Em 2015, estudantes ocuparam escolas e ruas para dizer não a “reorganização” proposta por Geraldo Alckmin em São Paulo. A reorganização resultaria no fechamento de 94 escolas, o que mudaria a vida escolar de mais de 300 mil estudantes e cerca de 74 mil professores.
À nível nacional tínhamos duas políticas de cortes que afetariam a educação naquele momento. A primeira era a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que visava limitar gastos em diferentes áreas, incluindo a educação. Já a segunda era a PEC do Teto (PEC 55) que alteraria a Constituição Federal (1988) e congelaria por 20 anos recursos públicos.
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A partir dessas movimentações aconteceram duas mobilizações estudantis consecutivas, sendo a primeira em 2015 e a segunda em 2016. Dessa forma, o movimento político dos estudantes protagonizou uma luta importante, ganhando até músicas como “O trono do estudar” produzida em união de diversos cantores. O movimento de 2016, intitulado como “Primavera Secundarista”, se tornou um marco e teve “vitória” naquele ano.
Em 2013, as jornadas de junho já haviam sido um marco político e social, a organização “livre” e com uma descentralização em relação a partidos políticos já chamava atenção. Além disso, a luta do Movimento Passe Livre tomou não somente as ruas do centro da cidade de São Paulo, como também as periferias com o pedido de que os trabalhadores fossem para rua.
Nessa época, eu tinha 12 anos e participei dos protestos do MPL na Zona Sul, irei deixar uma foto do dia que alguns integrantes do movimento vieram dormir na Associação que meu pai preside.

Em 2015 os estudantes se posicionaram para afirmar que a escola era deles, um lugar diferente da narrativa receptiva, o clamor era pelo coletivo. A Prof. Dra. Flavia Ginzel em sua tese de doutorado intitulada A insurgência da crítica e a crítica da insurgência:
resistência, autonomia e desafios pós-ocupações secundaristas (2024), a pesquisa realizada com jovens “ocupas” após as ocupações em Sorocaba traz importantes contribuições a partir das experiências narradas por esses jovens, não só reafirma questões trazidas por outros estudos como o olhar para a escola como um lugar de reconhecimento, pertencimento, de trocas, saberes e diversidades, mas também da construção de olhar desses jovens para a política e a decisão de se organizarem contra essas políticas incisivas do Estado.
Partindo desses olhares e da minha experiência pessoal nas lutas é que decidi construir este texto para perguntar: de quem é a escola?
Ao observamos os movimentos após a Primavera Secundarista, a nível nacional e estadual as políticas que nos assustaram foram reformuladas, ampliadas e aprovadas. Pensando nisso, decidi retomar esse recorte temporal, pois estamos vivendo em um momento desafiador para a educação, especialmente à nível estadual.
A partir de 2017 as políticas voltadas a educação focaram em fomentar a ideia de que o novo modelo seria mais compatível com o “mercado” ou com formar o estudante dentro da área de interesse, o NEM (Novo Ensino Médio), não somente ampliou as cargas horárias, como flexibilizou o currículo e propôs os itinerários formativos.
O projeto é interessante, a discussão sobre ele precisa de um aprofundamento que uma coluna não dará conta de realizar, mas é fato que entre o projeto e a prática existe um vão, um vão que também é composto pelo o que é oferecido de recursos a escola e comunidade escolar como um todo.
Para além dos debates sobre recursos, essas políticas excluem a realidade do estudante periférico que precisa trabalhar, por exemplo. Também não pensam melhores condições de trabalho docente.
Uma complementa a outra, mas não parecem contínuas, à medida que não pensamos que um estudante que trabalha não vai optar por estar na escola somente por receber 200$ do Pé de Meia, e se temos que implementar esse tipo de política é porque algo não está compatível com o ideal colocado primordialmente.
A escola vira um objeto, perde a sua essencialidade, aprender se torna algo pautado não no conhecimento, mas no marketing desse conhecimento. A escola é de quem? Se em 2015, os estudantes gritavam nas ruas que a escola precisava se manter, melhorar e pediam por melhores ambientes para toda a comunidade escolar, o que nos restou?
Qual estudante permanece nessa escola? Para é essa escola?
Não digo aqui que tenhamos que realizar a crítica de maneira extrema, mas no mínimo precisaríamos revisar, à nível nacional, quais caminhos estamos direcionando para a educação em nível médio no Brasil. Já à nível estadual, não é preciso uma lupa para enxergar que todas as políticas caminham para a iniciativa privada, e não possuem tempo e nem espaço para debate.
À qual interesse serve uma escola cívico-militar? De quem e para quem é essa escola? Não digo que não tenham estudantes que gostem da ideia, mas qual projeto de escola é esse? O que muda e melhora no currículo? S e o foco é o aluno e as trajetórias desses estudantes, quais conhecimentos e recursos essa escola oferece?
Como disse, esse texto não dá conta de responder, mas relembrei a lutar para que possamos refletir o que ficou para nós após esses 10 anos? O que podemos observar nas políticas de educação agora? De quem é essa escola?
Se em 2015 e 2016, lotamos as ruas para afirmar que as escolas eram nossas e que não aceitaríamos políticas de destruição, quais realidades temos agora? O projeto de escola que está vigente pertence a quais interesses? E quais alunos são contemplados por esse projeto?
Segundo dados publicados em uma nota técnica em 2023 pela Rede Escola Pública e Universidade (REPU):
“Os dados analisados permitem afirmar que a expansão do tempo integral no ensino médio não ampliou as matrículas nesta etapa de ensino nas redes estaduais em todo o país. Ao contrário, o que vimos, desde 2008, é uma perda de quase 830 mil matrículas, sendo a redução das matrículas noturnas uma das principais variáveis que impactaram esta redução. Vale ressaltar que tal perda de matrículas tem sido contínua desde 2008, indicando que a aprovação das legislações, programas e políticas com foco no ensino médio e na expansão do tempo integral no referido período não produziram os efeitos de expansão da oferta e, muito menos, de universalização desta etapa da educação básica”.
A partir da perspectiva que segui nesse texto, essa é uma escola para marketing, é um projeto de escola que não pensa no conhecimento e nem nas trajetórias reais dos alunos e tampouco se interessa pelos territórios onde serão desenvolvidos os projetos. Há uma padronização da educação e uma política excludente em relação à jovens periféricos e suas trajetórias.
Após 10 anos, qual escola temos?
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