Fotorreportagem

Grupo atua para mudar a visão da população sobre pessoas com deficiência em Osasco

Edição:
Evelyn Vilhena

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Atendendo cerca de 400 pacientes no bairro Jardim Cipava, localizado em Osasco, região metropolitana de São Paulo, a organização Igats busca possibilitar maior autonomia e independência aos pacientes através de atividades ligadas principalmente à arte.

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As aulas de música funcionam como terapia para Rodrigo Sobral, conta o professor José Elias Foto: Mateus Fernandes.

As aulas de música funcionam como terapia para Rodrigo Sobral, conta o professor José Elias Foto: Mateus Fernandes.

O IGATS, Instituto de Gestão, Administração e Treinamento em Saúde, foi criado em 2009, originalmente no bairro Jardim Belval, em Barueri. Atualmente o instituto atua em unidades espalhadas por 8 municípios em São Paulo. Entre essas unidades, está a do bairro Jardim Cipava, em Osasco, que atende cerca de 400 pessoas moradoras de bairros do entorno, sem restrição de idade.

Através de um acompanhamento contínuo, a organização utiliza diversas abordagens para melhorar a saúde e a educação de pessoas com deficiência, entre elas o trabalho com materiais recicláveis. “É a nossa maior matéria prima aqui, até por causa de nossos recursos virem muito de doações”, conta Ricardo Beserra, psicólogo e um dos coordenadores da unidade de Osasco. 

Denise Fernanda, de 60 anos, exibe artesanato que realizou no IGATS Osasco. Foto: Mateus Fernandes.

“Eu gosto de vir,  senti falta em casa quando não tava podendo vir [para o espaço].”

Conta Denise Fernanda,  paciente.

Na unidade, que antigamente era uma escola de educação especial, existem dois núcleos: na parte de baixo está o Centro Especializado em Reabilitação (CER 2 Osasco), e Núcleo Ambulatorial, onde ocorrem atendimentos de saúde agendados. O outro núcleo, na parte de cima da unidade, é um Núcleo de Convivência, frequentado por aqueles que eram alunos da antiga escola.

Como o local antes era uma escola de educação especial, com a mudança da legislação, esses usuários não poderiam ser desassistidos, sendo assim, através do Núcleo de Convivência eles continuaram sendo estimulados.

Equipe do IGATS Osasco. Foto: Mateus Fernandes.

Os frequentadores recebem atendimento de especialistas em áreas como neurologia, psicologia,  fisioterapia, educação física, enfermagem, fonoaudiologia e dentista. Os trabalhos não são apenas ambulatoriais e clínicos: há trabalhos terapêuticos realizados com música, dança e esporte. Além disso, tem também o acompanhamento com assistentes sociais.

Paredes do CER 2 Osasco. Foto: Mateus Fernandes.

A existência de várias salas no espaço, permite que ocorram atendimentos tanto em grupo como mais individualizados. “Tudo depende da maneira como o paciente vai estar melhor se beneficiando”, afirma Rebeca Mancini.

As salas de atividades específicas, como as de música e de capoeira, contam com desenhos relacionados à atividade, assim, ao entrar na sala, eles já identificam o atendimento que terão, trabalhando também a questão do reconhecimento do ambiente. 

William Veloso é professor de capoeira e realizou a arte na parede da sala onde ocorrem as aulas. Foto: Mateus Fernandes

Atividades fora do espaço

xposição da CER 2 no Super Shopping Osasco. Foto: Mateus Fernandes.

Em setembro de 2021, o espaço realizou uma exposição com obras produzidas pelos pacientes. As obras foram expostas no Super Shopping Osasco, próximo a região central do município.

Ricardo, morador de Osasco e um dos coordenadores da unidade, conta que no dia da exposição observou os olhares do público que passava pelo shopping aos deficientes, onde segundo ele, é um local que não é considerado um espaço para eles estarem.

“… a gente pode ocupar esse espaço, isso não precisar nem ser avisado”,

afirma o Osasquense

Fotos que registram a história do CER 2 em Osasco estiveram presentes na exposição. Foto: Mateus Fernandes.

A proposta da exposição foi ampliar esse convívio dos pacientes, pois Ricardo relata que muitas vezes a pessoa com deficiência só convive com os responsáveis e com o pessoal da unidade, como no centro de convivência do IGATS.

“A gente que atende esse público, a gente que é da saúde mental, a gente entende que se não tomarmos posse de certos lugares não há mudança. Foi legal, até porque a gente tira aquela ideia do pessoal do shopping ou do empreendedor, que é ver a pessoa com deficiência sempre como coitadinho”

declara Ricardo, que é formado em psicologia.

A prática do esportes é incentivada, para evolução de corpo e mente. Na foto: Maria Isabel Carvalho, Iago Ramilo, 28 e Ediralf Rodrigues, 32. Foto: Mateus Fernandes.

Muitos acessos são negados ou dificultados para uma pessoa com deficiência, a falta de acessibilidade em aspectos básicos como a ausência de elevador ou uma rampa, diz muito sobre os lugares restritos e não pensados de forma plural, principalmente para pessoas com deficiência que são de territórios periféricos. Para Ricardo, muito disso se dá devido ao mercado e empresários não enxergarem a pessoa com deficiência como consumidora.

“Às vezes as famílias deixam de ir a determinados lugares com os filhos e vão sozinhos pensando: ‘ah, eu não vou com meu filho porque lá ele não vai se sentir bem’. Mas por que ele não vai se sentir bem? Porque o ambiente não foi pensado pra ele”

coloca Ricardo

Arte, reciclagem e cultivo fazem parte da rotina do espaço

Além da reciclagem, plantio, aulas de capoeira e outras atividades, as oficinas também abordam áreas artísticas, sempre buscando que o produto final seja feito pelos pacientes.

Todos desenhos foram feitos por atuais e ex- frequentadores. Foto: Mateus Fernandes.

O espaço realiza ações como eventos no bairro, práticas de esportes ao ar livre e festas temáticas, com a intenção principal de integrar os pacientes à comunidade e mostrar aos moradores que não deve existir restrição nesse convívio. Além de informar sobre a importância dos serviços públicos de saúde e assistência social para pessoas com deficiência.

Essas ações permitem ainda arrecadar doações para a instituição e também para as famílias, que em sua maioria vivem em alto risco de vulnerabilidade social. 

Visitante da exposição é auxiliada pela profissional Carla Isabel. Foto: Mateus Fernandes

Com o tempo, o uso do material reciclável que recebem por meio de doações, também se firmou na instituição com a ideia de conscientizar sobre o aspecto do meio ambiente e sustentabilidade. O espaço chegou a contar com instrumentos musicais feitos de materiais de reuso.

Bonecos foram feitos de material reciclável por pacientes da CER 2 Osasco Foto: Mateus Fernandes

As obras da exposição que realizaram em 2021, foram todas feitas em oficinas com materiais recicláveis que ocorreram no centro de convivência. Os materiais vêm de itens reutilizados na instituição ou de doações, desde garrafa plástica, caixa de leite a tampinha de garrafa. Rebeca destaca que todos os objetos foram construídos pelos pacientes.

“A IGATS tem um contrato de gestão [com a prefeitura] gerenciado pelo nosso diretor Renato Henrique Nogueira, em que os recursos para administração da unidade vêm dessa verba”

Apontam os coordenadores, que também utilizam o reuso de materiais para contribuir com a renda do espaço.

Escultura, feita na CER Osasco 2, foi depois para exposição no Super Shopping Osasco. Foto: Mateus Fernandes.

No IGATS Osasco, está também sendo abordada a ideia de agricultura para consumo próprio. Recentemente foram montados canteiros no jardim do local. A ideia é trabalhar com alimentos orgânicos e fitoterápicos, plantas não convencionais com propriedades proteicas.

Canteiros, recentemente feitos no jardim da IGATS Osasco. Foto: Mateus Fernandes

Recentemente foi plantado morango, que foi consumido pelos funcionários e frequentadores. Os pacientes atendidos podem levar os alimentos plantados pra casa e aprendem todo o processo de plantio, com o intuito de também passarem a ideia para os familiares. “Acaba se tornando um investimento inicial, que precisa só fazer uma manutenção depois, né?”, aponta Ricardo. 

Trabalho contínuo

Camily Alves Machado é frequentadora do núcleo CER.

Segundo a equipe, o trabalho do IGATS vai além dos pacientes: é preciso também orientar as famílias e a população em geral, a entender as complexidades e as demandas da pessoa com deficiência, e que ela pode e deve, estar inclusa na sociedade.

“A gente busca dar maior autonomia e independência para o paciente. Ele não vai deixar de ter a deficiência, mas a gente busca proporcionar uma maior qualidade de vida pra ele de acordo com suas potencialidades”,

declara Rebeca, coordenadora.

Rebeca e Ricardo contam que muitos pacientes chegam sem conseguir pegar no talher, pois era o responsável que servia na boca. Isso passou a ser um dos aspectos trabalhados, a autonomia para comer sozinho: “As pessoas questionavam ‘você vai dar faca na mão deles?’. Sim, nós vamos dar’, colocam.

Rebeca Mancini e Ricardo Beserra, ambos de 27 anos, são gestores do projeto em Osasco.

“A gente tem paciente que tem condições de estar no mercado de trabalho hoje”

afirma a coordenadora Rebeca.

O espaço desenvolve ações que contribuem para o desenvolvimento, mas reforçam que é necessário mais políticas públicas, inclusão, incentivo e que se ocupe os espaços públicos.

“Como a Rebeca tá cansada de dizer, a gente tem que interferir. O que é interferir? É ferir entre as partes. A partir do momento que a gente interfere, na rotina de um espaço, como o shopping, e não estanca, eles entendem que precisam fazer alguma coisa para que não precisem se ferir novamente. Só assim pra mudarmos essa realidade”,

finaliza Ricardo.

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