Iniciativa surgiu após a pandemia decretar fechamento de espaços culturais, impedindo a apresentação de artistas e produtores de conteúdo da zona norte de São Paulo.
Com o fechamento da Casa de Cultura da Vila Guilherme, espaço público de cultura localizado na zona norte de São Paulo, artistas e coletivos artísticos da região ficaram sem um local para realizar apresentações, uma destas iniciativas é a Mudança de Cena, coletivo que se inspirou na pandemia para criar o projeto HUB da Norte, uma plataforma de streaming de áudio que reúne podcasts da região.
Os idealizadores do Hub da Norte são Osmar Araújo e Leandro Senna, integrantes do coletivo Mudança de Cena, que entendeu a importância de reinventar a estrutura das atividades culturais durante a pandemia, levando essas atividades para o ambiente digital.
“Eu pensei em montar uma rádio web, só que a questão de ter uma rádio web é que precisa ter uma contratação de internet diferente, com melhor upload e mais cara, a gente não tem recurso no projeto para esse pagamento. Seria uma rádio web de 3 meses, que era o que tínhamos para pagar.”, conta Osmar.
A limitação imposta pelo acesso a um bom serviço de internet provocou o agente cultural a repensar o uso dos recursos adquiridos por meio da Lei Aldir Blanc, edital de apoio emergencial a agentes culturais afetados pela pandemia de covid-19.
Após entender que criar uma rádio não seria possível, Araújo iniciou o processo de desenvolver uma plataforma que vai conectar produtores de podcasts com ouvintes que são moradores da Zona Norte de São Paulo, com o objetivo de criar uma rede de produtores e consumidores de áudio.
Os principais assuntos abordados nos podcasts distribuídos na plataforma Hub da Norte são cultura, educação, ciência, direitos humanos e direito à cidade.
A iniciativa tem tudo para fortalecer o campo de produtores de podcasts nas periferias e favelas, um cenário promissor que já noticiamos com o surgimento de diversas iniciativas de podcasts e vídeocasts na quebrada, fato que está conectado também o comportamento dos moradores das periferias que passaram durante a pandemia a consumir mais conteúdos em áudio.
Parceiros
Segundo a Associação Brasileira de Podcasters (ABPOD) cerca de 70% dos podcasts brasileiros surgiram a partir de 2018, e foi nesse período que o jovem Igor Fink, 22, começou a produzir podcasts e hoje é um dos parceiros que distribuem conteúdo no HUB da Norte.
“Conheci o Osmar em 2017 em um projeto deles junto com o SESC. Desde então estamos trabalhando juntos. Eu sempre tive vontade de produzir coisas de algum jeito que agregasse conhecimento a outras pessoas. Quando chegou a pandemia, eu me vi com tempo livre e pensei que seria esse o momento de me dedicar a algo que sempre quis”, relata Igor.
Quando se trata de temas a discutir em seu podcast, Igor explica que os assuntos surgem aleatoriamente, mas de acordo com o que ele gosta de fazer. “Eu gosto muito de música e quando eu comecei a produzir o Herói Genérico não tinha uma pauta específica. Já produzi 15 episódios nele e acho que três foram sobre música, e os outros foram sobre temas variados”, conta.
“Eu queria falar sobre opressões vivenciadas dentro de coletivos, e como lidar com essa questão de raça, gênero e classe”
Amanda Nascimento é uma das parceiras do Hub da Norte para produção e distribuição de conteúdo em áudio.
Amanda Nascimento produz o podcast ‘Se Essa Rua Fosse Nossa’ e distribui o conteúdo no HUB da Norte, que surgiu como um trabalho de conclusão de curso da UNESP, mas que não poderia ficar só na academia.
“O tema do meu o meu TCC era sobre opressão. Eu queria falar sobre opressões vivenciadas dentro de coletivos, e como lidar com essa questão de raça, gênero e classe, essa intersecção dentro dos coletivos”, explica a podcaster.
Amanda afirma que a intenção do podcast não é necessariamente criar um manual de boas maneiras, mas sim de ter um espaço para que mulheres pudessem falar sobre todas as suas questões individuais, de como agregar mulheres negras, mães e LGBTQIA+, trazer à tona o debate em si e acolher todas essas diferenças e principalmente rever os atos dentro dos coletivos.
“Eu não quero dar respostas de como acolher mulheres negras é ‘assim e assim’ que se faz, não, eu queria enfatizar que isso acontece em qualquer estrutura de trabalho, ou até mesmo na militância esses temas sobre racismo, sobre violência contra mulher ou pressões e silenciamentos, o tema é um tabu e quando vamos confrontar ainda há muitos ruídos”, complementa.
Futuro
Para o criador da inciativa, a plataforma do Hub da Norte é promissora e ainda tem muito mais para crescer e agregar ao contexto educacional e territorial dos moradores das periferias.
Outro projeto que está no radar do coletivo Mudança de Cena é potencializar a atuação do HUB da Norte, oferecendo no formato de empréstimo infraestrutura e equipamentos para produção e captação de áudio para os produtores de podcast da zona norte.
Osmar conta que pretende dar início ao Fronteira Final, um projeto que visa disseminar conhecimento científico através dos podcasts juntamente com professores da rede pública de ensino da zona norte.
“O projeto a gente já aplicou uma vez e a gente não conseguiu o recurso, mas a ideia é basicamente que junto com algum professor de uma escola pública a gente faça um bate-papo sobre um tema da ciência.”, finaliza.