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Aluna e professora da Brasilândia lutam contra as adversidades do ensino a distância

Edição:
Ronaldo Matos

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Recentemente, noticiamos como alunos de cursinhos populares estão travando uma luta desigual para se preparar para o Enem durante a pandemia. Hoje, entrevistamos Aisha Gabrielle, 14, aluna da rede pública de ensino da Brasilândia, um dos distritos mais afetados pela pandemia de coronavírus, para mostrar como ela está lidando com as dificuldades para acessar a plataforma de ensino à distancia da rede municipal de educação de São Paulo. Neste cenário, você vai conhecer também o trabalho da professora Aline Marks, educadora que atua em escolas públicas deste distrito da zona noroeste e criou recentemente uma campanha de doação de tablets e notebooks, para amenizar os impactos do ensino remoto nos processos de aprendizagem de alunos das periferias. 



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Aisha Gabrielle,14, moradora do Jardim Guarani, bairro localizado no distrito de Brasilândia (Foto: Arquivo Pessoal)

Não é de hoje que o celular se tornou em uma ferramenta aliada da população jovem para realizar inúmeras tarefas digitais do cotidiano. No entanto, em meio à pandemia de coronavírus, o aparelho eletrônico demonstra inúmeras falhas de usabilidade para quem precisa usar o smartphone para rotinas de estudos a distancia. Essa é a realidade de milhares de jovens alunos que estão matriculados na rede pública de ensino nas periferias de São Paulo.

Umas dessas alunas é Aisha Gabrielle,14, moradora do Jardim Guarani, bairro localizado no distrito de Brasilândia, uns dos mais afetados pelo Covid-19 em São Paulo. Ela está cursando a nova série do ensino fundamental, porém se sente frustrada, porque desde abril, não conseguiu acessar a plataforma digital de ensino, período no qual as aulas on-line foram abertas para os alunos da rede municipal de ensino.

“Em nenhum dia eu conseguir acessar o site e o aplicativo, por conta dele não entrar em nenhum momento. Eu tento, tento, mas ele nunca entrou e infelizmente eu ainda não conseguir entrar,” descreve Aisha, relatando os momentos difíceis que tem passado ao ser prejudicada pelo fato de não conseguir acessar as aulas online durante a quarentena.

Pelo fato de Gabrielle não ter um computador em casa, o único dispositivo disponível para acessar a internet é o celular. Ela conta que para realizar suas tentativas frustradas de assistir suas aulas é preciso pedir o celular da sua mãe empresta, porque o dela não está em condições para uma boa experiência de navegação e visualização de arquivos. “O meu não tem condições, não tem memória suficiente”.

Segunda a estudante da rede municipal de ensino, ter um computador neste momento facilitaria muito a sua rotina diária cercada por dificuldade técnicas para acessar os conteúdos didáticos.

Durante o tempo que deveria esta em aula Aisha tenta se distrair com as coisas que tem disponível em sua casa, lendo um livro ou empinando pipa. O último livro que leu foi Raízes – A saga de uma família , que conta a história do guerreiro africano Kunta Kintê.

Aisha esclarece que as suas maiores dificuldades estão relacionadas ao processo de login na plataforma. “O que mais me impede é o modo de entrar, isso que está me incomodando, isso que está me prejudicando é o jeito de entrar”, conta a jovem narrando as tentativas frustradas de acessar o sistema. Ela finaliza demonstrando uma inquietação com o seu futuro nos estudos. “Fico preocupada em conseguir ter algum futuro, mesmo sabendo que isso vai passar um dia, eu me sinto bem prejudica”.

Professora mobiliza doações de tablet, notebook e computadores para alunos da Brasilândia

Diante dessa percepção de inadequação dos alunos ao universo do ensino a distância, Aline Marks, professora de história da rede municipal de ensino na Brasilândia, que atua com pesquisas voltadas a adolescentes e desenvolvimento de jogos voltados para educação, observou o contexto onde está inserida e teve a ideia de articular uma campanha para doação de tablets, notebook e computadores, para tentar suprir as dificuldades de jovens de territórios periféricos.

“Quem sabe se a gente conseguir equipamentos tecnológicos para essas crianças e adolescentes, eles podem conseguir na suas próprias comunidades alguma acesso à internet. Foi nesse momento que surgiu a ideia oficial de criar um texto e compartilhar com minha rede de contatos”, lembra a professora, sobre a forma como surgiu a ideia para criar a campanha, que está sendo divulgada em seu perfil pessoal no Instagram e Whatsapp.

Surpresa e animada com o crescimento que sua iniciativa tomou, a professora revela que colegas de trabalho estão aderindo a mobilização de doações, para espalhar a ideia, a fim de chegar em possíveis doadores. “Aqui na região da Brasilândia os coordenadores e diretores estão sabendo da proposta. Eles estão conversando com outras redes para tentar viabilizar alguma coisa, como entrega e recepção das doações.”

Até o momento a campanha já arrecadou um tablet, um notebook, e dois computadores, porém as distribuições ainda não foram feitas, pois Marks conta que ainda está estudando com será feito, para evitar aglomeração de alunos. “A gente está em planejamento ainda, mas a ideia é que a gente consiga com as direções e coordenações das escolhas públicas aqui de São Paulo primeiro, quem são os estudantes que não tem nenhum equipamento e como a gente pode chegar até eles”.

Aline enfatiza sobre a necessidade de uma inclusão digital, para que os meios de educação a distância funcione para todos. “Eu penso que a gente tá vivendo uma ‘pseudo escola’, a gente tá tendo que se reinventar de várias formas, mas não é uma invenção que seja equitativa, e uma reinvenção que exige não só o equipamento, não só a internet, mas uma habilidade de acessar isso”.

A professora relembra que o ensino remoto que está sendo praticado nesse contexto é diferente do ensino à distancia, pois além da preparação dos materiais já planejados, existe a opção do aluno, algo que já não ocorre no ensino remoto das escolas públicas, no momento que se tornou uma medida de urgência.

“As metodologias do EAD são pensadas e adaptadas com tempo e os estudantes se matriculam já sabendo das condições de acesso. Que precisam ter internet e equipamento compatível. Então, além da intencionalidade e da preparação do material e das aulas pelo professor, existe também a intencionalidade do estudante que escolheu o ensino à distância”, explica Aline, mostrando o porquê não devemos comparar o ensino a distância que já tem metodologias de aprendizagens mais elaboradas com o atual momento que os alunos da rede pública estão vivenciando durante a pandemia.

Marks defende a difusa de uma cultura, para introdução de novos métodos de ensino. “Além de precisarmos aprender e ensinar a aprendizagem remota, também precisamos encontrar meios para alcançar aqueles que não têm acesso algum”, conclui a professora.

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