Casas do Norte contribuem no resgate cultural da identidade nordestina nas periferias

Comerciantes, moradores de diferentes periferias em São Paulo, contam como as Casas do Norte aproximam migrantes nordestinos das suas origens.
Por:
Viviane Lima
Edição:
Evelyn Vilhena

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Empório Casa do Norte São Francisco

Entre um cliente e outro, Rita Queiroz, 55, conta como seu comércio, que vende produtos regionais, a aproxima do território que nasceu e viveu parte da infância. “[Ter uma casa do norte] me aproxima [das minhas origens], porque eu vim de lá criança, vivo aqui há muitos anos, mas nunca me esqueci de lá”, comenta. Rita nasceu na cidade de São Miguel, no Rio Grande do Norte, e chegou em São Paulo aos 13 anos, junto com os pais que se mudaram em busca de emprego.

Rita Queiroz é natural do Rio Grande do Norte e dona do Empório Casa do Norte São Francisco. (foto: Viviane Lima)

Atualmente, Rita mora no bairro Jardim Soraia, localizado no distrito do Capão Redondo, zona sul de São Paulo. A comerciante sempre trabalhou com vendas e, em 2020, decidiu abrir uma Casa do Norte, na mesma região onde mora, após seu marido, Luiz Fernandes, 54, que trabalhava em um restaurante, ter ficado desempregado durante a pandemia da covid-19.

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“Foi um momento difícil, mas a gente [tem] aquela coisa de nordestino, né, [que] sempre corre atrás e não desiste”, diz Rita. Luiz também é nordestino, natural da cidade de Cariré, no Ceará.

Empório Casa do Norte São Francisco. (foto: Viviane Lima)

Rita afirma que a maior parte de seus clientes são pessoas que também se mudaram de algum estado do nordeste para São Paulo. “A maioria dos nordestinos estão nessa área também”, aponta a comerciante se referindo às periferias.

A carne de jabá é um dos produtos tipicamente nordestinos que faz parte do Empório Casa do Norte São Francisco. (foto: Viviane Lima)

De acordo com o censo de 2010, cerca de 2,3 milhões de pessoas que vivem nas periferias de São Paulo, têm como local de origem a região nordeste do país. Desde então, há um intervalo de 13 anos no levantamento desses dados e, provavelmente, houveram mudanças nesse cenário.

Empório do Nordeste

A Empório do Nordeste existe desde 1991, no bairro Jardim Santa Tereza, em Embu das Artes, região metropolitana de São Paulo. A princípio o comércio era chamado tradicionalmente de Casa do Norte e foi criado por Sebastiana Lopes, 67, e Francisco de Araújo, 72. Os dois mudaram de Natal, capital do Rio Grande do Norte, para São Paulo, em meados de 1975 em busca de oportunidades. 

A loja Empório do Nordeste foi criada e está há duas gerações na família de Fabiana Lopes. (foto: Viviane Lima)

“São pessoas muito honestas e vieram bem de baixo mesmo. O que eles têm foi fruto de muito trabalho”, coloca Fabiana Lopes, 40, filha do casal, que em 2016 passou a administrar a loja. Fabiana nasceu em São Paulo, e conta que cresceu nessa casa do norte junto com os pais. “Desde os 7 anos já estou infiltrada no comércio, cresci aqui”, comenta.

Fabiana Lopes administra a loja desde 2016. (foto: Viviane Lima)

Fabiana relata que, embora não tenha nascido na região nordeste, criou um vínculo com o território através dos pais. “Eles me incentivaram a consumir todos os produtos para experimentar”. Ela menciona que muitos dos saberes que têm sobre os produtos típicos vieram daí, dos ensinamentos através dos seus pais.

Empório do Nordeste existe desde 1991, no bairro Jardim Santa Tereza, em Embu das Artes. (foto: Viviane Lima)

A comerciante mora em Taboão da Serra, na região metropolitana de São Paulo, é formada em gestão comercial e administração de empresas, tem um filho e é casada. 

Ela fala que os pais vieram do nordeste com o conhecimento sobre os produtos típicos da região em mente, mas não foi de imediato que eles montaram um comércio. “Eles vieram e foram trabalhar em empresas. E aí conseguiram juntar um capital para montar essa loja aqui em Embu das Artes”. Atualmente os pais de Fabiana, que vivem em São Paulo, são aposentados e passaram o empreendimento para a filha.

“Quando os meus pais começaram 100% dos clientes eram nordestinos, agora está bem dividido, [pois] a culinária nordestina está sendo consumida por todas as pessoas”, coloca. Fabiana conta que a carne seca e o requeijão são os produtos mais procurados na loja, mas que a campeã de venda é a farinha de mandioca.

A farinha de mandioca é o produto mais vendido no Empório do Nordeste. (foto: Viviane Lima)

Casa do Norte Varejão Nobre

Flaviano Pereira, 32, conhecido como Flávio, é subgerente de um supermercado e morador do distrito da Brasilândia. Na mesma região, no bairro Terezinha, ele, junto com Tamires Moreira, 36, sua esposa, administram a Casa do Norte Varejão Nobre.

A Casa do Norte Varejão Nobre fica no bairro Terezinha, distrito da Brasilândia. (foto: Viviane Lima)

“Na região não tinha e aqui é um bairro criado por nordestinos, eu achei uma oportunidade de ganhar dinheiro e montei a Casa do Norte”, conta Flávio sobre a abertura do comércio em 2021. Flávio é da cidade de Boa Viagem, no Ceará, e Tamires é natural do Rio Grande do Norte, do município de Alexandria.

Casa do Norte Varejão Nobre. (foto: Viviane Lima)

Manteiga de garrafa, bolo de rolo, castanha de caju no tacho, bolacha, charque, carne seca, cuscuz e requeijão são alguns dos produtos que fazem parte da loja. Segundo Flávio, o item mais procurado é a farinha de mandioca.

O comerciante conta que, em média, 80% dos seus clientes são nordestinos. “Porém tem os filhos dos nordestinos que são nossos clientes também”. O comerciante diz que o hábito de consumo de produtos nordestinos é algo que, geralmente, se passa de pais para filhos.

Bolo de rolo típico do estado de Pernambuco. (foto: Viviane Lima)

Flávio menciona que toda a família dele é do nordeste. Ele está em São Paulo desde 2003, mas pretende voltar para o seu lugar de origem. “A vida é assim, tem que trabalhar enquanto é novo, achei uma oportunidade de ganhar dinheiro aqui em São Paulo, por isso que eu estou aqui, mas pretendo um dia morar lá.”

Flávio é da cidade de Boa Viagem, no Ceará, e veio para São Paulo em 2003 para trabalhar. (foto: Viviane Lima)

Flávio conta que tem uma suposição sobre o porquê das Casas do Norte não se chamarem Casas do Nordeste, já que grande parte dos produtos comercializados são dessa região: “Eu acho que [é porque] a sigla é mais fácil de pronunciar do que Nordestino, por isso fica Casa do Norte e aí virou uma marca”, compartilha.

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