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Internet Solidária: campanha incentiva moradores de Ermelino Matarazzo a compartilhar wi-fi com vizinhos

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Tecnologias de sobrevivência são construídas cotidianamente nas periferias. Mas como se proteger da pandemia de coronavírus se parte dos moradores dos territórios periféricos não têm acesso ao mundo digital? Diante deste dilema, agentes culturais que fazem parte da Ocupação Cultural Mateus Santos, localizada em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, criaram uma campanha focada em democratizar o acesso a internet, entretenimento e informação aos moradores do território que não tem condições de contratar o serviço. 

Projeção da campanha ‘Fiqueemcasa’ promovida pelos coletivos da Ocupação Cultural Mateus Santos (Foto: Movimento Cultural Ermelino Matarazzo)

Neste momento onde o governo pede para que as pessoas fiquem em casa, solicite o auxílio emergencial por meio de sites e aplicativos, realize o estudo à distância por meio de plataformas Ead, o acesso a internet se torna um item essencial para garantir o direito à vida.

Uma proposta para reduzir os impactos desta dura realidade na vida de muitos moradores de Ermelino Matarazzo foi a criação da campanha ‘Internet Solidária’, na qual, agentes culturais e artistas que fazem parte da Ocupação Cultural Mateus Santos, irão realizar uma série de transmissões ao vivo com shows de artistas locais, para mobilizar moradores da região a tomar a importante decisão de compartilhar sua internet com vizinhos que não tem como contratar o serviço, devido a crise econômica que afeta principalmente a população periférica.

“Nesse momento é crucial tanto para acesso às informações, quanto para diminuir os efeitos do isolamento social, podendo ter acesso a lazer e também ao estudo, que são direitos básicos da população”, afirma Gustavo Soares, um dos articuladores culturais da Ocupação Cultural Ermelino Matarazzo, um espaço cultural independente gerido por coletivos artísticos e culturais que atuam nas periferias da zona leste de São Paulo.

A partir do dia 20 de março, a ocupação cultural suspendeu todas as suas atividades por tempo indeterminado, devido ao reconhecimento do protocolo de segurança do estado de calamidade pública, divulgado pela Prefeitura de São Paulo, decorrente da pandemia do novo coronavírus. Mas com muitas demandas de moradores em estado de alta vulnerabilidade social a região, o espaço se tornou uma referência de articulação comunitária, promovendo campanhas de doação de kits de higiene e organizando lives com artistas locais. 

Uma dessas campanhas é a ‘Internet Solidária’, iniciativa que procura diminuir os efeitos do isolamento social, motivando os moradores do bairro a criar seus próprios pontos de acesso à internet. “Tem mó galera que às vezes sai de casa para vim pra frente da ocupação, pra usar nossa internet, porque nossa internet é aberta”, explica Soares, enfatizando que a campanha está sendo uma forma de levar internet a mais pessoas no bairro.

Ele também explica que essa solução surgiu com a proposta de reduzir os impactos da pandemia no território. “Essa foi uma forma que a gente conseguiu pensar para diminuir tantos os efeitos da galera não precisar sair de casa, pra ir até algum ponto que tem internet livre , e ao mesmo tempo se manter em casa pra ter opções né, e assim manter a sanidade”, complementa o articulador cultural.”

A campanha a funciona da seguinte forma: o morador coloca o nome da rede wi-fi de ‘Fiqueemcasa’ e e muda a senha para ‘Fiqueemcasa’, criando uma rede de colaboração entre os próprios moradores e possibilitando o acesso á internet para o maior número de pessoas. Soares conta que a praça de wi-fi livre mais próximo do bairro está situada na Praça Giovanni Fiani, no bairro Ponte Rasa, localizado a 3 km da ocupação cultural.

Os articuladores culturais pensaram em um impacto que vai muito além da campanha, pois eles têm o intuito de fazer com que as pessoas façam parte dessa rede de mobilização e se conscientize do atual momento em que estamos vivendo. “A gente tá fazendo uma série de ações, que em conjunto a gente acredita que minimiza bastante os efeitos da pandemia, aqui no bairro”, relata Gustavo, ressaltando a importância das mobilizações coletivas pensadas para ajudar os moradores do bairro durante a quarentena.

Soares complementa que ainda não consegue prever quais serão os resultados gerados pela campanha, mas permanece bem otimista com as iniciativas no território durante a essa pandemia. “Tivemos comentários bem positivos, mas a campanha começou ontem então ainda não dá pra avaliar os resultados. Esperamos que agora tenha muitos pontos de acesso na quebrada.”

Enquanto a solução não vem do poder público, iniciativas como dos agentes culturais da Ocupação Ermelino Matarazzo, geradas com baixo custo e com grande possibilidade de impacto real na vida das pessoas são por enquanto a maior e melhor oportunidade de acesso à internet para quem não tem condições de contratar o serviço nas periferias.

“A arte na periferia é isso, ela é o suspiro”

Um dos objetivos da Ocupação Cultural Mateus Santos é oferecer aos moradores de Ermelino Matarazzo novas possibilidades de imaginar e enxergar a vida nesse momento caótico, fruto da pandemia. Para isso eles utilizam a arte e articulação com artistas locais, com o intuito de produzir pequenos shows transmitidos ao vivo em suas páginas nas redes sociais.

“A live foi um momento de compartilhamento das obras e da forma como eu acesso aquelas obras, e como aquilo me faz pensar o mundo”, descreve Luan Charles, músico e integrante da banda Nova Malandragem, que busca democratizar a produção da música instrumental na periferia.

Com a dependência da tecnologia para fazer ecoar a sua arte neste momento, o artista também fala da experiência de fazer um show sem platéia, acessando as pessoas apenas por meio de telas de celulares e computadores. “Mesmo que seja uma música que dura 3 minutos ela é um convite, para você experiênciar naqueles três minutos uma outra forma de viver a vida”, define Charles, fazendo uma reflexão sobre o impacto gerado pela arte da periferia. “A arte na periferia é isso, ela é o suspiro.”

Charles diz que ainda está descobrindo essa conexão com a tecnologia e arte, e as lives é algo totalmente diferente do que está acostumado, mas está tentando se adaptar, porque vê nela uma oportunidade de fazer as pessoas se sentirem acolhidas. “É uma oportunidade para as pessoas não se sentir isoladas por completo e também não se sentir excluída.”

As lives são transmitidas pelos perifes no Facebook e Instagram da Ocupação Cultural e pelo instagram pessoal do artista @luan_trompreto. Desde o início da quarentena Luan e seu grupo já fizeram quatro lives e ele enfatiza que pretende trazer mais conteúdos diversos sobre música e afeto, assuntos que estão tomando muito do seu tempo ultimamente.

Impactos da pandemia nas periferias muda opinião de eleitor de Bolsonaro sobre voto

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Arrependido do voto nas eleições presidenciais de 2018, empreendedor da quebrada reconhece que Bolsonaro não tem capacidade para ser presidente. O fraco desempenho no combate à pandemia e as queimadas na Amazônia foram fatores cruciais para o eleitor avaliar e repensar a capacidade do presidente de governar o país. 

Imagem aérea da abertura de covas no Cemitério São Luis, zona sul de São Paulo. (Foto: Menino do Drone)

O jovem Jhonny Miranda, 21, morador de Itapecerica da Serra, publicou recentemente em suas redes sociais estar arrependido de votar no presidente Jair Bolsonaro, sentimento que vem sendo compartilhado por muitos brasileiros, devido aos últimos acontecimentos que envolvem o líder do poder executivo federal em relação às tomadas de decisão para combater a pandemia de coronavírus e a crise política com o ex-ministro da justiça Sérgio Moro e a Polícia Federal.

Com o avanço da pandemia de coronavírus nas periferias e a possibilidade de ter familiares afetados, por fazerem parte dos grupos de risco, o empreendedor mudou sua avaliação em relação ao preparo do presidente para governar o país. “Acho que foi um momento crucial pra entender que ele não tem capacidade e nem competência pra estar onde está. Governos similares a ele como o primeiro ministro britânico e o presidente americano mudaram o discurso quando perceberam que a situação é realmente grave, no entanto, o Bolsonaro prefere fingir que nada acontece.”

Miranda afirma que conhece diversas pessoas que não fizeram como ele, publicando em suas redes sociais a insatisfação com o presidente, mas que se arrependem de ter votado em Bolsonaro.

Em 2018, ano no qual, as eleições presidenciais foram marcadas por um cenário de constantes ataques políticos por meio da difusão de fake news, o presidente Jair Bolsonaro surgiu como um candidato que prometia renovar as estratégias políticas ligadas principalmente à segurança pública e a economia brasileira. Esse discurso foi um dos fatores que levou Miranda a definir seu voto.

“As ideias e propostas em segurança publica e na economia foram os pontos cruciais para meu voto em Bolsonaro. Ele sempre afirmou que colocaria pessoas técnicas e que não interferiria nas decisões de seus ministros”, conta ele, enfatizando que a escolha dos ministros demonstra um cenário totalmente contrário ao prometido durante a campanha. “O problema que a maior parte dos ministros, principalmente do meio ambiente, relações exteriores e educação são altamente ideológicos e travam uma guerra imaginaria com a já falecida ideologia petista.”

“É nítido que o presidente caiu na velha política ou sempre esteve nela”

Essa percepção de Miranda de avaliar a incapacidade do presidente de governar o país não surgiu recentemente. Desde o período de início das queimadas nas florestas amazônicas, o empreendedor já demonstrava uma insatisfação com a atuação de Bolsonaro e seus ministros. ” Durante as queimadas na Amazônia ao invés dele resolver ele criava acusações e especulações que em nada ajudaram.”

O jovem empreendedor faz questão de ressaltar a sua maior decepção com o presidente. “As duas pautas que me fizeram votar nele (segurança publica e economia) eu não me arrependo. Agora com a saída do Sergio Moro o cenário muda. É desesperador a forma como os ministros de Relações Internacionais e Educação leva seus cargos com despreparo, sendo isso, juntamente com a crise na Amazônia e a atual crise da pandemia minhas maiores decepções.”

Miranda faz questão de enfatizar que não segue uma ideologia política ou seguimento partidário especifico de direita ou esquerda. “Acho que essa divisão política no Brasil corrobora para o extremismo e não compactuo com nenhuma dessas.”

Embora esteja descontente com o desempenho e o formato de governar de Bolsonaro, o jovem não acredita que o caminho seja o impeachment. “Eu sou absolutamente contra um impeachment já que isso traria um longo período de impasse político e de derrotas na economia e na vida social.”

Ele finaliza a entrevista dizendo que se identifica com a frase da cientista política americana Amy Erica Smit. “O ministro pulou do ‘Titanic antes que afunde’, pois é notório que ele sabe dos crimes praticados pelos filhos do presidente e outros aliados”, e complementa afirmando: “é nítido que o presidente caiu na velha política ou sempre esteve nela.”

Centro de Mídia M´Boi Mirim oferece oficina de escrita do VAI

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A oficina “Sua ideia no papel – Oficina de Escrita do VAI” acontece no dia 21 de março, das 9h às 14h30, no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo.

Com o propósito de fortalecer interessados em inscrever seu projeto para o edital do Programa de Valorização de Iniciativas Culturais – VAI o Centro de Mídia M’Boi Mirim, espaço que visa potencializar coletivos e articuladores culturais das periferias a partir da comunicação, oferece a atividade “Sua ideia no papel – Oficina de Escrita do VAI” no dia 21 de março, das 9h às 14h30, no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo.

A oficina será ministrada pelo coletivo de comunicação Desenrola e Não Me Enrola e tem como objetivo fazer com que as pessoas consigam desenvolver a escrita do seu projeto de forma autônoma por meio da construção da estrutura da justificativa, objetivos específicos, plano de trabalho e orçamento. Os interessados em participar desta oficina podem se inscrever até a próxima sexta-feira, 20, com encerramento ás 15h, por meio deste link. O encontro será focado na escrita de uma ideia, ou seja, o coletivo participante precisa ter noções mínimas do seu projeto.

Obs: É indicado a presença de (no mínimo) dois integrantes do coletivo. Caso não seja possível, pode participar uma única pessoa.

Agenda:

Sua ideia no papel – Oficina de escrita do VAI

Data: 21/03/2020
Horário: 9h às 14h30
Atividade gratuita
Local: Centro de Mídia M’Boi Mirim – R. Thereza Silveira de Almeida, 3 – Jardim Ângela, zona sul, São Paulo – SP

Debate ao vivo discute importância dos movimentos culturais da periferia na pandemia

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O debate vai reunir remotamente coletividades que atuam nos territórios da zona leste e será transmitido pela página do Fórum de Cultura da Zona Leste. Conscientes dos impactos gerados pela pandemia nas periferias, coletivos, articuladores culturais e artistas independentes têm atuado no atendimento das emergências, colocando em prática uma visão ampla sobre o papel dos coletivos. 

Encontro de coletivos culturais da zona leste de São Paulo. (Foto: Fórum de Cultura da Zona Leste)

Nesta sexta-feira (24), coletivos culturais da zona leste de São Paulo vão transmitir, a partir das 19h, um debate ao vivo sobre a importância dos movimentos culturais em tempos de pandemia de coronavírus na página do Fórum de Cultura da Zona Leste.

Já confirmaram presença a Ocupação Cultural Mateus Santos (Movimento Cultural Ermelino Matarazzo), Love CT, LabCasa Cultural, Okupação Coragem (Resiste Quebrada), Espaço de Nós pra Nós (Batakerê), São Mateus em Movimento, Centro de Estudos Periféricos, Comitê Solidário ZL (Coletivo Paulo Freire). A conversa será mediada pela Sílvia Lopes Raimundo, do Instituto das Cidades na Unifesp Campus Zona Leste.

Em um primeiro momento, a doença parecia atingir principalmente moradores de bairros nobres da cidade, com renda suficiente para realizar viagens à Europa e Ásia. Mas, o vírus se espalhou rapidamente pelos territórios, e é nos bairros periféricos onde provoca mais mortes.

Para além dos problemas na saúde, a quarentena, principal medida de contenção do vírus, tem atingido a população mais pobre, impedida de fazer seus corres na informalidade ou dispensada de trabalhos precários.

Nesse cenário, os trabalhadores e trabalhadoras da cultura têm colocado em prática ações de solidariedade, alinhadas com uma visão ampla do que é cultura, praticada em diversas coletividades da cidade. Na zona leste, algumas dessas coletividades têm feito coleta, triagem, higienização e distribuição de alimentos e itens de proteção, como máscaras e kits para a lavagem das mãos nas ruas.

Com grande contribuição territorial e bibliográfica para o debate do fazer cultural e político nas periferias da cidade de São Paulo, o Fórum de Cultura da Zona Leste é uma rede de coletivos e artistas independentes, formada por sujeitas e sujeitos periféricos, que lutam de maneira permanente pelo direito aos meios de produção, fruição e acesso à cultura nos territórios periféricos.

Direitos invisíveis: moradores denunciam estado de abandono nas favelas do Rio Pequeno

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O Rio Pequeno é o distrito mais populoso da Subprefeitura do Butantã. É sobre a vida nas Favelas da São Remo e da ‘1010’ que o Desenrola abre a série de reportagens ‘cidade dos direitos invisíveis’, na qual vamos percorrer as periferias e favelas das quatro regiões de São Paulo, contanto histórias de moradores, para entender como é a vida nos distritos que possuem os maiores indicadores de aglomeração de moradias e habitantes durante a pandemia de coronavírus, com base em dados publicados pelo Censo 2010, que completam 10 anos de existência em 2020. 

Composto por mais de 40 bairros, o distrito do Rio Pequeno está localizado na região oeste da cidade de São Paulo. Os dados produzidos pelo Censo em 2010 revelam que há mais de 12 mil habitantes por quilômetro quadrado morando no território. Além disso, o estudo aponta que o Rio Pequeno é o menor distrito em extensão territorial da Subprefeitura do Butantã com 9,70 km², mesmo assim, ele possui o maior índice populacional da região com 118.459 moradores.

Todos os distritos vizinhos ao Rio Pequeno, que fazem parte da Subprefeitura do Butantã são maiores em extensão territorial, mas possuem um número bem menor de habitantes. Entre eles estão: Morumbi com 11,40 km² e 46.957 moradores; Butantã com 12,50 km² e 54.196 moradores; Raposo Tavares com 12,60 km² e 100.164 moradores; e Vila Sônia com 9,90 km² e 108.441 moradores.

Os dados revelam que o Rio Pequeno possui uma característica comum nas periferias de São Paulo: há um grande número de moradores que se auto-organizam em moradias irregulares, que demandam da existência de políticas públicas para acessar condições mais humanas e dignas de existência, mas que ao mesmo tempo são invisíveis para o Estado.

Dez anos depois da publicação destes dados, os moradores das favelas da ‘1010’ e São Remo denunciam que as condições de vida nas favelas não mudam, porque eles não são enxergados pelo poder público. “Moro aqui desde sempre, e é difícil. É difícil morar na comunidade porque não tem auxilio nenhum, as pessoas não nos enxergam, tem casa com um metro quadrado que moram 6, 7 e até 8 pessoas dentro de vielas. Como se mantém essas pessoas em casa, e ainda faltando alimentação, material de higiene e até água?”, questiona Marcos Antonio dos Santos, mais conhecido no território como Bulula, 45, morador da favela da ‘1010’.

Outra moradora da favela São Remo é a dona Maria Das Dores Bezerra, 42 anos, que mora no território há mais de dez anos. Segundo ela, o número de moradias irregulares só aumenta, juntamente com a vulnerabilidade dos moradores. “To no bairro a mais de dez anos e aqui só aumenta as moradias que são bem precárias, conheço famílias de seis pessoas que moram em um cômodo só. É bem precária, é bem apertadinho.”

Dona Maria complementa, descrevendo que o quintal das casas abriga banheiros externos e a passagem da viela acaba se tornando um local de encontro com a porta do outro vizinho. “Tem gente que não tem banheiro dentro de casa, é do lado de fora, é tudo bem apertado. A porta de uma casa ta na frente de outra porta, dentro de uma viela, é bem apertada.”

A partir dos dados disponíveis no Censo 2010, o Mapa da Desigualdade publicado pela Rede Nossa São Paulo em 2017 mostra que na Subprefeitura do Butantã havia quase 25 mil casas situadas em favelas, um indicador que ilustra claramente a condição de aglomeração de moradores na região. A pesquisa também apontou que a quantidade de moradias cresceu em relação ao ano de 2008, período no qual o distrito possuía mais de 22 mil casas localizadas em favelas.

Viela na entrada da Favela da São Remo, no Rio Pequeno. (Foto: Reprodução Facebook)

“Urbanização de favela é tentar organizar uma vida que tá fora do padrão” 

Os depoimentos dos moradores entrevistados pela nossa reportagem ilustram bem o tamanho do problema apresentando pelos dados produzidos pelo Censo em 2010. Como já se passaram 10 anos, esses indicadores podem estar bem maiores, devido ao aumento da vulnerabilidade dos moradores das periferias e favelas, devido ao desemprego, e a redução de investimento em serviços sociais estruturantes, como saúde e educação.

Segundo a mestranda em Planejamento Urbano pela FAU-SP, Gisele Brito, a políticas públicas de moradia e de urbanização das favelas seriam bem vindas se o Estado soubesse elaborar e implantar. “As questões de moradia estão em pauta a pelo menos uns 40 anos, o problema é que o Estado dá soluções erradas, ou soluções que as moradias continuam sendo tratadas como mercadorias, e aí não tem como resolver, o programa Minha Casa Minha Vida, por exemplo, é o maior programa de habitação que existe. 

Foram construídas mais de 2 milhões de casas e ainda assim, enquanto estavam sendo construídas essas habitações, o número de déficit habitacional aumentou”, aponta ela, enfatizando que o problema habitacional nas favelas nunca vai ser resolvido enquanto for tratado como mercadoria, e não como um direito à cidade e direito à moradia.

Para Brito, a urbanização das favelas é uma conquista histórica de muitos movimentos sociais, que conseguiram levar asfalto, água e luz para os bairros favelados. Isso se dá até hoje pautando as condições precárias de moradia e a questão do saneamento básico dentro da cidade.

Ela também explica que a remoção dos moradores não é uma solução para esse problema, mas que é importante compreender e reconhecer o modo de vida dos moradores, que não segue padrões socioeconômicos tradicionais. “Urbanização de favela é tentar organizar uma vida que tá fora do padrão.”

As considerações da pesquisadora têm forte conexão com o projeto de lei nº 619/16 que regulamenta o Plano Municipal de Habitação na cidade de São Paulo, no qual os objetivos estratégicos seguem a seguinte proposta descrita na página cinco do documento.

“Um dos aspectos mais importantes da política habitacional é sua diversidade. Os desafios a serem enfrentados são variados e pressupõem ações específicas para cada caso. Não se pode oferecer para uma favela consolidada há décadas a mesma política que se ofereceria para outra em situação de risco iminente, assim como não são problemáticas semelhantes, por exemplo, a da população em situação de rua, de moradores de cortiços, ou de famílias que residem em loteamentos distantes, na periferia. Cada realidade enseja uma ação diferente do Poder Público, uma integração específica com as políticas urbanas, uma parceria própria com outras secretarias ou subprefeituras.”

“Como que faz quando tem detergente e não tem água, quando tem água e não tem detergente?”
 

A Coalizão Pelo Clima, um grupo de coletivos que promovem debates e ações de combate às mudanças climáticas produziu um mapeamento listando os bairros da cidade de São Paulo que estão sendo atingidos pelo corte água em determinados horários do dia. No relatório, as duas favelas da zona oeste, tanto a ‘1010’ quanto a São Remo são registradas.

Os moradores afirmam que é mais um ponto que interfere na quarentena e no cuidado para não ser contaminado pelo novo coronavírus. “Como que faz quando tem detergente e não tem água, quando tem água e não tem detergente? Para os moradores daqui a água acaba toda noite, não dá nem para tomar banho antes de dormir e continua as campanhas para lavar as mãos e manter tudo limpo. É mais uma coisa que mostra que a gente tá sendo esquecido e isso afeta a nossa existência diariamente”, alerta Bulula.

Dona Maria diz que o abastecimento de água no território segue um padrão de horário para ser interrompido e para ser restabelecido. “Falta água todo dia, mais ou menos umas 21h da noite e só volta entre 5h e 7h da manhã. Eu tenho muito medo, tem que fazer tudo que usa água cedo e separar um balde de água para deixar caso precise né? Eu tenho filha pequena daí é complicado, eu to com muito medo de ser contaminada”, desabafa.

“A gente sabe o que tamo vivendo, então precisamos nos ajudar” 

Devido à ausência programada do Estado nas favelas do Rio Pequeno, os moradores compreenderam há muitos anos que a redução das desigualdades depende também da solidariedade de uns com os outros. Por isso, eles começaram a se organizar para coletar doações de alimentos e produtos de higiene, como forma de combater a contaminação de coronavírus em seus territórios.

“A gente que tá aqui sabe o que tamo vivendo, então precisamos nos ajudar, eu to coletando doação e levando para várias famílias todo dia”, diz Bulula. Ele valoriza as ações solidárias que estam acontecendo no bairro e informa um endereço para quem quiser ajudar. “O lugar de doação aqui é na favela da 1010, na Rua Cleon Mário Gacceone, 279. Temos que nos ajudar e ajudar as famílias que precisam mais, salvar nosso bairro”, finaliza o morador.

Nas periferias de Ferraz de Vasconcelos, grupo no Facebook articula moradores para combater pandemia

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Combater a disseminação de notícias falsas, realizar anúncios diários de comércios locais que estão funcionando com serviços de delivery e cobrar medidas de prevenção da prefeitura de Ferraz de Vasconcelos estão entra as principais ações do grupo, que tem mais de 10 mil membros e vem substituindo a necessidade de reuniões comunitárias presenciais durante o período de contenção da pandemia de coronavírus. 

Nas periferias de Ferraz de Vasconcelos, grupo no Facebook articula moradores para combater pandemia (Foto: Pedro Gomes)

Não é de hoje que moradores das periferias de Ferraz de Vasconcelos, cidade da região metropolitana de São Paulo, tentam encontrar formas de lidar com o descaso do poder público municipal. Diante deste cenário “organizar e provocar” é a definição utilizada por Pedro Gomes, mais conhecido como Peter Gomes, para definir o significado da função dele no grupo de Facebook chamado “Comunidade Ferraz de Vasconcelos”, fórum de discussão comunitária que reúne moradores para debater os rumos e melhorias de serviços públicos na cidade.

Atualmente, o grupo tem 10.476 membros. Parece pouco se comparado ao último censo do IBGE que estima um número de 168.306 habitantes na cidade. Mas o impacto que essa rede de discussões comunitárias causa na vida dos ferrazenses torna-se gigantesco, perto dos poucos recursos de participação política que esses cidadãos têm acesso.

Então como informar e reivindicar direitos de uma forma que consiga alcançar o máximo de pessoas, a fim de ouvi-las? Essa foi uma das perguntas que Peter se fez, percebendo a popularização do facebook na época. Com isso, ele resolveu criar um grupo que ajude a população a refletir, se expressar e pensar no que é bom ou ruim para a cidade.

“Buscamos usar o espaço para informar sobre o que está acontecendo, cobrar os governantes locais, mas também entreter a população que nesse momento tem que ficar em casa”, conta ele, fazendo uma referência direta ao cenário da pandemia de coronavírus que tem assustado os moradores de Ferraz. “Também fazemos com muito bom humor para evitar que a comunidade tenha apena um olhar catastrófico.”

Segundo Peter, os impactos das discussões são diversos e chegam ao tom de ameaças. “O que soltamos no grupo sempre vai parar nos grupos políticos, a ponto é claro, de já termos recebido ameaças diversas, processos, etc”, relata.

Reunião comunitária virtual

Através do grupo, eles já organizaram protestos e outras ações por melhorias na cidade de Ferraz, as quais ele acredita que a rede de moradores tem força para interferir nas decisões políticas dos governantes de sua cidade. “O povo comenta muito. O povo está ligado ao grupo. É uma parcela dos moradores da cidade.”

Uma demonstração clara da força política dos moradores que fazem parte do grupo aconteceu durante a última live do prefeito de Ferraz de Vasconcelos, José Carlos Fernandes Chacon, onde ele diz: “Brasileiro está se apavorando a toa, mas uma semana e isso ai já sai de moda”. Na ocasião, o líder do executivo municipal estava reunido junto com os secretários para discutir medidas preventivas para combater o Covid-19.

Confira a live realizada pelo prefeito.

Após o ocorrido, Peter imediatamente publicou um post no grupo, dando a oportunidade dos membros apresentarem sugestões de como a prefeitura deveria combater a pandemia de coronavírus na cidade. A publicação chegou a ter até 100 comentários com forte engajamento dos moradores.

“Esse vídeo repercutiu bastante. E o grupo também partiu para o confronto direto com o Secretário da Comunicação da prefeitura, que chegou a nos ameaçar de processo. Após isso passamos a ver que passaram a tratar com mais seriedade o tema”, relata Peter.

Logo após a intervenção dos moradores, o poder público municipal divulgou algumas medidas iniciais para lidar com o caso do Covid-19 na região. Umas delas foi emitir um decreto contratando uma empresa que vai instalar leitos de triagem e UTI em caráter emergencial na cidade.

Peter se diz preocupado com a situação, acredita que muitas pessoas de sua cidade não se deu conta da circunstância que estam vivendo atualmente, mas segue informando e se organizando em rede, verificando a veracidade de todos os conteúdos postados no grupo para não correr o risco de disseminar nenhuma Fake News e ajudando os moradores de sua região a se adaptar com essa nova realidade.

“Hoje estamos com um tópico tentando identificar e divulgar mercados, farmácias e outros serviços de entrega da cidade que estão funcionando, para assim evitar que as pessoas saiam de casa”, afirma o mediador do grupo.

A importância do grupo para os moradores

Uma das integrantes desse grupo é a moradora Julia Sousa, que reside no bairro Parque Dourado. Ela conta que entrou no grupo com o objetivo de saber mais sobre sua cidade, descobrir coletivos culturais ou grupos que se articulam de alguma forma nos territórios, devido à existência de poucos meios de comunicação em atividade na cidade, que produzam esse tipo de informação.

“Na internet a gente consegue encontrar notícias sobre Ferraz vinda de grandes meios de comunicações, mas na TV onde as pessoas daqui têm o maior acesso, raramente”, afirma Sousa. Ela explica que as poucas mudanças que a cidade vem conseguindo surgem do uso dessas ações nas redes sociais e complementa: “um grupo desses é de extrema importância, para as informações chegarem até as pessoas, a internet tem essa ótima utilidade.”

Ainda Indignada com a atitude do prefeito durante a transmissão ao vivo, Julia enfatiza a importância do grupo, diante de uma cidade que está com a qualidade dos serviços públicos comprometidos. “Nossa cidade está abandonada há muitos anos. Temos um ex-prefeito preso, um que foi preso e solto, e agora esse que ninguém consegue encontrar direito,” finaliza ela, demonstrando indignação em relação a trajetória dos últimos representantes do poder público executivo da cidade.

Conheça a rede de mulheres fornecedoras de ovos de páscoa das periferias de SP

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Com a crise econômica gerada pela pandemia de coronavírus, uma rede solidária composta por um grupo de mulheres empreendedoras mapeou 18 produtoras que fornecem uma grande diversidade de sabores e formatos de ovos de páscoa, que atuam nas regiões leste, sul e norte da cidade e também em municípios vizinhos, como Guarulhos e Ferraz de Vasconcelos. 

Conheça a rede de mulheres fornecedoras de ovos de páscoa das periferias de SP (Foto: Reprodução Facebook da Maravilha Doces)

A fim de fortalecer a economia local das periferias de São Paulo, por meio da ‘Ação Solidária Páscoa do Bem’, as empreendedoras que administram as iniciativas Macambira Sociocultural, Bora Lá Comunicação e a Kinah Desenvolvimento Profissional, que atuam na zona sul de São Paulo, mapearam e articularam 18 mulheres que integram uma rede de fornecedoras de produtos alimentícios à base de chocolate, para dar visibilidade ao negócios de pequenas produtoras de ovos de páscoas nas quebradas.

Um dos objetivos do mapeamento é promover o serviço dessas empreendedoras durante o período de crise financeira gerada pela pandemia de coronavírus, que afeta principalmente os trabalhadores informais das periferias, principalmente as mulheres que são chefes da família.

No mapeamento, você vai encontrar pequenos produtores que atuam em bairros das regiões sul, leste e norte da cidade, além de municípios vizinhos de São Paulo, como Guarulhos, Poá e Ferraz de Vasconcelos, com preços acessíveis, que são bem atrativos se forem comparados com os valores de ovos de páscoa disponíveis nas redes de supermercado que estão dentro dos territórios periféricos.

Confira abaixo a lista de fornecedores por região com link para redes sociais para contato.

Zona Sul de São Paulo

@deniseetcetal atua no Jardim São Luis com produção de ovos de páscoa, doces e bolos para festas, cestas de café da manhã e festa na caixa.

@julianachocolateecia também atua no Jardim São Luis com produção de ovos de páscoa tradicional e recheada, ovos infantis com personagens,

 A @comidinhas_da_veru atua no Grajaú produzindo ovos tradicionais, ovo de colher, ovos trufados, ovo frito – um ovo de chocolate em forma de ovo frito, além de bombons sortidos recheados.

@josichocolight atua no Jardim Ângela fornecendo ovos tradicionais (branco, ao leite e meio amargo), ovos de páscoa de colher que tem 15 sabores, ovos de páscoa salgado, cesta de chocolate com cenourinha e bombons.

@docura_explosiva atua em Santo Amaro produzindo ovos trufados, ovos de colher, bolos de festa, doces, tortas doces, cones trufados, bombons recheados e pão de mel.

Re Chocolatier também atua em Santo Amaro fornecendo ovos de páscoa de meia banda, ovos de páscoa com casca recheada, caixa de bombons sortidos, lembrancinhas de chocolate, pão de mel e pirulitos de chocolate.

K&Z Doces e Salgados atua no Jardim Aurélio produzindo ovos de páscoa, marmitex, sobremesa, lanches, porções, doces e salgados.

@mc_chocolates10 atua no Jardim Sete de Setembro oferecendo diversos formatos e sabores de ovos de páscoa.

Ateliê maravilhas & Doces atua no Campo Limpo, produzindo ovos de páscoa de colher, ovos tradicionais, pão de mel, bolo de pote e ovos trufados.

Márcia Atelier de Doces atua no Jardim Lucélia produzindo ovos de páscoa, pirulitos de chocolate, pão de mel e trufas.

@fatima_nagao atua no Jardim Celeste fornecendo pão de mel, trufas, brownie, torta de limão, torta holandesa, pavê de amendoim, biscoitos artesanais, bolo da vovó, doces finos e bem casado.

@kykacakes atua no bairro da Guarapiranga produzindo cup cake de chocolate personalizado, ovos de páscoa, ovo frito de chocolate, pirulitos de chocolate, pão de mel, mini trufas, ovos de colher, cone trufado e kit confeiteiro.

@matulasdanega atua no Capão Redondo fornecendo ovos personalizados, ovos de colher, ovos tradicionais, ovos recheados e bombons.

A Ladoce atua no Jardim Nakamura oferecendo ovos de páscoa com preços diversos e acessíveis, focando em produtos como trufas e cones caseiros.

Zona Leste de São Paulo

@kyvia.cake atua em Ermelino Matarazzo produzindo ovos de páscoa simples, ovos de colher,barrinhas recheadas, mix de barrinhas, brigadeiros e bolos temáticos.

@helo_salgados atua no Jardim Caiuby no Alto Tietê produzindo ovos de páscoa tradicionais, ovos de colher, mini pães de mel, mini suspiros, bolo da vóvó e bolo de pote.

Ferras de Vasconcelos

@cintia.maia.9843 atende no município de Ferraz de Vasconcelos  produzindo ovos de colher, ovos trufados, ovos de chocolate ao leite, ovos crocantes e chocolate branco.

@confeitaria.rodrigues atua na Cidade Kemel fornecendo ovos de páscoa simples, ovos de colher, mini ovos de páscoa, ovos de pote e ovos de corte.

Guarulhos

@ciabiscoitos atende em Guarulhos, oferecendo biscoitos decorados, pirulitos de chocolate, brigadeiro, doce beijinho, ovos de colher, pão de mel e cup cake. 

Como é ser mãe na quebrada em tempos de Coronavírus?

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Conversamos com mulheres, moradoras das periferias de São Paulo, para compreender como o Coronavírus afetou a sua relação com a sua família e a vida profissional.

Jardim Monte Azul – Zona Sul de São Paulo, 2018. (Foto: Gsé | DiCampana Foto Coletivo)

Nas últimas semanas escolas, universidades, creches, espaços culturais e diversos órgãos público e privados suspenderam as atividades por conta do Covid-19, conhecido popularmente como Coronavírus, a orientação partiu do Ministério da Saúde com recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Dentro desse cenário, como tem sido a rotina de diversas mães trabalhadoras, moradoras das periferias que enfrentam uma dura jornada de trabalho para cuidar dos filhos e da sua casa?

Se por um lado a orientação é de não termos aglomeração de pessoas no mesmo espaço, por outro lado, milhares de trabalhadoras, entre eles mães, enfrentam transporte público lotado sem conseguir se esquivar desse trajeto para chegar ao trabalho.

“Sei que é difícil para cada profissão, emprego não está fácil, as contas não esperam e tem prazo para vencer”

Para a babá Antonieta Neves Oeiras, 35, moradora do Parque Bologne, localizado na periferia da zona sul de São Paulo, a preocupação é imensa: “sou mãe e tenho dois filhos, um de 18 anos e outro de 10. Gostaria de estar em casa com meus filhos, mas não é possível”, afirma ela, reconhecendo a necessidade de manter o emprego. “Preciso trabalhar, além disso, meus patrões trabalham na área da saúde e também não poderão ficar em casa com os filhos deles.”

Antonieta trabalha de babá há mais de seis anos, na Vila Mariana, bairro de classe média na zona sul da cidade. Sua rotina implica em permanecer no serviço de forma quinzenal, porém, como tem um diálogo aberto com seus patrões, consegue voltar para casa até antes desse período, dependendo da necessidade dos pais das crianças que ela cuida. Mas dentro do período, ela volta para descansar em casa, cuidar e matar a saudade de seus filhos.

Com a chegada do Coronavírus no Brasil, sua rotina mudou, tendo que ficar mais tempo no trabalho do que o previsto, já que depende do transporte público para se locomover do trabalho para casa.

“Sei que é difícil para cada profissão, emprego não está fácil, as contas não esperam e tem prazo para vencer. E cada caso é um caso. Para quem pode ficar em casa, não saiam, fique em casa e tomem todos os cuidados possíveis. Não está fácil para ninguém. Estou longe dos meus filhos, nos falamos apenas por celular, o aperto no coração aumenta pelo fato de estar longe deles, e esse aperto é imenso, mesmo sabendo que estão sendo bem tratados, orientados, aos cuidados da minha mãe, para que eu possa estar aqui, cuidando dos filhos dos outros. É assim pra quem precisa trabalhar”, enfatiza.

Antonieta também ressalta a preocupação por conta do Coronavírus, orientando seus filhos a lavarem bem as mãos, sempre passar álcool em gel e não saírem de casa em hipótese alguma, além disso, a tensão aumenta já que sua mãe dona Maria Nádia Neves Ribeiro de 56 anos de idade é diabética e está na lista de risco do vírus. “Antes de sair para trabalhar, fiz compras e deixei tudo em casa, para que nada falte e também para que não precisem sair de casa”.

“Com a escola e creche fechada, tenho que me dividir em cuidar dos meus filhos em tempo integral e ao mesmo tempo trabalhar”

A design de sobrancelhas Fabiana Calixto Braga de Oliveira, 38, moradora da Vila Flávia, zona leste de São Paulo, é mãe de 4 filhos, sendo dois jovens com de 20 e 13 anos e dois pequenos de um ano e cinco meses e outro de apenas quatro meses.

Além da preocupação com filhos e o movimento de clientes em seu trabalho, Fabiana revela que parte do impacto do Coronavírus na sua família está atingindo a relação e o cuidado com a sua mãe, dona Maria José Calixto de 70 anos. Ela faz parte da lista de pessoas dentro do grupo de risco devido a idade e baixo índice de imunidade.

“Minha mãe é minha vizinha, ela sempre ficou próxima dos meus filhos, e agora com tudo que está acontecendo, estamos evitando o contato, porém, ela não compreende, fica chateada, acha que nós estamos com medo dela passar o vírus pra gente, quando na realidade, somos nós que estamos tomando cuidado para manter a segurança dela”, relata a design de sobrancelhas.

Fabiana trabalha de forma autônoma e administra o seu próprio negócio num cômodo que fica dentro da sua casa. Segundo ela, o fluxo de clientes caiu por conta do Coronavírus. “Faz uns dias que estou sem trabalhar, porque as pessoas estão se precavendo. Mas eu estou estudando uma estratégia de marketing para trazer conforto e segurança para ter minhas clientes de volta. Sempre trabalhei com álcool em gel e máscara”, conta ela.

Para muitas mães, que trabalham fora de casa ou de forma autônoma, as medidas adotadas para prevenção do Coronavírus tem sido uma solução quando a questão é a segurança da família. Mas, quando o assunto é com quem deixar os filhos se as creches e escolas estão fechadas, a pandemia se torna um grande problema no cotidiano.

“O que precisamos nesse momento é realmente diminuir a circulação de pessoas, porém, com a escola e creche fechada, tenho que me dividir em cuidar dos meus filhos em tempo integral e ao mesmo tempo trabalhar. Tudo isso afetou 90% da minha rotina diária”, argumenta Fabiana.

Apoio às mães da quebrada

Atitudes de solidariedade estão ocorrendo, inclusive por meio das redes sociais, exemplo disso, foi a atitude da design gráfico Ju Dias, 38, moradora do Campo Limpo, zona sul da cidade, que publicou no seu perfil do Facebook uma mensagem onde oferece a ajuda as mães e idosos do território.

A mensagem diz:

“Mães, se precisarem de ajuda com as crias neste caos, sabemos que não é escolha para todas a quarentena. Trabalho de casa, tenho quintal, então caso precise, estamos ai.

Quem estiver em quarentena / idoso e precisar que se compre algo, chamem no PV.

Bora formar uma rede de cuidado…

Moro próximo ao terminal João Dias/ Arariba / metrô Campo Limpo / Vila das Belezas / Monte Azul.”

Ju Dias lembra que a ideia de oferecer ajuda ocorreu depois de acompanhar várias mulheres que trabalham na área da educação preocupadas com as mães do território, que por conta do fechamento das creches e escolas, não tinham com quem deixar os seus filhos. “Pensei que poderia ajudar, uma vez que trampo de casa, sendo autônoma. Tenho também uma mãe idosa, com várias questões de saúde, que não mora aqui perto, mas que necessita de ajuda para compra de remédio, comida etc.”

Além da vó, a moradora também possui uma irmã que também necessita de cuidado com os filhos. “Minha irmã também precisa de ajuda muitas vezes Ela tem duas filhas cadeirantes. Como não estou perto o suficiente para ajudá-las no dia dia, posso contribuir com quem está por perto”, reforça.

Dias enfatiza que sua atitude foi algo pontual, com intuito de ajudar o maior número de mulheres que querem ajudar ou que necessitam de ajuda.

Além de ser empreendedora, ela faz parte da Escola Feminista Favelada Abya Yala, que está desenvolvendo uma Rede de Mulheres Em Defesa da Vida. Ao lembrar que na periferia, mulheres em sua maioria negras, mães, serão as mais afetadas nestes tempos sombrios que virão, ela faz uma convocação: “se você pode ajudar ou se você precisa de ajuda, acompanhe ou entre em contato conosco por meio das nossas redes sociais, facebook: escolaabyayala e instagram: escola_abyayala.”

Respeitando quarentena, paróquia transmite missas ao vivo no Jardim São Luís

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Durante a quaresma o número de paroquianos quase dobra nas igrejas católicas das periferias. No Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, uma paróquia seguiu as orientações do governo estadual e cancelou as missas abertas ao público. Para não perder o contato com os membros, reforçou a utilização de transmissões ao vivo pelo Facebook para manter a conexão com a fé durante a pandemia.

Respeitando quarentena, paróquia transmite missas ao vivo no Jardim São Luís (Foto: Joice Soares)

Nas últimas semanas o Brasil tem vivido momentos difíceis com o aumento de casos confirmados de pessoas com a COVID-19. Medidas para evitar a disseminação do vírus, como o isolamento social e a quarentena têm impactado a vida da população em diversos setores.

Neste cenário de crescimento da pandemia do coronavírus, muitas pessoas se apegam à fé para superar esses momentos de incerteza. Atento a aglomeração de pessoas nos cultos em templos evangélicos e as missas em igrejas católicas, governador João Dória sugeriu na semana passada o cancelamento desses eventos religiosos, para evitar uma grande concentração de públicos em locais fechados.

Como solução para o cancelamento temporário de diversas missas e cultos religiosos, organizações religiosas têm utilizado recursos tecnológicos disponíveis nas redes sociais, como a transmissão ao vivo pelo Facebook, para manter a conexão entre os fiéis e os líderes religiosos.

É exatamente assim que a Paróquia Santo Antônio de Sant’anna Galvão, localizada no bairro do Jardim Guarujá, no Distrito Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, tem realizado as missas. Através de lives nas redes sociais.

Segundo Joice Soares, uma das responsáveis pelas transmissões ao vivo nesta quarentena do coronavírus, a igreja já realizava lives das celebrações há quase um ano, com intuito de estar próximos também dos paroquianos que por diversos motivos não poderiam estar indo à celebração.

As transmissões ao vivo da paróquia são coordenadas pela PASCOM, uma pastoral de comunicação da própria igreja. Nesse período de quarentena houve um aumento de fiéis acompanhando as celebrações online. “Já tínhamos um bom público antes dessa quarentena, porém aumentou consideravelmente, já que as pessoas que costumavam assistir presencialmente agora nos acompanham 24h pelas redes”, comenta Soares, integrante da PASCOM.

Para o aposentado, Josué Nonato, morador do bairro Chácara Santana, no distrito do Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, as lives realizadas pela equipe da Paróquia Santo Antônio de Sant’anna Galvão, tem sido uma boa iniciativa nesse momento.

O aposentado conta como tem sido para ele e sua esposa, Marleide Sena, acompanhar as missas através das lives nos últimos dias: “tem sido muito triste, pois nós estamos particularmente muito envolvidos em muitos movimentos pastorais, mas atrevemos a dar à opinião de toda comunidade, pois as celebrações para nós é momento de um encontro pessoal com Deus e a comunidade toda está muito abatida e apavorada com essa situação.”

Joice também comenta que houve um aumento na interação dos fiéis com tudo que é publicado na página, e ressalta a idade e perfil do público que tem acompanhado as transmissões: “Temos um público variado, mas que sua grande maioria está acima dos 50 anos, porém temos uma quantidade considerável de jovens que nos acompanham.”

Desde o início da pandemia do COVID-19, muitas pessoas têm utilizado ainda mais a internet como meio de ligação entre amigos e familiares que também estão em isolamento. Fazer live se tornou uma solução de sucesso em diversos meios nas últimas semanas, desde artistas, cantores, músicos, e agora também nas instituições religiosas.

A igreja pretende continuar as transmissões das missas mesmo após o período de quarenta, e com a normalização da rotina das pessoas. “Nossas transmissões não dependiam só da quarentena para acontecer. Nesse período de reclusão social, aumentamos o número de lives para que o povo não ficasse desamparado. Mas, as transmissões já fazem parte da nossa rotina e vai continuar fazendo”, afirma Joice.

Nonato apoia as conexões online que a igreja busca fazer com os fiéis neste período de quarentena, mas ressalta que a importância da conexão presencial. “Entendo que a transmissão deve continuar porque essa alternativa foi criada para pessoas em condições especiais, mas a normalização da rotina é imprescindível”, conclui o aposentado.

Farmacêuticos afirmam: o álcool em gel poderia ser gratuito

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Em meio aos crescentes casos de covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, o álcool em gel deveria ser comercializado? Confira a opinião de farmacêuticos que trabalham ou moram nas periferias de São Paulo. 

Farmacêuticos contam porque o àlcool em gel poderia ser gratuito (Foto: Thais Siqueira)

Na última sexta-feira (20), o governador de São Paulo, João Dória firmou um acordo com a Abrafarma (Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias), no qual as farmácias teriam que comercializar o álcool em gel a preço de custo em todo o Estado. Até o fechamento dessa reportagem, o valor médio do produto encontrado nas farmácias visitadas foi de RS 19,90.

A medida tomada pelo governo estadual tem conexão com o período de avanço da pandemia de Coronavírus na cidade de São Paulo, no qual um fenômeno de consumo assustou moradores das periferias que tentavam ir até farmácias localizadas nas regiões leste, sul, norte, oeste e centro da cidade: não havia álcool em gel 70% disponível para compra e nem estoque e nas raras vezes que encontravam o produto, o preço abusivo surpreendia os consumidores.

O álcool em gel 70º é um produto que pertence à classe de medicamentos sanitizante, utilizado principalmente em estabelecimentos industriais e comerciais. Ele tem a finalidade de reduzir a quantidade de bactérias nocivas à saúde humana a níveis considerados seguros. Durante a pandemia de coronavírus, a mão é o principal membro do corpo humano que passa por aplicações do medicamento, devido ao fato de estar em constante contato com diversos ambientes de contaminação.

Atento aos impactos dos preços abusivos nos moradores das periferias o Desenrola entrevistou farmacêuticos que estam na linha de frente de combate à pandemia, atendendo a população que vai a todo o momento nas drogarias à procura de máscaras e principalmente do álcool em gel 70%.

“O governo tem condições de subsidiar para serem gratuitos em qualquer tipo de estabelecimento, mas aqui no Brasil é um mundo capitalista, então só vive em torno do dinheiro”, argumenta o funcionário de uma farmácia localizada no Jardim Ângela, zona sul da cidade, que preferiu não ter sua identidade revelada.

Para ele, a falta do produto nas prateleiras não tem uma ligação direta com as farmácias, mas sim com os fornecedores. “Primeiro são os subsídios que o governo não tava dando. Isso é certeza e foi essa a informação que chegou pra gente, entendeu? Tem muito nos depósitos das empresas, porém o subsídio que o governo estava dando pra eles não estava sendo o suficiente para eles liberarem o produto”, afirma ele, ressaltando: “chegou isso pra nós aqui.”

O depoimento do farmacêutico tem conexão direta com a medida adotada pelo ministro da economia, Paulo Guedes, que decidiu reduzir alguns impostos sobre medicamentos ligados ao combate do coronavírus, entre eles o IPI (Imposto sobre Produto Industrializado). No entanto, tal medida ainda não apresentou efeitos diretos no bolso do consumidor, pois o abastecimento e o preço continuam comprometidos.

Letícia Lourenço, moradora do Jardim Coimbra, zona sul de São Paulo, mora com sua mãe e o irmão. Ela afirma que já foi duas vezes a farmácia, mas não obteve êxito de encontrar o álcool em gel. “Me sinto vulnerável, pois é um produto que está sendo essencial pra não contrair a doença”, conta ela. Enquanto ela permanece na saga para achar o produto, está usando detergente e sabonete líquido para higienizar as mãos, mas o problema maior é quando necessita sair de casa, momento onde o uso do álcool em gel é se faz fundamental.

Mesmo com movimentações do governo Federal e Estadual para redução de preço, o álcool em gel continua sendo comercializado com acesso restrito a poucas pessoas. Esse cenário tem incomodado o farmacêutico de uma grande rede de farmácias, que mora no Jardim Ângela e trabalha no centro de São Paulo.

“A procura está sendo muito grande. E quem chega a encontrar o produto, no caso, o álcool em gel, estão comprando além do que precisa com receio da falta, mas o problema é que as outras pessoas precisam também para estar colocando em casa, seja um ou dois, não estão conseguindo comprar. Não estão pensando na família do próximo.”

Enquanto o poder público não tomar uma medida mais drástica, as farmácias que pertencem a empresas privadas continuarão com a responsabilidade de intermediar o consumo de um produto essencial para a população para o combate a coronavírus.

A cronologia dos preços do álcool em gel

Antes do acordo realizado pelo governo do Estado, a nossa equipe de pesquisa encontrou o álcool em gel de 500 mg a preços que chegou a ultrapassar 24 reais. Além disso, em alguns estabelecimentos não havia previsão de chegada nas prateleiras.

Entre os dias 15 e 19 de março, o Desenrola percorreu 20 farmácias localizadas nos seguintes distritos da cidade de São Paulo: no Jardim Ângela e Jardim São Luís, zona sul de São Paulo, o preço médio do produto ficou em torno de R$ 21; em São Mateus, distrito da zona leste da cidade, o valor médio foi de R$ 19; já no Rio Pequeno, zona oeste da capital, o preço médio nas farmácias visitadas foi de R$ 23.

Após o dia 20 de março, data do acordo firmado entre o governo do Estado de São Paulo e a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias, o preço do produto sanitizante ficou congelado no valor de R$ 19,90. A nossa reportagem perguntou para os farmacêuticos se esse preço erra correto e justo.

“Antes da crise tava saindo à base de R$ 12 a R$ 13 o vidro grande de um litro. Agora, depois disso aí, foi a R$ 34 no início né. Agora o governo delimitou a 19,90. O preço máximo que chegou a custar aqui foi de R$ 23”, conta o farmacêutico de uma farmácia no Jardim Ângela, revelando que embora o valor tenha reduzido, o valor do produto deveria estar bem mais barato se fosse mantido pelas farmácias o valor cobrando antes da pandemia de coronavírus.

Segundo o morador do Jardim Ângela, que trabalha numa farmácia no centro de São Paulo, o preço do álcool em gel 70% de 500 mg também estava bem mais barato antes da pandemia chegar a São Paulo. “Antes da crise, o pote de álcool em gel estava saindo por R$ 15. Hoje na frente do metro, as farmácias estão vendendo por R$ 25 e até R$ 30.”

O Procon, Fundação ligada a Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, entidade responsável por garantir a efetividade do código de defesa do consumidor tem realizado uma fiscalização rotineira em farmácias em todo o estado para impedir a cobrança de preços abusivos, no entanto, os depoimentos dos farmacêuticos entrevistados pelo Desenrola reafirmam que o interesse econômico ainda está acima da realidade socioeconômica dos moradores das periferias.