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Internet Solidária: campanha incentiva moradores de Ermelino Matarazzo a compartilhar wi-fi com vizinhos

Edição:
Ronaldo Matos

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Tecnologias de sobrevivência são construídas cotidianamente nas periferias. Mas como se proteger da pandemia de coronavírus se parte dos moradores dos territórios periféricos não têm acesso ao mundo digital? Diante deste dilema, agentes culturais que fazem parte da Ocupação Cultural Mateus Santos, localizada em Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo, criaram uma campanha focada em democratizar o acesso a internet, entretenimento e informação aos moradores do território que não tem condições de contratar o serviço. 



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Projeção da campanha ‘Fiqueemcasa’ promovida pelos coletivos da Ocupação Cultural Mateus Santos (Foto: Movimento Cultural Ermelino Matarazzo)

Neste momento onde o governo pede para que as pessoas fiquem em casa, solicite o auxílio emergencial por meio de sites e aplicativos, realize o estudo à distância por meio de plataformas Ead, o acesso a internet se torna um item essencial para garantir o direito à vida.

Uma proposta para reduzir os impactos desta dura realidade na vida de muitos moradores de Ermelino Matarazzo foi a criação da campanha ‘Internet Solidária’, na qual, agentes culturais e artistas que fazem parte da Ocupação Cultural Mateus Santos, irão realizar uma série de transmissões ao vivo com shows de artistas locais, para mobilizar moradores da região a tomar a importante decisão de compartilhar sua internet com vizinhos que não tem como contratar o serviço, devido a crise econômica que afeta principalmente a população periférica.

“Nesse momento é crucial tanto para acesso às informações, quanto para diminuir os efeitos do isolamento social, podendo ter acesso a lazer e também ao estudo, que são direitos básicos da população”, afirma Gustavo Soares, um dos articuladores culturais da Ocupação Cultural Ermelino Matarazzo, um espaço cultural independente gerido por coletivos artísticos e culturais que atuam nas periferias da zona leste de São Paulo.

A partir do dia 20 de março, a ocupação cultural suspendeu todas as suas atividades por tempo indeterminado, devido ao reconhecimento do protocolo de segurança do estado de calamidade pública, divulgado pela Prefeitura de São Paulo, decorrente da pandemia do novo coronavírus. Mas com muitas demandas de moradores em estado de alta vulnerabilidade social a região, o espaço se tornou uma referência de articulação comunitária, promovendo campanhas de doação de kits de higiene e organizando lives com artistas locais. 

Uma dessas campanhas é a ‘Internet Solidária’, iniciativa que procura diminuir os efeitos do isolamento social, motivando os moradores do bairro a criar seus próprios pontos de acesso à internet. “Tem mó galera que às vezes sai de casa para vim pra frente da ocupação, pra usar nossa internet, porque nossa internet é aberta”, explica Soares, enfatizando que a campanha está sendo uma forma de levar internet a mais pessoas no bairro.

Ele também explica que essa solução surgiu com a proposta de reduzir os impactos da pandemia no território. “Essa foi uma forma que a gente conseguiu pensar para diminuir tantos os efeitos da galera não precisar sair de casa, pra ir até algum ponto que tem internet livre , e ao mesmo tempo se manter em casa pra ter opções né, e assim manter a sanidade”, complementa o articulador cultural.”

A campanha a funciona da seguinte forma: o morador coloca o nome da rede wi-fi de ‘Fiqueemcasa’ e e muda a senha para ‘Fiqueemcasa’, criando uma rede de colaboração entre os próprios moradores e possibilitando o acesso á internet para o maior número de pessoas. Soares conta que a praça de wi-fi livre mais próximo do bairro está situada na Praça Giovanni Fiani, no bairro Ponte Rasa, localizado a 3 km da ocupação cultural.

Os articuladores culturais pensaram em um impacto que vai muito além da campanha, pois eles têm o intuito de fazer com que as pessoas façam parte dessa rede de mobilização e se conscientize do atual momento em que estamos vivendo. “A gente tá fazendo uma série de ações, que em conjunto a gente acredita que minimiza bastante os efeitos da pandemia, aqui no bairro”, relata Gustavo, ressaltando a importância das mobilizações coletivas pensadas para ajudar os moradores do bairro durante a quarentena.

Soares complementa que ainda não consegue prever quais serão os resultados gerados pela campanha, mas permanece bem otimista com as iniciativas no território durante a essa pandemia. “Tivemos comentários bem positivos, mas a campanha começou ontem então ainda não dá pra avaliar os resultados. Esperamos que agora tenha muitos pontos de acesso na quebrada.”

Enquanto a solução não vem do poder público, iniciativas como dos agentes culturais da Ocupação Ermelino Matarazzo, geradas com baixo custo e com grande possibilidade de impacto real na vida das pessoas são por enquanto a maior e melhor oportunidade de acesso à internet para quem não tem condições de contratar o serviço nas periferias.

“A arte na periferia é isso, ela é o suspiro”

Um dos objetivos da Ocupação Cultural Mateus Santos é oferecer aos moradores de Ermelino Matarazzo novas possibilidades de imaginar e enxergar a vida nesse momento caótico, fruto da pandemia. Para isso eles utilizam a arte e articulação com artistas locais, com o intuito de produzir pequenos shows transmitidos ao vivo em suas páginas nas redes sociais.

“A live foi um momento de compartilhamento das obras e da forma como eu acesso aquelas obras, e como aquilo me faz pensar o mundo”, descreve Luan Charles, músico e integrante da banda Nova Malandragem, que busca democratizar a produção da música instrumental na periferia.

Com a dependência da tecnologia para fazer ecoar a sua arte neste momento, o artista também fala da experiência de fazer um show sem platéia, acessando as pessoas apenas por meio de telas de celulares e computadores. “Mesmo que seja uma música que dura 3 minutos ela é um convite, para você experiênciar naqueles três minutos uma outra forma de viver a vida”, define Charles, fazendo uma reflexão sobre o impacto gerado pela arte da periferia. “A arte na periferia é isso, ela é o suspiro.”

Charles diz que ainda está descobrindo essa conexão com a tecnologia e arte, e as lives é algo totalmente diferente do que está acostumado, mas está tentando se adaptar, porque vê nela uma oportunidade de fazer as pessoas se sentirem acolhidas. “É uma oportunidade para as pessoas não se sentir isoladas por completo e também não se sentir excluída.”

As lives são transmitidas pelos perifes no Facebook e Instagram da Ocupação Cultural e pelo instagram pessoal do artista @luan_trompreto. Desde o início da quarentena Luan e seu grupo já fizeram quatro lives e ele enfatiza que pretende trazer mais conteúdos diversos sobre música e afeto, assuntos que estão tomando muito do seu tempo ultimamente.

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