Racismo ambiental: ação humana e ecocídio

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O pilar de todo esse debate é: as alterações do clima, o ecocídio, a degradação ambiental e o racismo são operados por poucos grupos, pela elite econômica e frequentemente por pessoas brancas. Cabe a quem luta pela vida adiar o fim do mundo.

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Encontro realizado pela UNEafro Brasil, no Quilombo de Ivapurunduva, no Vale do Paranaíba (SP), 29 de fevereiro de 2020. Foto: Tiago Fernandes.

Nas periferias urbanas e nas terras de povos indígenas e quilombolas, habitação, segregação e racismo ambiental ensaiam juntas formas que disciplinam o comportamento e as relações humanas, para, assim, absorver às violações de direitos humanos como expressões “naturais” da experiência de viver nas periferias urbanas e rurais, da vida favelada e em áreas de conflito – ou em estado de “saque” de recursos naturais.

A linha imaginária que cria uma separação entre natureza e progresso impõe uma perspectiva de dualidade como se de um lado estivesse a defesa de uma “vida selvagem” e do outro o desenvolvimento econômico e “civilizatório”. De um lado um “passado primitivo” e do outro a obsessão por uma “liberdade” que atua como rolo compressor de qualquer forma de solidariedade popular, coletiva e de bem viver.

Nos termos do significado das mudanças climáticas, elas apontam que o que está ocorrendo é que o aumento da temperatura global apresenta efeitos nocivos para todo tipo de ecossistema, para toda a vida humana e organismos vivos do planeta.

Na prática, as alterações do clima acontecem por uma bateria de problemas. O mais conhecido deles é a emissão de gases do efeito estufa, que concentram em um nível acelerado, gases na atmosfera (CO², CH², N²O, etc.), impedindo que o calor recebido pelo sol seja expelido e isso aumenta a temperatura do planeta.

Mas a essência do problema está nas dinâmicas de relações humanas baseadas no lucro, no poder e no extermínio. Há um debate sobre justiça climática que propõe uma reflexão que nos provoca a medir o papel dos responsáveis pelos impactos ambientais.

Isso nos implica pensar que os conflitos humanos são capazes de produzir alterações significativas de degradação ambiental. Neste caso, há uma série de prerrogativas de “regulação” internacional de operações militares em conflitos que vão do uso de armas químicas a testes de ogivas nucleares.

Entretanto, por mais que existam prerrogativas ratificadas em pactos internacionais, de naturezas distintas em certo grau, a questão fundamental que pesa sobre as medidas de mitigação dos crimes ambientais, é a responsabilidade dos Estados na participação, conivência e promoção das práticas de degradação ambiental.

Na discussão sobre justiça climática, o entrecruzamento de conflitos e a busca pelo controle territorial para o controle da exploração, extração e distribuição dos recursos naturais é um componente do que podemos chamar de ecocídio ou racismo ambiental.

Se há um consenso nos organismos internacionais é o de que cada Estado tem sua autonomia para criar jurisdições próprias na penalização de crimes ambientais. Todavia, isso acontece porque na prática não há nenhum mecanismo internacional capaz de penalizar Estados (o que acarretaria em sanções contra a sua sociedade civil como um todo), sendo assim, a questão se volta para a responsabilidade dos indivíduos.

“É a porta de entrada para várias formas de ações e organizações criminosas: da milícia ao narcotráfico; da grilagem ao desmatamento; do uso de agrotóxicos ao trabalho escravo.”

É aqui que nosso problema ganha cor, rosto e identidades próprias.

Mas antes de se voltar especificamente para o caso brasileiro, vale elencar algumas formas de degradação ambiental causadas pelo conflito, que podem mudar todo um ecossistema ou destruir biomas.

Na guerra do Iraque durante os anos 90, as tropas de Saddam Hussein acabaram com os pântanos da Mesopotâmia, como retaliação há uma revolta xiita. Com isso, destruíram todo um ecossistema, e neste caso, o maior de terras úmidas do Oriente Médio.

Na República Democrática do Congo, em que a guerra civil, na década de 90, trouxe dramaticamente conflitos sangrentos, fez com que a busca por alimento se voltasse a espécies de animais selvagens e silvestres e, como efeito, reduzisse drasticamente sua população.

O ataque norte-americano na Guerra do Vietnã (1961-1971), com o uso da arma química conhecida como Agente Laranja. Espalharam milhões de litros de herbicida que causaram a perda da biodiversidade do ecossistema da floresta, além de causar graves doenças na população local como câncer, danos neurológicos, úlcera e outras.

Então, agora que compreendemos que degradação ambiental é algo mais amplo do que apenas às emissões de gases causados pelo setor energético e de transporte, vamos considerar o caso brasileiro. 

Segundo dados do Climate Watch, considerando os principais países que produzem gases do efeito estufa entre 1990 e 2019, o Brasil marca seu lugar na 6° posição.

Diferente de China e EUA que figuram na liderança do ranking, a principal fonte de emissão de gases no nosso país não está na manufatura e transporte, mas, sim, no modelo econômico baseado no agronegócio.

Para além do modelo econômico, o agronegócio impõe um modelo de necro-sociabilidade, aceitando todo tipo de forma de violência e/ou política. É a porta de entrada para várias formas de ações e organizações criminosas: da milícia ao narcotráfico; da grilagem ao desmatamento; do uso de agrotóxicos ao trabalho escravo.

Só no período entre 2016 e 2017 cresceu 350% os assassinatos contra quilombolas, demonstram os dados do relatório “Racismo e violência contra quilombos no Brasil”. Impulsionados por ondas de grilagem de terras ou extrativistas ilegais em áreas de preservação.

O mesmo problema se reflete com os povos indígenas. O caso mais recente do desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Philips, no Vale do Javarí, região de terras indígenas, expuseram a brutalidade da violência com base na defesa dos territórios.

São os casos da morte do líder quilombola Edvaldo Pereira, na comunidade do Jacarezinho, Maranhão, que lutava contra as invasões do plantio de soja em seu território e da menina Yanomami morta e estuprada por garimpeiros, na comunidade de Araçá, região de Uraricoera, em Roraima.

Voltamos na questão básica, como responsabilizar quem comete crimes ambientais? 

Temos um desafio, principalmente, quando são os principais interessados na promoção do racismo ambiental, do ecocídio e na degradação que legislam ou são frente de definição dos temas relacionados ao meio ambiente.

É o caso do Deputado Federal Ricardo Barros, líder do governo na Câmara, que segundo o Brasil de Fato, é sócio de uma empresa de mineração no Pará, e aprovou com urgência o PL 191, que libera mineração em terras indígenas.

Por último, o Ministério Público do Rio de Janeiro apontou em investigações que o gabinete de Flávio Bolsonaro, na Assembléia Legislativa, teria financiado através de rachadinhas construções de edifícios irregulares junto com a milícia. Construções irregulares que oferecem risco aos moradores e criam uma diversidade de lixo ambiental.

Esse texto não oferece respostas objetivas para o problema da Crise Climática e os seus impactos ambientais, também há muitos aspectos dos seus efeitos não descritos.

Sobretudo, o pilar de todo esse debate é: as alterações do clima, o ecocídio, a degradação ambiental e o racismo são operados por poucos grupos, pela elite econômica e frequentemente por pessoas brancas, cabe a quem luta pela vida adiar o fim do mundo.

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