OPINIÃO

Maternidade e pandemia: por amor a minha filha busquei forças para seguir

Edição:
Redação

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Com todas as dificuldades e desafios nessa jornada de me tornar mãe durante a pandemia de covid-19, eu só posso agradecer pela vida da minha filha, porque foi o amor por ela que me salvou de uma depressão profunda, é o amor por ela que tem sustentado e trazido alegria para a minha família.

Eu preciso iniciar esse texto falando sobre a minha experiência com a gestação em tempos de pandemia. Creio que muitos desafios, tristezas e lágrimas impactaram a vida de todas as mulheres que engravidaram em 2020. Se antes da pandemia, o normal da maternidade era estar rodeada pelos seus e com direito a diversas mãos na barriga para sentir o bebê se mexendo, durante essa crise sanitária que afetou a vida do mundo inteiro, isso não foi possível.

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Nenhuma mulher que foi gestante em 2020 pode simplesmente ir a um restaurante, sentar-se, conversar e saciar o desejo de comer aquele tão famoso prato inesperado. Foram e são tempos difíceis que estamos enfrentando. Nada de chá de bebê, abraços, beijos como demonstração de carinho, nada de chá-revelação, como mais uma desculpa de reunir quem se ama em um período tão especial na vida de uma mulher que é a gestação.

No meu caso, durante a gravidez, passei por uma situação que não desejo para ninguém, quanto mais para uma mulher grávida. Por conta da Covid-19, perdi minhas duas irmãs, pois é. Com sete meses de gestação, ao invés de estar pensando no chá de bebê, fazendo todo o enxoval da minha filha, eu estava enterrando minhas duas irmãs num intervalo de 10 dias de falecimento de cada uma.

No enterro das duas eu senti minha bebê mexendo sem parar, ao ponto de precisar ir ao hospital ser medicada e só depois, sentir ela se acalmando dentro de mim. Foi por amor a minha filha que busquei encontrar forças para seguir, foi por amor a minha filha que me alimentava todos os dias sem sentir fome, foi por amor a minha filha que aceitei fazer terapia quando minha amiga Mariana Belmont, junto com a Uneafro Brasil disponibilizaram essa possibilidade para mim, e foi por amor a minha filha e também por amor ao meu companheiro Ronaldo Matos e aos meus sobrinhos, Júlio Cesar 25, e Ana Luiza 12, que resolvi me acalmar, viver e seguir em frente, por mais difícil que fosse lidar com toda a dor que senti e sinto durante esses 7 meses sem ter a minhas irmãs ao meu lado. 

Thais Siqueira durante a gestação/Foto: Flavia Lopes

O parto 

Quando descobri que estava grávida eu já tinha em mente a vontade de ter parto natural. Estava me preparando para isso, fazendo exercícios de pilates, yoga e tudo mais. Após ter perdido minhas irmãs, senti que meu mundo havia desabado na minha cabeça, parecia que o universo estava contra mim, sentia que estava me afogando e tentando lutar contra a correnteza sem sair do lugar.

Nesse período, eu estava me preparando para ser mãe pela primeira vez, e o universo me presenteou com mais dois filhos que são os meus sobrinhos. Prometi para minha irmã que cuidaria dos dois, minha irmã sabia que se algo acontecesse com ela, teria minha irmã Flávia e eu para cuidar dos seus filhos, porém, Deus também levou a Flávia e ficou somente eu aqui para cuidar, orientar e dar todo meu amor e carinho para os meus sobrinhos.

Foi quando decidi que meu parto seria cesárea, pois já sem forças meu maior medo era de passar mal durante o parto, de ter uma crise de choro durante esse processo, já que essas crises não tinham hora e nem lugar para começar.

Um dia antes do nascimento da Alika chorei muito por não ter minhas irmãs ao meu lado num momento tão especial e importante da minha vida. Era difícil não ficar emocionada, eu chorava de um lado, e meu companheiro Ronaldo Matos chorava do outro.

Me internei para seguir com o parto cesárea, minha bebê nasceu no dia 14 de dezembro de 2020. A partir deste momento um sentimento inexplicável tomou conta de mim, sentir minha bebê deitada com a cabeça encostada no meu peito pela primeira vez, seu calor, sua respiração, seu cheirinho é algo que estará guardado para sempre na minha memória e no meu coração.

Thais Siqueira durante o nascimento de sua filha, Alika/Foto: Camila Baby Boom

Foi um dia tranquilo, me sentia cansada pelo processo do parto e ao mesmo tempo energizada com a chegada dela. Porém, no decorrer da noite minha bebê teve uma pequena queda de saturação e precisou ir para a UTI. A enfermeira havia entrado no quarto para pegá-la, mas imediatamente eu levantei cheia de dores por conta da cirurgia do parto cesariana e decidir ir junto, não existia nada no mundo que me fizesse ficar deitada naquela cama enquanto minha filha era conduzida para uma UTI, mesmo que fosse para ficar em observação.

Aquela foi a primeira noite que de um total de 11 dias de muita angústia, choros e tristeza, que eu passei com a minha filha internada na UTI neonatal para recém-nascidos.

Meu coração e minha mente não estavam preparados para ter alta da maternidade sem minha filha nos meus braços. Chorei muito quando tive alta e ela ficou, as enfermeiras tentavam me consolar, mas eu não conseguia lidar com todos aqueles sentimentos.

Durante esse período, todos os dias o Ronaldo e eu saíamos cedo de casa e passávamos o dia inteiro no hospital, esperando as horas que eram liberadas para que pudéssemos ver a nossa filha. Como eu amamentava, conseguia entrar mais vezes e passava mais tempo com ela. Ali, pude sentir e observar a dor das mães que precisam lidar com seus pequenos internados numa Unidade de Terapia Intensiva.

Cada bebê que recebia alta era uma alegria coletiva, e ao mesmo tempo, os olhos dessas mães diziam: “estou feliz por ela e pelo bebê, mas quando será a minha vez, a vez de sentir a alegria de sair daqui com a minha filha?”.

Eu dormia e acordava pensando na minha filha. Nada mais fazia sentido, somente a sua recuperação poderia preencher com vida aquele vazio no peito. 

Thais Siqueira e Alika/Foto: Acevo pessoal, Thais Siqueira

Maternidade 

Depois de tanta dor e tristeza, que somaram a perda das minhas irmãs, mais o fato da minha filha ficar internada na UTI, Ronaldo e eu chegamos no hospital com a notícia de que minha filha finalmente teria alta naquele dia 25 de dezembro de 2020. Meu coração batia tão forte, a vontade que eu tinha era de pegar minha bebê no colo e sair correndo do hospital na mesma hora em que ficamos sabendo do laudo médico.

Alika teve alta no dia 25 de dezembro, data comemorativa que sempre foi importante na vida das minhas irmãs. Para a nossa família foi o melhor presente de Natal, Alika nos trouxe esperança, aconchego, uma leveza na alma depois de tudo que havíamos passado nos últimos meses.

Neste mês de maio que é celebrado o dia das mães, minha filha completa cinco meses de vida eu não vou aqui romantizar a maternidade, pois tudo muda na sua vida, nada jamais será como antes.

São cinco meses de muito amor, cabelos mais despenteados do que penteados, noites mal dormidas e apesar dela já dormir durante a noite toda, meu sono que antes de ser mãe era pesado, tornou-se tão leve que acordo no meio da noite só para olhar e ver se está tudo bem com ela. Sabe aquele velho ditado? Depois que eu fui mãe, nunca mais comi direito. É muito verdade, porque antes da gente as crias vêm em primeiro lugar.

Hoje eu estou buscando conciliar o equilíbrio de ser mãe presente e voltar ao trabalho. Esse processo não é simples, não é fácil. Eu tenho uma rede de apoio, Flavia Lopes e Evelyn Vilhena que são minha família no Desenrola, meus sobrinhos e meu companheiro Ronaldo me ajudam dentro desse processo. Se a mulher tem uma rede de apoio ajuda e muito, porém, se ela não tiver essa rede de apoio se torna mais complicado. Mais complicado ainda por conta da pandemia.

Thais Siqueira e Ronaldo Matos com Alika e família Desenrola/Foto: Acevo pessoal

Maternidade na pandemia 

Thais Siqueira e sua filha Alika / Foto: Marcelino Melo e Arte: Flávia Lópes

Eu gostaria que a minha filha estivesse rodeada de toda a minha família e de todos os meus amigos que me ajudaram no decorrer de todas as coisas que aconteceram. Porém, por conta da pandemia, isso ainda não é possível. E ser mãe durante a pandemia também é mais um desafio que precisamos enfrentar, por aqui, ninguém chega perto e pega a Alika no colo sem lavar as mãos, usar álcool em gel e usar máscara.

Nem o Ronaldo e eu que somos os pais da Alika não pegamos ela no colo sem máscara, é uma triste realidade, mas necessária para preservar a saúde da nossa filha. Não sabemos se a qualquer momento podemos nos contaminar com a covid-19 e passar para nossa bebê, o vírus é invisível, ele não avisa onde está.

Além disso, os passeios com a Alika acontecem somente quando vamos em uma consulta com a pediatra, ela ainda não sabe o que é ir ao parque, mercado ou qualquer outro lugar. Todo cuidado é pouco, mas achamos que é melhor passarmos por tudo isso agora e nos mantermos protegidos, do que renunciarmos à segurança e cuidados com ela, por conta deste momento.

Diferente da realidade de muitas mães, estou voltando ao trabalho e tendo a possibilidade de fazer isso, sem sair de casa, o que me permite mais tempo com a minha bebê, são mamadas, troca de fraldas e banhos durante reuniões por meio do Zoom ou Meet. Às vezes, é preciso pedir uns 5 minutos para agilizar uma coisa aqui e outra ali para não perder o foco da reunião.

Diante de tudo isso posso dizer uma coisa: não podemos romantizar a maternidade, mas também não podemos negar o sentimento, a força, a coragem, a fé e principalmente o amor que sentimos ao sermos mães, é um sentimento tão inexplicável que ao meu ver é um amor divino e genuíno, que só pode vir de Deus para os nossos corações.

Com todas as dificuldades e desafios nessa jornada da vida de mãe, eu só posso agradecer pela vida da minha filha, porque foi o amor por ela que me salvou de uma depressão profunda, foi o amor por ela que tem sustentado e trazido alegria para a minha família.

Então para mim, enquanto mãe, está tudo bem, não comer direito, não dormir, não conseguir me arrumar e todas as dificuldades para encontrar o caminho para lidar com a Maternidade x Trabalho, porque sei que encontrarei o equilíbrio para isso, e está tudo bem, porque o amor que sinto por ela é mais forte do que tudo que já senti na vida.

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