ensino superior, o cenário não é nada animador. Com a aprovação da Emenda Constitucional 95 – PEC dos gastos, que limita os gastos públicos à variação da inflação por 20 anos, aumentam as barreiras sociais na educação a partir das reduções de bolsas, burocratização e enxugamento de vagas para acesso a programas como Fies e Prouni, fora a falta de verbas para a manutenção das estruturas educacionais e programas de pesquisa.

Ingressar no ensino superior não é a única preocupação desse jovem. A última pesquisa do Censo da Educação Superior, mostra que somente em 2016, 30% dos alunos matriculados em instituições públicas e privadas tiveram que deixar seus cursos, o que equivale a 3,4 milhões de universitários.

Quando se trata do jovem que vem das periferias, a preocupação aumenta. “Muitos jovens da periferia até conseguem chegar nas universidades, porém, muitos não conseguem se manter, porque nessa redução, a assistência estudantil é uma das áreas que está sofrendo. Então você tem menos alunos podendo morar em repúblicas, morar nas próprias instituições”, relata o coordenador Rafael sobre os impactos desses cortes para os jovens periféricos que conseguiram ingressar nas universidades.

Educação popular como estratégia de cuidado 

Frente a essa conjuntura, muitos jovens procuram formas alternativas para percorrer o caminho até o ensino superior. Uma das possibilidades são os cursinhos populares que vem gerando grandes impactos não só na difusão de conteúdos teóricos, mas também na construção de um olhar crítico sobre as demandas sociais.

O coordenador pedagógico da Rede de Cursinhos Ubuntu, Rafael Cícero, contextualiza a importância de experiencias com a educação popular nas periferias. “Faz tempo que a periferia é um polo de resistência. Temos muitos cursinhos nas periferias fazendo esse enfrentamento e defendendo a democratização do acesso à universidade. Elas estão ali no campo do que chamamos de educação popular, e essa educação é uma defesa, uma luta de emancipação da classe trabalhadora.”

“Muito mais do que ser um espaço conteudista, de simplesmente debater assuntos dos currículos escolares, essas experiências também são na sua maioria experiências de formação de cidadãos, de jovens críticos, de jovens com olhar mais amplo para sociedade. Elas ajudam nesse campo de cidadania, no sentido de reconhecimento, pertencimento”, conta o coordenador sobre como agentes das periferias vem buscando alternativas frente ao sucateamento do ensino público.

Residente do bairro João XXIII, zona oeste de São Paulo, o estudante Pedro Fernandes, 21, um dos articuladores na criação do Cursinho Livre Cláudia Silva Ferreira, conta que a partir do programa de formação também é necessário questionar a importância de ocupar esses espaços acadêmicos. “Entender que o vestibular, a faculdade, é uma ocupação de espaço, como uma pessoa pobre e talvez a primeira da família a entrar na universidade.”

Junto com a dificuldade de acesso, os desgastes psicológicos que acompanham esses estudantes, faz com que muitos desenvolvam traumas e barreiras mentais que afetam inclusive suas relações com a família e amigos.

“A saúde mental de estudantes que são da periféria e pessoas que estudam no Dante Alighieri, é totalmente diferente. Eu cheguei aqui atrasado porque eu estava trabalhando, por exemplo”, compartilha o estudante Pedro.

O psicólogo Ricardo Cavalcante ressalta que os processos psíquicos desses jovens são diferentes: “o jovem burguês está naquele momento só estudando, só se preocupando com isso. O jovem da periferia além de se preocupar com estudo, tem que se preocupar em cuidar do irmão mais novo, tem que se preocupar em ajudar em casa, por exemplo. Então os desgastes emocionais vão nesse sentido.”

*Esta reportagem faz parte do projeto #NoCentroDaPauta, uma realização dos coletivos Alma Preta, Casa no Meio do Mundo, Desenrola e Não me Enrola, Imargem, Historiorama, Periferia em Movimento e TV Grajaú, com patrocínio da Fundação Tide Setubal.

Cerca de 30 reportagens serão publicadas até o final de outubro com assuntos de interesses da população das periferias de São Paulo em ano eleitoral. Acompanhe os sites e as redes sociais dos coletivos e não perca nada!

Literatura Negra e periférica é tema de encontro na zona oeste de São Paulo

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Sarau Elo da Corrente recebe a escritora Jenyffer Nascimento, nesta terça-feira (25).

Sarau Elo da Corrente (Foto: Divulgação)

Ainda precisamos falar sobre isso. Em agosto, a Academia Brasileira de Letras (ABL) frustrou as expectativas de quem esperava pela posse da escritora mineira Conceição Evaristo. Ela seria a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na entidade literária, fundada em 1897. O episódio fomentou ainda mais a necessidade do debate sobre os saberes, identidades e desafios das escritas das mulheres negras e das periferias.

Pernambucana de nascença e paulistana de vivência, a escritora Jenyffer Nascimento traz um pouco deste debate na atividade Roda de Saberes e Identidades, do Circuito Literário nas Periferias, que acontece na próxima terça-feira (25), no CEU Vila Atlântica, no Jaraguá, Zona Noroeste de São Paulo (SP).

“Falar da importância da literatura negra e periférica é de pensar na contribuição para preencher uma lacuna na história mal contada de nosso país. É ocupar um lugar de disputa, quando sempre ousaram nos manter invisíveis. Quiseram apagar nossa existência e a força de nossos escritos. Por isso, fomentar, discutir e difundir a literatura produzida por pessoas negras, sobretudo mulheres, e muitas delas oriundas de periferias, é libertador tanto para quem escreve quanto para quem lê”, comenta Nascimento.

Se a discussão é potente, a escolha particular do público é essencial. O Circuito Literário nas Periferias tem como foco os bairros distantes do centro da capital e tem como um de seus parceiros o Coletivo Elo da Corrente, que atua há mais de 10 anos na Zona Oeste da cidade.

Integrante do coletivo, a escritora Raquel Almeida fará a mediação da atividade. Ela enfatiza o valor da atuação dentro do território onde formou-se. “Eu vejo como um retorno ao lugar que eu cresci e aprendi a sobreviver. O Elo da Corrente sempre almejou estar em espaços de ensino como um apoio. Também tivemos a sorte de ter uma leva de professores e coordenadores comprometidos, o que possibilitou a nossa atuação em conjunto. É importante agir coletivamente com a escola por uma educação mais abrangente”, diz.

Sarau Elo da Corrente: Roda de Saberes e Identidade

Circuito Literário nas Periferias

Terça-feira (25) às 14 horas

CEU Vila Atlântica | Rua Cel. José Venâncio Dias, 840 – Jaraguá – São Paulo (SP)

Sobre Jenyffer Nascimento

Pernambucana de nascença e paulistana periférica de vivência, Jenyffer Nascimento é escritora. Na adolescência foi fisgada pelo hip-hop, começou a escrever letras de rap e foi integrante do grupo de feminino “Minas do Subúrbio”. Mais adiante, encontrou na cena dos saraus da Zona Sul de São Paulo, a força histórica, cultural e artística de expressão de um povo. Assim se junta aos seus e timidamente volta a escrever. Em 2013 publicou pela primeira vez seus escritos participando da Antologia do Sarau do Binho. Em seguida, participou do livro Pretextos de Mulheres Negras. Um ano depois publicou seu primeiro livro autoral “Terra Fértil” pelo Coletivo MJIBA. Atualmente é educadora, poeta, mãe e articuladora cultural. Colabora na Revista Amazonas e no coletivo Periferia Segue Sangrando.

Sarau Elo da Corrente

O Coletivo Elo da Corrente realiza encontros mensais desde 2007. Seu eixo de atuação é a produção, fomento e difusão da cultura de periferia, negra e nordestina.
O sarau mensal tem o intuito de incentivar a leitura, recitar poesias e valorizar a arte e cultura da periferia paulistana.

O coletivo também mantém uma biblioteca comunitária, um espetáculo de poesia falada, um blog e uma editora independente, a Elo da Corrente Edições, que publica obras de artistas parceiros.
Suas atividades acontecem no Bar do Santista –Rua Jurubim, 788-A – Pirituba (Zona Oeste). A entrada é livre.

http://elo-da-corrente.blogspot.com/

FELIZS chega a quarta edição com a participação de artistas de várias regiões do Brasil

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Entre 10 e 22 de setembro, a Feira Literária da Zona Sul (FELIZS) ocupa equipamentos de cultura eeducação,localizados nos distritos de Campo Limpo, Capão Redondo, Jardim São Luis e Jardim Ângela, ambos na zona sul da cidade.

Tenda Literária da Feira Literária da Zona Sul (Foto: João Cláudio de Sena)

Com apresentações de dança, música e poesia, o Sarau do Binho abre a quarta edição da Feira Literatura da Zona Sul (FELIZS) na noite de segunda-feira (10), às 20h, no espaço do Teatro Clariô, localizado na divisa de Taboão da Serra com São Paulo, na zona sul da cidade. O tradicional encontro poético celebra a importância do movimentoliterário nas periferias paulistanas, para fomentar o surgimento de novos autores, selos editoriais e o crescente número de consumidores de arte.

A FELIZS é uma iniciativa de produtores culturais e artistas que fazem parte do Sarau do Binho, um dos movimentos artísticos precursores da cultura dos saraus na zona sul da cidade. “Nós queremos mostrar para a cidade o quanto se produz de arte e cultura nos distritos do Campo Limpo, Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luis, territórios que são potências em produção literária em São Paulo”, afirma Diane Padial, enfatizando o nome dos territórios que serão contemplados com atividades da feira literária.

Para mostrar a ligação da feira literária com espaços de cultura e educação nas periferias, naterça-feira (11), um grupo de articuladores culturais promove uma Caminhada Literária pelas ruas do Campo Limpo. “Essa vivência irá mostrar às pessoas lugares marcantes no território, onde a literatura e a arte fazem parte do cotidiano dos moradores”, diz Suzi Soares, produtora cultural e integrante do Sarau do Binho.

Ela reforça que boa parte do público da feira literária são jovens estudantes e professores. “Cerca de 50% dos espaços por onde as atividades da FELIZS irão passar, são escolas municipais ou bibliotecas públicas, e isso revela uma característica da feira, em engajar e aproximar jovens do universo do livro e da leitura.”

Segundo Padial, essa edição da FELIZS tem uma programação pensada para reunir autores de diversas cidades brasileiras. “O Sarau “Poesia de Todo Canto”, iniciativa que conta com participações de artistas que residem nas cidades de: Itabuna na Bahia, Itacoã em Roraima, Natal no Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Alto Solimões, um município do Amazonas, representa bem essa proposta da FELIZS”, explica a produtora, ressaltando que o tema da feira traz a provocação “De Onde Você Vem?”, como forma de conectar diferentes autores e vivências com o fazer literário.

Outro destaque na programação da feira literária são as exibições e debates sobre filmes no estilo de curta-metragem e documentários, produzidos por cineastas das periferias. “Precisamos abrir cada vez mais espaço para discussões que perpassam a literatura e o cinema, pois as bordas da cidade revelam cada vez mais profissionais com talento e sensibilidade, paracontar histórias de grupos e pessoas que se dedicam a mudar a sua vidae a de outras pessoas, por meio da arte. E a Felizs está valorizando isso”, destaca Suzi, abordando a importância do audiovisual e a sua conexão com a literatura.

Ao longo da programação da FELIZS, o público poderáparticipar ativamente de encontros com grandes autores que atuam dentro e fora das periferias. O escritor e professor Milton Hatoum está entre eles, bem como a escritora feminista Jenyffer Nascimento, autora da obra Terra Fértil. “Ao longo da FELIZS haverá muitas conversas com autores, justamente para aproximar o público do processo de criação das obras e da identidade artística de cada autor”, reforça Suzi.

Questões de raça e gênero não ficam de fora da programação. Neste contexto, a professora Diva Guimarães, personagem que ganhou projeção nacional durante a FLIP, em 2017 surge ao lado da poeta e doutora em estudos da tradução, Tatiana Nascimento para um bate papo sobre mulheres negras,diáspora e emancipação.

O encerramento da FELIZS acontece no sábado (22) na Praça do Campo Limpo, na zona sul de São Paulo, local aonde moradores, artistas, autores e editoras independentes ocupam o espaço público para interagir com a programação da feira literária, que este ano traz uma série de shows especiais, entre eles o cantor Chico César, o compositor Marcelo Jeneci e o grupo de batuqueiros e compositores Samba da Vela.

Moeda Literária e o fomento a publicações independentes

Além de conectar moradores das periferias de São Paulo com autores de diversas regiões do país, a FELIZS coloca em prática a utilização da “moeda literária”, iniciativa que visa fomentar o consumo de livros publicados por autores e selos independentes. “Vamos ativar a circulação desta moeda, com o objetivo de movimentar o comércio de livros na Praça do Campo Limpo, local onde será realizada uma grande feira com tendas para autores e editores no dia 22 de setembro, data de encerramento da feira”, conta Padial.

Ela lembra que nesta edição da FELIZS o selo editorial Sarau do Binho irá apoiar o lançamento de obras de alguns autores da periferia. “Em 2017, o selo editorial estreou na Felizs com a publicação de quatros livros. Para este ano, vamos manter esse número, lançando mais quatro, para fortalecer a entrada desses autores no mercado do livro.”

Os livros “Desassossego” de Ermi Panzo, “Do verbo que o amor não presta” de Helena Silvestre, “Vértices Poéticas” de Zá Lacerda e a “A festa da palavra na arte do encontro – Das Noites da vela ao Coletivo Sarau do Binho” de Diego Elias, estão entre os títulos selecionados para serem lançados durante a feira livros na Praça do Campo Limpo, no encerramento da feira literária. “Vamos unir o lançamento da moeda com a publicação de obras independentes. Desta forma, a Feira Literária da zona sul contribui diretamente com o fortalecimento da produção literária na periferia, incentivando o contato de moradores das periferias com obras de autores independentes”, finaliza.

Confira aqui a programação completa da Feira Literária da Zona Sul.