Essa frase retirada da música do Belo me deu o desafio de desenvolver um texto sobre emoções e sua importância no jogo político.
Quem lê essa coluna e a acompanha desde o início sabe minha visão como autora acerca das figuras políticas e do que podemos analisar sobre construção de imagem, imaginário e simbologias através de falas, frases e ações. Mas por que amam tanto figuras extremas ou que nos parecem controversas? Aquelas que não parecem ter coerência?
Vamos relembrar o conceito do ser humano como pessoa múltipla, mas para além disso, um ser subjetivo. A política se faz junto à sociedade, ela a acompanha e assim como suas tendências seriam ignoradas?
Por que a paixão importa? Existe racionalização completa de algo como votar? Na TV, Siqueira Júnior, nos mostra um mar de emoções, uma figura questionável, mas que joga e faz uso das crenças, da tragédia, da comédia, você rir enquanto assiste os dados de morte ao fim de uma tarde. Poderia então se construir imagens sem mexer com emoções?
“Atrás de um ditador existe um grande amor”, essa frase retirada da música do Belo me deu o desafio de desenvolver um texto sobre emoções e sua importância no jogo político. Ela que dará título a este breve texto que tem como foco principalmente trazer uma reflexão e jamais uma conclusão do que seria a influência do uso das emoções dentro de campanhas políticas.
Irei iniciar trazendo uma análise da última campanha de Bruno Covas, com título “Força, Foco e Fé”, que traz uma identidade para seu momento de vida e casa com conceitos do dia a dia (algo que estamos exaustos de ver e rever nas campanhas), mas para além disso uma campanha extremamente emocional, com direito a relato de vida extenso, vídeos em viagens enquanto estava doente e a coisa mais forte: morar na Prefeitura enquanto enfrenta a morte.
Isso dá a ele não somente o título de sobrevivente, mas de salvador, ele é parte do povo em alguns recortes do vídeo e ao mesmo tempo é o cara que “foi criado para ser governante, veio de família, com história”. Ele é aquele que pode não só por saber, mas por jamais (nem em seu leito de morte) abandonar o povo.
Uma leitura dramática, mas real, o marketing político e as emoções movendo o voto. Não que isso nos torne irracionais, sabemos que emoções fazem parte das vivências e do nosso cotidiano, mas coloco aqui reflexões de onde nascem as paixões por aqueles que seriam nossos algozes?
Milton Leite, outro exemplo, irá usar forró em suas campanhas, mas para além disso formará uma família em torno de seu nome, um trabalho muito bem-feito que pode não mover montanhas, mas mantém poderes.
Uma família, pai e filhos, eleitos e que não só conquistam votos, conquistam emoção ao fazer um churrasco anual e abraçarem famílias que os seguem. É neste momento que você leitor mais crítico pode rir e dizer: “mas ele não faz nada, quem não vê isso?”, eu diria o oposto, ele faz muitas coisas, talvez nossos olhos estejam trancados em uma perspectiva tão crítica a ponto da nossa crítica não se aprofundar, por isso observo grupos políticos como a “Família Leite” e me coloco enquanto moradora e participante lendo suas placas, vendo emoção e fé nas pessoas a algum tempo.
Será que a emoção é descartável? Nesse jogo, eu precisaria te fazer sentir amado? Ou eu posso apenas conversar com você sem criar laço nenhum?
Trago novamente Bolsonaro (como fiz em meu último texto), uma figura sem dúvidas, inédita, e que ainda possui seguidores apaixonados, é paixão, as manifestações “pequenas” que ainda ocorrem são feitas pelos apaixonados, aqueles que já não se colocam como aprendizes, mas donos de uma verdade única: ele é o “mito”. É paixão. Getúlio Vargas vai mover laços através da rádio, é emoção, é nacionalismo, é o povo.
Talvez olhemos pouco para como vem sendo construído o cenário político no Brasil a anos, com Boni moldando a imagem de Collor nos anos 90, com prefeitos sendo “sexys”, com futuros candidatos provando masculinidade nas redes sociais.
Existe mais para ver além do que nos enfurece? Talvez nem tudo seja sobre certo e errado? Talvez os abraços sejam dados aos aliados (sejam eles opostos anteriormente ou não). E os carinhos ao povo para manutenção de uma ideia do governante enquanto famoso. A voz, a imagem, o poder, são emocionais.
“Portanto, é preciso, em primeiro lugar, tentar esclarecer o que entendemos por emoção, antes de aplicar essa noção no exame da política contemporânea. Emoção encontra seu equivalente no velho sentido da palavra paixão, que designa o conjunto de movimentos afetivos, mais ou menos estáveis, engendrados pelo choque de um estado individual com a análise de uma situação. Isto implica em duas consequências importantes: as emoções não resultam de um encaminhamento puramente individual, mas se inscrevem em uma perspectiva social e cultural; elas não se opõem à cognição.”
Christophe Prochasson, Scielo Brasil, 2009
Eu poderia continuar escrevendo aqui as lógicas do coletivo nisso, o poder do discurso ou várias outras teorizações, mas esse texto buscou tratar que atrás de um ditador existia um grande amor, porque talvez o complemento que Belo faz na frase seguinte “sempre fui apaixonado por você”, possa ser utilizado de maneira muito ousada para fazer referência até aos nossos saberes inconscientes, as ideias que não aprendemos ou a costumes que carregam consigo valores únicos, pertencentes a uma única classe, que jamais perdeu. Eu sempre fui, nós sempre fomos apaixonados por algo, mas o quê?
As emoções não são ruins, o texto não pretendeu tratar campanhas políticas como algo horrível, muito menos desprezá-las, mas sim dar ao leitor um pouco mais de poder na hora de pensar política partidária. Não esqueçamos quem está do nosso lado, ao que podemos ser condicionados e até mesmo aquilo que pode ou não nos mover.
Ao quebrar e iniciar uma quebra de estruturas, compreendamos que eles irão fazer de tudo, usar todas as formas e reutilizar suas armas contra nós. Mas nós temos a nós. Nossa ancestralidade. Nossa construção.
“Eu sei que o sonho ainda pode acontecer.”
Belo, Reinventar