Produtores de alimentos orgânicos no Jardim Ângela, contam sobre a importância de se apropriar da comida que é produzida no território e como a agricultura familiar foi uma fonte de conexão e renda para eles, principalmente no período da pandemia de covid-19.
Há um bom tempo a proximidade com alimentação orgânica e agricultura familiar já fazem parte da vida de Santa Sabina, 46, e do seu marido, Hernando Sousa, 55. Nascida em São Jerônimo da Serra, no Paraná, Santa tem raízes familiares próximas ao território rural, e alguns anos depois se reaproximou dessa atividade. Seu companheiro, Hernando Sousa, é nascido em Itaobim, Minas Gerais, onde trabalhava na roça.
Santa e Hernando moram há 18 anos no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo, e se conheceram quando trabalhavam em uma padaria, já morando em São Paulo. Em 2008, ainda quando atuavam na padaria, fizeram um curso de capacitação oferecido por uma ONG, que ensinava sobre o cultivo de alimentos orgânicos. Chegaram a trabalhar por um período na ONG, e logo em seguida passaram a cultivar a própria horta em casa.
“Na verdade a nossa saúde vem do alimento, né, mas as pessoas não sabem porque não tem o conhecimento próximo, o verdadeiro. Só que o nosso objetivo era fazer o certo, não enganar ninguém por dinheiro”, coloca Hernando.
O cultivo de alimentos orgânicos no terreno de casa, já acontece há 14 anos na vida do casal, que iniciaram com o intuito de ter alimentos para consumo próprio, mas que ao longo do tempo passaram a vender para moradores do bairro. Foi há 4 anos, em 2017, que passaram a pensar uma estrutura para a comercialização dos alimentos orgânicos no território.
Hoje eles se organizam e trabalham juntos com o núcleo familiar, onde os filhos fazem as entregas semanais de acordo com o que foi produzido naquele período.
“Quando veio esse período da pandemia, a gente prosseguiu. Minha esposa fazia as planilhas tudo em casa, a gente tinha a certificação. A gente faz tudo registrado, não tem nada de engano”, conta Hernando.
Os clientes recebem por WhatsApp a lista dos produtos da semana, que incluem hortaliças, chás e ervas, ovos, às vezes até animais que são criados no terreno da família no Jardim Ângela.
“Nós aprendemos que o sistema não nos ensina a verdade porque quer nos escravizar. Porque você compra tudo no mercado parece que é alimento saudável”, coloca.
Santa e Hernando, contaram que o trabalho com a horta, que deram o nome de Semeando o Futuro, foi essencial durante o período de isolamento social e que se não fosse pela clientela construída ao redor do bairro, eles teriam passado dificuldades.
Maria de Fatima Antônio, 62, moradora do bairro Jardim Fraternidade, localizado no distrito do Jardim Ângela, conheceu o trabalho da família através da indicação de uma amiga. Preocupada com a saúde, ela diz estar muito satisfeita com o trabalho, já que recebe produtos frescos, variados e de qualidade.
Apesar da pandemia, que a impossibilitou de ir até o terreno buscar os produtos, a mudança na forma das entregas ajudou a família a manter a cliente.
Garantia de acesso
A agrônoma, integrante da equipe técnica da SOF – Sempreviva Organização Feminista e atuante da ATER – Assistência Técnica e Extensão Rural, Glaucia Santos Marques, analisa a importância de iniciativas nas periferias voltadas para alimentação saudável, em contraponto a ideia de classes que gira em torno do tema.
“É muito importante ter hortas urbanas, hortas nos territórios, experiências de países que passaram por crises, e fico lembrando de bloqueios, como Cuba teve. A importância que teve as hortas urbanas para soberania alimentar, como isso muda, como isso é uma potência para tornar mais acessível a alimentação das pessoas”, analisa a agrônoma.
Ela compara as diferenças no acesso entre pessoas que começaram a comer orgânicos por questões de saúde, acesso à informação ou por terem tido algum problema de doença na família e passaram a se preocupar em se alimentar de forma saudável, sendo que o cenário não é o mesmo para grande parte da população.
“Eu acho que na periferia a preocupação é sempre outra, é sempre como chegar no final do mês tendo uma refeição pra todo mundo da família. Infelizmente a gente tá vivendo essa realidade a muito tempo, tendo que espremer o dinheiro pra chegar no final do mês, então você deixa de comprar um legume, por exemplo. Na pandemia reduziu o consumo de hortifrúti na periferia, não é o orgânico, mas o pessoal deixou de ir na quitanda”, coloca Glaucia.
“Várias pessoas tentaram consumir alimentos que aumentam a imunidade, para melhorar a saúde, teve muita gente que começou a plantar nos quintais, nas hortas comunitárias, isso existe há muito tempo na periferia”, afirma a agrônoma Glaucia Santos.
Diante do cenário de insegurança alimentar e até mesmo falta de comida que diversas pessoas passam e que sofreram ainda mais durante a pandemia, Glaucia afirma que poderiam existir mais espaços coletivos voltados para alimentação e cultivo. “Se tivéssemos áreas e espaços de plantio coletivo muita gente estaria plantando para o próprio consumo”, aponta.
“As pessoas não entendem a diferença entre cuidar de roça e cuidar de horta. A horta exige atenção o dia todo, tudo interfere, é quase como um bebê” – Santa Sabina.
Santa cuidando da horta que fica localizada no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo.
A família de Santa e Hernando, buscaram no cultivo e venda de alimentos orgânicos um caminho para consumirem produtos mais saudáveis, disseminar a produção pelo território e que mesmo não sendo o objetivo principal, conseguiram gerar renda a partir da alimentação saudável no território. Eles não se consideram empreendedores, e reforçam que acreditam na comida como uma forma de melhorar a saúde e ajudar a comunidade.
“O produto orgânico é totalmente diferente do mercado. Às vezes as pessoas acham feio, porque é pequeno, acontece deu juntar mais pés de alface pra ficar mais cheio, até saiu no prejuízo, mas prefiro fazer meu cliente ficar feliz e saudável, do que tacar veneno. Isso não é qualidade” afirma Santa.
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