Reportagem

Jovens do Jardim Ângela relatam suas perspectivas após se vacinarem contra a covid-19

Edição:
Evelyn Vilhena

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Durante o mês de setembro, realizamos um levantamento com 44 jovens, de 15 a 26 anos, em sua maioria moradores do Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo, para entendermos quais são suas perspectivas de futuro após se vacinarem, como refletiu na realidade de cada um e de que forma tiveram a saúde mental afetada.

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Foto/Reprodução: Flávia Santos

No início do mês de agosto de 2021, a população jovem de São Paulo começou a ser imunizada contra a covid-19 e muitos jovens movimentaram suas redes sociais com posts e hashtags sobre a vacinação. O Desenrola conversou com alguns jovens das quebradas de São Paulo, para entender como parte deles tem reagido após a imunização contra a covid.

Realizamos um levantamento com 44 jovens, de 15 a 26 anos, em sua maioria moradores do Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo e de acordo com os entrevistados, muitos deles se sentiram mais confiantes depois de tomarem a vacina, outros nem tanto, se mostrando ainda bem preocupados.

Entre os 44 jovens da quebrada que fizeram parte do levantamento, 25 deles contaram que já estão saindo de casa e se encontrando com amigos, e outros 19 jovens afirmaram ainda não se sentirem seguros para isso, sendo que alguns deles relataram que saem apenas para trabalhar ou estudar. Todos os jovens se vacinaram, com a primeira ou as duas doses para imunização.

Conversamos com a Livian Araújo, 21 anos, moradora do Vila Gilda, bairro que faz parte do distrito Jardim Ângela, zona sul de São Paulo que participou do levantamento. Ela é graduanda em Enfermagem, já tomou as duas doses da vacina e nos contou sobre como sua rotina está sendo reconstruída depois de ter se vacinado e sua família também.

“A partir do momento que tomei a primeira dose e meus familiares também tomaram, voltamos a ter costumes que tínhamos no mundo antes da pandemia, ainda seguindo todos os protocolos de segurança, revi amigos, parentes, senti confiança para enfim finalizar meus estágios obrigatórios do curso técnico de enfermagem e trouxe principalmente a esperança para um melhor cenário, tanto em número de mortes, quanto de casos” afirma Livian.

Por mais que já tenha tomado as duas doses da vacina, ela pontua que continua tomando todos os cuidados necessários quando sai de casa, pois o vírus continua circulando e a vacina protege apenas de um estado grave.

“Estou saindo e encontrando aos poucos, mas nunca em ambientes fechados e lotados ou com mais de 20 pessoas. Todo cuidado ainda é primordial para esse momento com chances de uma nova onda com a variante Delta”, relata ela. 

Livian Araújo, de 21 anos, tomou as duas doses da vacina na UBS Cidade Ipava / Foto: Flávia Santos

Outra jovem que ouvimos foi Thalita Lima, de 19 anos, moradora do bairro Cidade Ipava, no Jardim Ângela, que também já tomou as duas doses e que conta como a pandemia e toda realidade que estamos vivendo influenciou em sua vida pessoal, comparando suas experiências antes e durante o covid-19.

“Um amadurecimento mais rápido sobre responsabilidades, e o quanto eu tive que me apegar mais na minha fé sobre toda essa situação, e até o presente momento tá sendo tudo muito mais complicado em conquistar meus objetivos”, desabafa a jovem que segue se cuidando e imagina um futuro sem pandemia e mais esperançoso.

Mesmo tendo sido imunizada, a jovem reforça que os cuidados não podem parar, que a vacina protege, mas que ainda é possível contrair o vírus e levar para amigos e familiares. 

Pamela Cuba, 21, também moradora da Cidade Ipava, estudante de nutrição, tomou as duas doses da vacina contra o covid-19 e conversou com o Desenrola. Seus relatos se assemelham aos de outros jovens, com esperança e sempre mantendo seus cuidados com os mais próximos.

“Minha perspectiva não melhorou 100%, mas a vacina traz uma esperança que tudo volte ao normal logo, uma segurança para os meu familiares”

relata a jovem.

Pamela diz que em todo período da pandemia usou suas redes sociais para influenciar as pessoas com informações relevantes, para dessa forma conscientizar o público que alcançava.

“Eu compartilhava nas minhas redes sociais algumas informações também, sobre os efeitos de cada vacina, como elas reagem no nosso organismo, etc”, concluiu ela sobre a importância das pessoas se informarem corretamente e essas informações serem repassadas.

Pamela Cuba, de 21 anos, tomou as duas doses da vacina na UBS Cidade Ipava / Foto: Flávia Santos

Consequências emocionais

“Minhas crises de ansiedade aumentaram, eu tive um momento de quarentena que faltei muito pouco para ter um surto”

 relato de um dos jovens que participaram do levantamento.

“Perdi muito do pouco que tinha de controle da minha saúde mental e com a atual conjuntura econômica do país, e todo esse turbilhão de informações, digamos que influenciou um pouco no meu cotidiano e na ansiedade”

Também levamos a seguinte pergunta para os jovens que dividiram suas perspectivas com o Desenrola: “Qual foi a maior diferença que você notou em si mesmo comparando a realidade antes e durante a pandemia?” e o retorno que tivemos com maior frequência foi referente ao estado emocional abalado.

“Durante a pandemia eu me vi muito mais ansiosa, insegura e estressada com relação a antes e isso afetou muito na minha interação com pessoas que eram próximas a mim”, relata Livian Araújo.

“Após a vacinação que eu comecei a de fato sair de casa para os meus compromissos e retornar a minha rotina, ter o contato com outras pessoas, isso melhorou drasticamente minha saúde mental e já vi uma evolução nítida”

afirma Livian.

Pamela e Livian / Foto: Flávia Santos

A angústia de não ter certeza do que vai ou não acontecer no futuro, agravada pela pandemia, é uma preocupação diária de muitos jovens periféricos. Para falar sobre esse aspecto, conversamos com Julia Malvezzi, psicóloga comunitária que trabalha com jovens da Rede Ubuntu, espaço de educação popular, que também foi afetado de forma significativa.

Julia explicou sobre a essência da Rede Ubuntu, e que com o impacto da pandemia, muitas atividades idealizadas para auxiliar os jovens, como rodas de conversas, bate-papos e trocas vêm acontecendo remotamente, desde 2020, quando as instituições precisaram suspender aulas presenciais.

“Acho que a primeira coisa que podemos pensar sobre o que aconteceu com um jovem da periferia na pandemia, é que esse jovem já vive uma vulnerabilidade social, de não ter acesso a educação, que às vezes precisa buscar um emprego ao invés de estar estudando”, analisa a profissional. 

“Perdi muito do pouco que tinha de controle da minha saúde mental, e com a atual conjuntura econômica do país e todo esse turbilhão de informações, digamos que influenciou um pouco no meu cotidiano e na ansiedade”

 relato de um dos jovens que participaram do levantamento.

A psicóloga trabalha no intuito de contribuir com a saúde mental do público, partindo do princípio que a saúde mental de um jovem começa a partir do momento em que ele se reconhece, conhece a si mesmo e o seu valor dentro da sociedade.

“Pensar na saúde mental de um jovem da periferia é perguntar a ele: ‘você tem um espaço onde você possa narrar sua própria história? Onde você pode pensar quem é você? Alguém está te escutando?'”, argumenta a psicóloga.

argumenta a psicóloga.

Júlia conversou com o Desenrola sobre suas experiências com os jovens de quebrada, mas afirma que não há pessoa melhor para falar da juventude, se não a própria juventude. Ela reforça que os jovens precisam ser ouvidos em todos seus locais de socialização e relacionamento.

“A pandemia trouxe ao jovem uma crise do futuro. Então, “qual é o sentido de eu estudar sendo que talvez não exista futuro? Qual é o meu futuro?’, se o futuro já era difícil para um jovem da periferia, a pandemia trouxe um futuro mais machucado”, finaliza. 

*Esta reportagem foi produzida com o apoio do Fundo de Resposta Rápida para a América Latina e o Caribe organizado pela Internews, Chicas Poderosas, Consejo de Redacción e Fundamedios. O conteúdo dos artigos aqui publicados é de responsabilidade exclusiva dos autores e não reflete necessariamente a opinião das organizações. 

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