Editorial

Mais de 150 mil famílias em luto, inclusive a nossa.

Edição:
Redação

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Por aqui, a família de um integrante do Desenrola é a família de todos do Desenrola. Para nós é assim: não é só trabalho, é afeto, é cuidado, é família, seja de sangue ou de coração. Hoje vamos falar da nossa família, que assim como outras milhares perderam e tem perdido pessoas amadas, seja pela bala, pela fome ou pela covid-19. 

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Flavia, Thais e Fabiana.

Assim que começou o isolamento social devido a pandemia em março deste ano, fechamos nosso espaço, o Centro de Mídia M’Boi Mirim, e passamos a trabalhar de casa para ajudar a conter a proliferação do vírus que já fazia milhares de vítimas ao redor do mundo. Em maio, a irmã e a mãe da Flavinha contraíram a Covid-19, mas conseguiram se curar e hoje estão bem. O mesmo não aconteceu com as irmãs da Thais.

Pessoas mais próximas já sabem que esse mês foi muito doloroso para nós. Nas últimas semanas, perdemos Fabiana e Flávia, nossas queridas familiares. Irmãs da Thais, mulheres negras e periféricas, Fabiana e Flávia estavam sempre presentes em nossas vidas.

Ambas foram internadas, uma no hospital Parelheiros e outra na Santa Casa da Bela Vista. Com poucos dias de internação, nenhuma das duas resistiu. O falecimento da Fabiana aconteceu no dia 05 e o da Flávia no dia 14 de outubro.

Nossa intenção é compartilhar a importância das duas na vida da família e daqueles que tinham a sorte de tê-las por perto. Por aqui, a família de um de nós do Desenrola é a família de todos do Desenrola. Para nós, é assim: não é só trabalho, é afeto, é cuidado, é família, seja de sangue ou de coração.

A Fabiana sempre cedeu sua casa e suas panelas quando a gente e os jovens atendidos no nosso programa de formação, o Você Repórter da Periferia, estávamos fazendo reportagens no Grajaú. A casa dela era parada obrigatória e o almoço sempre era o macarrão do Desenrola.

A Flávia fez orações assim que alugamos o espaço do Centro de Mídia na intenção de que nossa atuação ali sempre trouxesse prosperidade. Falando nisso, elas sempre que conseguiam estavam por lá, participando da nossa inauguração e de outros eventos.

Há 500 anos estamos morrendo: de fome, de bala e agora também de covid-19

A pandemia nunca parou tudo de fato, principalmente para quem mora nos territórios periféricos. Nunca tivemos em um isolamento adequado, até porque sabemos de onde vem as pessoas que de fato fazem os serviços e a cidade acontecer todos os dias.

Quantos pessoas da sua família de fato puderam ficar em casa e no final do mês ter seu dinheiro garantido? Quantas pessoas que você conhece se sentiam seguras em casa? Pensa em quantos conhecidos e amigos continuaram a trabalhar durante todo esse tempo. Já se perguntou por que isso aconteceu?

Nossa morte, a morte de quem é preto, periférico, pobre, lgbtqia+ não é um problema para quem governa e para a burguesia. Nossas mortes não tem relevância para eles, mas para nós sim. As mais de 150 mil famílias em luto importam para nós.

Hoje, segundo o IBGE, temos 10 milhões de brasileiros passando fome e 13,8% da população está desempregada. Em 2016, quase 75% das mortes violentas eram de jovens negros. Fome, desemprego e morte: é o que esse modelo socioeconômico tem oferecido à nós, pretos, pobres, periféricos.

Nossas famílias sofrem há muito tempo, choram em um luto permanente. Nossos ancestrais foram arrancados de seus territórios e escravizados, a maioria dos que se revoltaram foi dizimada. De geração em geração, da colonização ao século XXI, nossa dor se mantém.

É por nós e por muito mais que seguimos acreditando na comunicação periférica como umas das ferramentas da nossa revolução e independência. Para que o genocídio pela fome, pela bala, pela covid-19 entre tantas outras, parem de interromper brutalmente nossas vidas e os nossos sonhos.

Aqui fica nosso abraço e agradecimento pela passagem da Fabiana e da Flavia nesse mundo e abraço a todas as famílias que perderam pessoas queridas. 

Autor

1 COMENTÁRIO

  1. Meu eterno sentimento para ti Thais e sua família. Realmente perder um ente familiar não é fácil, e sim, muito difícil e doloroso superar duas perdas pessoais em um curtíssimo espaço de tempo, ainda mais para esse vírus silencioso, mas mortal que é o coronavírus. Que com ele foi assim, nos tirou pessoas essenciais, assim du nada… Que Deus possa confortar seu coração, com a chegada da sua princesa, e que ela traga dias melhores ao seu coração e de todas(os) que foram acometidos por essa tragédia. Um Bjão, um forte abraço acalentador em todas e todos da família Desenrola e “Nunca” nos Enrola, rs – Saudades do nosso eterno Centro de Mídias.

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