No início de março deste ano, a Defesa Civil interditou o polo da instituição devido a problemas estruturais, e a Secretaria Municipal de Educação afirma que está tudo “sob controle”, mas muitos envolvidos permanecem preocupados com a situação.
Desde o dia 19 de março de 2021, o CEU Capão Redondo, localizado na Rua Daniel Gran, no bairro Jardim Modelo, na região do Capão Redondo, zona sul de São Paulo, encontra-se interditado. Segundo colaboradores, alunos e pais de alunos, muitas questões ainda permanecem sem respostas.
Conversamos com alguns professores que compõem o corpo docente da instituição e também com alguns responsáveis por alunos do polo, que contaram sobre o impacto dessa interdição. Os entrevistados que dividiram seus relatos com o Desenrola preferiram não se identificar.
De acordo com os profissionais entrevistados, a construção de uma identidade própria para o CEU Capão Redondo demorou anos para ser concretizada e foi preciso muita persistência para que hoje o polo pudesse receber alunos surdos, oferecer aulas de libras, materiais adequados e profissionais capacitados.
“Aprendi a ser professora lá, profissionais incríveis entraram, saíram, mas tem um grupo maravilhoso que permaneceu. Temos poucos professores com pouco tempo de casa, a maioria está há mais de 5 anos. Quando cheguei lá, a escola ainda não tinha identidade, muito menos vínculo com a comunidade e alunos”, conta uma das educadoras.
Outra característica do espaço, que tem um polo bilíngue, é que oferece aulas de libras não somente aos alunos com deficiência auditiva, mas para todos os estudantes, para que assim, consigam também se comunicarem entre si.
Foram muitos projetos idealizados no local para contribuir com o desenvolvimento e crescimento acadêmico dos alunos, entre eles: dança, teatro, leitura, natação, xadrez, reforço de português e matemática, além de grafite, futsal e música. Muitos desses projetos eram incluídos na rotina dos alunos, incentivando o contato com o meio cultural.
“O trabalho ao longo do tempo nunca foi fácil, temos muitos alunos com deficiência, então sempre fomos bastante cobrados” conta uma das professoras.
O polo possui três unidades educacionais, sendo elas o CEI, EMEI E EMEF e um dos diferenciais é que sua estrutura comporta mais de 120 alunos com deficiência auditiva.
“Muitas escolas da região não aceitavam os alunos com deficiência e mandavam procurar o CÉU, que lá nós tínhamos suporte, mas não, não tínhamos suporte, lá nós tínhamos uma equipe que estava disposta a fazer diferente”
relatou uma professora.
As professoras reforçam que o processo de construção do CEU Capão não foi e ainda não é fácil, que foi com o tempo, diálogo e otimismo que os profissionais se sentiram aptos e seguros para estarem na linha de frente de um polo diferencial na região.
“Fomos nós que com muito trabalho, fomos criando laços, destruindo barreiras e construindo a identidade da escola. Quando o polo bilíngue chegou, também foi assim, sem muita conversa com os professores, houve bastante resistência. Mas aos poucos o trabalho foi acontecendo”, comentou a professora.
Falta de suporte
Devido a pandemia, em 2020, as aulas presenciais foram suspensas no CEU do Capão Redondo e foi adotado o ensino remoto. No início de 2021, retomaram com as aulas presenciais, seguindo os protocolos necessários para essa nova fase, mas no mês de março de 2021, o polo sofreu a interdição feita pela Defesa Civil, por problemas estruturais na construção.
Alguns pais dividiram com a gente suas angústias diante do cenário que seus filhos estão vivendo. Entre muitas queixas, uma das mais comuns é o fato das crianças terem sido transferidas involuntariamente para outras escolas, sem nenhum diálogo e sem as famílias e os profissionais do CEU serem ouvidos.
“Essa desorganização é lamentável. Só foram correr atrás quando foi liberado 100% dos alunos de forma presencial. Aí jogaram nossos filhos de qualquer jeito em qualquer escola só pra dizer que eles não estavam sem escola”, desabafou a mãe de um aluno do CEU.
O que também preocupa muitos pais, é que as escolas para onde seus filhos foram transferidos, não possuem condições para receberem os alunos. Além da distância de suas casas para as novas escolas, sendo que agora, alguns precisam tirar de seus próprios bolsos o gasto da locomoção dos filhos de casa até a escola.
“Estou em tratamento médico e meus filhos estavam já sendo prejudicados com as aulas remotas, mas era necessário, em razão da pandemia. Agora, restando apenas alguns meses para o final do ano letivo, a gestão pública de maneira irresponsável, agrega mais este prejuízo ao desenvolvimento cognitivo dos alunos”, relata o pai de dois alunos do polo.
Um dos benefícios que os alunos do CEU Capão Redondo tinham, era o TEG – Transporte Escolar Gratuito, onde conquistaram esse recurso e era o que deixava muitos pais mais tranquilos, mas por conta da transferência para outras escolas, muitos estudantes perderam esse benefício, sendo que diversos alunos foram matriculados em escolas muito distantes de suas residências.
“Se meus filhos correm risco de perderem o ano letivo? Não, já perderam!”
desabafou o pai dos alunos.
A interdição, que ocorreu este ano pela Defesa Civil, se deu pelo deslocamento de placas de concreto que envolvem a estrutura, e que de acordo com alguns profissionais da unidade, já era do conhecimento da DRE – Diretoria Regional de Educação do Campo Limpo, há quatro anos.
Essa interdição está prevista para ser finalizada até dezembro deste ano, e os pais dos alunos optaram por manterem seus filhos nas aulas remotas até que a reforma seja concluída, mas de acordo com as próprias famílias, eles não foram ouvidos nas reuniões feitas com órgãos responsáveis, e os alunos, compulsoriamente, foram remanejados para escolas de outras regiões.
“Os alunos que frequentam o polo, tem uma prioridade da TEG (Transporte Escolar Gratuito), por isso fazem parte do projeto, mas eles estando fora do polo essa garantia já não é mais garantida. E eles vão para uma lista de espera de toda uma rede municipal. Tem aluno que dentro do polo já tinha uma dificuldade de TEG, imagina fora”, coloca outra profissional do corpo docente da unidade, que prefere não ser identificada.
Dessa forma, muitas famílias estão tendo que pegar transporte ou se deslocarem a pé para chegarem nas escolas onde os estudantes foram transferidos.
Entramos em contato com a Secretaria Municipal de Educação e eles alegaram que não há risco de desabamento no local. Afirmaram também que a SIURB – Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras realizou vistorias no CEU para acompanhar a evolução das placas de concreto e que na última vistoria foi constatada a movimentação dessas placas e a necessidade de intervenções emergenciais no local.
A Secretaria concluiu dizendo que o prazo de execução das obras é de, no máximo, 180 dias. A preocupação dos familiares e professores da unidade só aumenta, tendo suas falas, sugestões e angústias não ouvidas, além da falta de garantia que após a conclusão da obra, todos alunos e professores retornem para o polo.