Varre Vila transforma hábitos de coleta de lixo na zona leste de São Paulo

Edição:
Ronaldo Matos

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Em parceria com moradores e poder público, projeto realiza ações de educação ambiental para melhorar os processos de limpeza e conservação dos espaços comuns das periferias de São Paulo. 

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Quadra do bairro Santa Inês, zona leste, depois da revitalização do Varre Vila. Foto: Redes Sociais

Durante o ano de 2020, auge da pandemia de covid-19, a Prefeitura de São Paulo registrou aumento de 17,4% na coleta seletiva de resíduos domiciliares. Neste contexto, o trabalho de iniciativas como o Varre Vila, teve grande impacto, pois o projeto criado em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, transforma moradores em agentes comunitários que zelam pela limpeza das ruas, praças e vielas do território.

Mesmo durante o período de isolamento social, os trabalhos não pararam para o Varre Vila, iniciativa que existe há 10 anos e tem como ponto de partida realizar este tipo de trabalho de mobilização de moradores no bairro Santa Inês, que faz parte do distrito de Ermelino Matarazzo.

“Antes eu descartava o lixo juntando tudo, não tinha essa noção de como impacta o meio ambiente”

Jenilda Maria de Jesus, 50, é professora e mora no bairro Santa Inês, no distrito de Ermelino Matarazzo. 

Espaço comum de lazer e convívio dos moradores do Jardim Santa Inês passou pelo processo de revitalização promovido pela Varre Vila. (Arquivo pessoal)

Para a professora e moradora do bairro Santa Inês, Jenilda Maria de Jesus, 50, a relação dos moradores com o lixo impactou não só a limpeza do bairro, mas também a auto estima.

“O Varre, além de proporcionar a limpeza da rua, ele também proporciona a limpeza pessoal. Através do trabalho com lixo e com as pessoas, o projeto já começa com diferencial que é o envolvimento com as pessoas como um todo”, afirma a moradora.

Uma das principais mudanças de comportamento notadas pela professora é o aumento de atenção em relação ao descarte e separação do lixo domiciliar. “Antes eu descartava o lixo juntando tudo, não tinha essa noção de como impacta o meio ambiente e aqui a gente não tinha hora para colocar lixo”, relata a professora.

“A gente entra no território desacreditado e vamos fazer um resgate da confiança entre prefeitura, empresa e morador”

Ionilton Gomes de Aragão, 53, é morador do bairro União de Vila Nova e criador do Varre Vila.

Rotatória onde o lixo é acumulado para remoção. Foto: Ionilton Aragão

O idealizador do projeto, Ionilton Gomes de Aragão, 53, um baiano nascido na Chapada Diamantina, e morador do bairro União de Vila Nova, zona leste, afirma que a ideia é promover a mudança de comportamento e melhoramento dos espaços em comum entre os moradores da região em que o projeto atua.

“A gente entra no território desacreditado e vamos fazer um resgate da confiança entre prefeitura, empresa e morador. Nesses lugares em que a confiança está comprometida, principalmente na periferia, a gente vai tentar conversar com as lideranças e lá dizem que não tem jeito, limpa hoje, amanhã já tá tudo sujo de novo”, comenta menta Aragão.

Para o criador do projeto, o Varre Vila é pautado na mudança de comportamento através de conversas e ensinamentos, ministrados por ele e uma equipe do projeto, nos próprios bairros em implementação, batendo de porta em porta e os convidando para entender a proposta de descarte dos lixos orgânicos, sólidos, recicláveis e entulhos.

O idealizador do projeto explica que utiliza os princípios de Paulo Freire e uma das metodologias aplicadas no projeto é como a do metrô, onde os que estão pichados, são recolhidos para a limpeza antes de voltar a circular, ou seja, o autor nunca mais o vê. Segundo ele, com os moradores funciona da mesma maneira em relação ao lixo. Quando um morador vê o descarte incorreto, ele mesmo tira o quanto antes.

“Tudo isso tem a ver com a disciplina. E aí o morador pensa ‘sempre joguei o lixo aqui’ mas eu faço uma abordagem de que eu estou compartilhando a responsabilidade com eles, eu não tô trazendo uma ordem de que tem que trazer o lixo naquele horário, pronto acabou”, explica.

Os moradores dos bairros onde o Varre Vila atua, passaram por um processo de reeducação, onde aprendem a lidar com o lixo reciclável, com os orgânicos e através da composteira transformar em adubo, e também o entulho.

“Hoje é notável, se você chegar aqui no bairro você não vai ver lixo nas calçadas de forma aleatória e até a maneira de descartá-lo é diferente”, enfatiza a professora, ressaltando a transformação que o projeto gerou de forma coletiva no bairro. 

Túnel revitalizado no bairro União de Vila Nova pelo Varre Vila. Foto: Thomaz Martins

Articulação comunitária 

Durante as reuniões que acontecem nas próprias ruas, os moradores recebem orientações de descartes, combinam os melhores dias e horários para o recolhimento de seus lixos e recebem 20 unidades de sacolas plásticas de 50 litros para a partir daquele momento fazer o descarte correto.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, cerca de mais de 50% dos resíduos sólidos são gerados por atividades humanas de construções. Por conta disso, o Varre Vila também propõe a mudança de hábitos dos construtores da quebrada, os pedreiros e ajudantes que recebem orientações mais específicas e diretas sobre os resíduos pós obras. É uma parceria à parte, já que são eles quem dão fim aos entulhos.

“A geração de entulho passa pelo pedreiro, se nós tivermos o pedreiro conosco ele não vai deixar ninguém levar esse entulho para qualquer lugar, ele vai ensacar bonitinho e levar para o ecoponto ou vai contratar uma caçamba”, explica Aragão.

O Varre Vila disponibiliza uma caçamba de lixo na última sexta e sábado do mês, onde recolhe aproximadamente 30 toneladas de entulho. Nos primeiros quatro anos deste serviço, o projeto disponibilizou um calendário anual com imã de geladeira para os moradores, depois desse período virou hábito e não precisavam mais dele.

Segundo a prefeitura da cidade de São Paulo, existem cerca de 10 mil funcionários responsáveis pela limpeza urbana, que atendem aproximadamente 7.800 quilômetros de vias. São coletadas, em média, 270 toneladas de resíduos domésticos por mês.

Ainda assim, iniciativas como o Varre Vila, acabam se tornando uma ação fundamental para promover o serviço onde o serviço público não chega até a população com a possibilidade de oferecer uma educação ambiental.

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