CyberFunk: conheça o futuro do funk nas periferias e favelas

Edição:
Ronaldo Matos

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Movimento futurista criado por jovens da Brasilândia, zona norte de São Paulo, visa transformar o funk numa tecnologia de impacto social de geração de renda, trabalho e autoestima da juventude periférica.

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Foto: Dan Fotografia

“Cada pessoa da quebrada é uma estrela, e o nosso baile é um sistema solar”. Essa é definição que o rapper Rincon Sapiência canta em sua música “Amor e Calor”. Essa referência musical inspirou jovens da Brasilândia, zona norte de São Paulo, a criar um novo imaginário sobre o futuro da cultura do Funk nas periferias, transformando os jovens em protagonistas desse cenário.

A partir destas experiências culturais, dois jovens moradores do território da zona norte criaram o Cyberfunk, uma tendência de tecnologias sociais que na visão deles irão transformar a relação das pessoas com o Funk,  diferente da forma como ele é conhecido nos dias atuais. 

Essa história começa a partir do trabalho cultural de Milena Fonseca, 21, moradora do Jardim Carumbé, bairro localizado no distrito da Brasilândia, zona norte da cidade. Ela é diretora criativa e produtora da festa Afrika Queens, um evento dedicado a resgatar e celebrar a ancestralidade e o protagonismo da mulher negra.

Junto com o fotógrafo Danilo Santos 21, morador de Taipas, bairro localizado em Pirituba, criaram um editorial fotográfico denominado CyberFunk, que segundo eles, é o ponto de partida para o movimento futurista ganhar uma estética e um significado popular e acessível a outros jovens das periferias, por meios das redes sociais.

O editorial retrata através da fotografia os cenários culturais que eles pretendem criar e estar no futuro do funk em suas quebradas. Para esse processo ser elaborado, eles imaginaram um futuro, onde o funk não seja só o movimento que agita as noites na quebrada, mas que também traga um protagonismo para juventude periférica.

“São jovens de vários lugares da cidade contribuindo para essas tendências, essas criações e movimentos” 

Milena Fonseca

“O Funk sempre foi popular, como DJ, eu posso dizer que o Funk é o que anima as festas sabe. Se tocar o Funk a festa vai animar na hora, é uma coisa que foge do nosso entendimento”, afirma a produtora cultural.

Ela não se compromete em trazer uma definição sobre o Funk, mas sim explorá-lo em suas diversas narrativas para criar vários imaginários de futuro. “Ele revoluciona, ele cria tendência sabe, ele dita muitas coisas na cidade, e é um movimento inteiro, são jovens de vários lugares da cidade contribuindo para essas tendências, essas criações e movimentos”, complementa.

Milena faz parte da direção criativa do editorial CyberFunk. Ela conta que teve a ideia de construir cenários de futuro para o Funk e para a juventude periférica quando se juntou com outros artistas envolvidos no projeto, como a Mc Luana, na qual, ela considera uma artista incrível que inspirou a desenvolver a ideia do funk futurista.

O próximo passo de Milena foi mergulhar em referências na internet para criar o nome e o conceito do projeto. “Surgiu esse nome Cyber por causa dessas novas tecnologias que a gente tá acessando e da nova era que a gente tá vivendo”, explica.

Danilo relembra o momento quando os jovens começaram a produzir o editorial CyberFunk, “Fiquei muito feliz nesse dia que ela me mandou toda a proposta, eu fiquei no pique de produzir. O resultado foi muito longe, se é louco”, elogia o fotógrafo, afirmando que os artistas envolvidos também ficaram satisfeitos com o resultado do trabalho.

O editorial CyberFunk pode ser acessado por meio do Instagram. Atualmente, os criadores do conceito futurista vêm utilizando seus perfis pessoais nas redes sociais para alcançar e se conectar com a juventude periférica, que enxerga no funk um movimento cultural transformador.

“Hoje a internet é o nosso maior transporte”, avalia a produtora executiva. Ela revela que o projeto irá ganhar novos formatos de conteúdo para abordar o tema CyberFunk.

A diretora relembra que esse movimento do CyberFunk vem na tentativa de modificar alguns conceitos que existem atualmente no Funk. “A cena do funk ainda é muito quadrada em relação às mulheres, em relação a identidade de gênero, em relação a várias coisas. Eu acredito que quem pode modificar isso somos nós”, acredita Milena.

O fotógrafo que é parceiro de Milena no projeto CyberFunk enfatiza a sua crença no Funk e ressalta como essa cultura está conectada com a transformação da juventude periférica. “O funk já passou o tempo de falar muita besteira sabe, hoje os moleques e as minas estão vindo pra revolucionar de verdade, eu acredito nisso, nessa melhoria sempre na área do Funk”.

Um dos propósitos do CyberFunk, segundo Danilo é abordar a autoestima da juventude periférica, para que as pessoas possam se reconhecer como parte deste movimento. “Nosso trampo tem tudo haver com autoestima, a pessoa não se vê como ela é, aí vendo uma foto que foi tirada ela fala: caramba eu sou bonita sim”, analisa o fotógrafo.

Para Danilo, conectar a arte da fotografia com a autoestima da pessoa logo após o fotógrafo ressalta que trazer esses temas para seus trabalhos se conecta com sua arte

“Eu gosto de levantar a autoestima da pessoa, meu trabalho é esse também. Eu acho que isso faz parte do Funk também”, acrescenta Danilo, destacando que o seu trabalho está crescendo e que ele começará a trabalhar também com artistas que cantam Funk agora. “Recentemente eu abri um canal no Youtube e vou começar a produzir clipe também, quero fazer isso”.

O Funk e a economia da quebrada 

Ao descrever a necessidade de trazer novas narrativas de futuro para uma cultura que sofre repressão dentro das periferias, Milena ressalta que além de um impacto cultural, o CyberFunk visa ter um impacto econômico na vida de diversos moradores das periferias, que muitas vezes se encontra sem perspectiva de futuro.

“É a porta de oportunidade para várias pessoas periféricas. Ser um MC e trampar com isso é um sonho que consome a juventude de verdade, em cada quebrada tem pessoas, tem artistas que subiram e conseguiram fazer uma grana e ser reconhecidos”, enfatiza Milena.

Foto: Dan Fotografia

Ela complementa sua visão de futuro afirmando a necessidade de criar uma identidade cultural aonde a periferia não ganhe apenas com a música, mas com todo o ecossistema que gira em torno dela. “Eu acho que a economia vira uma chave porque aí já é outra história, não necessariamente sendo MC, mas fazendo outras coisas”, explica.

Um dos cenários de futuro apontados por Milena para o desenvolvimento da economia do Funk nas periferias é a construção de uma rede social voltada para o movimento CyberFunk. “Imagino toda arte feita de neon, pessoas fabricando seus próprios kits, pessoas fabricando suas músicas e vendendo nesta rede social também”, vislumbra.

Ao lado da sua parceira de trabalho, Danilo ressalta a importante presença do Funk no ciberespaço, como uma das principais ferramentas de visibilidade para Mc’s, para além dos bailes de favela. “Mano o funk faz as pessoas se sentirem feliz, imagina quando isso melhorar ainda mais tá ligado? Tem vários menor que curte e quer fazer um som hoje em dia e que se vê na internet”, exclama o fotógrafo.

Com uma consciência crítica e bem apurada sobre a importância das tecnologias, os artistas afirmam que ela é um meio de comunicação eficiente e acessível para conseguir se expressar, mas ressaltam que não é um fim, e traz a necessidade de enxergar além dos algoritmos. “A internet aproxima e facilita nosso trabalho para que ele chegue mais longe, e o trabalho de outras pessoas que estão longe chegue até a gente, mas a arte tá quase em tudo, só ter a sensibilidade de enxergar, que você vai ver estar em tudo”, conclui Milena. 

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