Opinião

Ancestralidade: as águas que limparam o sangue também regaram a terra

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 Do costume de cantar e comer ao modo de lavar as roupas. A ancestralidade mora no dia a dia, naquilo que nos toca porque é real.

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Praça do Campo Limpo, zona sul, SP/2017 – Foto: DiCampana Foto Coletivo

Muito se fala em como a ancestralidade seria importante, mas as narrativas nos fazem pensar que a mesma mora distante do nosso olhar, quando na realidade nossa ancestralidade se faz presente no dia a dia e nos hábitos que nem sabemos de quem herdamos, mas estão vigentes.

Esta ancestralidade que faz parte de nós pode sim ser redescoberta, ser estudada e por vezes ser reconhecida nas falas de outras pessoas, mas mora em nós. Do lavar as mãos ao hábito do uso de ervas na comida. Do costume de cantar e comer ao modo de lavar as roupas. Da estética vinda do samba de roda ao rock. A ancestralidade mora no dia a dia, naquilo que nos toca porque é real.

A ancestralidade não foi encontrada em livro, nem em blog, a ancestralidade não foi embora de nós, ela foi saqueada sem permissão, foi apagada para que nossos ancestrais perdessem as forças pois tirar o dia a dia, a família e a língua de alguém é a maior violência que se pode aplicar, não à toa Portugal foi bem sucedido em seu colonialismo mesmo sendo um país falido.

Todavia, mesmo com essa trajetória as construções ocorreram e as trocas de afeto foram se constituindo, o Brasil tem mais de África do que de Estados Unidos e não precisa ser um grande estudioso para saber disso, as águas que limparam o sangue também regaram a terra, os morros que foram isolamento também constituíram novas formas de se relacionar.

Não existe romance nessa história, isso é nítido, mas existe vida, pulsante, existe afeto, existem saberes que foram passados durante séculos em comunidade, existem saberes que nunca nos disseram o que são, mas temos. Afetos que sabemos trocar e que sabemos construir.

A periferia vive e bebe o tempo inteiro dessa história, nossas vivências são parte disso, não aprendemos somente olhando para fora, também nos reconhecemos olhando para nós, para nosso redor, compreendendo nossas próprias formas de viver, de se comunicar e de sobreviver.

Foto: Pedro Oliveira

Esse texto é uma forma de me comunicar com uma parte de mim que ainda conflita muito em falar sobre o que me cerca intimamente, talvez começar a me reconciliar com aquilo que sempre senti, talvez abrir alas para contar o que sei de África até agora, que é pouco, mas que já transformou muito do meu dia a dia. O texto mais breve de todos os que já escrevi nesta coluna e talvez o mais introspectivo.

Mas sobretudo, feito com o foco em destacar que é preciso valorizar nossos saberes, nossos modos de viver, é necessário entender a ancestralidade como parte de nós, não como um organismo distante.

“Nludi nzo ka u natanga muntu mosi ko”

O teto da casa nunca é levantado por uma pessoa só

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1 COMENTÁRIO

  1. Pode crê! Apesar de roubada, nossa ancestralidade se encontra adormecida dentro de cada um de nós, nesta mesma forma citada no texto, na dinâmica da vida nas quebradas, que são uma extensão da pós ancestralidade, na maneira de tratar o mano na rua, e os ensinamentos passados para os menor

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