Quilombo Brotas: o primeiro quilombo urbano do Brasil

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Este texto é um convite ao presente e a reflexão de como estamos mantendo nossas relações com as raízes e com a ideia de urbanização e sustentabilidade.

Durante a matéria de políticas públicas e combate ao racismo, ministrada por Eliete Barbosa e Danilo Benedicto no CELACC – USP, pude pesquisar e conhecer a história do Quilombo Brotas, localizado na cidade de Itatiba. Este texto é um convite ao presente e a reflexão de como estamos mantendo nossas relações com as raízes e com a ideia de urbanização e sustentabilidade.

O Sítio Brotas foi comprado em 1888 por um casal de alforriados, sendo o primeiro quilombo urbano do Brasil, porém apenas em 1969 foi realizado o registro em cartório e somente em 2003 o Sítio Brotas foi certificado como Área Remanescente de Quilombo pela Fundação Palmares, tornando-se Quilombo Brotas e ainda hoje está em processo de titulação.

O Quilombo possui problemáticas próprias acerca da gentrificação urbana e dificuldade de diálogo com as instituições competentes. A gentrificação ocorre em conexão com as construções do loteamento Nova Itatiba e com o fortalecimento do avanço de ampliação “urbana” mais “agressiva” no entorno, aqui especulo que isso se conecta com os debates sobre mercado imobiliário e o crescimento de cidades no entorno.

Estas problemáticas passaram a afetar também a liberdade religiosa da população quilombola, já que possuíam uma pequena represa onde eram feitas as práticas religiosas relacionadas a Umbanda, e as obras interferiram no curso das águas fazendo a nascente secar, impossibilitando assim a relação com as águas que dentro das religiões de matriz afro-brasileira são muito importantes, sendo utilizadas para rituais, entregas, banhos entre outros.

O quilombo também é uma área de troca com a natureza, você retira e devolve, existe uma lógica de preservação, então o que é sustentabilidade e urbanismo, quais as lógicas que são levadas em conta quando falamos sobre cidade, tecnologia e crescimento.

Sendo direito constitucional a preservação da cultura afro-brasileira, mas se fez presente durante toda a pesquisa, a angústia dos questionamentos de até onde as estruturas seguem a defesa dessa preservação.

Pude observar no desenvolver da pesquisa que o Quilombo foi esquecido nesse processo de construção e nessa ideia de dinâmicas e pertencimento do local, sendo que a população quilombola está lá desde 1888, o que deixa um tanto quanto difícil não enxergar como parte do racismo institucional, observando as instituições que atravessam os diversos setores do quilombo que foram afetados.

Hoje nas redes o assunto da ancestralidade e das nossas raízes é o foco de muitas pessoas, mas como está nosso povo? Seja nas periferias, nos quilombos e onde desejam estar. Como estão vivendo?

Falar de gentrificação é dizer que existem pessoas sem o direito de exercer sua cultura, sem moradia ou com altos custos de moradia em locais que já residiam anteriormente. A cidade se torna então um lugar ingrato para vivermos. Será que somos parte dela?

A ancestralidade ocorre hoje, o presente é nosso precioso princípio e bússola, o Quilombo Brotas resiste e procura formas de se manter em meio a ausência de seguridade do poder público e as invasões de quem busca lucrar sem respeitar quem ali estava antes. 

Agradeço a Vera, que está como representante do quilombo, pela disponibilidade de ouvir o grupo e realizar essa importante troca. Atualmente o Quilombo Brotas está se reconstruindo após as chuvas e continua enfrentando os embates (que nem deveriam existir), mas que só trazem a tona como ainda não chegamos onde achamos que já estamos.

Agradeço também a Aline, Beatriz, Lilian, Flavio e Sâmia que faziam parte desse grupo de trabalho e compartilharam das descobertas que essa pesquisa trouxe.

Nossa ancestralidade é hoje, somos nós, o passado é referência, o futuro é nossa consequência
Como água que corre e desvia
Como vento que sopra, refresca, mas também derruba estruturas
Como o fogo que esquenta, que incendeia, que não se limita
Como a terra que nos firma em pé, que nos permite construir
Como a liberdade que não existe sem coragem, sem força, sem responsabilidade

Poesia de Agnes Roldan

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